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Reconstruir o Mundo – Vol. 01.1 – Cap. 03 – A Recompensa Pelo Perigo Mortal

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Os caçadores arriscavam suas vidas em meio às ruínas para reivindicar as relíquias do Velho Mundo que adormeciam em seu interior. Mas o que exatamente fazia de algo uma “relíquia”? Em termos gerais, a palavra significava qualquer coisa associada à ciência e tecnologia extremamente avançada do Velho Mundo. Mais especificamente, referia-se a objetos produzidos durante o período do Velho Mundo. Estes incluíam máquinas de precisão, por exemplo, mas mesmo uma xícara comum do Velho Mundo era tecnicamente uma relíquia. Naturalmente, o primeiro traria mais dinheiro para o caçador que o recuperasse, mas a maioria dos caçadores não conseguia perceber a diferença e, portanto, levava de volta o que lhes chamava a atenção para avaliação e venda.

Como regra geral, as relíquias mais valiosas eram aquelas que não podiam ser facilmente replicadas no nível atual de tecnologia, mas nem sempre era óbvio o quanto uma relíquia seria valiosa à primeira vista. O que parecia ser um acessório barato ou um utensílio de uso diário às vezes revelava possuir propriedades extraordinárias. Por mais impossível que parecesse, uma pequena faca descoberta em uma ruína poderia cortar facilmente através de aço e concreto, para não falar de carne ou peixe, com a mínima pressão, porém nunca cortaria um humano, por mais que fosse pressionado contra a pele. E não importa quantos blocos de aço cortava, também mantinha o seu corte perfeitamente. Sua lâmina não enferrujou na água nem reagiu quando imersa em ácidos fortes como o aqua regia. Quando os pesquisadores corporativos removeram o que parecia ser o mecanismo de segurança da faca, ela tinha cortado um tanque  – e os trabalhadores dentro – que estavam claramente fora do alcance da lâmina. A própria faca imediatamente se desfez em pó.

A ciência e a tecnologia da época de Akira foi construída a partir da análise de muitos achados semelhantes. Mas mesmo pesquisadores habilidosos, com vidas inteiras de sabedoria acumulada, só conseguiram entender uma pequena fração das relíquias do Velho Mundo. Devido as relíquias serem dificilmente compreendidas  que podiam ser comercializadas a preços tão altos. E inúmeros caçadores – Akira entre eles – estavam indo para as ruínas para mais um dia arriscando suas vidas e encontrar mais.

No momento em que Akira se recuperou de quase ser morto e do desânimo que se seguiu, o fogo de artilharia do lado de fora já havia silenciado.

Como o menino parecia estar melhor, Alfa decidiu retomar a expedição.

Parece que as coisas se acalmaram, disse ela. O que você acha de voltarmos ao trabalho, Akira? E, por favor, tenha cuidado desta vez.

— Eu terei. — Akira acenou com a cabeça, sério — Farei exatamente o que você me disser para fazer. Prometo.

Bem. Vamos andando. Alfa deu à Akira um sorriso de satisfação. Assumiu  a liderança ao caminharem, enquanto Akira a seguia com um olhar intenso. Saíram do prédio e cruzaram a área onde encontraram a máquina gigante, passando por prédios desmoronados e escalando escombros enquanto passavam pelas cicatrizes da provação.

A experiência de Akira o havia afetado fortemente, tanto para o melhor quanto para o pior. Sua expressão endureceu, agora que sabia que máquinas invisíveis percorriam as ruínas – monstros que poderiam desafiar até mesmo o armamento anti-monstros – sem falar em sua pistola barata. Mas venceu seu medo com determinação e avançou cautelosamente, convencido de que estaria seguro enquanto obedecesse Alfa. Ela ficou feliz em observar sua atitude enquanto continuava a guiá-lo através das ruínas, evitando as ameaças que espreitavam ali com extraordinária precisão.

Em pouco tempo, haviam deixado a periferia e alcançado uma área mais profunda das ruínas.

Akira. Alfa apontava para um dos muitos edifícios.

Encontraremos algumas relíquias aqui.

Akira olhou para o edifício abandonado com interesse. Tendo chegado até aqui, não podia deixar de esperar por uma recompensa que justificasse seus riscos. Porém  o edifício era muito semelhante aos outros que havia passado, sem nenhum sinal de que valeria a pena sua viagem.

— Você se importa se eu perguntar por que você escolheu este lugar? — Akira perguntou sem pensar, então nervosamente questionou-se se Alfa achava que estava duvidando dela novamente.

Alfa, no entanto, apenas sorriu confiante. De modo algum, disse. Explicarei enquanto você procura por relíquias dentro. Seu comportamento convenceu Akira de que poderia esperar encontrar um grande tesouro, e a seguiu ansiosamente para dentro.

O prédio que Alfa apontou já foi um shopping center do Velho Mundo. Akira vislumbrou as sombras da antiga prosperidade ao passar por estantes esmagadas que ficavam perto de paredes abertas, sobre pisos repletos de arranhões e restos de monstros mecânicos. Fragmentos de ossos e engrenagens humanas jazem ao lado dos esqueletos dos gigantes orgânicos. Numerosas relíquias testemunharam o passado glorioso do lugar, quando estava repleto de uma deslumbrante variedade de artigos, Akira olhou para o rescaldo das batalhas entre os muitos caçadores que vieram em busca delas e das hordas de monstros. As estruturas sobreviventes do Velho Mundo tendiam a ser robustas, de modo que os buracos nas paredes e as marcas de queimaduras nos tetos eram um monumento à devastação feroz do conflito.

Os muitos corpos espalhados provaram que valeu a pena correr riscos por este lugar, mas também representavam o fim reservado para aqueles incapazes de resistir à atração das relíquias do Velho Mundo.

Você perguntou porque eu escolhi este lugar, disse Alfa. Antes de mais nada, é seguro. A maioria dos monstros mecânicos nas ruínas são sistemas de segurança para algumas instalações ou outras, e seus deveres muitas vezes incluem a eliminação de monstros orgânicos. Portanto, você está em menor perigo devido a monstros orgânicos dentro de instalações vigiadas.

— Mas isso não significa apenas que monstros mecânicos vão me atacar em vez disso? — Akira perguntou.

De fato, os sistemas de segurança mecânica patrulhavam aquele edifício também, embora não tivessem encontrado nenhum graças à orientação precisa de Alfa. Monstros mecânicos costumam se ater às rotas de patrulha e aos postos de guarda, explicou ela. Isso os torna muito mais fáceis de evitar, desde que você conheça seus padrões de patrulha.

Os monstros orgânicos, por outro lado, podem mudar seus movimentos para responder a novas situações e tomar muitas decisões impulsivas, o que os torna difíceis de prever. Portanto, enquanto você estiver comigo, estará mais seguro em áreas com uma proporção maior de monstros mecânicos.

Akira ouviu com atenção – nunca tinha ouvido isso nos becos das favelas. — Entendo. Eu nunca pensei nisso dessa maneira. Mas como você descobre esses padrões?

Existem várias maneiras, mas não vou me incomodar em repassá-las. Levaria décadas para explicá-las suficientemente bem para que você realmente as entendesse. Alfa mostrou um sorriso ousado e malicioso. Ou você preferiria ter tempo? Eu concordei em responder suas perguntas até que você estivesse satisfeito, portanto, não me importaria de lhe dizer.

— Oh, não. Eu vou passar. — Akira estremeceu. Tomou a resposta de Alfa como uma brincadeira e assumiu que ela nunca havia planejado lhe contar – mas também suspeitou que, se a provocasse insistindo numa resposta, poderia realmente começar uma explicação interminável.

Alfa sorriu. Havia antecipado a resposta dele. Sério. Bem, me avise se você mudar de idéia. Agora, porque escolhi este lugar, a outra razão é que selecionei cuidadosamente as relíquias que você coletará.

— Você escolheu? As relíquias aqui valem muito, então?

O valor das relíquias é importante, mas não tanto quanto se você pode carregá-las de volta com você. Encontrar uma fortuna não lhe fará nenhum bem se pesar dez toneladas. E por outro lado, você não poderia recuperar uma relíquia ao lado de um monstro, mesmo que fosse pequeno o suficiente para segurar em sua mão.

— Isso faz sentido.

Então fui à procura de um lugar onde é provável que você encontre relíquias valiosas que até você possa levar de volta, e decidi que esta era a melhor combinação.

Isso satisfez a curiosidade de Akira sobre um ponto, mas também suscitou outra pergunta.

— Espere —, disse ele. — Isso significa que o lugar que eu estava procurando ontem realmente está limpo?

Foi esgotado de relíquias, Alfa confirmou. Essa área estaria repleta de caçadores se ainda tivesse algo valioso por perto onde até uma criança como você pudesse encontrá-lo. Estou errada?

— Acho que não. — O pensamento de que havia arriscado sua vida por nada no dia anterior fez Akira sentir-se cansado tardiamente. — Achei que descobriria algo bom se ousasse as ruínas, mas acho que não estava pensando direito.

Você nunca teria me conhecido de outra forma, então eu diria que seu risco valeu a pena. Alfa sorriu encorajadoramente. Você terá muitas chances de apreciar a sorte que teve nos próximos dias.

Akira sorriu, com seu espírito evidentemente restaurado. — Bem observado, — disse ele. — Mal posso esperar.

Eu não vou decepcioná-lo. Alfa sorriu com confiança.

Na verdade, os arredores das ruínas ainda guardavam um punhado de relíquias de baixo valor para qualquer um que se importasse em procurá-las. Embora não valessem o suficiente para interessar a um caçador mediano, elas teriam facilmente satisfeito uma criança da favela. Em outras palavras, Akira não estava perdendo seu tempo, afinal. E Alfa estava plenamente consciente disso enquanto o conduzia mais profundamente às ruínas.

 

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Os caçadores não foram os únicos visitantes das ruínas. As empresas investiram somas imensas em expedições, e muitas outras também procuraram por relíquias. Eles continuavam, às vezes cooperando e outras vezes brigando, até que cada parte concluía que não valia mais a pena o esforço.

Todas tinham padrões diferentes para decidir quando terminariam com uma ruína. As corporações se retirariam primeiro. Elas gastaram generosamente com seus militares particulares, e seus soldados eram extremamente bem equipados e altamente qualificados.

O custo financeiro do pessoal perdido foi, portanto, igualmente extremo. Assim, as corporações rapidamente desistiram de quaisquer relíquias, exceto aquelas que não podiam ser obtidas de outra forma, tais como equipamentos de fabricação do Velho Mundo que não podiam ser reproduzidos nos dias de hoje. As corporações poderiam se envolver em conflitos armados por causa de descobertas tão raras; relíquias comuns poderiam simplesmente ser compradas de caçadores.

As organizações mais ricas preferiram resolver as coisas com dinheiro sempre que possível.

Os caçadores comuns seriam os próximos a se retirar. Eles avaliavam objetivamente potenciais lucros das relíquias contra a ameaça representada pelos monstros, pesavam os prós e contras e partiriam enquanto as probabilidades ainda estivessem a seu favor.

Os últimos a partir seriam os incrivelmente habilidosos, que continuavam a se defender dos monstros enquanto recolhiam relíquias até que não houvesse mais nenhuma, e os incrivelmente inexperientes, que ficavam muito tempo por ganância e acabavam mortos.

Dessa forma, as ruínas eram continuamente despojadas de relíquias enquanto cadáveres se empilhavam em seu lugar. A certa altura, todos comparariam a quantidade de relíquias descobertas com a quantidade de corpos restantes e decidiriam que uma ruína não valia seu tempo. Então, finalmente, ficaria deserta.

O antigo shopping center que Akira estava explorando ainda continha mais do que algumas relíquias de valor, prova de que mesmos caçadores totalmente armados achavam a área perigosa demais para valer a pena. Ele havia entrado em uma zona repleta de monstros poderosos – uma que, em circunstâncias normais, nunca teria sido capaz de alcançar.

Akira, é claro, não sabia nada sobre o valor das relíquias. Estava apenas seguindo as instruções de Alfa e enfiando o que parecia promissor em um saco de papel. Até aquele saco foi um de seus achados – o que havia trazido se rasgou com o peso.

— Tem certeza que isso vai aguentar todo o caminho de volta para a cidade? — Perguntou, olhando nervosamente para a sacola de compras que continha suas descobertas. Era feita de papel fino e parecia estar longe de ser robusta.

Não se preocupe, Alfa assegurou. Essa bolsa foi feita no Velho Mundo, uma relíquia por si só. É muito mais forte do que parece.

— Hã? Então, esta é a tecnologia do Velho Mundo. Legal.

Akira voltou sua atenção para o interior da bolsa, cheia de relíquias que Alfa havia cuidadosamente selecionado: uma faca com sua bainha, algumas peças de máquinas de uso desconhecido, várias embalagens que Alfa havia dito que continham remédios para ferimentos, algo que parecia um curativo, algo mais que se parecia com um relógio de pulso, e assim por diante. Todos eram pequenos objetos porque Alfa rejeitou qualquer coisa muito volumosa ou pesada para uma criança como Akira carregar.

Akira distraidamente tirou a faca da bolsa e a segurou. Parecia comum, como uma faca que poderia ver em exposição em uma barraca de rua. Removeu a bainha para revelar uma lâmina arredondada que parecia tudo menos afiada.

— Você tem certeza de que esta faca é do Velho Mundo? — Perguntou ele. — Há algo de especial nisso? Não me parece grande coisa.

Deve ser bastante útil para cortar coisas, respondeu Alfa. Ela tem um mecanismo de segurança, mas eu teria cuidado ao lidar com ela se eu fosse você.

— Entendi. — Akira guardou a faca na bolsa, que ainda tinha espaço para mais relíquias e não era particularmente pesada. Tendo vindo de tão longe, estava ansioso para voltar com o máximo que pudesse carregar. — Ainda não está cheio. Não deveriamos pegar mais algumas?

Alfa sacudiu a cabeça. Não, esse é o seu limite, disse. Você terá que correr se encontrarmos algum monstro no caminho de volta, então qualquer coisa volumosa ou pesada o suficiente para atrasá-lo fará com que você morra. Não seja ganancioso.

Akira valorizava sua vida e estava determinado a obedecer à Alfa. Arrependidamente, acenou com a cabeça e desistiu de sua busca.

— Entendi. Então, quanto vou receber por tudo isso?

Eu também não posso ter certeza disso. A taxa atual para relíquias flutua com a demanda. E você não vai vender todas. Ponha a faca de lado para você, e eu aconselharia a não vender o remédio também. Mesmo ferimentos leves muitas vezes levam a sérios problemas sem tratamento adequado. Pense nisso como um seguro.

— Isso significará ainda menos para vender.

Você terá que aguentar isso; é uma despesa necessária.

Akira hesitou, então concordou. — Bem. — Ainda lamentava que não poderia vender tantas relíquias, mas disse a si mesmo que o que restava ainda era suficiente para alguém como ele. Voltou sua atenção para outro lugar.

Agora, vamos começar de novo, disse Alfa. Desta vez, você estará carregando um peso decente, portanto seja especialmente cuidadoso. Se você for visto devido a  essa bolsa que o atrasa, você realmente será explodido em pedacinhos desta vez. Sorriu ameaçadoramente, provocando uma careta em Akira.

— Eu… Eu ficarei bem.

Então vamos lá.

Mais uma vez Akira seguiu Alfa nervosamente. Por sua vez, Alfa usou um sorriso alegre.

Akira conseguiu voltar ao deserto – perigoso por si só, mas ainda mais seguro do que as ruínas patrulhadas por monstros invisíveis. Inconscientemente, fez uma nota mental marcando o fim de sua expedição e relaxou, embora certamente ainda não estivesse seguro. Ao fazer isso, o cansaço que havia esquecido em seu estado tenso voltou rapidamente e soltou um suspiro.

Poderíamos parar para descansar, se você estiver cansado, sugeriu Alfa. Você não precisa se preocupar em ficar de vigia enquanto eu estiver por perto.

— Boa idéia. — respondeu — Porém não vamos demorar muito; quero voltar para a cidade o mais rápido que puder.

Tudo bem! Você gostaria de conversar nesse meio tempo?

A vida solitária de Akira o deixou sem nada para contribuir, então Alfa acabou fazendo a maior parte das conversas, enquanto ele a encorajava com um comentário ocasional.

A propósito, disse, você sabia que a cidade de Kugamayama foi fundada para explorar as ruínas da cidade de Kuzusuhara?

 — Sério? Eu não tinha ideia. Você certamente sabe muito.

Pode não parecer, mas estou bastante bem informada. Dito isto, a maior parte do meu conhecimento é sobre o Oriente. Não posso lhe dizer muito sobre o Ocidente ou o Centro.

— O Ocidente, huh? Também não sei muito sobre isso, mas ouvi dizer que é como se fosse um outro mundo.

Eu conheço apenas algumas histórias. Alguns dizem que carece de qualquer tecnologia superior e outros que é habitada por magos, mas você deve levar isso com cautela.

— Centro está cheio de organizações chamadas, um…países? Acertei?

Assim ouvi dizer. “O Oriente” é tudo a leste do Centro, embora também possa significar a área que a LOCG – Liga Oriental das Corporações GovernamentaisControla. Você está interessado no Centro, Akira?

— Nah. Quero saber primeiro tudo o que devo sobre o Oriente. Quero dizer, ainda nem sei ler.

Deixe isso comigo. Vou acrescentar uma educação básica ao seu regime de treinamento, além da alfabetização.

— V- Você vai? Obrigado. — Akira sentiu-se grato pela generosa oferta de Alfa, mas isso também o assustou um pouco. Acreditava firmemente que um presente gratuito poderia custar muito caro.

De nada. Alfa lhe deu um sorriso gentil. Sua felicidade, no entanto, era só para ela.

 

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De volta a Kugayama, Akira foi direto para o Posto de Trocas local. O Escritório dos Caçadores mantinha vários desses postos por toda a cidade, e sua clientela variava de acordo com o distrito. As trocas dentro das paredes lidavam principalmente com caçadores de elite cujas descobertas valiosas ocasionalmente desencadeavam guerras de lances corporativos, elevando ainda mais seus preços astronômicos. Aquele que Akira visitou – no distrito inferior, próximo às favelas – servia principalmente a uma mistura de caçadores novatos e moradores de favelas, e só atraía as relíquias mais baratas. Embora as trocas fossem teoricamente tratadas exclusivamente em relíquias, este ramo de menor prestígio começou, com o tempo, a comprar outras mercadorias – embora geralmente a preços baixos – e tornou-se uma fonte vital de renda para os residentes locais.

Akira entrou na estação de troca e retirou as relíquias que estava vendendo de seu saco de papel. Colocando-as em uma bandeja, entrou em uma fila para esperar sua vez no balcão. Havia seguido o conselho de Alfa e guardado a faca e os suprimentos médicos para si mesmo. Nojima, o homem de meia-idade que comandava o balcão de câmbio, avaliou Akira como um menino de rua e o tratou de acordo – até perceber que os objetos na bandeja do menino não poderiam ter vindo das favelas.

— Mostre sua identidade de caçador se você tiver uma — disse, de repente todo profissional. Akira apresentou o pedaço de papel que lhe foi entregue como identidade. Nojima o tomou, inseriu alguns dados em um terminal próximo e depois os devolveu junto com três moedas. A bandeja e as relíquias nela contidas acabaram em uma prateleira atrás do funcionário. Akira olhou para as moedas em sua mão, cada uma valendo cem auruns.

O aurum era uma moeda corporativa emitida pela Sakashita Indústrias Pesadas, uma das cinco principais empresas que compunham a LOCG. Como tal, o aurum era usado principalmente dentro da esfera de influência econômica da SHI, que incluía a cidade de Kugamayama. O valor de trezentos auruns era relativo – ele compraria uma única refeição barata para um residente médio do distrito inferior de Kugamayama, enquanto que no distrito de elite era um trocado de bolso que não compraria nem mesmo um copo de água. E os trezentos auruns na palma de Akira foram o fruto de sua jornada mortal nas ruínas, sua recompensa por enfrentar os ataques de um monstro para recuperar relíquias que nunca poderia ter alcançado sem o apoio de Alfa – e apenas mal o tinha feito com ela.

O menino olhou para as míseras três moedas com intensa insatisfação, depois olhou para cima para encontrar o olhar de Nojima com um olhar franzido, pronto para protestar, embora não tivesse sequer certeza do que dizer. Mas o funcionário tinha esperado sua reação e não lhe deu a chance.

— Tenho certeza de que você tem sua parcela de reclamações, disse com uma expressão profissional e um tom de cautela, mas você é um caçador de nível um sem credibilidade e nenhum histórico, e esta é sua primeira venda, então sua taxa é fixada em trezentos aurum. De qualquer forma, deveria estar grato por estarmos dispostos a te pagar tanto pelo que pode acabar sendo lixo mesmo sem pré-avaliação.

Akira entendeu o ponto de vista do homem, e até concordava com uma parte dele, mas isso não fez nada para amenizar sua expressão. Percebeu que seria inútil discutir, no entanto.

— Terminaremos a avaliação de seus bens amanhã o mais cedo possível. — continuou Nojima, observando a atitude de Akira. — Uma vez feito isso, acrescentaremos o que ainda lhe devemos à sua próxima taxa, a não ser que o valor da avaliação seja inferior a trezentos auruns, caso em que você nos pagará a diferença. Portanto, se está confiante de que trouxe algo que vale muito, volte e nos venda mais alguma coisa.

— Iremos reconhecê-lo pelo seu ID de caçador, por isso, se o perder, pode perder a sua confiança e reputação com ele. Alguma pergunta?

— Então eu devo voltar amanhã? — Akira perguntou, incerto.

— Somente se a avaliação estiver concluída, e quanto mais valiosa uma relíquia, mais tempo isso leva. E mesmo assim, somente se você tiver algo mais para trocar. Você não será pago por sua última descoberta até que nos venda sua próxima, então não apareça de mãos vazias. — Uma pitada de preocupação era demonstrada pela atitude séria de Nojima. Ele tinha visto muitas crianças como Akira aparecerem no posto de troca com relíquias duramente conquistadas, mas poucas delas voltaram para fazer uma segunda venda, e apenas um punhado delas listadas até a décima. O resto ou desistiu da caça ou morreu.

— Não sei quantos riscos você correu hoje, mas se você quer ganhar a vida como caçador, terá que continuar correndo-os. Se isto foi suficiente para quebrar seu espírito, desista. Você vai acabar morrendo.

— Não, obrigado. — Akira atirou de volta imediatamente. — Eu poderia morrer com a mesma facilidade nas favelas. Vou continuar adiante.

Nojima sorriu. Isso lhe parecia determinação – e a determinação dava força às pessoas, tornando sua sobrevivência mais provável.

— É verdade? — disse. — Bem, tome cuidado lá fora.

A ideia de que esse garoto poderia sobreviver levantou o ânimo de Nojima quando passou para o próximo cliente.

Fora do posto de troca, Akira olhou uma vez mais fixamente para os trezentos auruns em sua mão. Fez as pazes com seu pagamento por enquanto, mas ainda não estava feliz com isso. Suspirou, liberando seu desânimo, então enfiou as pequenas moedas – sua recompensa por perigo mortal – em seu bolso.

Alfa sorriu encorajadoramente para ele. Não se preocupe, disse. O resto de seu pagamento está um pouco atrasado, mas valerá a pena a espera.

Akira se recolheu e acenou com a cabeça enfaticamente. — Sim, você está certa. De jeito nenhum vou deixar que uma coisinha dessas me afete. —  Obrigou-se a se concentrar no que viria em seguida. — Alfa, amanhã vou voltar para as ruínas.  Está tudo bem para você?

Com certeza.

Chegar cedo depois de um dia de aventura, acordar revigorado para a caça às relíquias do dia seguinte: Akira não teria gostado de mais nada naquele momento. Mas seu plano de voltar para a ruína acabou sendo adiado, enquanto Akira seguia em direção ao beco onde fazia sua cama, alguns outros moradores da favela o atacaram nas ruas secundárias. Tinham observado o posto de trocas e apostaram que qualquer um que trouxesse algo para vender estaria saindo com dinheiro. E lutaram com o menino até a morte por apenas trezentos auruns.

No final, venceu, mas levou um tiro no estômago – normalmente um ferimento fatal.

Só escapou da morte graças ao remédio que havia encontrado nas ruínas, que se mostrou tão chocantemente eficaz que o restaurou para uma condição perfeita após um único dia de descanso.

Apesar deste lembrete sombrio de que ainda mal era forte o suficiente para sobreviver nas favelas, retornou às ruínas recém-determinado a ter sucesso como caçador.

 


 

Tradução: Nagark

Revisão: Bravo

 

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