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O Paladino Viajante – Vol. 02 – Cap. 01.1

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Essa pessoa usava um manto com capuz que dificultava a visão dos olhos. E estava segurando um arco exclusivamente decorado em suas mãos. Uma flecha já havia sido encaixada na corda. Tinha penas brancas. Essa pessoa ainda não havia puxado a corda do arco, mas parecia estar em um estado de alerta, que me disse que poderia fazer isso em segundos, se tivesse vontade. O capuz e a roupa exterior tinha um esquema de cores do solo e da grama, e usava bota alta de couro e luvas de couro. Um facão curto estava pendurado na cintura e também tinha várias outras facas. Era provavelmente um caçador.

Silêncio mortal.

Eu contra o suposto caçador. Ninguém falou ou se mexeu.

A tensão piorava a cada segundo que se passava.

Nada bom, pensei. Deveria estar apreciando a emoção do meu primeiro encontro com outra pessoa viva agora, mas não podia nem me dar ao luxo de fazer isso. Realmente nada bom.

O primeiro contato havia sido acidentalmente estabelecido entre dois completos estranhos no meio da floresta. Só o conhecimento da minha vida anterior poderia ter me dito que essa era uma situação extremamente perigosa. Afinal, esta era uma floresta longe da civilização. Não existe sistema judicial ou aplicação da lei aqui. Em outras palavras, se a violência repentinamente ocorresse, eu não poderia esperar receber o mínimo de ajuda. Era um lugar como esse onde nos encontramos, ambos estranhos e armados.

Agora… qual seria o curso certo de ação?

Devo sorrir e pedir um aperto de mão ou algo assim? Eu me coloco no lugar dele: Se um homem armado que encontrei de repente sorrisse para mim e estendesse sua mão… eu poderia pegar nessa mão?

Talvez eu devesse soltar minha arma para mostrar que era inofensivo? E se essa pessoa já pretendia lutar comigo? E se suspeitar de uma armadilha? E quanto à possibilidade de que, quando eu largar minha arma, esse movimento possa ser mal interpretado como o primeiro sinal de um ataque?

Usar bênção para mostrar que sou um devoto seguidor de um deus? Não, isso ainda deixaria a possibilidade de eu ser um sacerdote de um deus maligno, tentando esconder minha verdadeira natureza. Além do mais, me pergunto se essa pessoa realmente apenas ficaria parada e assistiria enquanto eu começava a usar uma habilidade bem na frente dela.

Sim… eu não tinha como provar que não era uma ameaça. E ainda pior, eu não pertencia a uma comunidade. Portanto, não poderia sequer fornecer o nome de alguém que pudesse me atestar. Isso significava que não tinha como provar meu caráter. No meu mundo anterior, os antropólogos culturais haviam advertido sobre os perigos do primeiro contato acidental com pessoas desconhecidas. A tensão e a cautela eram altas nesse tipo de situação, e era possível que isso se desenvolvesse diretamente para uma luta letal.

Minha frequência cardíaca subiu. O caçador ainda estava decidindo como lidar com essa situação, mas eu poderia dizer que essa pessoa estava tão tensa e em guarda quanto eu; o olhar sendo lançado sobre o meu equipamento das profundezas do capuz dela era a prova. Ela estava sendo pressionada a tomar uma decisão entre lutar ou fugir.

O caçador baixou os quadris um pouco. A sensação de formigamento na minha pele ficou mais intensa.

Isso era ruim. Muito ruim. Nesse ritmo, íamos acabar lutando até um de nós morrer.

Enquanto procurava desesperadamente as palavras certas, voltei os olhos para o que a pessoa carregava, percebi de repente: o arco que o presumível caçador estava carregando, já havia visto aquele estilo de arco antes, nas aulas de história natural de Gus. Sim, isso era… Então eu deveria…

Entrando em pânico internamente e me movendo muito devagar para não provocar um ataque do meu oponente, coloquei a palma da mão direita no lado esquerdo do peito e pronunciei cada palavra da forma mais clara e cuidadosa possível.

— “As estrelas brilham na hora do nosso encontro.”

A pessoa encapuzada diante de mim ficou com os olhos arregalados.

— Élfico Antigo…? — Ela dissera com um tremor de choque em sua voz. Era uma voz tão clara e linda quanto um sino. — Você tem conexão com os elfos?

— Não. Mas eu pensei que você pudesse ter.

Eu me lembrava desse tipo de arco. De acordo com as aulas de Gus sobre a história natural, Rhea Silvia, a deusa da água e da vegetação, tinha como servos uma raça de pessoas bonitas e com longevidade, descendentes das grandes fadas que haviam sido criadas há muito tempo pelo Progenitor. Eles eram uma raça chamada de elfos, e era a eles que este arco pertencia. Então pensei que usar uma saudação élfica poderia ajudar a soltar um pouco da tensão.

— Keh! — O caçador cuspiu com desdém. — Bem, você não está errado.

Eu adivinhei certo. A voz do caçador se abrandou um pouco, mas dessa vez foi a minha vez de me surpreender: apesar de ter uma voz bastante melódica, o tom dela parecia bem rude. Ouvi dizer que as longas vidas dos elfos fizeram deles uma raça paciente e muito graciosa…

— Eh. Seja como for. — O caçador relaxou a postura e tirou o capuz.

A primeira coisa que chamou minha atenção foi o cabelo prateado. Sobrancelhas franzidas, olhos afiados de jade, nariz esguio, linha elegante do queixo e lábios finos e apertados. De baixo do capuz, o rosto de um menino com uma beleza de alguma forma feminina foi revelado.

Suas orelhas não eram as longas e pontudas orelhas que eu poderia esperar, mas eram curtas, mais ou menos do mesmo tamanho que as de um humano, e só um pouco mais pontudas. Se me lembro de minhas lições corretamente, isso era característico de um meio-elfo, um filho de raça mestiça nascido entre elfos e humanos…

— Melhor perguntar, — disse ele, interrompendo meus pensamentos. — Você fez isso? — Ele apontou para o javali deitado no chão e depois para a lâmina da minha lança, molhada de sangue.

— Sim, eu fiz.

Ele franziu a testa.

— Esse é um jeito antigo de falar…

Fiquei confuso por um momento, mas depois de pensar sobre isso, percebi que cerca de duzentos anos se passaram desde o tempo de Sanguinário e Maria. Isso era mais do que tempo suficiente para uma linguagem mudar, mesmo que este mundo tivesse raças como os elfos que viviam vidas muito mais longas que os humanos. Eu devo ter soado antiquado. Talvez até arcaico. Em termos de português do meu antigo mundo, eu poderia ter soado como se estivesse falando usando palavras como “tu” em vez de “você”. Eu teria que ouvir como as pessoas atuais falavam e consertar meu discurso para que correspondesse e não deixar as pessoas cautelosas comigo.

— Desculpa. É uma espécie de hábito.

— Estranho, mas seja o que for. Então, essa coisa, — disse o meio-elfo de cabelo prateado, voltando o assunto para o javali. — Era minha. — Ele apontou para a flecha saindo dele.

As penas da flecha eram brancas, o mesmo que as outras flechas em sua aljava. O fato de não ter muito tempo entre eu matar o javali e ele aparecer também indicava que ele provavelmente não estava mentindo.

— Você se intrometeu e matou, — disse ele sem rodeios.

A razão pela qual ele estava praticamente me acusando de roubar sua presa era provavelmente porque ele estava cauteloso com exatamente o que estava acontecendo com ele. Ele queria me parar antes que eu tivesse a chance.

O desejo de pedir desculpas era quase instintivo, um hábito da minha vida passada, mas evitei.

— Sim. Ele veio me atacando, então fui forçado a fazer isso para me defender. Mas… — Isso foi, na verdade, um assunto de discussão. Era hora de táticas de negociação. — Eu o matei , então eu assumo que tenho direito pelo menos da metade.

Eu estava esperando que isso pudesse me levar a entrar em um acordo… se isso seria um élfico ou um humano, eu não tinha ideia.

 

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As negociações continuaram em profundidade por um tempo.

O meio-elfo de cabelos prateados era um excelente negociador; eu, por outro lado, não tinha experiência no mundo real em negociações e estava praticamente à sua mercê. Ele parecia estar na mesma faixa etária que eu, mas os elfos e, de fato, os meio-elfos que compartilhavam parte do sangue élfico viveriam mais tempo, então, pelo que sei, ele poderia ser consideravelmente mais velho do que eu. Apesar disso, de alguma forma consegui manter a minha posição, e eventualmente estabelecemos um acordo onde eu pegaria o ombro do lado que apunhalei em troca de ajudar a matar o javali.

Matar um javali selvagem exige muito trabalho.

Para começar, tivemos que levá-lo até um rio, drenar o sangue e depois limpá-lo juntos. Sua pele estava coberta de lama. Provavelmente estava se esfregando em algum lugar.

— Ahhh, essa merda está em pedaços, — disse o cabelo prateado, olhando para a cabeça da flecha que tirou do javali selvagem. Ela havia quebrado em pedaços. Deve ter atingido um osso.

Eu o observei soltar a ponta da flecha e guardá-la cuidadosamente no bolso. Parecia que itens de metal eram muito valiosos nessa área no momento.

— Temos que tirar os fragmentos, — disse ele. — Se alguém morde esta coisa pensando que é carne, vai se dar mal.

Utilizamos uma área plana de pedra ao lado do rio para remover cuidadosamente os fragmentos da ponta da flecha, e depois começamos a trabalhar. Eu desenvolvi algumas habilidades nisso graças a Sanguinário, mas o cabelo prateado era ainda mais eficiente do que eu. A gordura subcutânea era deliciosa de suínos selvagens, então o teste de sua habilidade com faca nessa situação era o quão perto da pele você poderia cortar. E ele era terrivelmente preciso e rápido também.

— Agora, então. — Ele enfiou a faca sob a mandíbula do javali e cortou todo o seu pescoço. Ele parecia ter alcançado o osso do pescoço, então eu segurei a cabeça e torci para deslocá-la.

— Heh. Você sabe sobre essas coisas. — Ele me deu um sorriso, então sorri de volta. Então, com alguns pequenos movimentos da faca, ele cortou a carne e o tendão e separou a cabeça completamente.

Eu coloquei a carcaça do javali de costas e a segurei, e ele começou a cortar sua barriga da garganta até o final, tomando cuidado para apenas cortar a pele. Cortar profundamente causaria danos aos órgãos internos, o que resultaria em… hum, uma boa maneira de dizer… o conteúdo de seus intestinos, bexiga e órgãos reprodutivos saindo tudo e fazendo uma enorme bagunça. Dessa maneira, não haveria necessidade de se preocupar.

Quando terminou, ele fez cortes em vários lugares com um machado, e então juntos forçamos as costelas a se separarem. Cortamos ao redor do ânus, abrimos a cavidade torácica, descemos o diafragma, descascamos a membrana até a coluna vertebral…

— Você vem pra fora… — Ele agarrou a traqueia e o esôfago do porco e os puxou para a extremidade traseira. Todas as suas entranhas saíram de uma só vez em uma única massa. Ele fez tudo certinho.

Nesse ponto, parecia muito mais com “carne”, o tipo que eu tinha visto congelado e pendurado em filmes e na TV na minha vida anterior. Enfrentei a cabeça do javali que removemos e juntei minhas mãos em oração.

Eu sinto muito. E obrigado. Nós não desperdiçaremos o que tomamos.

— Você é um verdadeiro crente, não é? — Ele disse brincando, dando de ombros gentilmente. — Mmkay, como combinado, um ombro para você. — Ele habilmente inseriu seu facão em uma junta da carne que uma vez foi um javali e cortou apenas o ombro da frente. — E isso é feito para o porcionamento.

— Yep.

Com um machado encharcado de sangue e um facão curto em nossas mãos, trocamos sorrisos em reconhecimento pelo trabalho árduo um do outro.

— Acho que é melhor comermos o fígado. Vai estragar rapidinho, — ele disse.

— Ah, eu tenho uma panela.

Fígado fresco é delicioso.

Nós estávamos trabalhando no rio frio do inverno, então minhas mãos já estavam congeladas. Enquanto o cabelo prateado estava fora pegando troncos, eu juntei alguns galhos secos e rapidamente ateei fogo neles com um Flammo Ignis sussurrado. Pensei que seria melhor manter em segredo que eu poderia usar magia por agora. Não era que eu achasse que ele não fosse confiável… embora isso fosse possível. Simplesmente não sabia o suficiente sobre a sociedade moderna. Magia pode ser aceita na época de Gus, mas eu não sabia como a sociedade a considerava hoje.

— Brrr… Deuses, que frio. — Eu tirei minhas botas e esquentei minhas mãos e pés ao lado do fogo.

Depois de um tempo, cabelo prateado voltou.

— Congelando, — ele disse, jogando alguns troncos no fogo. Então sentou-se ao meu lado. Nós sorrimos um para o outro por algum motivo.

— Beleza, aqui está o que tanto esperamos, — eu disse.

— Até que enfim.

Segurei a panela sobre a chama e coloquei um pouco de gordura de javali. Uma vez que tinha coberto bem o fundo da panela, coloquei as tiras de fígado que eu já tinha cortado, depois tirei um pouco de sal e salpiquei. Um som crepitante acompanhou o cheiro delicioso de carne cozida.

Fechei meus olhos e coloquei minhas mãos juntas.

— Mater nossa Mãe-Terra, deuses de boa virtude, abençoe esta comida, que por amor misericordioso estamos prestes a receber, e deixe-nos sustentar em corpo e mente.

— Porra, você é realmente um religioso radical. — O meio-elfo de cabelo prateado estava me olhando incrédulo. Parecia que ele não era do tipo que acreditava muito nessas coisas.

Mas pensando nisso logicamente, eu era o único com memórias de uma vida anterior. Não faria mais sentido eu estar esperando impacientemente para comer, e ele ser religioso? Apesar de estar no meio da oração, eu me diverti com o quanto isso era sentido.

— Pela graça dos deuses, estamos verdadeiramente agradecidos.

— Impressionante. Agora vamos comer.

Ele pode ter ficado impaciente, mas pelo menos foi educado o suficiente para não ignorar minha oração e começar a comer antes de mim.

Depois que terminei de orar, cada um pegou uma faca que tínhamos lavado e limpo, espetou em um pedaço de fígado cozido na panela e levantou-a. O vapor estava subindo. Enfiei a carne na minha boca.

Estava quente. E tão delicioso. O forte sabor do fígado com apenas uma pitada de sal adicionado encheu minha boca. Deuses, estava bom. Eu me peguei desejando uma cerveja gelada.

Até mesmo as rugas na testa do cabelo prateado tinham se afrouxado agora. Refeições consumidas depois de muito trabalho eram realmente deliciosas.

Antes que eu percebesse, o sol quase se pôs.

 

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— Hã? Você quer saber… o caminho? O quê?

Quando lhe perguntei o caminho depois de terminarmos de comer, ele olhou para mim de maneira estranha, como eu esperava.

Foi quando eu soube que estava certo em perguntar. A questão era um pouco perigosa. Ele levantava suspeitas que seriam difíceis de responder. Tal como…

— Sério, de onde você veio? Eu nunca te vi por aqui.

— Bem, isso é… difícil de explicar. Não sei o que dizer.

Se eu fosse cem por cento honesto com ele e dissesse: “Eu fui criado por mortos-vivos em uma cidade arruinada, lutei contra o deus da morte e comecei uma jornada”, ele acharia a história tão louca que tive absolutamente nenhuma confiança que eu poderia levá-lo a acreditar. Não ter uma maneira de provar as coisas são muito difíceis, não importa a sociedade. Os seres humanos não têm como se mostrar inofensivos por conta própria; eles só podem pedir a outras pessoas para atestar por eles. No meu mundo anterior, isso veio de sistemas sociais como o registro familiar e carteira de identidade, e neste mundo, parecia vir de seus parentes e da comunidade local. O fato de não tê-los equivalia a declarar ao mundo que eu poderia ser uma pessoa perigosa. Mas um feiticeiro que usa Palavras dificilmente pode se dar ao luxo de mentir… então, por enquanto, decidi ser um pouco vago para não ter que mentir.

— Eu vim do sul, serve?

— O sul? Irmão, não tem “sul”. Aqui é o mais sul possível.

— Como assim, não tem sul?

— Este é o ponto mais meridional. Fronteira da humanidade. Você está na Floresta das Bestas em Southmark.

Floresta das Bestas. Esse era um nome bastante intimidante. Talvez houvesse muitas criaturas ferozes. Aquele javali certamente era uma delas. Eu vou ter que tomar cuidado.

Como eu pretendia explicar isso? Realmente não tinha ideia.

— Eu vim do sul. É complicado…

— Ohh… Você é um desses tipos de aventureiros? Um caçador de ruínas?

Um caçador de ruínas… Agora que pensei nisso, havia ruínas que recontavam o tempo de Maria e Sanguinário espalhadas pela estrada até aqui. Talvez escavar esses tipos de lugares fosse uma ocupação para algumas pessoas? Nesse caso, minha situação não era tão diferente. Afinal, eu mesmo estava tentando subsistir apenas o que ganhara naquela cidade arruinada.

— Sim, é mais ou menos isso…

— E você se perdeu?

— Hmm, eu acho… isso é meio que… — eu respondi, parecendo quase desanimado.

— Oh, cara. — O meio-elfo de cabelos prateados suspirou em aparente desespero. — Você é o aventureiro mais indiferente que já vi. Ehh… tanto faz. Apenas siga este rio a jusante. Alguns dias e você estará em uma pequena cidade. Provavelmente vai te ajudar a partir daí. Boa sorte. — O tom de suas duas últimas palavras me disse claramente que não se importava. Parecia que a boa vontade que eu nutria ao trabalhar com ele estava desaparecendo rapidamente graças à conversa muito suspeita que eu havia começado.

— H… Hmm, eu entendo que não é muito bom perguntar isso, — eu falei hesitante, — mas se houver alguma chance eu poderia parar onde você vive ou algo do tipo…

Seus olhos ficaram incrivelmente afiados. Dando um suspiro longo e exasperado, ele olhou para mim.

— Eu não quero me envolver muito com você. Não me faça desenhar.

— Sinto muito.

Não pude discutir. Ele estava totalmente certo e eu sabia disso. Se eu estivesse no lugar dele, também não iria querer me envolver nos meus assuntos. Eu era um soldado armado de identidade e filiação desconhecidas. Quem gostaria de convidar alguém assim para a comunidade?

— Então não me siga.

Percebi que o sol estava quase se pondo e estava ficando muito mais escuro.

Ele se levantou e jogou o javali em suas costas. Ele tinha uma constituição pequena, mas era mais forte do que parecia. Deve ter treinado. Treinar aumenta suas habilidades físicas muito mais neste mundo do que no meu antigo.

— Ah, você está bem sem uma luz?

— Eu posso cuidar de mim mesmo, obrigado.

Ele murmurou alguma coisa, e o que parecia ser uma bola de luz veio flutuando das profundezas da floresta em direção a ele.

— O que é…

— É uma fada.

— Nunca vi uma antes…

Fadas e elementais eram feérico inferiores: seres frágeis que eram mediadores da natureza e a ajudavam com seu trabalho. Havia técnicas para poder conversar com eles e, às vezes, fazer uso deles. Aqueles que podiam manipular essas artes místicas eram referidos como elementais.

Os elfos, que eram servos do deus dos feéricos, Rhea Silvia, diziam ter uma forte afinidade com outros servos feéricos. Evidentemente, esse meio-elfo que herdara sangue élfico não era exceção.

Lembrei-me de uma vez ter lido em um dos livros de Gus que a essência do elementais era sensível, compreensiva e receptiva ao nebuloso e volúvel. Era ainda outro ramo do místico, separado da “magia”, o poder das Palavras, com seu foco na teoria, conhecimento, memória e repetição, e da “bênção”, que oferecia proteção e graça divina para agir com fé religiosa e a disciplina.

— Adeus, — ele disse simplesmente, e se afastou para longe com o javali nas costas.

Foi a única conversa que tive com outra pessoa em quase dez dias. Talvez fosse por isso que senti uma estranha vontade de não deixá-lo ir. Antes que eu percebesse, eu estava chamando-o quando saiu.

— Eu sou Will! William G. Sanguimari! e você?

Houve uma pausa antes de ele responder.

— Menel. Meneldor. Duvido que nos veremos novamente, entretanto, — ele respondeu, indo embora. — Tente não morrer na sua jornada.

Com o javali esfolado nas costas, ele se afastou, o chão ao redor dele iluminado pela luz da fada brilhante. Eu o assisti ir sem tentar segui-lo.

Desconfiado de criaturas que poderiam ser atraídas pelo cheiro de sangue, eu fui para uma boa distância de onde tínhamos esfolado o javali. Acendi outra fogueira e usei corda para amarrar minha folha de lona entre algumas árvores para fazer uma barraca rudimentar. Inscrevi Sinais que serviriam como alarmes de advertência em vários lugares, e Palavras com o poder de afastar insetos e coisas de natureza demoníaca. Finalmente, peguei o cobertor e fui para a cama. O ombro do javali que peguei seria o café da manhã de amanhã.

Eu mantive uma conversa com uma pessoa real e viva. Na verdade, foi surpreendentemente bom. Estava me preocupando por nada.

Menel. Meneldor. Eu parecia lembrar que significava “uma águia muito veloz” em Élfico. Ele foi um pouco rude, mas me diverti conversando com ele.

Ele disse que nós provavelmente nunca nos encontraríamos novamente. Enquanto eu caía no sono, esperava que algum dia nós nos encontremos.

Na calada da noite, ouvi uma voz.

Prithee, Ó fogo.

No nevoeiro entre o sono e a vigília…

Ó meu fogo.

… era uma jovem mulher com cabelos negros e um capuz que obscurecia seus olhos.

Conforme você viaja…

Sempre reticente e inexpressiva, ela falou seu desejo:

Prithee, traga luz para a escuridão distante.

E então, como relâmpagos, numerosas visões iluminaram o interior da minha cabeça, queimando em minha mente.

Armas. Gritos. Caos. Sangue. Sangue. Corpos. Corpos. Corpos. E… cabelo prateado.

Eu respirei profundamente.

— Lúmen!!

Quando mergulhei a luz na lâmina de Lua Pálida, apressadamente preparei meu equipamento e corri para a floresta noturna.

 

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Eu continuei andando, meu caminho iluminado por magia. Se eu não fosse mais rápido, ficaria louco. As revelações estavam descaradamente prevendo uma tragédia, e Menel ia ser a vítima.

Eu cerrei meus dentes.

Eu suspeitava disso, mas agora estava confirmado: a era em que eu estava vivendo era seriamente perigosa. Alguém que você conheceu hoje pode ser um cadáver amanhã. Loucura…

Eu olhei em volta de mim. Não havia nada além de floresta escura. O inverno significava que a grama não estava muito coberta, pelo menos, mas duvidava que eu seria capaz de alcançar a vila de Menel nesta escuridão apenas andando cegamente. Eu tinha a opção de rastrear as pegadas de Menel, mas se eu fizesse esse tipo de busca cuidadosa, não sabia se conseguiria chegar a tempo. Sem mencionar que Menel poderia ter coberto seus rastros. Ele era cauteloso comigo, afinal, e era um caçador profissional. Se ele estivesse falando minimamente sério sobre esconder suas pegadas de mim, eu não seria capaz de fazer nada sobre isso.

Eu entoei várias Palavras em rápida sucessão. Eram Palavras de busca, usada para detectar coisas.

— Para lá…

Era uma magia simples que estima a direção geral, mas era melhor que nada.

Eu me preparei para ser imprudente.

Segurando meu escudo, atravessei as moitas da floresta, pulei por uma encosta íngreme e entoei Queda Suave para amortecer a queda. Impulsionei-me para frente, fazendo uso pesado de uma variedade de técnicas que qualquer um acostumado com a caminhada normal na floresta definitivamente faria se eles me vissem.

O fato de haver uma vila significava que deveria haver um espaço bem aberto em algum lugar. Parando de vez em quando para obter um senso geral de direção com as Palavras de Buscas, continuei correndo.

De repente, lá estava. Eu podia ver a área aberta fora da floresta. Havia campos com fileiras de sulcos e, além delas, na escuridão da noite, quase conseguia distinguir os contornos de várias casas cercadas por uma cerca de madeira. Parecia que nada havia acontecido.

Eu… não cheguei tarde…?

Não… Havia uma chance, uma boa chance, de que a tragédia já tivesse acontecido. Não sabia a causa do que eu tinha visto nessa revelação. Poderia ser um demônio, um goblin, uma criatura morta-viva, uma besta… Se me aproximasse descuidadamente, era possível que eu fosse atingido antes de estar pronto.

Conjurei várias Palavras e matei a luz que ficava na lâmina da Lua Pálida. Primeiro de tudo: observar. Eu decidi ficar em alerta e me aproximar com cautela. Mantendo meu corpo no chão, saí da floresta e me aproximei abaixado. Então ouvi uma conversa.

— Pensei ter visto algo brilhando na floresta…

— Você não está vendo coisas?

Havia dois lampiões e eles estavam se aproximando. Segurando as luzes estavam dois homens, um de meia-idade e um adolescente, cada um vestindo uma bata de pele sobre uma túnica desbotada e carregando um porrete na mão. Meu primeiro pensamento foi que eles poderiam estar na patrulha noturna da aldeia. Pelo menos, eles não pareciam no limite como teriam se um desastre como esse tivesse acontecido.

Então as coisas ainda não eram como eu as tinha visto na revelação, afinal de contas. Graças aos deuses.

— Hm?

Quando comecei a relaxar, o mais velho dos dois homens percebeu minha forma pelo seu lampião. Sorri desajeitadamente para ele e decidi me aproximar. Percebi que se eu me nomeasse um conhecido de Menel, eles não seriam imediatamente rudes comigo. Eles me olharam e mal haviam aberto a boca para falar quando eu dei um passo à frente e me lancei com a minha lança.

— O quê…?!

— Hyeeek!

Houve um eco de metal colidindo. Eu me aproximei novamente e balancei minha lança para o lado sem interromper o fluxo. Houve outro choque metálico.

— Para trás! — Fiquei na frente dos dois para protegê-los, bloqueando o que quer que estivesse voando para nós com meu escudo.

O atacante…! Se eles estavam usando uma arma de projétil, então eles não eram bestas. Isso então deixava apenas demônios, goblins e mortos-vivos na equação. Eu rapidamente olhei para o que tinha caído, esperando ser capaz de identificar o meu oponente.

Era uma flecha com penas brancas.

Minha mente congelou. Naquele mesmo instante, houve um barulho repentino. O som de uma corda de arco! Eu levantei meu escudo e desviei a flecha.

Flechas vindo de frente eram difíceis de ver. Era muito difícil acertá-las com uma lança. Enquanto protegia as áreas mais vulneráveis do meu corpo, eu expandi minha luz conjurada e olhei de onde elas vieram.

No final da minha linha de visão… franzindo a testa com um olhar sério no rosto… era um meio-elfo de cabelo prateado com uma flecha encaixada na proa da mão.

Atrás dele, havia mais dez homens com roupas um pouco sujas, armados com porretes e lanças. Não havia dúvidas.

— Menel…

Vila do Menel? Um desastre ia acontecer com ele? Eu tinha que me apressar e salvá-lo? Quão tolo fui…

Menel… Meneldor não seria uma vítima da tragédia que eu testemunhei.

Ele era o autor.

 

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Meu cérebro não conseguia acompanhar. Por que Menel… Nós compartilhamos risos e sorrimos juntos, não é…?

— Vão. Ataquem a aldeia, — Menel ordenou. — Eu vou lidar com ele.

Os homens atrás dele começaram a se dispersar.

— Espe… — eu tentei me mover para pará-los quando outra flecha voou em minha direção. Se eu me esquivasse, a flecha acertaria um dos dois atrás de mim. Desviei a flecha com meu escudo.

— Eu disse para não me seguir… Sério, irmão… — Algum tipo de emoção brilhou nos olhos de Menel, mas desapareceu no instante seguinte. — Morra.

O feito que vi no momento seguinte foi incrível. Ele disparou três flechas, mirando o meu rosto, braço e perna, em um movimento único, fluído e ininterrupto.

Minha mente ainda estava confusa, mas meu corpo, treinado por Sanguinário, reagiu com precisão ao ataque incrível de Menel. Enquanto usava meu escudo para derrubar as flechas que vinham em meu braço e rosto, puxei minha perna para trás e virei meu corpo para o lado, desviando da última flecha.

— Ah… ah… — Os suspiros sem palavras dos dois atrás de mim começaram a se transformar em gritos. Eles finalmente começaram a entender a situação.

— Todos! Acordem! Acordem!

— ESTAMOS SOB ATAQUE! Tragam as armas! Escondam as mulheres e as crianças!

— Tch! — Os gritos pareciam colocá-lo sob pressão, Menel disparou mais flechas contra mim. Cada uma foi brutalmente precisa. Tinha certeza de que, se não tivesse um escudo, já teria várias flechas no meu corpo. E pensar que eu considerei não trazê-lo; como se viu, essa coisa estava salvando minha vida.

Enquanto avançava, mantendo minha defesa, Menel recuou, mantendo a mesma distância entre nós.

Se esta era a sua distância ideal, então… eu diminuiria essa distância!

Acceleratio! — Uma explosão de velocidade.

— “Gnomos, gnomos, ande sob os pés!” — Menel gritou quase ao mesmo tempo. O chão subitamente se contorceu, tentando puxar minhas pernas para baixo.

Com toda probabilidade, era o Escorregar, um feitiço que usava gnomos, os elementais da terra. Eu ainda estava acelerando; se meu pé fosse pego, provavelmente me machucaria.

Eu podia ver Menel sorrindo com satisfação. Ele usou esse poder elementar no momento absolutamente perfeito, e eu não tinha uma estratégia imediata para lidar com esse tipo de coisa. E como eu não tinha estratégia…

— SSEHHH-HNG!! — Eu bati meu pé com todas as minhas forças. Houve um barulho estrondoso. O chão tremeu poderosamente e os gnomos pararam seu trabalho como se tivessem medo da quietude.

— O quê?! — Menel ficou boquiaberto. O mesmo aconteceu com os homens que tentavam atacar a aldeia. Mesmo os homens que tinham saído com armas, com a intenção de revidar, estavam olhando para mim com os olhos arregalados.

Eles estavam todos evidentemente inconscientes, que se você fosse forte, poderia resolver praticamente tudo pela força!

— Filho d…! — Menel recuou ainda mais, amaldiçoando.

Depois de atirar flechas em minha direção em rápida sucessão, ele pendurou o arco sobre o ombro e começou a atirar facas. Elas vieram em minha direção em parábola, talvez ele tivesse uma maneira especial de jogá-las, ou talvez as próprias facas tivessem algum truque em seu design, curvando-se em minha direção da esquerda e da direita. Aquelas que eram seguras para evitar, me esquivei virando meu corpo; aquelas que não davam, desviei com o meu escudo. Pressionei ainda mais. Escudos realmente eram convenientes. Eu estava feliz por ter trazido um.

Menel parecia que finalmente havia se resignado a me encarar. Ele segurava o machado pronto para atacar e depois…

— “Salamandra! Queime-o!”

Por trás, Respiração de Fogo veio em minha direção pelo lampião do homem de meia-idade. Sem me virar, estiquei minha lança e esfaqueei as chamas, dispersando-as.

Eu praticamente vi chegando.

— De jeito nenhum. — Menel parecia estupefato.

Sua finta era positivamente direta em comparação com o deus da morte e os truques que Gus e Sanguinário tinham feito quando ficavam sérios.

Enquanto Menel estava parado lá, diminui a distância.

— Você é forte pra porra… — Ele disse com um sorriso amargo no rosto.

Eu enfiei o cabo da minha lança em seu plexo solar.

Eu ouvi o ar sendo forçado para fora de seus pulmões, e ele caiu de joelhos. Seu diafragma estava subindo e descendo e ele não conseguia controlar sua respiração. Ele não seria capaz de se mover adequadamente por um tempo. Enquanto isso, conjurei a Palavra de Teia para contê-lo.

Eu olhei para a aldeia. Não teve batalha; todo mundo assistiu a nossa luta com espanto. Considerei-me bem sortudo.

Eu decidi capturar o resto dos invasores antes que alguém se machucasse.


 

Tradução: Erudhir

Revisão: Merciless

 

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