POV ELEANOR LEYWIN
“Preciso de você aqui.” Foi o que Arthur disse. “Fiz alguns progressos aqui, especialmente com os asuras mais jovens.” Mas o que, exatamente, eu deveria fazer? “Você vai ter que continuar o que comecei. Agora vocês duas representam todos os humanos, elfos, anões e alacryanos daquele mundo.”
Claro, sem pressão nenhuma, né?
As palavras do meu irmão se repetiam na minha mente como um eco infindável, desde o momento em que ele partiu. Era sufocante. Não só as instruções, mas estar em Epheotus… mais ainda, no castelo do Lorde Indrath. Cada voz elevada vinha carregada de uma intenção cortante, que me atingia em cheio e revirava o estômago.
Recuei para um aposento nos andares superiores, um solário com varandas voltadas para dois lados distintos. Minha mãe, por outro lado, estava grudada na Anciã Myre. Apesar de tudo, ela transbordava uma energia furiosa. Talvez fosse o fato de estar cercada por dragões e seu domínio do éter, ou talvez fosse o simples conhecimento de que Lorde Indrath havia mandado Arthur enfrentar Agrona sozinho. Ou talvez… fosse o mesmo peso esmagador de responsabilidade que me fazia me esconder aqui em cima, mas ela levava a sério seu papel de mãe do “Grande Lorde” Arthur Leywin.
Acho que ajudava o fato de seus poderes de cura utilizarem éter. Para os dragões, isso tornava sua posição de “arconte” mais significativa, e ela estava empolgadíssima para aprender como o éter influenciava suas habilidades de cura. Até os asuras estavam se ferindo, sucumbindo à exaustão enquanto combatiam a fenda, e ninguém no castelo ousava recusar a ajuda de mais uma curandeira.
Fechei os olhos com força ao ouvir o estalo distante da terra se partindo, seguido por uma pulsação inquieta de assinaturas de mana instáveis, e me perguntei de onde vinha essa energia repentina. Eu me sentia esgotada. Exausta.
Espero que o Arthur volte logo. Não deveríamos estar aqui.
— Será que a Tani deixaria a gente sair do castelo? — perguntei a Boo, distraída, referindo-me à minha babá-dragão, que estava de guarda no corredor.
Boo, deitado sob um feixe de sol próximo, resmungou e sacudiu a cabeça. Infelizmente, eu concordava com ele.
Ao menos as varandas ofereciam uma vista espetacular da ferida no céu — um lembrete constante e angustiante do abismo que nos cercava.
— O que eu deveria fazer? — murmurei, antes de repetir mentalmente, mais uma vez, as palavras de Arthur.
Eu tinha amigos aqui, pelo menos. Talvez até tivesse conquistado um pouco de respeito dos asuras que participaram do ritual de caçada conosco. Vireah, Naesia… Mas será que me ouviriam? E o que eu diria, mesmo que ouvissem? Acabei voltando às palavras de Arthur, mas foi outra voz que ecoou dentro de mim.
“Até que Arthur escolha uma dessas mulheres como esposa, nenhuma delas vai olhar para outro homem.”
Minhas sobrancelhas se ergueram de imediato. Era isso que Arthur queria? Que eu selasse algum tipo de aliança? Passei as duas mãos pelo rosto, exasperada.
— Ele não pode se casar com uma princesa asura. Ele já tem a Tessia — falei em voz alta, sentindo a expressão endurecer no meu rosto. — Depois de tudo o que eles passaram, este mundo devia a eles um pouco de paz.
Puxei uma mecha do meu cabelo, frustrada. Então… eu? Sou eu quem deve unir nosso clã a outro? Só de pensar, fiquei enjoada. Nunca tive sequer um namorado de verdade… e o Arthur sempre foi totalmente contra qualquer romance na minha vida — não que um casamento político arranjado tivesse algum romance envolvido. Ainda assim, não parecia ser isso que ele queria.
Boo grunhiu e me encarou com seus olhos escuros e pequenos. Deixei-me cair ao lado dele, encostando as costas em seu corpo quente, enquanto coçava seu pelo áspero. Ele parecia imune a todo o caos à nossa volta. Sinceramente? Eu invejava aquela serenidade, esse jeito de aceitar o que viesse.
— Mas e se a lição for que as pessoas raramente conseguem o final que desejam? — perguntei, virando o rosto para Boo, que repousava o queixo sobre uma das patas, meio que me olhando de volta. — E você, Boo? Se fosse um príncipe do Clã Leywin, aceitaria se casar com alguma ursa ilustre só pra forjar uma aliança com outro clã mais poderoso?
Ele bufou e desviou o olhar, fechando os olhos com um ar de total desprezo.
Soltei uma risada trêmula, um pouco insana.
— Que espírito de equipe o seu, hein? — Outro grunhido, e eu revirei os olhos. — Você entendeu o que eu quis dizer.
Seu corpo vibrava levemente contra o meu. Afundei ainda mais em seu lado fofo e fechei os olhos, tentando calar os pensamentos que zuniam sem parar na minha cabeça.
Uma das muitas assinaturas de mana que rodopiavam feito enxames pelo castelo capturou minha atenção ao se aproximar com propósito. Ouvi vozes baixas no corredor, e então Tani enfiou a cabeça pela porta, enquanto outro asura se afastava em marcha apressada.
— Com licença, Lady Eleanor — disse a mulher-dragão de cabelos verdes, com um sorriso tenso. — Você foi convocada.
— Convocada? — repeti, feito uma idiota.
Ela apenas assentiu, aguardando.
Boo se levantou e me cutucou até que eu me erguesse.
— Tá bom, tá bom — resmunguei para ele, me apoiando em seu pelo espesso para me levantar. — O mensageiro disse do que se trata?
A guarda fez que não com um aceno educado.
— Vários dos herdeiros estão sendo reunidos, mas é tudo que sei. — Lançando um olhar ao redor, baixou o tom. — Imagino que seja uma forma de mantê-los a salvo.
— Certo, então… nos guie — respondi, fazendo um gesto para que seguisse adiante.
Ela sorriu novamente, assentiu com a cabeça e girou nos calcanhares, marchando com rapidez pelo corredor.
Percorremos corredores suntuosos, decorados com pompa régia, passando por portas abertas que revelavam suítes espaçosas, salões de estar, salas de estudo e aposentos cujo propósito eu sequer ousava adivinhar. Descemos rumo às profundezas do castelo, e o silêncio era inquietante. Cruzamos com apenas alguns guardas e criados, apesar de eu sentir, como um peso físico sobre o peito, a presença esmagadora dos seres poderosos que habitavam aquele lugar.
No fim de uma escadaria em espiral, ocupando todo o patamar de modo que não pudéssemos passar, um jovem asura de cabelos azul-escuros em cascata e pele com um leve tom verde-lodoso falava com outro guarda de Indrath, os braços cruzados. — Eu devia estar com meu pai, não trancado num porão qualquer. Não é assim que o clã Grandus encara a morte.
— Por favor, Lorde Raedan, eu… — O guarda ergueu os olhos pela escada e notou Tani e eu nos aproximando. Pigarreou e saiu de modo incisivo do caminho, recuando para o corredor lateral. — Essas ordens vêm não só de Lady Myre Indrath, mas também de seu tio. Os grandes lordes foram categóricos.
O titã deu um passo para o lado, com uma expressão que deixava claro que ainda não havia terminado de discutir. Tani seguiu adiante, me conduzindo, e trocou um aceno com o outro guarda, que revirou os olhos em resignação, de costas para Raedan. Raedan. Boo emitiu um rosnado baixo e grave ao passarmos, e eu senti o olhar do titã nos acompanhando. O jovem nobre pareceu desistir da discussão, e ele e seu guarda se colocaram em nosso encalço.
Arrastei os pés, subitamente nervosa. Boo soltou um zumbido profundo e reconfortante, posicionando-se ao meu lado, roçando os flancos nas paredes do corredor e, de tempos em tempos, entortando algum quadro ou tapeçaria pendente.
Limpei a garganta e perguntei:
— Então… o que está acontecendo?
— Só uma precaução — respondeu o outro guarda, de forma rígida, atrás de mim.
— Ele quer dizer que estamos sendo isolados como sobreviventes escolhidos, caso o pior aconteça — resmungou o titã.
— Os grandes lordes providenciaram vossa proteção absoluta — reiterou o guarda. — Este é o santuário pessoal do Lorde Indrath, agora cedido a você e aos demais herdeiros. Praticamente todos os outros foram convocados para ajudar nos esforços de estabilização da terra e da fenda, Lady Eleanor. Trata-se de uma honra… e de uma necessidade.
Raedan fez um gesto impaciente, dispensando a explicação. Seguimos em silêncio até o destino final.
Tani nos guiou até o coração do castelo. Os túneis se tornaram mais ásperos, como se tivessem sido esculpidos diretamente na pedra da montanha. Paramos diante de uma belíssima porta de madeira negra, adornada com entalhes intrincados preenchidos de prata e ouro. Ela vibrava com magia.
Ao tocar as maçanetas de ferro ornamentado, houve uma centelha, e o fluxo de mana me tirou o fôlego. A porta se abriu com suavidade, liberando uma lufada de ar quente, vozes e o cheiro irresistível de carne defumada e pão recém-assado. Ela fez um gesto para que entrássemos.
Boo foi o primeiro a atravessar, farejando em busca da origem daqueles aromas de dar água na boca, mas eu me virei para minha guarda.
— Minha mãe vai se juntar a nós aqui?
Tani deu de ombros, de forma curiosamente elegante.
— Acredito que ainda esteja com Lady Myre. Não posso falar por ela, mas imagino que sua mãe será enviada em breve.
Eu reprimi o impulso infantil de exigir minha mãe. Afinal, ela provavelmente estava mais segura com a Anciã Myre do que em qualquer outro lugar.
Curvando a cabeça em sinal de respeito, acenei com a mão e segui Boo para dentro do aposento.
— Eleanor!
Riven, do Clã Kothan, se levantou de onde estava recostado próximo a uma fogueira de chamas multicoloridas. Ele era apenas um entre várias pessoas já reunidas no recinto, todos agora voltando o olhar para mim, e para o titã logo atrás.
— Então você também foi aprisionada, hein? — Apesar do tom leve, havia uma ponta de amargura em sua voz.
O titã, que entrara logo atrás de mim, respondeu primeiro:
— Meus apelos para ajudar meu clã a manter nosso lar de pé foram ignorados. Ele lançou um olhar duro para Tani e o outro guarda, que fecharam a porta em silêncio atrás de nós.
— Pelo visto, ainda estamos esperando por mais alguns — comentou uma fênix que eu não reconhecia. — Vão nos colocar num tipo de espaço extradimensional. Mesmo que Epheotus colida com o Velho Mundo, quem estiver dentro vai sair ileso.
— É, mas… e o resto do nosso clã? E os nossos pais? — rebateu Romii, irmã de Riven, com a voz tensa e irritada.
Mordi o lábio, pensando na mamãe. Depois, em Arthur. Se aqui já era aterrorizante… o que será que ele estava enfrentando?
Boo me deu um leve empurrão com a cabeça, como consolo.
O titã me encarava como se eu tivesse perdido o juízo, e foi aí que percebi que estava parada no meio da sala, olhando para o chão, a boca entreaberta, com uma pergunta a meio caminho da garganta. Fechei a boca e olhei ao redor de novo.
Vireah, Naesia e Zelyna já estavam ali. Havia também outros membros de seus respectivos clãs, ao que parecia. Todos acomodados em poltronas e sofás dispostos em meia-lua ao redor da lareira. Mesas baixas estavam repletas de comida e bebida. Uma hamadríade de aparência rústica permanecia afastada, com uma caneca de madeira na mão, aparentemente alheia à conversa.
O cômodo era meio caverna, meio salão luxuoso. As paredes lembravam obsidiana: reluzentes, facetadas, cortadas com um brilho vítreo e irregular, como se tivessem se formado naturalmente. Diferente do resto do Castelo Indrath, ali não havia decorações nas paredes ou no teto — apenas quatro estátuas douradas de dragões em forma humanoide, ocupando os cantos da sala. Com minha visão aguçada pela vontade de Boo, consegui ler a placa abaixo da estátua mais próxima. Ela homenageava uma heroína das guerras contra as Assombrações, de um tempo antes até mesmo à existência de Epheotus.
Era difícil até de imaginar.
— Anda, El. Senta e fica à vontade. Você também, Raedan. Podemos ficar aqui por um bom tempo — disse Riven, voltando ao lugar de onde tinha se levantado. Saltou por cima do encosto do sofá e esbarrou na irmã, que revidou com um soco no braço.
O titã soltou um grunhido e se acomodou em uma poltrona alta e rígida, ligeiramente fora do círculo.
Boo bufou e me cutucou. Dei uma risadinha, peguei uma fatia de carne ainda gotejando e joguei para ele, depois escolhi um pãozinho verde-esfumado, de aroma terroso, mais para ocupar minhas mãos do que por fome. Eu não fazia ideia do que estava fazendo ali, tampouco de como deveria me dirigir àquelas entidades. Vireah bateu de leve no sofá ao seu lado e eu me joguei ali, desajeitada. Inclinando-se, ela me envolveu nos braços como se abraçasse uma irmã reencontrada depois de anos, e seu poder se enrolou ao meu redor como um manto quente, me fazendo sentir pequena, como um bebê recém-nascido.
Riven e Romii dividiam um assento largo, acolchoado até parecer uma nuvem, bem à minha frente. Naesia, filha de Novis Avignis, estava aninhada numa poltrona felpuda ao lado do sofá que eu dividia com Vireah. Zelyna andava de um lado para o outro entre duas das estátuas douradas, do lado oposto ao da hamadríade.
Boo forçou passagem até o centro do círculo e se jogou bem em frente à lareira, praticamente obstruindo a vista do fogo. Vireah e Naesia trocaram um olhar antes de rirem baixinho. Apesar da leveza aparente, a tensão pairava nos cantos dos olhos de ambas. Boo as observava — e a todos — com desconfiança, suas orelhinhas redondas tremulando a cada novo movimento.
— Ele é um guardião impressionante — disse Raedan do nada. O titã taciturno lançou outro pedaço de carne, e Boo o abocanhou no ar com um estalo. — Um tanto pequeno para sua espécie, mas ainda é jovem. Seu vínculo é forte. Isso… me surpreende.
Minhas sobrancelhas quase escaparam do rosto.
— Você consegue sentir o nosso… vínculo?
Ele respondeu com um grunhido que, para meu espanto, soou perigosamente parecido com o do próprio Boo.
— Sou Raedan, filho de Rockford e sobrinho de Radix, do Clã Grandus. Treino bestas como seu Boo há meio século.
— Ah… — mordi o lábio. Sem saber o que dizer, dei uma mordida no pãozinho.
— Eleanor, não sei se chegou a conhecer Eithne, do Clã Grenriver — disse Vireah com polidez, fazendo um gesto em direção à hamadríade reservada.
Aprendi que os hamadríades eram as menos numerosas entre os asuras, e raramente tinham descendentes. Não havia jovens no Clã Mapellia, então aquela hamadríade devia ser, provavelmente, o mais próximo que tinham de uma herdeira.
Eithne fez um aceno contido com a cabeça, mas não sorriu nem respondeu.
Mais algumas apresentações foram feitas. Alguns eram membros de nosso grupo de caça, outros eram nomes que ouvi durante meus estudos sobre a corte de Epheotus.
— Isso é tão humilhante — murmurou Romii para Riven. — Somos tratados como porcelana, enquanto todo o resto se sacrifica para manter a linha de frente.
— Estamos cumprindo nosso dever como belos estandartes vivos, minha cara irmã — respondeu ele, com um leve toque de sarcasmo. Contudo, o humor não alcançou seus olhos.
Fiquei me remexendo, arrancando pedacinhos do pão e mastigando sem pensar.
— Odeio estar presa assim. — Naesia dizia, voltando-se a Vireah. — Juro, minhas asas estão latejando para se abrirem e me levarem para longe deste castelo.
— Ao menos você entende por que está aqui — respondeu Vireah, em voz tão baixa que mesmo com meus sentidos aguçados precisei me concentrar para escutar. — O que eu pensava ser um aprendizado virou, na verdade, um treinamento para uma proposta de casamento com um homem que eu nunca conheci. Ela empalideceu levemente e lançou um olhar na minha direção. — Sem ofensas, é claro, Ellie. Seria uma grande honra…
Fiz um gesto rápido com a mão, dispensando o pedido de desculpas. Eu mesma não saberia como reagir.
A fênix que havia falado antes parece ter ouvido também, pois se inclinou sobre o encosto do nosso sofá e acrescentou:
— É uma pena que essa aliança por casamento não tenha sido acertada antes. O Clã Avignis teria muito a ganhar. — Ela sorriu com malícia. — E se a Naesia não estivesse interessada, eu teria adorado mostrar ao novo grande lorde os meus encantos…
Eu sabia que deveria dizer alguma coisa, mas não fazia ideia de como me intrometer. Em vez disso, comecei a puxar discretamente a costura da almofada do sofá, encolhendo-me cada vez mais dentro das almofadas, como se o estofado fosse me engolir. Um zumbido abafado começou a preencher meus ouvidos, abafando as vozes à minha volta, e uma pressão crescente se formou no meu peito.
Sinto muito, Arthur, pensei, subitamente desesperada. Acho que não consigo… eu vou…
Foi então que senti uma onda de energia quente, familiar, que só poderia vir de Boo. A pressão diminuiu, o gume gelado do pânico se retraiu. Encontrei os olhinhos escuros dele e soltei o ar devagar, como se fosse o primeiro suspiro em horas. Valeu, grandão…
A porta abriu-se novamente, e duas sílfides etéreas, de cabelos vaporosos e pele pálida, flutuaram para dentro. Foram apresentadas como gêmeas do clã Aerind, Eolia e Boreas, mas sua posição no clã e relação com Lady Aerind me confundiram um pouco. Eram indistinguíveis uma da outra. Seus olhos, da cor do céu de verão visto através de nuvens finas, percorreram a câmara, pousando nas bandejas de comida. Sem dizer uma palavra, flutuaram até a mesa, pegaram punhados de frutas vermelhas e começaram a comê-las distraidamente com suas pequenas bocas repletas de dentes finos como agulhas.
— Prazer em conhecê-las — falei, depois que as apresentações terminaram.
Ambas me encararam em silêncio, mastigando devagar. Nenhuma respondeu.
Riven riu ao se levantar e se colocar entre as gêmeas, passando um braço ao redor do pescoço de cada uma.
— Eolia, Boreas. Incrível ver vocês. Não ligue pra elas, Ellie. Os sílfides raramente descem de suas nuvens e, quando o fazem, suas cabeças continuam bem presas lá em cima.
Uma rajada de vento percorreu a sala fechada, e as gêmeas giraram com suavidade para escapar do toque do basilisco.
— Todos viveremos nas nuvens antes que isso acabe — disseram em uníssono.
— Bem… contanto que a gente viva… — arrisquei, mas a tentativa de piada morreu assim que saiu da minha boca. Ofereci aos gêmeos um sorriso meio constrangido antes de buscar refúgio no olhar de Boo, implorando por algum conforto em meio ao meu vexame. Ele balançou a cabeça com ar rabugento. — Só quis dizer que… agora é um tempo assustador para todo mundo.
Raedan grunhiu.
— Por isso mesmo deveríamos estar em qualquer outro lugar, menos aqui. Sem ofensa, Lady Leywin, mas tenho pouca paciência para conversas fiadas enquanto o destino do meu clã, da minha raça inteira, está por um fio.
— Ela sabe, Raedan — rebateu Naesia, numa defesa firme. — Você sabe que foi o irmão dela quem foi enviado ao Velho Mundo para lidar com Agrona. Todos nós queremos ajudar, mas estamos aqui cumprindo ordens. Isso também faz parte do nosso dever, não faz?
Raedan respondeu com outro grunhido indiferente, mas Riven ergueu a taça e exclamou:
— Ora, ora!
Vireah falou em seguida:
— Minha mãe me contou que partes de Epheotus já estão despencando para o Velho Mundo. Nosso lar está desmoronando e, ao fazê-lo, está destruindo o dela também. Ela apertou minha mão. — Talvez um pouco de conversa seja exatamente o que precisamos para acalmar os nervos.
Raedan bufou.
— Muito bem então. Sabemos quase nada sobre os arcontes fora do Castelo Indrath. Conte-nos sobre esse Arthur Leywin.
Hesitei, pega de surpresa pela pergunta inesperada.
— Não há muito o que contar… — comecei, mas a frase morreu antes de se formar. — Bom, na verdade, isso não é verdade. Só não sei bem o que vocês gostariam de saber. Imagino que vocês não saibam quase nada sobre o povo que chamam de inferiores — ou sobre o nosso mundo, não é?
Seu rosto se contraiu, e percebi que o tinha ofendido sem querer.
— O que quero dizer — emendei rápido — é que vocês nunca tiveram motivos pra estudar nossa cultura. Antes de vir para Epheotus, eu também não sabia nada sobre os asura, mas aprendi tanto, tão rápido… — Um sorriso involuntário se desenhou em um canto da boca. — Como, por exemplo, que a Romii ronca como uma hiena de ferro… e sempre culpa o Riven.
— Ei! — exclamou Romii, cruzando os braços com um beicinho, enquanto o irmão caía na gargalhada.
— Sei que talvez eu não pertença a este lugar — continuei, sentindo-me mais leve a cada palavra. — Essa coisa toda de arconte… Eu sei que não sou uma asura. É só um título. Arthur talvez seja outra coisa, mas eu… não sei se há algo que eu possa dizer sobre ele que ajude vocês a entender nosso clã, nosso povo. Porque eu, minha mãe… nós somos humanos. E, ironicamente, acho que minha vida sempre foi um pouco assim. Fora do lugar.
E havia algo de revelador no fato de eu estar falando, e todos os asura na sala estarem atentos, ouvindo. Todos.
— Eu despertei bem cedo para um humano, quero dizer, meu núcleo de mana se formou, caso não saibam o que isso significa. Mas só consegui porque Arthur me ajudou. Mesmo naquela época, ele já era diferente. E acho que eu também acabei sendo, porque ele era. Cresci numa cidade flutuante chamada Xyrus…
— Vocês têm uma cidade flutuante? — perguntaram as gêmeas sílfides em uníssono, com súbito entusiasmo.
— Sim! — respondi, animada pela reação delas. — Ela se chama Xyrus e foi criada pelos magos antigos… ou djinns, como são realmente chamados. Ou eram. Só que Xyrus é como… uma bolha, um fragmento do mundo separado do resto da civilização. E crescer ali, despertar cedo, ouvir sempre sobre meu irmão e suas loucas aventuras, ter nobres e até a diretora da academia mágica entrando e saindo da minha casa…
Parei, percebendo que estava divagando, mas sem ter certeza se queria parar.
— Sou filha de dois aventureiros aposentados, de uma cidade pequena. Nada de especial. Mas quando tudo desandou, quando Arthur foi preso, eu fui parar numa caverna escondida por magia, protegida por uma vidente e por uma besta mágica de Epheotus, presente de alguém que eu achava que só podia ser uma divindade. Não consigo pensar em exemplo melhor de alguém fora do lugar. Era como se outra vida tivesse invadido a minha, ou como se eu tivesse tropeçado dentro da vida de outra pessoa. E ainda assim, tudo ficou mais estranho. Depois disso, vivi num castelo voador com reis e rainhas, cercada pelos maiores magos humanos, elfos e anões.
Boo resmungou, e não pude conter uma risada. Raedan ergueu uma sobrancelha, visivelmente compreendendo parte da nossa troca silenciosa.
Romii se recostou, as mãos entrelaçadas atrás da cabeça, uma perna cruzada com a outra enquanto ouvia.
— Então… todos os lugares onde você viveu flutuavam? Não é exatamente a imagem que eu tinha de como os “menores”… — ela empalideceu — perdão, como os humanos viviam.
Balancei a cabeça, deixando o sorriso sumir devagar.
— Não. Também vivi bastante debaixo da terra. Quando a guerra começou, o castelo voador foi destruído e nossos reis e rainhas foram mortos por Agrona. Minha avó Rinia nos salvou, eu, minha mãe e Tessia, para quem já a conheceu, e sobrevivemos num tipo de abrigo subterrâneo, um santuário criado pelos djinns. — Sorri, com pesar, olhando para o chão, lembrando da amizade que floresceu entre mim e Tessia, das vezes que eu visitava Rinia nos túneis, e de como tentava amparar a mamãe quando pensávamos que Arthur havia morrido. — Também vivi por um tempo com os anões, na cidade-capital deles, Vildorial.
— Ouvi dizer que o seu povo é dividido em três ramos — disse, pela primeira vez em voz clara, a hamadríade silenciosa, Eithne. — Esses elfos e anões, junto com os humanos. São algo como os ramos divergentes do povo asura, como dragões, titãs e hamadríades?
Pensei por um instante. Nunca tinha encarado por esse ângulo.
— Acho que sim. Sempre pensei que fôssemos bem distintos. Quando eu morava em Xyrus, na verdade, elfos e anões raramente apareciam fora dos muros da academia. Estávamos em guerra, há muito tempo, mas então os conheci. Tessia, Vovó Rinia, minha amiga Camellia. E todos os anões. E eles são só… pessoas. Como eu. Depois conheci os alacryanos também. Gente criada sob o domínio de Agrona, com o sangue dele correndo nas veias. Humanos, mas… diferentes. E… — Dei de ombros. — Bem, no fim, eles também eram só pessoas. Mesmo em guerra, ainda havia bondade entre eles.
Vireah se inclinou para o lado, tamborilando o dedo no lábio inferior e me observando atentamente. As chamas da lareira lançavam sombras líquidas de ametista pelos fios rosados de seu cabelo.
— Então você está dizendo que, no fim das contas, somos todos apenas… pessoas? Humanos, elfos e anões são iguais entre si… e iguais a nós, asuras?
Mordi o lábio com força, tentando decifrar o tom dela. De repente, fui violentamente lembrada do abismo de poder entre nós, mesmo que ela só tivesse sido gentil e protetora desde que nos conhecemos.
— Não estava tentando fazer uma afirmação — confessei, lançando um olhar rápido a Raedan antes de acrescentar: — Só… conversando, mas… na verdade, não concordo com o que você acabou de dizer.
O silêncio que se seguiu foi marcado por trocas de olhares surpresos.
— Quero dizer, talvez vocês devessem parar de nos chamar de “menores” — emendei, rapidamente. — Mas, se é pra compartilharmos o mesmo espaço, acho que é muito importante lembrar que nós não somos iguais. Pelo menos, não em força ou poder mágico. Ainda assim… somos pessoas. Indivíduos. Com nossos próprios sonhos, esperanças e vontades. Não somos… adoradores. Ou escravos. — Pensei nos djinn. — Nem bucha de canhão. Nem lenha para alimentar a próxima grande máquina de guerra.
Todos me encararam, chocados, e eu ergui as mãos, defensiva.
— Ei, vivi a maior parte da minha vida durante essa guerra contra Agrona Vritra. Só estou dizendo o que vejo.
Um dos sílfides, agora flutuando de cabeça para baixo, os cabelos esvoaçando como se mergulhados em água, disse:
— Esta guerra ainda não acabou. Pode muito bem ser o fim de ambos os nossos mundos.
— Dê-nos algum crédito — retrucou Riven, cruzando os braços, claramente incomodado. — Não entendo por que todos vocês acham, de forma tão crível, que Epheotus será destruída. Todos os grandes poderes do nosso mundo estão lutando para salvá-la. Eu vi com meus próprios olhos, e tenho fé de que conseguiremos.
Achei notar certa urgência em seu tom. Como se ele precisasse acreditar que o último ato de Agrona Vritra, outrora líder dos basiliscos, não terminaria em apocalipse.
— Eu com certeza tenho fé no meu irmão — falei, tentando oferecer algum consolo com o olhar. — Confio que ele fará tudo o que for possível, mas também confio no que ele me diz. E ele… ele não acredita que Epheotus possa sobreviver como é agora. Seja hoje ou daqui a quinhentos anos, esse plano que vocês criaram precisa ruir. E ele está contando com vocês para guiar o povo através disso.
— E quem é Arthur Leywin para fazer tais proclamações? — rugiu Raedan. — Seu clã foi recém-nomeado, sua raça uma invenção dos grandes lordes, saída do nada. Não têm vínculos. Nenhum laço com os outros clãs ou raças. — Ele olhou ao redor. — Devemos seguir os conselhos dos nossos próprios líderes, e não nos submeter a esse meio-humano.
— Ah, dá um tempo — rebateu Naesia, incisiva. — Você sabe que ela não quis dizer isso. E Arthur Leywin é um grande lorde, caso tenha se esquecido. E… se ele acha que o tempo de Epheotus está se esgotando… — Ela hesitou, como se tivesse que forçar as palavras para saírem. — Eu lutei ao lado dele. Vi do que ele é capaz. A forma como pensa, como age… é algo de outro mundo. Como as histórias antigas, dos fundadores de Epheotus.
Um silêncio pesado pairou sobre nós.
Zelyna, que mal falara desde minha chegada, parou de andar de um lado a outro e tomou um assento diante de Raedan. Seus dedos traçavam as costuras da calça de couro.
— Quando eu era jovem, meu clã ainda vivia isolado por conta das rebeliões de Agrona. — Ela lançou um sorriso apertado para Riven e Romii. — Meu pai não me levava às reuniões dos Oito Grandes. Cresci praticamente só entre os nossos. Quando ele finalmente me trouxe ao Castelo Indrath… acho que se arrependeu imediatamente.
Um sorriso genuíno brotou em seu rosto. Apesar da pele aquamarina e das cristas escuras nas têmporas, naquele instante ela parecia jovem… e humana.
— Conheci um general panteão a serviço de Lorde Indrath e fiquei imediatamente encantada. É claro que, para os padrões asuras, eu ainda era uma criança. E acho que ele nem me notou, o que só me fez querer chamar sua atenção ainda mais.
Zelyna prosseguiu com a história, e o ambiente relaxou. Riram, trocaram provocações, lembraram momentos. Depois, Naesia assumiu o fio da conversa, contando sobre quando foi punida com uma década de tarefas domésticas por ter fugido para as montanhas com garotos nobres, fazendo-os competir pela atenção dela.
Raedan compartilhou seu primeiro fracasso com uma besta guardiã, um “nadador dos céus” que mordia os pés de quem tentava montá-lo, e como aprendeu a aceitar a natureza imutável de certas coisas.
Pensei em fazer uma conexão com o momento atual. Sobre como a cultura asura precisaria mudar, ou ser refeita. Em vez disso, compartilhei uma lembrança leve: ir às compras com minha mãe e os Helstea em Xyrus, obrigando Arthur a experimentar roupas até ele quase perder a cabeça.
Eu não preciso convencê-los. Nem mudá-los. Arthur disse que estou aqui para representar nosso povo, então é isso que vou fazer.
— Eu adoraria provar esses “pãezinhos de mel” de que você falou — disse Vireah, examinando a mesa com um ar quase decepcionado. — Talvez, quando tudo isso acabar, você me leve para “fazer compras” em Xyrus?
— Ah, por favor! — exclamou Naesia, empolgada. — Tanta gente sem magia criando coisas tão incríveis… eu preciso ver isso!
Eu sorri. — Acho uma ideia excelente.
A conversa continuou pela sala por um bom tempo, o que pareceram horas.
— E então — dizia Boreas, já no meio de uma história sobre ter adormecido e acordado nos Campos Cerúleos após ser levado pelo vento — esse gato enorme, feito de grama cortante, saltou uns quinze metros no ar, desesperado para morder…
O chão tremeu. Fui arremessada do meu assento para o chão, soterrada por uma bandeja de canecas e diversos tipos de bolos.
Num instante, todos estavam de pé. Vireah me levantou como se eu não pesasse nada, antes que Boo a empurrasse de lado, protegendo-me.
— Estou bem — falei, fazendo carinho entre seus olhos enquanto observava ao redor, nervosa. — Ou espero estar.
A câmara tremeu outra vez. Bolhas de vento surgiram ao nosso redor, amortecendo os impactos. As quatro estátuas douradas caíram com estrondo, e uma mesinha tombou sobre a lareira.
— Não consigo sentir nada através dessa maldita barreira — rosnou Riven, os olhos percorrendo as paredes de obsidiana como se procurasse uma saída.
As portas se abriram com força, e a Anciã Myre entrou. Ela trazia vários asuras, a maioria pálida, desalinhada, com olheiras profundas. Levei alguns segundos para reconhecer minha mãe entre eles, já que ela era consideravelmente menor que os outros. Suspirei de alívio quando ela surgiu entre dois dragões cautelosos e me lançou um pequeno aceno.
— Está na hora de partir — anunciou Myre, sem nenhuma doçura. O peso da soberania voltava à sua postura. — Preparem-se para serem enviados à dimensão de bolso. — Sem olhar para trás, ela fez um gesto para que os outros entrassem. Alguns pareciam estar se juntando a nós, como minha mãe, enquanto o resto se posicionava como se estivesse pronto para apoiar o que quer que Myre estivesse prestes a fazer.
Minha mãe correu até mim e apertou minha mão. Vireah apoiou a dela sobre o ombro de minha mãe, envolvendo-nos numa bolha protetora de mana enquanto o chão sacudia violentamente sob nossos pés.
— Não posso dizer quanto tempo vocês permanecerão fora do espaço e do tempo — continuou Myre, a voz carregada. — Nem em que estado encontrarão o mundo quando retornarem. Sem Kezess, tudo o que podemos fazer será enviá-los para lá.
Havia algo em seu tom, um traço cru de emoção, que me chamou a atenção.
— Onde está Lorde Indrath?
Seu olhar recaiu sobre mim e minha mãe como uma tempestade.
— Lorde Indrath, há tanto tempo soberano de Epheotus… está morto.
— O quê? Isso é impossível…
— Epheotus pode sobreviver sem ele? Nós devemos…
— Agrona está por trás disso? E ele? E quanto a Arthur Leywin? Nós somos…
As perguntas e exclamações se atropelaram, ecoando umas sobre as outras, mas minha mente… estava vazia.
Arthur…
— Por favor, não há tempo — disse Myre com firmeza.
Olhei para ela então. De verdade. Escrito nas rugas pálidas de seu rosto envelhecido encontrei uma dor crua e uma determinação desesperada para a qual eu nem sequer tinha palavras.
— Atravessamos a fenda — declarou. — Epheotus está caindo.
Tradução: NERO_SL
Revisão: ***
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Comentários
Caramba. Tomara que o próximo seja um pov do Arthur.
Tenho quase certeza que Myre sabe que foi Arthur que matou Kezess. Ela é compasa do Leviatan kkk Capítulo meio fraco, apenas o final foi impactante. Alice manipular éter, Como assim? Ellie filosofando… Quero ver como Arthur vai pousar Epheotus, a pressão esmagará todos!
Em sentido de ação, o capítulo realmente foi fraco. Mas a obra precisava de uma pausa pra outra perspectiva em Epheotus, principalmente depois do surgimento da fenda. Esse capítulo cumpriu perfeitamente esse propósito.
Volta la na primeira vez que o Arthur foi pra epheotus treinar com a Myre… eles comentam que as magias desviantes de cura, utilizam éter “vivum”, assim como a a Rynia ao enxergar possiveis futuros.. usa o “Aevum”
Agora tô nervoso pelo próximo capítulo.
caralho, capítulo interessante pra saber a outra perspectiva do rolê, bem escrito até, a myre sabe que foi o Arthur, próxima sexta vai ser pica🔥
Desde quando foi mostrado que a Myre tem uma forma de vovozinha e uma forma jovem eu suspeitei que ela esconde algo, sempre suspeitei que ela era a mais poderosa do casal. Será que ela é o “último chefão”???
Maravilha de capítulo 😤👌
Se o Arthur segurar o continente asura inteiro, vai ser o melhor cap da obra inteira de fato.
Cap meio morno, pensei que ia volta logo com uma pedrada, mas pelo jeito pedrada vai ver no “velho mundo” como dizem os asuras se o arthur num der jeito nessa queda de epheotus.
Autor usando a ellie pra mandar o papo de empatia pros trocentos asuras que chegarem no mundo dela não detona td mundo por que eles se acham os pika grossa.
E a myre hein, pelo jeito que ela olho pra ellie antes de dizer que o kezess tava morto ela deve imaginar se não já souber que foi o arthur que passou faca nele, tem td pra ela ser mais foda que o kezess pelo menos em algum aspecto, lembro até hj que em uma interação entre os 3 (acho que quando tavam discutindo o arthur se tornar arconde) o arthur captou atravês do gambito uma sensação de medo do kezess pra myre.