POV ARTHUR LEYWIN
Apesar de não ter olhos visíveis, a face ondulada do ser dourado e brilhante me encarava até os ossos. Minha própria mente parecia vazia, destituída de intenção ou pensamento consciente. Eu podia sentir os fios dourados percorrendo minha mente e memórias, meu passado, presente e futuro. A sensação me aterrorizava em um nível existencial.
— Quem é você? — Minha voz soou oca e suave, a ressonância barítona engolida pelo vazio e pela minha própria dúvida.
— Você já perguntou isso. — Os fios pulsavam e vibravam enquanto a entidade falava. — Eu sou o Destino. Ou… um aspecto do Destino. O porta-voz.
Enquanto me esforçava para encontrar outra coisa a dizer, procurei desesperadamente na vasta extensão do vazio etéreo que nos cercava. A única característica concreta do vasto vazio preto-púrpura era o portal. Perguntei-me o que aconteceria se tentasse fugir de volta por ele.
Não, é por isso que estamos aqui, lembrei a mim mesmo, tentando me forçar mentalmente a superar o medo incomum que me privou dos sentidos.
— O que foi aquilo, lá atrás? Haneul? As Garras das Sombras e as outras tribos? Por que a farsa?
Os fios dourados se desenrolaram, tremulando pelo ar e se enrolaram de volta à forma humanoide à nossa esquerda, colocando-nos entre o Destino e o portal. Sylvie e Regis giraram em torno de mim para manter nós três encarando o Destino.
— Escolhi uma figura de suas memórias que pensei que o deixaria à vontade para tornar esta conversa mais confortável. — Novamente, os fios vibraram, um indício disso surgiu na voz ressonante e desumana do aspecto do Destino. — Você carrega consigo muitas centenas de horas de lembranças daquele chamado Haneul, dando a aparência de grande importância. — Algo parecido com uma risada percorreu a forma, emitindo ondulações ao longo das muitas centenas de fios dourados que se estendiam a partir dela. — Talvez não fosse conforto que você precisasse para introduzi-lo nesta conversa, mas confusão.
Olhei para Sylvie, que encontrou meus olhos com uma sobrancelha levantada.
— Isso… não é exatamente o que eu esperava.
Regis inclinou a cabeça, perplexo.
— Nem eu.
— Suas expectativas só poderiam se mostrar malformadas — respondeu a figura, como se pudesse ouvir nossos pensamentos. — Você sabe bem pouco, mas sua percepção o levou à beira de um entendimento maior. Até a borda do horizonte. Seu crescimento, seu poder, seus muitos sucessos e fracassos, o prepararam para uma coisa, e somente uma coisa.
— Controlar o aspecto do éter conhecido como Destino? — perguntei em voz alta, um arrepio percorrendo minha espinha.
— Não. — A palavra pairava no ar, parecendo ressoar de cada corda que compunha a forma física da entidade. — Mas seu mal-entendido é muito… humano.
Antes que eu pudesse responder, as cores se espalharam pelo vazio, girando e se fundindo para formar um céu azul nublado, um campo verde exuberante e uma extensão de oceano ondulante, cada onda com sua crista branca reluzindo como muitos diamantes sob um sol amarelo. Quando minha atenção retornou ao aspecto do Destino, ele novamente se envolveu no djinn de pele azul e olhos rosados, Haneul.
Dando um passo experimental, o chão sob meus pés parecia sólido. Inclinei-me, passando a palma da minha mão sobre as lâminas de grama, sentindo cada uma se curvar e depois voltar ao lugar. Algo nesta cena era familiar.
— Onde estamos?
— Depende de quando você está — respondeu Haneul. Ele se aproximou da beira de um penhasco alto que se erguia verticalmente de uma ampla praia abaixo. Sombras correram repentinamente pela paisagem, e prédios começaram a surgir da areia. Figuras sombrias se moviam pela praia como milhares de formigas. — As assombrações foram as primeiras a construir aqui. Há muito, muito tempo.
Uma grande cidade cresceu diante de nós, cheia de pequenas figuras escuras que apareciam e desapareciam rápido demais para serem vistas. A cidade engoliu a linha costeira e o penhasco, se estendendo até onde a vista alcançava em todas as direções. Em seguida, outras figuras apareceram. Sombras brancas, depois azuis, depois vermelhas e marrons, todas desceram sobre a cidade. Embora a cena distante carecesse de detalhes, era óbvio que uma batalha terrível estava se desenrolando. Ambos os lados sofreram muito e, quando acabou, a paisagem tinha sido devolvida ao seu estado anterior. Nada restou da cidade.
Lembrei-me do que Kezess havia me contado sobre o antigo ramo dos asuras chamado de assombrações.
— Acabamos de ver todos os outros asuras se unindo contra as assombrações guerreiras, não é? — disse, principalmente falando para mim mesmo.
Logo, figuras brancas estavam invadindo a praia e, assim como as figuras escuras que representavam as assombrações haviam feito antes delas, começaram a construir uma grande cidade. Só que, antes que a cidade fosse concluída, todas as manchas brancas desapareceram. Franzi a testa para a cidade fantasma meio construída por vários longos momentos. Justo quando estava prestes a me virar para Haneul e perguntar o que tinha acontecido, a terra se abriu e engoliu a cidade inteira.
— Quando os dragões levaram Epheotus deste mundo, apagaram todos os sinais de sua civilização da terra para que as futuras pessoas não soubessem nada sobre eles. — Haneul olhou tristemente para a praia vazia. A construção e a queda das duas cidades tinham deixado a paisagem áspera e parte do penhasco esculpido. — Está sempre aqui. Este lugar atrai todas as civilizações que crescem no solo desta terra.
— O que você…
Fiquei em silêncio quando um novo povo se espalhou pela praia. Seu progresso foi mais lento do que o das assombrações ou dos dragões. Começando com pequenas cabanas, expandiram sua vila para uma cidadela, então para uma pequena cidade encostada no penhasco. A terra ao nosso redor era lavrada e revirada para se tornar solo marrom, onde eram cultivadas colheitas. Espessas colunas de fumaça começaram a sair das chaminés de alguns edifícios, que agora eram feitos de tijolos em vez de argila ou madeira. As docas se estendiam até o oceano e pequenos navios à vela apareciam. Seu progresso pareceu parar por algum tempo, e então…
As manchas brancas caíram sob fogo branco e a cidade foi apagada em um piscar de olhos.
Meu primeiro pensamento foi nos djinn, mas eu tinha visto uma cidade djinn. Isso não parecia o mesmo. Entretanto, como antes, as formas brancas eram os dragões…
Uma ideia assustadora obscureceu minha mente e recorri a Haneul para obter confirmação. Seus olhos rosados permaneceram na praia.
Pouco tempo depois, outro grupo de pessoas apareceu. Como antes, lentamente construíram a terra, superando a civilização anterior, à medida que estruturas imponentes se tornavam a espinha dorsal de uma cidade murada que se estendia ao longo da costa em ambas as direções. Então, as formas brancas borradas voltaram e os prédios desmoronaram. Quando os dragões partiram, todos os vestígios da cidade foram desfeitos.
Sylvie soltou um gemido baixo e dolorido, seu olhar permaneceu inabalável enquanto ela observava a destruição sombria se desenrolar diante de nós.
— Este é apenas um pequeno canto de um continente deste mundo, durante uma estreita janela de tempo — disse Haneul, sua voz estranhamente vazia de emoção. — Você precisa ver isso para entender. Somente quando entender, será capaz de ver.
O tempo continuou a passar como uma inundação, e várias outras cidades surgiram e foram destruídas, cada uma representando uma civilização, um povo completamente novo. Então, uma cidade que eu reconheci surgiu.
— A cidade dos djinn. Aquela que vi no julgamento. Zhoroa.
Estávamos perto do mirante com vista para a cidade, ao lado da pequena cachoeira. A era pacífica dos djinn parecia durar mais do que as outras civilizações, mas eu sabia o que estava por vir. Quando aconteceu, desviei o olhar. Já tinha visto o fim de Zhoroa; não precisava vivenciá-lo novamente.
Quando olhei novamente, a cidade dos djinn havia desaparecido. Não restava nenhum pedaço ou grão, nem uma parede arruinada ou uma fundação. Nada.
— Eu vi, mas não entendo — disse após um tempo.
— Eu sei — respondeu Haneul.
Logo, as pessoas voltaram. Desta vez, porém, consegui distinguir algumas delas. Estavam construindo no topo do penhasco, que ao longo do tempo tinha se desgastado criando mais uma encosta. Em vez de uma simples faixa de costa oceânica, grandes partes da ampla praia tinham sido destruídas pela destruição anterior, criando uma baía familiar.
— Ah… que merda! — exclamou Regis quando percebeu. — É lá que Etistin está agora.
A cena se desfez, o chão se dissolveu sob meus pés, o céu se desfez em finas tiras de cor. Estávamos mais uma vez flutuando dentro do reino etéreo ao lado do portal. Haneul se foi e, em seu lugar, o aspecto do Destino retornou, seu corpo de seda brilhante iluminando a mim e meus companheiros.
— Aquilo foi real? — Sylvie perguntou ofegante, incapaz de esconder seu crescente pânico e repugnância de nossa conexão.
A luz ao redor do aspecto do Destino diminuiu.
— Sim.
— Todas aquelas civilizações… — Tive que engolir, umedecendo minha garganta seca e inchada. — Os dragões destruíram cada uma delas?
— Sim.
— Não pode ser — disse Sylvie, balançando a cabeça e se virando.
Não precisei ver o rosto dela para sentir as lágrimas escorrendo de seus olhos. Coloquei minha mão em suas costas na tentativa de confortá-la.
— Que insight devo tirar disso? Que os dragões não apenas exterminaram os djinn, mas também muitas outras civilizações antes deles? Como isso me ajuda a entender o Destino?
O aspecto se desfez novamente, apenas para se reformar bem na minha frente.
— É a base sobre a qual você deve construir sua nova compreensão do éter.
— Como podemos acreditar em você? Como podemos acreditar em qualquer coisa neste lugar? — As palavras de Sylvie foram nítidas e acusatórias. — Estamos na pedra-chave. Você pode ser apenas uma invenção. Tudo o que vimos, até mesmo essa conversa, até você, tudo pode ser uma fantasia.
— Sylv… — Eu disse, meu tom consolador. Através de nossa ligação mental, a puxei para mim. Embora ela não tenha se movido fisicamente, sua vontade estava contra a minha. Um arrepio percorreu seu corpo, e sua respiração se acalmou.
O aspecto do Destino permaneceu imóvel no vazio.
— É incorreto afirmar que estamos no artefato que você chama de pedra-chave.
Enquanto a entidade falava, cravei meus dedos no meu esterno, subitamente consciente da horrível sensação de coceira vindo do meu núcleo. Eu não estava de volta ao meu corpo físico, ainda conseguia sentir a distância entre ele e eu, mas ao mesmo tempo, quase sentia minha respiração indo e vindo dos meus pulmões, meu peito se expandindo e contraindo. Quando me concentrei, até conseguia ouvir Sylvie ao meu lado, sua respiração mais rápida, mais aguda, como alguém prestes a ser despertado por um pesadelo.
Estávamos mais perto de nós mesmos, mas não estávamos totalmente em um lugar ou outro.
— Isso é verdade, Arthur/Grey. Você não está totalmente na pedra-chave ou no mundo real. Sua mente está aqui, comigo, nesta prisão. — A luz dourada tremulava com o que meu cérebro primitivo traduzia como raiva. — Vocês três podem acreditar nisso simplesmente escolhendo fazê-lo. O Destino está tanto dentro quanto fora da pedra-chave, assim como vocês.
— Uma prisão? — perguntei, sem compreender totalmente o que significava o aspecto do Destino.
Os braços de fios dourados se levantaram para os lados da figura, um gesto que parecia abranger todo o reino etéreo.
— Não foi permitido que o mundo além, o plano do fogo e da terra, da água e do ar, crescesse em seu curso natural. Este lugar, este reino etéreo como vocês o consideram, é um sintoma de que o mundo está sendo reprimido, restrito. É antinatural, sua formação como um cisto no mundo desperto.
Sylvie recuou alguns passos. Sua pele estava pálida e ela mexia nas mangas de seu vestido preto.
— A destruição de todas aquelas civilizações…
As palavras do avô dela voltaram subitamente à minha mente: Tudo o que fiz foi para manter este mundo vivo, e seria prudente para você colocar isso firmemente na frente de qualquer outra suposição que você faça sobre mim. Havia mais do que isso, no entanto. Kezess havia falado sobre equilíbrio e sobre asuras lutando e destruindo o mundo. Não pude deixar de pensar que, talvez, ele estivesse se referindo a algo além da destruição física.
Considerei tudo o que sabia sobre o éter: ele abrigava uma espécie de consciência, exigindo que os dragões trabalhassem ao seu lado, persuadindo-o a tomar a forma desejada; ao absorver e purificar o éter através do meu próprio núcleo de éter, mudei minha relação com ele, permitindo-me manipulá-lo diretamente em vez de lutar apenas para influenciar a maneira como os dragões faziam; o éter podia alterar o tempo, o espaço e a energia vital da própria vida, sendo poderoso o suficiente até mesmo para conectar, ou separar, a essência espiritual de alguém de seu corpo de carne e sangue.
Embora a primeira pergunta em minha mente fosse porquê os dragões e Kezess queriam suprimir o avanço do mundo, não foi a pergunta que fiz.
— O que é o éter, realmente? O que é o destino?
— O éter é tudo antes da vida e depois da morte — disse o aspecto. Enquanto falava, os fios dourados se enrolavam em torno de si mesmos e a figura parecia crescer. — O éter é tanto espaço quanto vazio. É um tempo infinito e sem limites. É a própria essência da magia neste mundo. — Os fios estavam se enrolando ao nosso redor agora, como se estivéssemos no centro de uma bola de fio de algodão. Imagens eram reproduzidas pela corda entrelaçada.
Eu vi… eu mesmo, caindo. Só que a imagem que se desenrolava na luz dentro da esfera de fios dourados não estava focada em mim, mas no homem ao meu lado. Nós caímos e caímos, e então… paramos. Minha queda foi interrompida antes da colisão com o chão duro, mas o bandido não teve tanta sorte. A cena parecia congelada. Enquanto eu estava inconsciente, os últimos batimentos fracos do coração do bandido bombearam sangue para o solo a partir de uma centena de feridas, e a pequena quantidade de mana que se agarrava ao seu corpo foi liberada na atmosfera.
Então, outra coisa também foi liberada; algumas pequenas partículas de éter, como faíscas de ametista, saíram de seu corpo e foram absorvidas pela fina névoa de éter atmosférico que brilhava e ganhava vida na imagem.
Ao lado e um pouco dentro da imagem da morte do bandido, outra imagem também estava sendo reproduzida. Esta me mostrava caindo de uma árvore, minha mão envolta em uma lâmina de vento. Um golpe rápido na artéria carótida de um escravo, seguido por uma morte rápida. Novamente, a liberação de sangue, mana e, finalmente, algumas pequenas partículas de éter.
Outras imagens reproduzidas junto com elas. Cada uma mostrava uma cena diferente, mas todas eram iguais: cenas de morte. E acompanhando cada morte, a liberação de partículas etéreas.
Entre as cenas, eu me deparei com uma em particular.
— Não — gritei, ou pelo menos achei que sim. Não conseguia ouvir minha própria voz com o som dos meus batimentos em meus ouvidos. Eu não queria ver, mas não conseguia desviar o olhar.
Na imagem, o corpo do meu pai estava estraçalhado em meio à carnificina da batalha. Pensei que ele já tinha… morrido, mas a mana ainda estava agarrada a ele. Seus lábios estavam se movendo, só um pouco. Eu não conseguia tirar meus olhos da imagem horrível. “Alice. Ellie. Art.”. O movimento lento e silencioso de seus lábios dizia nossos nomes. “Eu amo vocês. Eu… amo vocês. Eu…” Seus lábios silenciaram e a força constritiva do seu núcleo se libertou. A mana purificada subia dele como vapor em uma manhã fria de inverno. E então, o éter.
Eu fechei meus olhos.
— Já chega. Eu… entendi.
Quando abri meus olhos de novo, o aspecto do Destino havia retornado à forma humanoide de fios dourados entrelaçados.
Sylvie entrelaçou os dedos nos meus e segurou minha mão com força. Eu podia sentir que ela estava assumindo uma parte do peso emocional que a cena havia depositado sobre meus ombros.
Ao meu lado, Regis balançou a cabeça, fazendo as chamas de sua juba ondularem como uma bandeira.
— Então, éter é… o quê, exatamente? Pessoas mortas?
Os fios dourados pulsavam com uma luz furiosa.
— O éter é a energia mágica concentrada deixada por um ser vivo quando eles partem.
— E ele… carrega um pouco da intenção deles — acrescentei, as peças se encaixando em minha mente. — O éter é consciente e pode ser influenciado… porque já esteve vivo.
Lágrimas brilharam nos olhos do meu vínculo.
— É por isso que ele se lembra das formas que assumiu antes. Civilizações inteiras de mortos. Outros além dos djinn devem ter alcançado um estágio onde poderiam utilizar éter. As formas de feitiços… são o eco de sua consciência coletiva fundida na magia viva.
O aspecto do Destino tremeu e todo o reino etéreo pareceu se fechar ao nosso redor.
— O cisto que é este reino deve explodir se o mundo for colocado de volta em seu curso adequado — disse o aspecto. — O mundo sofre sem o éter, e o éter sofre sem o mundo.
Imaginei as almas de todos aqueles que haviam partido neste mundo condensadas no reino etéreo e não pude deixar de me perguntar se alguma parte do meu pai também estava lá. Não só meu pai, mas Adam, Sylvia, Rinia, os Eraliths e os Glayders, Feyrith, Cynthia… havia muitos mortos para citar. Eles estavam sofrendo, presos dentro dessa prisão antinatural?
— Ela disse que o reino etérico é como as coisas terminam… — disse Sylvie, dando-se um pequeno sacolejo e puxando sua mão livre da minha. — Na minha visão, nas Relictombs. — Seus olhos se estreitaram enquanto ela encarava o aspecto do Destino. — Como, exatamente, o mundo está sendo reprimido?
A cabeça sem rosto virou-se para observar Sylvie. Em vez de palavras, imagens passaram por nossas mentes coletivas: campos de mortos, o éter deles subindo como fantasmas violetas acima deles; a silhueta de um dragão abrindo um buraco no tecido do mundo; um lugar entre lugares sugando partículas de energia ametista como uma esponja; ondas de foco saindo de uma fenda no céu e reverberando pela superfície do mundo…
As imagens desapareceram e o aspecto do Destino continuou.
— Um punho escamoso está fechado ao redor do mundo. Somente quando seu aperto for quebrado, as paredes falsas corrompendo a ordem natural serão derrubadas.
Meu estômago afundou. Eu não conseguia definir exatamente a sensação, mas algo no tom do ser me deixou desconfortável.
— O que acontece quando essas “paredes falsas” caírem?
— A existência continua. Os mundos seguem girando. O tempo avança como deveria. — A cada palavra falada, os fios dourados tremulavam com uma luz pálida.
— Entropia — pensou Sylvie, a palavra ressoando de forma sinistra dentro de mim. — A ordem natural é seguir o fluxo temporal. Exatamente como ela disse.
O espaço etéreo ao nosso redor se endureceu, assumindo bordas definidas, depois cores e, finalmente, textura, uma cena do mundo real mais uma vez surgiu ao nosso redor. O brilhante e imóvel cenário azul e dourado era como estar dentro de uma janela de vitral, mas quando me virei para olhar ao redor, as bordas duras se desfizeram, como areia ao vento.
Estávamos no deserto. Um vento forte soprava do leste, chicoteando areia em nossos rostos. A figura de fios entrelaçados era novamente Haneul. Ele acenou com a mão e o vento diminuiu. A areia flutuava como uma neve fina de volta ao chão do deserto. À distância, eu podia ver a pedra alta que marcava a direção do refúgio escondido dos djinn.
Haneul cruzou os braços, enfiando as mãos nas mangas opostas como algum velho monge. Seus olhos se fecharam e ele virou o rosto em direção ao sol.
— Canalize a runa que você chama de “God Step”.
Eu hesitei. Em vez de seguir as instruções de Haneul, eu me abaixei e passei os dedos pela areia.
— Este é o mundo real?
— Não. — Haneul não olhou para mim, mas manteve sua postura meditativa. — Ainda estamos no meio. O que você fizer agora não terá efeito fora da pedra-chave, mas permitirá que eu mostre a você a resposta para sua pergunta.
— Tenha cuidado, Arthur — pensou Sylvie.
Levantando-me novamente e limpando a areia da minha pele, respirei fundo. Com um pé no mundo real e outro na pedra-chave, era fácil canalizar o éter para a runa divina. Os caminhos etéreos, linhas brilhantes de luz violeta, conectavam cada ponto no espaço a todos os outros pontos. Exceto que os caminhos não eram retos como sempre foram antes. Os pontos individuais que marcavam possíveis destinos para God Step se incharam, como se algo os estivesse empurrando do outro lado, e os caminhos conectivos se curvaram e se distorceram.
Haneul abriu os olhos novamente. As íris rosa claro estavam tingidas com partículas de ametista à luz do sol.
— Eu te trouxe para um futuro onde você já derrotou seus inimigos, Arthur/Grey. A intenção que aprisiona este mundo foi libertada, mas você ainda é necessário. Eu vou te ensinar como resolver o problema na raiz.
Sylvie movia nervosamente seus pés na areia ao meu lado. Regis observava Haneul com desconfiança.
Em vez de entrar nos caminhos etéreos, segurei um, da mesma forma que fiz com os fios dourados que representavam o Destino.
— Bom — disse Haneul. — Agora, imagine em sua mente como cada caminho está interconectado em um ciclo contínuo, como a linha de um jogo de cama de gato1, entrando e saindo de cada ponto no espaço. Fortaleça a runa que você chama de Réquiem de Aroa e solte a linha.
Enquanto mantinha o foco em God Step, dividi a saída do meu éter e canalizei um fluxo para o Réquiem de Aroa. À distância, pude sentir o eco das runas aquecendo minhas costas. Partículas de éter roxo brilhante corriam pelos meus braços e se espalharam sobre minhas mãos. Firmando meu aperto no caminho, eu puxei.
Meus braços incharam. Éter instintivamente os inundou, e eu puxei ainda mais forte. Comecei a tremer, mas o caminho permaneceu seguro, nem mesmo dobrando sob minha força.
— Este não é um teste de força física bruta, mas de entendimento — explicou Haneul pacientemente. — Seu insight sobre esta runa está incompleto, e sua compreensão do caminho aevum é limitada. Contudo, você está vinculado com alguém que está melhor alinhado. Compartilhe esse fardo.
Relaxando sem soltar o caminho, olhei para Sylvie. Ela encontrou meu olhar com um aceno sério, então se dissolveu no espírito prateado, que flutuou para o meu núcleo.
— Abram suas mentes um para o outro — continuou Haneul quando nos unimos. — O insight do dragão está impresso em seu espírito, não aprendido. Ela deve se abrir completamente para vocês terem sucesso.
Senti Sylvie tentando expor sua mente, derrubando as barreiras que ambos tínhamos erguido ao longo dos anos para nos protegermos um do outro e a nós mesmos, mas não foi fácil.
— O insight requer risco. O crescimento exige dor — pensou ela, depois repetiu novamente. — Eu sou feito de você, e você é feito de mim. Eu posso curvar o fluxo do caminho do tempo, então você também pode.
Lentamente, senti a compreensão de Sylvie penetrar em mim, uma faísca de cada vez.
A imagem repentina de seu corpo se dissolvendo em partículas de ouro e lavanda interrompeu meu foco.
— Sylv, você está bem?
— Estou —, ela respondeu mentalmente, sua voz surgindo de uma fuga de meditação feroz. — Posso sentir, você não pode? A atração do insight. Eu atravessei o tempo em si, e o tempo me marcou. Não tenho certeza se entendi o que isso significava antes. Mas agora…
Pouco a pouco, nossas mentes se fundiram, tornando-se uma só. Naquele momento, o caminho etéreo distorcido em minhas mãos se moveu, e quando um se moveu, todos se moveram. Mil cordas caídas se apertaram, e toda a rede de pontos e caminhos conectivos se flexionou. Eu não estava totalmente ciente de qualquer compreensão que Sylvie estivesse compartilhando comigo que estava permitindo que isso acontecesse, mas Haneul estava certo.
Um por um, os pontos começaram a rasgar.
O éter se espalhou.
Eu continuei puxando, rasgando o vão cada vez mais largo até que…
A estrutura da realidade cedeu.
Eu agarrei Regis, que se dissolveu e se refugiou em meu núcleo com Sylvie enquanto uma erupção de força aérea como nada que eu já tinha visto ou imaginado rolava pelo deserto. A areia se erguia no ar enquanto a atmosfera evaporava, as fundações do continente se partindo longe abaixo de mim, incapazes de resistir à força.
De alguma forma, eu não fui destruído, mas flutuei do chão para o ar enquanto a onda passava infinitamente além de mim. Tudo o que pude fazer foi observar do meu ponto de vista cada vez mais alto enquanto a explosão limpava o deserto e rachava o mundo até o seu núcleo. A onda violeta varreu Sapin em seguida, e então achatou as Grandes Montanhas. Logo, toda Dicathen desapareceu, perdida sob o oceano violeta.
Eu flutuava livre da erupção, cada vez mais alto, observando o éter engolir os oceanos e depois Alacrya antes de se derramar livremente no vazio do espaço além.
— O movimento da ordem para a desordem, da forma para a ausência de forma. A dissolução da estrutura. Entropia. — A voz projetada mentalmente de Sylvie estava oca. — A progressão natural de todas as coisas.
Haneul se foi, mas a forma entrelaçada do Destino ainda flutuava comigo.
— Isto é liberdade. É a ausência de restrições. É aqui que seu caminho o leva, Arthur/Grey. Você é a chave.
Virei-me para a figura semelhante a uma boneca, meus movimentos lentos, minha expressão assombrada.
— Todos aqueles momentos em que você me cutucou e provocou, certificando-se de que as coisas saíssem do jeito certo. É para isso que tudo isso foi feito, o que você está tentando fazer?
— Arthur, destruidor de seu mundo, ou guardião do universo? — Regis pensou de forma sombria. — Isso coloca as coisas em uma perspectiva interessante, não é?
O rosto inexpressivo do aspecto me considerou sem emoção.
— O vento não busca derrubar a árvore. As ondas do mar não conspiram para desgastar a face do penhasco. O estado atual da realidade é contrário à progressão natural deste mundo. No momento em que seu espírito entrou em seu corpo, você se tornou o instrumento pelo qual isso seria corrigido.
Acenei fracamente para o planeta destruído, ainda cercado pela onda de éter em constante expansão.
— Mas isso? Como isso é melhor do que o que Kezess ou Agrona fizeram? — Levantei as mãos, quase dominado pelo desespero. E por baixo, uma raiva crescente. — Não. Não, este não é o futuro. Eu nego. Eu recuso.
— É claro — disse o aspecto do Destino, com uma fraca luz dourada cintilando ao longo dos fios que uniram sua forma. — Atualmente, este é o único caminho a seguir. E você perceberá isso com o tempo. Não há limite para o número de vezes que podemos ter esta conversa. Eventualmente, você viverá a sequência perfeita de eventos que lhe permitirá ver a verdade.
Fiquei boquiaberto.
— Se eu nunca sair da pedra-chave, não posso destruir o mundo. — Minha expressão se endureceu em um olhar feroz. — Se necessário, ficarei aqui para sempre. A dimensão de bolso que me prende eventualmente entrará em colapso, e meu corpo vai se decompor e morrer, ou Agrona me encontrará e me matará.
— As possibilidades são infinitas. — O brilho cintilava no rosto inexpressivo da figura, que não pude deixar de pensar estar sorrindo para mim. — Mas todas as eventualidades levam à quebra da barreira e à libertação do éter de volta ao reino físico. E em todas as versões, você é a lança que rompe o cisto.
— Não tem com ele saber disso — pensou Sylvie.
— Espaço, tempo, vida. Juntos, esses aspectos do éter produzem o Destino. E o Destino é o ato de conhecer, de alinhar exatamente assim — respondeu o aspecto. — Se eu sei, é só porque o mundo não poderia ser de outra forma.
Regis zombou, o barulho passando por mim como um arrepio nas minhas costas.
— Que besteira. Pura conversa fiada. Talvez os pedaços que se coagularam para formar o Destino costumavam estar vivos, mas este porta-voz, este aspecto do Destino, não entende os vivos — acrescentou Regis.
— Ele enxerga através do tempo e do espaço como olhamos através de uma sala — disse Sylvie, continuando com o pensamento de Regis. — Quantos milhões, ou bilhões, talvez, de vidas vividas e encerradas se uniram para formar o Destino? Pode ser capaz de ver para frente e para trás no tempo para estudar causa e efeito, mas não entende motivação, e não pode reconhecer a singularidade de cada ser. Para algo que passou por tantas mortes, tantas perdas, nós, e nosso mundo inteiro, somos muito pequenos.
O espírito prateado se libertou do meu peito antes de se manifestar ao meu lado.
— Destruir toda a vida deste mundo é uma parte necessária para que tudo volte ao normal? — perguntou Sylvie.
— Não, não é necessário. É natural. É inevitável. Isso… não é importante.
— Você viu todos os futuros, todas as possibilidades? — perguntou Regis, sua projeção mental se voltando diretamente para o aspecto do Destino.
— O Destino são todos os futuros, todas as possibilidades — respondeu calmamente.
Abaixo de nós, o mundo desapareceu. Qualquer conexão que ligasse Dicathen a Epheotus havia desaparecido. A sopa etérea escondia as estrelas distantes, o sol e a lua, tornando o céu indistinguível do reino etéreo.
— Mas você não é infalível —, eu disse com a voz suave, minha atenção voltada para dentro enquanto lutava por algum contraponto. Independentemente do que tinha dito, não tinha intenção de ficar trancado para sempre dentro da pedra-chave. — Você não consegue ver tudo… ok, talvez você possa, mas não consegue entender tudo o que vê. Quando cheguei, você confundiu as memórias armazenadas dentro daquele cristal com as minhas. — Minhas palavras vieram mais rápido à medida que eu continuava falando. — Você pensou que esse Haneul, um antigo djinn que morreu muito antes de eu reencarnar neste mundo, era de alguma forma meu amigo, mesmo que eu nunca tivesse visto ou ouvido falar dele.
O brilho cintilava esporadicamente ao longo do corpo enovelado em fios. — A infalibilidade não é um componente necessário para o sucesso em alcançar um estado de equilíbrio natural. O fracasso na ação é como o mundo evolui, um componente natural da decadência entrópica.
Fechei os olhos e pressionei as palmas contra eles em frustração. A conversa era irritante. Tinha que haver um caminho a seguir, mas…
Ofeguei, a realização me atingiu como água gelada. Estávamos parcialmente no reino físico e eu tinha conseguido, sem esforço, alcançar minhas runas divinas.
O éter saiu do meu núcleo e viajou pelos canais que eu havia forjado nos poços de lava das Relictombs nas minhas costas, imbuindo a runa lá.
Minha mente ganhou vida, meu foco se dividiu em várias direções fragmentadas ao mesmo tempo. Gambito do Rei. A fadiga e a névoa mental que eu tinha experimentado anteriormente tinham desaparecido. Estava perto o suficiente do meu corpo para utilizar a runa divina normalmente. Imediatamente, minha mente começou a analisar vários argumentos possíveis ao mesmo tempo, livrando-se da raiva, frustração e consternação que tinha sentido e se envolvendo no conforto frio da razão e das evidências factuais.
Um único fio de ouro seguia cada pensamento. Em cada consideração, o Destino estava lá, observando a linha de pensamento se desenrolar. Não importava quantos pensamentos eu tivesse ao mesmo tempo, os fios do Destino estavam entrelaçados em cada um deles.
Havia uma sequência necessária para os eventos, então os organizei na ordem necessária quando comecei a tentar resolver cada etapa. No entanto, como os caminhos etéreos que se conectavam dentro e através do reino físico e do vazio etéreo, cada etapa se conectava à próxima em um ciclo. Eu não conseguia atingir nenhum objetivo individual, como escapar da pedra-chave com um insight do Destino, sem saber como realizar o que veio antes e depois.
Os fios dourados agiam como uma bússola. Em vez de o Destino examinar meus pensamentos, eu usava esses fios do Destino para puxar quadros individuais da minha própria mente dividida para frente ou para trás no tempo, não apenas considerando as muitas possibilidades, mas procurando ativamente por elas usando a capacidade da pedra-chave de forjar mundos e linhas do tempo inteiras.
Nos muitos holofotes do olho da minha mente, vi dezenas, até centenas, de conversas possíveis com o Destino se desdobrarem, reproduzindo cada uma simultaneamente e em sua totalidade. Também manifestei mentalmente batalhas tanto contra Agrona, quanto Kezess, buscando um plano eficaz para eliminá-los do mundo sem destruí-lo no processo. Para sequer considerar a possibilidade de aliviar a pressão do reino etéreo e realinhar nosso mundo em sua trajetória adequada de crescimento, era essencial encontrar uma solução para o desafio que Agrona e Kezess apresentavam. Isso se devia ao fato de que qualquer tentativa nesse sentido dependia inteiramente dos desfechos dos dois eventos iniciais. Apesar de meus melhores esforços para explorar possíveis soluções para a liberação do éter, os resultados de qualquer sequência específica de causa e efeito foram dramaticamente alterados pela forma como resolvi as situações anteriores, criando um ciclo de destruição sem fim no qual até o Gambito do Rei se esforçou para encontrar significado.
Não havia a sensação de uma passagem de tempo, apenas o desdobramento de muitas possibilidades.
Foi só com o toque de um dedo em meu rosto que voltei a mim, separado da sequência cada vez maior e mais ramificada das minhas muitas linhas de pensamento díspares.
Sylvie estava pairando no vazio à minha frente. Ela olhou para sua mão, que estava manchada de sangue. Lambi os lábios e senti o gosto de sal e ferro.
— Arthur, seu nariz… — disse Sylvie um momento depois.
Tentei concentrar o éter em direção ao nariz sangrando. Meu núcleo não respondeu.
Dezenas de ramos separados de pensamento colidiram uns com os outros, cada colisão enviando uma onda de dor através do meu crânio. Foi difícil reunir foco suficiente para olhar para dentro.
Meu núcleo estava vazio, o resto do meu éter queimando como combustível em minhas runas divinas, todas as quais brilhavam quentes e douradas nas minhas costas.
Meus olhos piscaram, e senti meu corpo ceder. Um braço forte me envolveu, me segurando no lugar apesar de estarmos flutuando livremente no vazio.
— Ei, chefe, você precisa absorver um pouco desse éter — encorajou Regis, com sua mente brilhante e desperta enviando brasas quentes de dor pela base do meu crânio.
— Ele não consegue… — O medo de Sylvie enviou tremores pela minha espinha. — É seu verdadeiro núcleo que está vazio!
Seus pensamentos entravam e desapareciam. Eu não conseguia processá-los, não conseguia acompanhar quais pensamentos eram meus ou deles. O Gambito do Rei ainda estava ativo? Meu cérebro parecia ter sido cortado em cem pedaços, como aquelas antigas exibições científicas na Terra que eram apenas fatias finas de uma pessoa, cada camada prensada em vidro e lançada para o mundo ver…
O mundo não podia ver meu cérebro, mas os fios do Destino sim. O Destino esteve comigo, emaranhado em cada curso considerado, em cada sequência de eventos teorizada. Aqueles fios dourados entrelaçados estavam em cada pensamento ramificado que eu tive.
Os fios dourados não eram a bússola, pensei com o último resquício de sentido que tinha. Eu era a bússola.
A escuridão me tomou, engolindo minha mente e meus pensamentos, e até mesmo os fios dourados entrelaçados.
Através das pálpebras fechadas dos meus olhos, dentro do vasto vazio negro, um pequeno ponto de luz apareceu à distância. A luz se aproximou, ficou mais brilhante, e então se transformou em um brilho intenso, forçando-me a fechar os olhos. Sons indiscerníveis atacaram meus ouvidos. Quando tentei falar, as palavras saíram como um grito.
Tradução: NERO_SL
Revisão: Crytteck
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