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O Começo Depois do Fim – Cap. 386 – Pureza

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POV ARTHUR LEYWIN

— Argh, passar cinco horas ouvindo esses anões jogarem o jogo da culpa me faz sentir falta de passar pelo cólon de besta de mana. — Resmungou Regis.

— Essas reuniões podem não ser emocionantes, só que são importantes. Só… tente apreciar a vista ou algo do tipo. — transmiti cansado.

O Salão dos Lordes dentro do Palácio Real de Vildorial tinha uma vista surpreendente. O salão em si ficava dentro de um enorme geodo, que se estendia pelo menos vinte metros de largura e talvez trinta metros do chão ao teto. Era difícil dizer o quanto exatamente porque o chão estava escondido por uma piscina giratória de névoa prateada.

A longa mesa esculpida à mão, onde a nobreza anã se encontrava, repousava sobre uma fina lasca de cristal, que flutuava sem suporte no ar, no centro do geodo. Para alcançá-la, tínhamos atravessado uma série de pedras pairando, que faziam uma espécie de caminho.

O geodo em si brilhava com um caleidoscópio de cores: a água-marinha desbotando em laranja enferrujado cortada com estriamentos roxos, cintilando em amarelo e branco. Quando a luz mudava, parecia que as cores pulavam e corriam juntas. Em vez de artefatos de iluminação, velas sempre acesas flutuavam em intervalos por todo o espaço, garantindo uma luz cintilante e constante que dava a sensação de ondas de cores banhando as miríades de superfícies pequenas do geodo.

Fiquei examinando isso por um bom tempo, principalmente quando os anões reunidos começaram a apontar os dedos ou discutir sobre quem tinha falhado nos deveres, quais clãs mereciam um assento na mesa e quem tinha demonstrado o pior fracasso para a espécie anã.

— Com todo o respeito com a Lança Mica.

o Lorde Silvershale disse pela sétima vez.

— Os Earthborns permaneceram simpáticos e amigáveis com os Alacryanos em Vildorial durante toda a ocupação. Nunca tiveram que deixar suas casas, nenhum de seus parentes morreu defendendo…

— Uma mentira descarada.

Respondeu Carnelian Earthborn, revirando os olhos negros como besouros.

— E não tem nem mesmo um inteligente, considerando que minha própria filha liderou a maldita guerra.

Olhei para Silvershale depois para Earthborn. O primeiro era mais velho, com cabelos até os ombros que haviam ficado grisalhos e uma barba trançada em três pontas. Carnelian, por outro lado, parecia relativamente jovem. Seu cabelo vermelho da cor de mogno não combinava com o de Mica, mas suas bochechas eram redondinhas e tinha um brilho jovem nos seus olhos que lhe dava a mesma aparência infantil da filha.

— Então, onde o Clã Earthborn esteve nos últimos meses?

Lorde Silvershale olhou ao redor da mesa, não para Carnelian, mas para os demais da nobreza anã.

— Claramente não nos túneis lutando contra os Alacryanos e os traíras.

Finalizou, cruzando os braços e mostrando aos outros um sorriso vitorioso.

— Ok, você está certo. — admiti para Regis. Parecia que a parte importante acabou.

Antes que os dois pudessem levar a discussão adiante, ou pior, atrair qualquer um dos outros lordes, me levantei. O cristal abaixo dos meus pés tocou contra a madeira petrificada da minha cadeira, atraindo todos os olhos para mim. Todos presentes, incluindo muitos nobres anões que conseguimos reunir em curto prazo,  os membros sobreviventes do conselho de Virion e os outros Lanças, levantaram-se com pressa também.

— Receio que preciso de tempo para me preparar antes de seguir para os outros portões de teletransporte de longo alcance, falei.

Mica soltou um suspiro aliviado, depois parecia que se tocou, porque se endireitou e suavizou sua expressão de um jeito um pouco mais nobre.

— Todas as Lanças, de fato, têm outros deveres a cumprir. Pai.

Ela finalizou com uma leve inclinação de cabeça.

— De fato.

Disse Carnelian, sorrindo para sua filha.

— Mantivemos nossos convidados por muito tempo, então que esta reunião da Assembleia dos Lordes seja adiada para uma outra reunião amanhã, ao meio-dia.

Ele bateu os nós dos dedos na mesa como um juiz batendo o martelo.

Do outro lado da mesa, Helen chamou minha atenção, arregalando os olhos um pouquinho e com os lábios firmemente pressionados. Eu sabia exatamente como ela se sentia.

Era difícil sentir pena dos anões, difícil evitar comparar a dor e perda deles com as dos elfos, mas não tinha como negar que tinham sofrido. Desde o início da guerra, estavam se massacrando silenciosamente nos túneis sob o deserto. As duas facções se viam como tolos e traidores de sangue, cada lado deixando transparecer o que era do melhor interesse dos anões.

Essa animosidade não desapareceria da noite para o dia, tinha certeza de que não tínhamos visto o último derramamento de sangue entre as facções anãs. Ainda assim, fizemos o que podíamos em tão pouco tempo.

A maioria dos anões ficaram emocionados ao ver os Alacryanos serem expulsos de Vildorial. No entanto, quase tantos ficaram furiosos quando os Alacryanos foram autorizados a se teletransportarem de volta para Alacrya. Mesmo entre a Assembleia dos Lordes, muitos se queixaram de que não havíamos executado todos os soldados Alacryanos por seus crimes. Bem, eu não poderia culpá-los.

Foi ainda mais controversa a decisão de permitir que esses anões, que foram os mais dedicados aos Alacryanos, saíssem com eles. Apesar das preocupações da nobreza anã que acabamos de dar a Agrona mais soldados, dificilmente pensei que seriam tratados como iguais em Alacrya. Porém, já seria tarde demais quando percebessem sua própria estupidez.

Não senti, no entanto, nenhuma simpatia com esses homens e mulheres.

Um servo abriu as portas que levavam de volta ao palácio, mas após a grandeza do Salão dos Lordes, parecia quase simples em comparação. Gideon estava encostado na muralha do lado de fora, enquanto quatro anões fortemente armados e blindados olhavam para ele de forma não amigável.

O inventor se afastou da parede com o som das portas se abrindo e me deu um sorriso grande e brincalhão.

— Até que enfim! Esses anões pensam tão devagar quanto a pedra em que vivem…

Gideon gradualmente parou, depois limpou a garganta enquanto os rostos dos guardas ficavam sombrios. Continuei andando e ele se aproximou ao meu lado.

— De qualquer jeito, fiquei esperando por você, garoto. Tenho algumas coisas para te mostrar, invenções em que trabalhei enquanto estava sob os cuidados dos Alacryanos. Tem algumas coisas que eu realmente acho…

Levantei a mão, prevenindo a enxurrada de informações prestes a vazar de Gideon.

— Eu quero ver de verdade, mas não agora, Gideon.

O rosto do velho inventor ficou desanimado. Torci o anel de pedra negra e polida do meu dedo médio e ofereci para ele. O momento de decepção sumiu quando o arrancou das minhas mãos.

— Preciso que se concentre nisso.

Ele ergueu o anel ao nível dos olhos e virou várias vezes.

— Mas isso é apenas um anel dimensional. O quê…

Ele ficou imóvel, seus olhos arregalados se viraram do anel para mim, enquanto um sorriso animado se espalhava pelo seu rosto.

— Ah, por favor, me diga que você trouxe presentes do outro continente.

Ele ficou nas pontas dos pés, quase pulando.

— Um pouco da tecnologia deles, talvez?

— Tecnologia muito específica. — confirmei.

— Descubra como funciona e se podemos replicar. Isso tem prioridade sobre qualquer outra coisa em que esteja trabalhando.

Saímos do palácio juntos, enquanto Gideon me bombardeava com perguntas que respondi da melhor maneira possível. Saiu correndo dos portões frontais, indo em direção ao Instituto Earthborn para analisar o anel dimensional e começar seus estudos, garantindo-me que não comeria ou dormiria até que tivesse respostas.

Dos portões frontais do Palácio Real, que ficava no maior nível de Vildorial, pude ver toda a caverna abaixo de mim.

A cidade estava agitada de atividade: soldados preparando defesas contra o inevitável contra-ataque de Agrona, alimentos e materiais sendo transportados do sistema de túneis expansivos, que cercavam a cidade, casas temporárias sendo arranjadas para as centenas de refugiados que trouxemos conosco, tudo isso combinado com as atividades diárias dos moradores da cidade.

O centro da cidade, uma praça enorme que dominava o nível inferior, tornou-se o marco zero para receber as centenas de refugiados Elfos que trouxemos conosco. Mesmo do palácio, pude ver que a praça estava repleta de grandes mesas, caixas e tendas para distribuir comida fresca e dar aos refugiados mais cansados e fracos um lugar para descansar, enquanto esperavam por acomodações mais confortáveis.

Muitos anões estavam alinhados para receber comida também, mas não pude deixar de notar o quão pouco eles se socializavam com os elfos. Usando éter nos meus olhos, olhei atentamente para os indivíduos e vi que ninguém se preocupou em esconder os olhares amargos entre as duas raças, de modo que uma tensão evidente pairava sobre a praça.

É uma pena, mas não inesperado, pensei. Os elfos veem os anões como traíras, enquanto esses anões famintos e com dificuldades veem os elfos como competição pelos poucos recursos.

— É melhor que resolvam isso.

Regis entrou na conversa.

— Estarão todos juntos na mira de Agrona. Ou de Kezess. Escolha seu megalomaníaco.

Respirei fundo, segurei por vários segundos e, lentamente, deixei o ar sair.

— Eu sei.

— Ainda acho que o Relictombs teria sido melhor.

Regis respondeu com o equivalente dar de ombros mental.

— Menos complicado.

Era verdade que Relictombs teria sido um abrigo impenetrável dos Asuras, considerando que eles não podiam nem entrar lá.

Mas então eu não seria melhor do que os Asuras, pensei com uma pitada de repreensão. Relictombs seria tanto uma jaula quanto um asilo, e eu me tornaria o mestre deles.

— É melhor um mestre que os proteja do que um que esteja pronto para sacrificá-los para seus próprios fins. — respondeu Regis.

— Imagino que foi o que Kezess e Agrona pensaram antes de se tornarem os tiranos que são hoje. — refutei.

— O verdadeiro problema é que você não vai se decidir logo. — Replicou, agitado.

— Discutir consigo mesmo e até comigo todos os momentos de cada dia sobre qual é a “melhor maneira” de fazer algo. É guerra. Haverá consequências e você terá que estar pronto para aceitar isso, não importa o que faça.

— Eu sei.

— Sabe mesmo? — Regis pressionou.

— Como toda essa coisa de portal para Alacrya. Você quer destruir, mas não quer desistir disso como uma ferramenta e apenas desativar ainda é perigoso, tem medo do que vai acontecer se estiver errado. É exaustivo estar aqui.

Sua enorme forma de lobo das sombras pulou para a estrada ao meu lado. Ele sacudiu a juba, o que fez as chamas inflamarem.

— Vou explorar

Resmungou, afastando-se pela estrada e ignorando o coro de gritos surpresos e assustados dos anões por onde passava.

Suspirei enquanto o observava indo, mas minha mente estava se instalando em um vazio discordante, enquanto meus pensamentos tremulavam como teias esfarrapadas de aranha no escuro, interrompidos pela frustração de Regis que ainda estava me consumindo.

Fechei os olhos com força, depois os abri e me concentrei na multidão novamente, procurando pela mamãe e Ellie. Após um minuto, as encontrei em uma das mesas longas. Mamãe estava colocando sopa nas tigelas, enquanto Ellie distribuía pedaços de pão e odres cheios de água.

Queria ir até elas. Quase tanto quanto eu queria ficar sozinho. Não conseguia suportar o pensamento de todas aquelas pessoas; seus olhos se voltando com expectativa na minha direção, suplicando e implorando…

Não os culpava. Nenhum pouco; afinal, entendia, porque vivi tudo isso antes, como o Rei Grey. Mas agora não era a hora.

Em vez de descer o caminho circular até o nível mais baixo, virei-me e me movi ao redor da extremidade do Palácio Real e através de um jardim cheio de cogumelos brilhantes. Em torno da extremidade do palácio, onde a pedra cortada se fundia novamente ao penhasco áspero e natural da caverna, havia um túnel arqueado esculpido na muralha. Vapor e o cheiro pesado e sulfúrico de uma fonte termal natural flutuavam.

O túnel curto se abriu para uma borda acima de uma série de piscinas redondas. A água tinha uma luminescência azul e tênue, quase como se estivesse absorvendo e refletindo a luz dos muitos fungos brilhantes e videiras suspensas, que cresciam nas muralhas e teto. Ninguém mais estava presente; durante nossa breve visita ao Palácio Real, Carnelian Earthborn explicou que os Alacryanos tinham proibido os anões de usar essas piscinas.

Suspeitei que os nobres voltariam logo, mas era o lugar perfeito para descansar e pensar no momento.

Deixando-me mover lentamente, quase sinuoso, caminhei ao longo da beira das piscinas até encontrar um lugar de que gostava, ao lado de uma piscina pequena em particular onde crescia um trecho de cogumelos de caule longo. Eles agitavam seus caules como a antena de uma besta de mana subterrânea.

Tirando as minhas botas, coloquei os pés na água e me sentei no chão macio e musguento.

A pedra angular tinha se tornado minha principal ferramenta para a meditação, então a retirei da runa dimensional. Virei o cubo preto fosco e pesado nas minhas mãos algumas vezes, levando isso em consideração.

Até agora, descobri que a escuridão dentro do reino da pedra angular reagia com o uso de mana, mas não de um jeito que eu pudesse ver ou manipular. Não era nada mais do que ondulações tingidas de preto no escuro. Graças à Caera, descobri que as ondulações pretas eram a própria mana, assim, teorizei que ter um núcleo de mana permitia ver as partículas de mana ao redor delas quando entravam na pedra angular. Minha falta de um núcleo de mana parecia ser o principal obstáculo que me impedia de seguir em frente.

Como fiz dezenas de vezes, imbuí éter na pedra angular. Minha consciência se precipitou nela, passando pelas paredes roxas na escuridão. Fiquei lá, cercado pelo vazio, enquanto o cheiro sulfúrico da água quente mal passava pela minha mente consciente.

Não me preocupei em ativar nenhuma das minhas habilidades etéricas, não procurei no vazio por sinais de magia ou mana. Nem mesmo pensei, pelo menos por um momento. Era como dormir, exceto que eu não tinha que me esforçar como fazia para dormir naturalmente.

Foi então que algo mudou após um tempo indeterminado. Não tinha tanta certeza do que era no início. Era uma sensação sutil, como uma picada na minha nuca quando alguém estava me observando.

Mas esse sentimento vinha de dentro do reino da pedra angular.

Algo mudou na escuridão perto das extremidades do que eu considerava minha “visão”. Não era o deslizamento preto e ofuscado que eu tinha sentido antes. Parecia mais… estrelas, quase não vistas através das nuvens noturnas e vagas. Eram partículas cinzentas quase imperceptíveis que pulsavam, virando para cá e lá, quase como se estivessem caçando algo.

Abri os olhos.

Do outro lado da sala, Ellie saiu de fininho pela entrada com a mão na parede, com o nariz franzido por causa do ar espesso e com a tensão deixando todos os músculos tensos. Ela semicerrou os olhos para a luz estranha que vinha dos fungos, depois me viu e relaxou.

— Uau.

Seu sussurro ecoou no silêncio das fontes termais.

El. Minha irmã foi a fonte das partículas cinzentas dentro do reino da pedra angular? Mas se for isso, como? Por quê? O que ela estava fazendo? Em vez de disparar essas perguntas como flechas, no entanto, mostrei um sorriso afetuoso e talvez cansado.

— Como me encontrou?

Ela franziu o nariz novamente.

— Tá, vai parecer estranho, mas senti seu cheiro.

— Sentiu meu cheiro?

Ri, enquanto franzia uma sobrancelha.

— Tenho certeza de que não sou tão fedorento assim, ou eu sou?

Cheirei minha túnica só para ter certeza.

— É parte da minha vontade bestial.

Disse ela, colocando uma mecha de cabelo atrás da orelha. Ela hesitou nas escadas que levavam da borda até a pedra musguenta que cercava as piscinas.

— Tudo bem se…

— Claro.

Disse imediatamente. Por mais que quisesse ficar sozinho para explorar a pedra angular, a fim de descobrir mais sobre as partículas cinzentas que eu tinha visto, depois de todo esse tempo, também só queria passar um tempo com minha irmã.

— Sente aqui comigo. A água está incrível.

Ellie sorriu para mim quando praticamente pulava entre as piscinas para se juntar a mim, chutando suas sapatilhas e pisando na água com os pés descalços.

— Cadê Boo?

Ela riu, chutando a água e espirrando em nós dois.

— Ele estava aterrorizando as crianças anãs nas filas de alimentação, então o mandei caçar nos túneis.

Ela franziu a testa de repente.

— Espero que ele fique bem. E se alguém pensar que ele é uma besta de mana selvagem ou algo assim? Eu deveria ter pensado nisso antes.

— Posso enviar Regis para fazer companhia a ele.

Falei para ela, notificando meu companheiro mentalmente para fazer exatamente isso. Senti o tédio dele sumindo, então sabia que ele concordaria ansiosamente. Ambos nasceram tecnicamente em Epheotus e senti a curiosidade de Regis sobre Boo várias vezes desde que voltei.

Ellie sorriu em agradecimento, mas seu sorriso tremeluziu nas bordas da boca.

— Ei… por que você não desceu para nos ver? Não… não é por causa da mamãe, ou é?

— Não, não é…

Parei de falar no meio, pensando no que dizer.

— Foi principalmente por causa da multidão, mas, talvez um pouco por causa da mamãe. Não me entenda mal. Não sinto nada além de amor por ela. É só que…

— É complicado?

Chutei e observei as ondulações na água, desaparecendo lentamente enquanto avançavam.

— Eu não sei o que é melhor para ela, El. Preciso de um tempo comigo, um tempo para digerir tudo o que aconteceu, iniciando a conversa, esperando ela assumir a liderança…

Ellie encolheu os ombros.

— Vai levar tempo. Mas você precisa saber que a mamãe realmente quer consertar as coisas entre vocês dois.

Ela deu um sorriso largo.

— E não apenas porque você é um herói louco e superpoderoso agora.

Ri, empurrando-a para o lado. Ela deslizou pela inclinação musgosa e ficou encharcada até os joelhos, depois jogou água em mim.

Quando a risada diminuiu, ela notou a pedra angular na minha mão pela primeira vez.

— E o que é isso?

— Uma pedra angular do mago antigo, djinn. É como… um manual de instruções para as artes de éter. Tenho me focado nisso por um tempo, mas não consigo entender. Sempre que acho que estou progredindo, acabo em outro beco sem saída. Tirando as…

Hesitei, porque minha curiosidade pesou sobre as partículas cinzentas contra minha preocupação em envolver minha irmã.

Ela passou um dedo ao longo da borda, olhando de perto para a superfície.

— Como funciona?

Não tinha como separar essas partes da minha vida, logo, decidi com um suspiro. Não mais.

— Quer ajudar?

Ela assentiu animadamente, então rapidamente expliquei o processo de treinamento que usei com Enola e Caera.

— É parecido com quando a gente costumava praticar a formação de formas diferentes com sua mana no castelo.

O rosto da Ellie se franziu de concentração enquanto levantava a mão. Um cubo idêntico se formou na palma dela, mas este foi feito com a sua própria mana brilhante e pura.

— Assim?

Assenti com a cabeça.

— Agora, minha mente vai entrar na pedra angular. É difícil me concentrar nos meus outros sentidos, então talvez eu não te ouça, mas continue até que eu volte, ok?

— Entendi.

Ela disse seriamente, deixando o cubo se dissipar enquanto se preparava para conjurar uma forma diferente.

Reentrei com nervosismo no reino da pedra angular, reprimindo quaisquer esperanças ou expectativas. Por um momento, tudo ficou parado, quieto e vazio. Em seguida, a mana começou a se mover e meu coração parou.

Queimando em meio ao preto sem forma, havia uma esfera irregular de partículas cinzentas e borradas. Após alguns segundos, a esfera começou a mudar, adicionando mais partículas de mana à medida que se tornava mais complexa. Como se fosse assistir a uma bola de argila sendo moldada em alguma forma, as partículas sombrias de mana se tornaram um urso inacabado, mas reconhecível. Pude ver que Ellie continuava trabalhando nisso, afinando o corpo, alargando as pernas, ajustando as sobrancelhas espessas do urso. Perdi o foco quando o urso começou a andar.

Abri os olhos e olhei para a água na frente da Ellie, onde um ursinho idêntico de mana pura estava lentamente manobrando pela superfície da água. Ela estava tão focada na sua criação que não tinha notado meu retorno.

A maioria dos magos se adaptavam a uma afinidade a um elemento específico muito cedo, mas a mana da Ellie nunca se manifestou dessa maneira. Como um aumentador, Ellie usava a mana pura do seu núcleo para conjurar, mas usava um arco para focar essa mana e projetá-la para longe de si mesma, dando-lhe um alcance mais longo do que a maioria dos aumentadores conseguiam controlar.

A maioria dos aumentadores finalmente revelavam uma afinidade por um elemento específico, com seus aumentos assumindo aspectos desse elemento por causa da abundância de mana elementar no núcleo. Porém, Ellie permaneceu pura e era a única conjuradora não-elementar que eu conhecia. A mana usada nos seus feitiços era inteiramente pura.

Fechando os olhos novamente, voltei ao reino da pedra angular. E lá vi o urso, fora de foco, mas claramente visível, andando na escuridão. Em seguida, o urso desapareceu, e uma silhueta simples tomou seu lugar. No início, a silhueta não tinha características, mas Ellie lentamente acrescentou detalhes, dando-lhe cabelos longos, um pequeno rosto e chifres distintos.

Uma garota… Sylvie.

Senti minha garganta se contraindo quando seu rosto ficou claro. Moldada pela mana borrada, ela parecia desconfortavelmente semelhante aos meus últimos momentos com ela, como se estivesse se dissolvendo na minha frente de novo…

Sentindo meu foco se esvaindo novamente, afastei essas memórias antigas e dolorosas para o fundo da minha mente, focando inteiramente na forma.

O que eu deveria estar vendo e sentindo?

O objetivo da pedra angular era me guiar em direção para um insight sobre algum princípio do éter. A primeira pedra angular me levou ao Réquiem de Aroa, mas o caminho para esse entendimento foi bizarro, quase sem sentido.

Mas o ponto era esse, pensei. Era a jornada que fornecia sabedoria, não a pedra angular em si. Não é como um manual de instrução, mas sim um mapa.

A figura da Sylvie começou a mudar novamente. Ela inchou, e as partículas de mana se precipitaram nela quando a figura se expandiu, formando asas, uma cauda e um longo pescoço. A forma dracônica da Sylvie.

O objetivo final podia ser um mistério, mas parecia claro que o caminho envolvia observar as partículas de mana enquanto elas se moviam ou reagiam ao conjurar um feitiço.

Não tinha certeza, mas duvidava que o djinn pudesse ver partículas de mana individuais do mesmo jeito que o Realmheart me permitia. Essa pedra angular lhes deu essa habilidade, o que devia ter permitido que eles ganhassem um insight adicional.

Mas o que poderia ser? E por que posso sentir a mana pura da Ellie, mas não a mana alinhada a um elemento?

O foco do djinn estava em aprender sobre o éter, não a mana, então qualquer que fosse o propósito da pedra angular, o insight que ela fornecia tinha que estar relacionada ao éter. Caera foi capaz de ver a mana com ela, mas simplesmente ver não lhe concedeu maior compreensão, duvidava que pudesse, já que ela não tinha afinidade com o éter.

Minha frustração aumentou, de modo que liberei meu domínio sobre o reino da pedra angular e deixei minha consciência voltar ao meu corpo.

Ellie estava tentando fazer as asas do dragão se mover, só que estava tendo problemas com os movimentos complexos. Seu rosto estava muito franzido por causa da concentração.

Fiquei quieto e em silêncio, aceitando a quietude silenciosa do meu entorno.

Como um mago quadra-elemental com a capacidade de usar o Realmheart, ao mesmo tempo que tinha uma melhor compreensão da mana do que qualquer outro mago em Dicathen. Não precisava ver agora para compreender. Podia não estar fisicamente na minha frente, mas ainda conseguia imaginar a energia irregular da mana vermelha do fogo, o encanto líquido da mana azul da água, as rajadas afiadas e cortantes da mana verde do ar e o rolamento pesado da mana amarela da terra.

Os djinn podiam ter precisado da pedra angular para ver e entender como as partículas da mana se moviam e reagiam aos feitiços sendo conjurados, mas eu não.

Terra, ar, água, fogo…

Meu olhar foi das paredes da caverna para o vapor e depois para as piscinas quentes. A mana foi atraída para os elementos físicos que representava. Esta sala estava repleta de todos os quatro elementos. No entanto, a mana atmosférica estava inativa, porque não tinha nenhum feitiço sendo conjurado. Assim, era necessário agitá-la.

— Ellie.

Falei mais alto e com mais força do que pretendia.

Minha irmã saiu do estado altamente concentrado, e o dragão desapareceu.

— Ah, droga.

— Deixa pra lá, eu preciso que você tente outra coisa. — falei com pressa.

— Crie formas que interajam com os elementos na sala. Interrompa a água, pedra, ar… dispare, qualquer coisa. Seja criativa.

Sem esperar por uma resposta, mergulhei de volta na pedra angular.

Após um momento, houve um lampejo, enquanto um raio como uma flecha voava no escuro. De longe, ouvi o barulho de pedra quebrando. Na pedra angular, vi uma ondulação se espalhando de onde a flecha tinha desaparecido, tingida de preto, mas sem uma forma.

Terra, pensei, observando o modo como a mana se chocava contra si mesma como pedras rolando colina abaixo.

— De novo. — falei.

Desta vez, observei o local ainda mais de perto. A flecha apareceu, brilhou e desapareceu.

Ellie atirou flecha após flecha, e cada impacto colocava a mana atmosférica em um breve movimento. Em seguida, fez lâminas giratórias para empurrar o ar e, finalmente, esferas como balas de canhão para arremessar na água serena.

Porém, embora os tremores, ondas e ondulações fizessem sentido lógico, não mudou nada sobre como eu os via. Tentei imaginar os distúrbios tingidos de preto dentro do reino da pedra angular, conforme as partículas, de cores brilhantes como realmente eram, começavam a antecipar como reagiriam aos feitiços da Ellie.

Compreendia a mana, conseguia ver sem realmente ver. Mas… talvez isso fosse parte do problema. Eu não estava aprendendo nada. Não tinha nenhum insight novo.

O que eu estava deixando passar?

Pensei na minha infância, como tinha aprendido a ser um mago quadra-elemental. E na Academia Xyrus, aprendendo a focar nos meus atributos mais fracos. Depois em Epheotus, onde como precisei mudar inteiramente como eu olhava para a manipulação de mana, inventando novas técnicas para me adaptar aos desafios que enfrentava. E, finalmente, quando aprendi sobre o Éter.

Lady Myre me disse que o éter era a criação. Era como uma xícara, a mana como a água. Mana em forma de éter. Ele controlava as formas que podia assumir. Mas eu já tinha aprendido que a compreensão dos dragões sobre o éter era limitada. Essa comparação simplista era falha…, mas isso não significava que não poderia ser útil.

Tentei canalizar éter pelo meu corpo. Não funcionou; minha mente e meu corpo estavam muito separados e distantes metafisicamente. Tentei de novo, tentando alcançar minha forma física sem perder minha conexão com o reino da pedra angular. Era como tentar tornar meus braços mais longos ou forçar um osso a dobrar.

Precisava sentir duas coisas ao mesmo tempo, manter duas ideias separadas na minha mente ao mesmo tempo. E lenta, muito lentamente, comecei a sentir as bordas duras da pedra angular nas minhas mãos, ouvi o gotejamento da água da nascente fluindo de uma piscina para a próxima e senti minha respiração entrando e saindo dos meus pulmões.

— El? — Eu perguntei, testando.

— Sim, devo… oh! Você está…?

— Ainda aqui, falei. —

Enquanto minha boca formava vagarosamente as palavras.

— Vou tentar algo…

E então forcei. Não tentei formar o éter, apenas o expeli do meu núcleo e corpo, enviando um pulso de partículas etéricas sem forma e inofensivas para a atmosfera. Lutei para manter meus sentidos abertos de ambas as direções, sentindo o éter se movendo pela sala, enquanto também observava as partículas de mana invisíveis se movendo dentro do reino do éter.

Perdi os rastros de ambas. Resistindo ao desejo de deixar o reino da pedra angular por causa da frustração, tentei continuamente. Não tinha certeza de quanto tempo continuei tentando, com Ellie continuando a perturbar a mana atmosférica de qualquer maneira que pudesse pensar.

Lentamente, duas imagens opostas se formaram na minha mente.

Uma era a forma do éter. O jeito como se movia com base na fusão da sua vontade e da minha, mas independentemente do espaço físico que me rodeava. Depois, tinha a mana vinculada a elementos individuais, inativas até serem agitadas pela magia da Ellie.

Entendi como o éter se movia e entendi como a mana se movia. Não há novos insights para cultivar lá, mas onde elas se interagiam…

O éter simultaneamente continha e dava forma à mana, e, ainda assim, a mana continuava se movendo exatamente como esperado da sua natureza.

Como uma ilusão cognitiva, percebi. Uma imagem que é duas coisas ao mesmo tempo, com o espaço negativo de uma criando a outra.

Minha perspectiva mudou. De repente, não estava apenas sentindo o éter, mas a forma da mana no meio dele. O reino da pedra angular se realinhou à minha nova perspectiva e, entre uma respiração e outra, tudo mudou.

Em vez de um campo interminável de um breu vazio, vi a forma áspera da gruta, pintada nas cores de mana. Ao meu lado, minha irmã radiava junto; todos os elementos sendo atraídos pelos canais delas para serem purificados no núcleo.

As cores corriam juntas, enquanto a cena desaparecia em um vórtice giratório de mana comigo no centro. Ao contrário da pedra angular anterior, não sentia a sensação de clareza na minha mente. Em vez disso, senti calor se espalhando pelo meu corpo físico, enquanto ao mesmo tempo uma janela se abria na minha cabeça, deixando a luz dourada banhar meus pensamentos mais profundos.

Meus olhos se abriram.

Ellie estava me encarando, não conjurando mais seus feitiços. Senti as runas divinas. Elas estavam lá, inativas, esperando que o éter as tocasse, desse vida e propósito. E tinha uma nova, ainda quente contra a minha pele.

Forcei o éter nela.

— Uau

Ellie tomou fôlego.

— Você tem tatuagens roxas e brilhantes nos seus olhos. Que maneiro.

Como antes, minha mente foi preenchida com conhecimento. Esta nova runa divina tinha um nome, um propósito, uma história, só que parecia incompleta. Ao contrário de antes, não era meu entendimento que estava incompleto, mas o do djinn. Instintivamente entendi que eles não tinham levado essa arte de éter ao seu pleno potencial. Contudo, eu poderia ir além.

E, assim, abandonei o nome que tinha vindo com ela. Quando minha visão mudou e a mana atmosférica que permeava a caverna apareceu ao meu redor, escolhi como chamaria essa runa divina.

Realmheart.

 

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Nota do autor: Espero que todos tenham gostado do capítulo desta semana ~ Obrigado a todos os meus leitores que compraram o Volume 9 como um e-book ^^ Se você foi um dos felizardos, eu agradeceria de coração se puder deixar uma avaliação honesta do volume como um todo na Amazon! Gostei dos comentários sobre os capítulos semanais aqui e no Discord, mas estou curioso para saber o que todos vocês pensam sobre o volume inteiro!

 


 

Tradução: Reapers Scans

Revisão: Reapers Scans

QC: Bravo

 

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