Dark?

O Começo Depois do Fim – Cap. 380 – Epílogo

Todos os capítulos em O Começo Depois do Fim
A+ A-

 

Uma tosse seca me sobreveio e eu acordei repentinamente num mar de dor. Uma nuvem grossa de poeira obscurecia tudo além do chão manchado de sangue que eu pensava ser meu leito de morte.

Meu último pensamento antes de ficar inconsciente voltou à minha mente. Era assim que eu imaginava a sensação de morte. Cada parte de mim gritava em agonia, a dor de cada ferida lutava por atenção, uma sobrepondo a outra em minha mente até que senti como se meu corpo inteiro tivesse sido cortado em pedaços pelo—

O Asura!

Apesar de um desejo forte de nunca mais me mover, virei a minha cabeça, movendo meus ossos quebrados e criando um coro renovado de agonias.

Não conseguia ver nada através da camada grossa de poeira. Mas também não conseguia sentir a presença insuportável do Asura.

Respirando profunda e calmamente, virei de lado e me esforcei pra levantar, lutando até ficar de pé. Pedras e destroços caíram de mim, o talho em meu peito pulsava dolorosamente, parcialmente sedado pela poeira coagulando na ferida.

Minhas pernas tremiam, os pedaços esfarrapados da minha armadura estavam tão frágeis como latas vazias de alumínio. Tentei empurrar mana para meu corpo com o intuito de me fortalecer, mas apenas encontrei uma dor apertada e embotada vinda de meu núcleo, que estava completamente vazio.

A reação fez meu estômago virar e bile subir até minha garganta.

Pedaços da batalha começaram a voltar à minha mente através das ondas de náusea e dor, minha respiração ficou presa em meus pulmões.

Varay, Mica, Aya…

Todas elas estavam—

Me virei quando ouvi pedras caindo das paredes ou tetos distantes. Meus sentidos estavam entorpecidos, meus pensamentos se arrastavam como lesmas em meu crânio, havia um rugido baixo em meus ouvidos como se eu estivesse debaixo d’agua. Apenas meu olfato ainda estava funcionando decentemente; a caverna fedia a enxofre e solo queimado.

Uma luz fraca e sombria cortava a nuvem obscura em pequenos clarões e eu senti mana movendo.

Minha boca se abriu sozinha, mas evitei gritar. Não sabia quem ou o que estava por lá. Poderia ser o Asura, ou sobreviventes retornando dos túneis, ou Alacryanos, alertados pela perturbação que a nossa batalha sem dúvidas havia causado no deserto acima. Eu não estava em condições de me defender caso a presença fosse hostil.

A imagem de sangue jorrando de cristais negros estilhaçados se sobrepôs às minhas últimas memórias de minha própria “morte”, senti uma pontada de esperança, mas rapidamente a selei.

Não deveria ter sobrevivido àquela batalha, não conseguia encontrar em mim nem um pingo de esperança de que as outras tivessem sobrevivido também. Tinha visto o que Taci havia feito à Aya e Varay e apesar da voz que havia soado em minha cabeça nos últimos momentos de consciência, sabia que nem mesmo uma Lança poderia sobreviver àqueles ferimentos.

Ainda assim, não poderia simplesmente ignorar a presença de outra pessoa aqui, comecei a mancar na direção da luz, me movendo tão rapidamente quanto meu corpo quebrado e armadura arruinada me permitiam.

O chão da caverna estava arruinado. Os destroços das rochas, que tinha sido alvo de raios ou despedaçadas como gelo, me forçava a tomar cuidado ao andar, tinha que navegar por várias fendas feitas pelos golpes de Taci. Uma parede parcialmente intacta de um dos vários edifícios destruídos havia sido lançada por vários metros e estava agora apoiada contra uma rocha enorme que havia sido deslocada do teto.

Cuidadosamente, me esgueirei pela lateral da parede e depois para um pedaço de rocha que se curvava na direção de onde eu havia visto a luz. A poeira foi abaixando enquanto me movia para a borda mais distante da caverna, apertei os olhos procurando por algum sinal de quem ou o que havia usado mana.

Foi difícil acreditar no que eu estava vendo.

— M-Mica?

As palavras lutaram relutantes para sair de minha garganta e o esforço pareceu acender um fogo em muitas outras feridas.

A Lança anã levantou os olhos para mim de onde estava ajoelhada ao lado de uma segunda pessoa. O lado direto de seu rosto estava manchado com trilhas de lágrimas no barro seco. Dúzias de marcas de cortes longas se cruzavam no lado esquerdo de seu rosto, e um buraco preto e sangrento era tudo o que restava do seu olho esquerdo. Todo o lado esquerdo estava encharcado de sangue seco e algum tipo de lama molhada que ela havia compactado sobre suas costelas.

Havia sangue pingando de suas palmas, onde ela tinha apertado as unhas e seu olhar normalmente brincalhão encontrou o meu com um vazio que me fazia questionar se estava realmente viva ou era apenas um aspecto sombrio do meu subconsciente.

Quando ela virou o olhar inquieto para a segunda figura, meus olhos seguiram, relutantemente.

O rosto de Aya estava pálido, seus olhos escuros sem visão encaravam o teto da caverna. Seu abdômen estava em uma ruína sangrenta onde Taci havia dado o golpe fatal.

— Eu…

Tive que parar para limpar minha garganta, e então continuei.

— Eu pensei ter ouvido ela, logo antes do fim. Ela… ela disse…

Mas eu tive que parar novamente, incapaz de falar com o nó em minha garganta.

Mica deixou cair os ombros, mas não respondeu.

Dolorosamente, me esforcei para descer pela elevação, me movi até o outro lado de Aya para poder me sentar com cuidado.

No passado, teria sido impossível me imaginar à beira de lágrimas pela morte de outro soldado, especialmente outra Lança. Foi com uma pontada de culpa que me lembrei da minha indiferença depois da morte inesperada da Lança Alea. Ela merecia algo melhor, assim como Aya. Derramar lágrimas por uma amiga levada cedo demais não era motivo para me envergonhar.

As seis Lanças haviam se tornado apenas duas, olhei para Mica, já não restava muito de nós dois. Isso também era algo para se lamentar. Nós deveríamos ter sido os maiores defensores de Dicathen, mas isso foi o que nos tornamos.

O som de uma bota raspando contra a pedra rígida me fez pular. Minhas pernas imediatamente fraquejaram, cai dolorosamente em um joelho, grunhindo com os dentes cerrados. Mica cambaleou quando se levantou, mas se manteve de pé, até mesmo conseguiu conjurar um pequeno martelo de pedra enquanto seu olho remanescente penetrava a escuridão.

— Diga seu nome!

Gritou, com a voz rouca.

Uma silhueta torta mancava na nossa direção, oculta pelo véu de poeira, com uma mão pressionada na lateral do pescoço. Ela parecia um fantasma.

O fantasma de…

Varay coalesceu diante de nossos olhos, como se tivesse voltado direto da terra dos mortos.

Seu braço esquerdo, que não estava mais lá, havia sido cortado no ombro e a ferida estava congelada. Um rastro de gelo escarlate marcava seu pescoço abaixo de sua mão, mas o sangue estava correndo livremente por entre os espaços.

Seus olhos estavam sem brilho, pulando entre Mica e eu de maneira desfocada. Ela se apressou para nosso lado, com a perna direita se arrastando a cada passo, mas quando chegou na borda da elevação, pisou em falso e caiu de cara no chão, soltando um gemido abafado.

Mica correu para ajudá-la, virando-a de lado e arrastando para a apoiar em seu colo.

O gelo em volta de seu pescoço havia se quebrado e derretido, revelando um corte macabro que abria seu pescoço quase até a garganta. Sangue jorrava como de uma fonte, encharcando Mica.

— Droga!

Mica se apressou para pegar um punhado de terra solta. Ela se focou, fechando seu olho e a face dela se contorceu com o esforço enquanto eu via a terra se transformar em uma lama grossa, que ela espalhou rapidamente sobre a ferida. Quando terminou, houve um outro clarão de mana, e o solo argiloso se endureceu, parando o sangramento.

Parei um momento, olhando para Varay.

Eu tinha visto ela morrer, tinha visto Taci golpear sua cabeça e arranca-la dos ombros.

— Uma ilusão…

Murmurei, me virando para o corpo de Aya. Mas a ferida dela definitivamente não era uma ilusão.

— Ela… ela disse que as ilusões não enganariam um Asura mais de uma vez… e usou os últimos momentos de sua vida para nos salvar. Sobrepondo ilusões de nossas mortes por cima de nossos corpos.

Estava chocado com sua demonstração final de força, suas palavras de repente fizeram sentido.

— Você fez o suficiente, Bairon. Não é a sua hora.

Ela estava usando as últimas reservas de sua força, se sacrificando para salvar o resto de nós, até mesmo me impedindo de usar a Fúria do Senhor Trovão e queimar até a morte.

— Não se mova. Não importa o que você ver. Não se mova.

Eu estava deitado aos pés de Taci, sua lança estava preparada acima de mim.

Examinei uma ferida profunda em meu ombro direito, e depois tracei os dedos até meu esterno. Apesar de dolorido e arroxeado, não havia nenhuma ferida lá. Meu núcleo estava intacto.

Soltei um bufo incrédulo, o que atraiu um olhar irritado de Mica.

— O quê?

As pálpebras de Varay se abriram lentamente ao som da voz de Mica. Seu olhar passou lentamente por mim antes de repousar em Aya. Seus lábios se abriram, sua garganta pulsava enquanto tentava falar, mas nada saía. Ela apenas suspirou e afundou ainda mais no colo manchado de sangue de Mica.

Mica acariciou o cabelo e Varay, mas seu olhar se voltou para o corpo de Aya.

— Eu senti a mana sair do seu núcleo. Eu pensei… Eu pensei que ela havia morrido instantaneamente, mas…

Um soluço sufocado interrompeu suas palavras e ela rangeu os dentes, frustrada.

Varay mudou de posição e tentou falar novamente.

— Ela… esvaziou seu… núcleo… de propósito.

Sua voz estava fraca e fina, saindo com dificuldade.

— Para… deixar… a ilusão… mais real.

— Ela precisava que o Asura acreditasse no que ele via e sentia.

Comentei, considerando cada uma de nossas feridas e quão perto do limite do nosso poder nós tínhamos chegado. Nossa assinatura de mana deve ter sumido até virar quase nada naqueles momentos finais.

— Era a única maneira dele não perceber.

— Mas foi o suficiente?

Mica perguntou, com a voz áspera.

— Para as pessoas nos túneis?

— Aquelas vidas já não estão mais em nossas mãos…

Respondi. Nós não tínhamos a força nem mesmo para caminhar, muito menos para ir atrás do Asura.

— Mas a vida de Aya… Nós podemos nos lembrar e velar nossa amiga. Enquanto esperamos por qualquer que seja o fim que nos espera.

Mica irrompeu em soluços irregulares. Varay forçou as pálpebras a ficarem abertas, deixando que lágrimas fluíssem pelas suas bochechas, mas sem tirar os olhos de nossa companheira caída.

Me virando, estendi os dedos vacilantes até Aya e gentilmente fechei seus olhos.

— Sinto muito.

Disse, com a voz como se fosse uma lixa grossa. Normalmente, era Varay que lidaria com coisas como essa, mas sabia o que eu gostaria de dizer.

— E obrigado, Lança Aya Grephin de Elenoir. Sua longa batalha chegou ao fim, mas aqueles que você deixa pra trás não vão parar de lutar até que seja nossa hora de nos juntar a você. Descanse agora.

 

––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

Nota do Autor: Bom, isso encerra o volume 9 de TBATE. Escrever isso durante o último ano foi uma jornada incrível, mas eu não posso esperar pelo Volume 10. Como anunciei há algum tempo atrás, a novel de TBATE vai estar em pausa por duas semanas enquanto me preparo para o Volume 10. Para aqueles que continuam apoiando pelo patreon apesar do breve hiato, obrigado pela sua lealdade <3

Espero que vocês estejam ansiosos pelo Volume 10! Tenho muitas coisas planejadas ^^

 


 

Tradução: Reapers Scans

Revisão: Reapers Scans

QC: Bravo

 

💖 Agradecimentos 💖

Agradecemos a todos que leram diretamente aqui no site da Tsun e em especial nossos apoiadores:

 

  • adilson_foxxdie
  • brenopaes.
  • deciotartuci
  • S_Eaker
  • xandons
  • .hopium
  • renatolopez
  • Abemilton Filho
  • acidente.l
  • bananilsonfarofa_
  • clebao014
  • hpuque
  • igor.ftadeu
  • Jão gay
  • jarvinhas
  • jpedro1
  • kaliu_010
  • kicksl
  • lucasaf9291
  • MackTron
  • MaltataxD
  • Matheusfss
  • ninixw.
  • rafa1123xd
  • viserionawaken
  • roberto7274
  • willian.zero
  • Tsunaga
  • augustokkjk
  • Enrig
  • fb2272
  • Mucego1991
  • vapor.train

 

📃 Outras Informações 📃

Apoie a scan para que ela continue lançando conteúdo, comente, divulgue, acesse e leia as obras diretamente em nosso site.

Acessem nosso Discord, receberemos vocês de braços abertos.

Que tal conhecer um pouco mais da staff da Tsun? Clique aqui e tenha acesso às informações da equipe!

 

 

Tags: read novel O Começo Depois do Fim – Cap. 380 – Epílogo, novel O Começo Depois do Fim – Cap. 380 – Epílogo, read O Começo Depois do Fim – Cap. 380 – Epílogo online, O Começo Depois do Fim – Cap. 380 – Epílogo chapter, O Começo Depois do Fim – Cap. 380 – Epílogo high quality, O Começo Depois do Fim – Cap. 380 – Epílogo light novel, ,

Comentários

Cap. 380