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O Começo Depois do Fim – Cap. 378 – Lugar Certo, Hora Certa

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POV ANCIÃ RINIA

O leito de rocha ancestral tremia sob meus pés. Sentia a mana atmosférica se agitando com a liberação de um enorme poder. Não demoraria muito agora.

Alguém colocou uma mão no meu ombro.

— Temos tempo suficiente?

Era a voz de Albold.

— Devemos preparar uma emboscada em algum lugar e atrasar um pouco mais o Asura?

Ri com desdenho.

— Nossa esperança agora está na pressa e na sorte, não na força de armas. Não fiquem ansiosos para ter uma morte sem sentido, nenhum de vocês.

Uma outra voz, vindo do final da fila.

— Você poderia se juntar a mim em cima da besta.

Era a Madame Astera, a quem Eleanor Leywin havia permitido montar seu vínculo, dado que ela estava sem uma perna. Foi uma oferta gentil, vinda de alguém que me odiava profundamente.

— Eu conheço o caminho usando meus pés e sentidos, não um urso. Vou andar.

Apertei o braço de Virion enquanto me guiava.

— Precisamos ir mais rápido.

Senti o seu olhar preocupado, apesar de não conseguir ver, mas ele fez como pedi e eu empurrei meu velho corpo para acompanhar.

Este era o ponto onde os caminhos potenciais se divergiam, minha habilidade de influenciar um futuro em potencial era limitada. Nosso grupo era de sessenta, talvez setenta pessoas: alguns membros do conselho, os aventureiros conhecidos como Chifres Gêmeos, o artesão Gideon e sua assistente e aqueles dentre os refugiados que tinham demonstrado mais fé em mim.

Eles iam precisar.

Grupos menores haviam se formado para descer em várias dúzias de túneis diferentes, liderados pelos Glayders, Earthborns ou outros magos fortes. Se as Lanças caírem muito rapidamente, ou lutassem por tempo demais, impedindo o Asura de chegar até nós no tempo certo, todos morreríamos. Se Taci nos caçasse muito rápido ou gastasse tempo demais rondando pelos túneis, também morreríamos. O tempo era crucial.

Meu pé direito passou por uma pedra afiada.

— Vire à direita na próxima bifurcação.

Disse a Virion, e depois de mais cinquenta passos me guiou para a direita, o caminho se inclinou pra baixo sob meus pés.

Uma explosão de algum lugar muito atrás e acima de nós fez cair poeira do teto da caverna. Alguém suprimiu um grito.

No final do declive, o túnel fez uma curva acentuada à esquerda.

— Todos vocês vão sentir uma forte sensação de desencorajamento à frente. Este é um truque dos magos antigos para prevenir que este lugar seja descoberto. Vocês precisam persistir.

Nós continuamos por várias outras bifurcações antes que a sensação ruim começasse. A princípio ela era moderada, apenas um alerta na mente que dizia:

— Algo está errado aqui. Tenha cuidado.

A sensação aumentava rapidamente enquanto progredíamos, se transformando em um sentimento de terror esmagador.

Aqueles que guiávamos começaram a reclamar e choramingar, nosso ritmo diminuiu apesar de meu encorajamento e das pancadas feitas pelas magias quebrando pedras ao longe. Até mesmo o urso estava ofegante, sua respiração era cortada e desesperada.

— Albold, leve todos os guardar para a retaguarda. Garanta que essas pessoas continuem se movendo.

Não deixei ninguém se virar, disse.

— Vo-Você não pode nos forçar!

Alguém disse, se engasgando.

— Você está nos levando para nossas mortes!

Vários passos pararam, pude ouvir as pessoas se empurrando. Os guardas se moveram para intervir, mas houve um pulso forte de intenção vinda do meu lado e todos ficaram em silêncio.

— Todos vocês podem sentir o perigo atrás de nós. Ele é bem real, mas essa magia funciona apenas na nossa imaginação. Se a Rinia diz que a salvação está adiante, então nós continuaremos.

A confiança e autoridade de Virion acalmaram a perturbação, pelo menos por enquanto. Quando se virou e começou a marchar novamente, com o corpo rígido ao meu lado, todos continuamos a seguir.

Bum, a mana respondia à batalha ao longe. Bum. Bum.

Era quase suficiente para motivar até mesmo os refugiados mais assustados a continuarem insistindo contra o terror mágico que procurava nos manter afastados.

Mas não totalmente suficiente.

Depois de cinquenta passos, alguns estava parando novamente. Depois de uma centena, os guardas atrás estavam arrastando os mais fracos. Depois de mil passos, até os guardas estavam sem forças e aqueles que eram mais impotentes para encarar o medo saíram do grupo e voltaram correndo pelo túnel, com gritos que ecoavam nas profundezas escuras.

— Deixe-os ir

Exigi, quando ouvi os passos de Albold começarem a seguir.

— Qualquer um que dê as costas agora estará perdido, incluindo vocês.

Nosso ritmo diminuiu excessivamente. A cada passo, tinha a sensação de estar movendo por um poço de piche, esperando pela escuridão cobrir minha cabeça e sufocar a vida pra fora mim.

Sabia que teríamos que cruzar esta barreira. Pensei que estivesse pronta. Estava errada.

Meus pés pararam de se mover. Virion me cutucou e quase dava pra ver sua careta. Ele estava dizendo algo, mas não conseguia ouvir graças ao bombear do sangue em meus ouvidos.

Tudo tinha sido em vão. Forcei demais meu corpo e agora não tinha forças para continuar.

A terra pareceu tremer e então ficar em silêncio. A mana se aquietou. A batalha do Asura contra as Lanças havia terminado. Nossa última linha de defesa tinha caído. Não havia tempo. Não para dúvidas, nem para o medo.

Um braço fino envolveu o meu e Virion soltou meu outro braço, se afastando. Outro alguém, mais baixo e ainda mais fino do que o primeiro, o substituiu.

Mana fresca e calmante fluiu através de mim. A maior parte do meu corpo já tinha se tornado uma dor unificada, tão constante que eu já havia me esquecido de que estava lá, mas ao toque da mana, essa dor desapareceu. Minha respiração ficou mais leve. Eu me endireitei.

Vinda do outro lado, uma luz dourada movia por mim, aquecendo meu núcleo e afastando a escuridão e o desespero.

— Obrigada, Leywins…

Murmurei quando consegui falar.

— Agora, vamos. Estamos desperdiçando tempo precioso aqui.

Alice riu ao meu lado, mas Ellie apenas me segurou mais forte.

— Nós vamos conseguir. Lugar certo, hora certa?

Limpei a garganta quando ela fechou de repente, cheia de emoção.

— Estamos quase lá.

As duas seguraram meus braços e me ajudaram a seguir adiante, com Virion logo à frente. A zona do medo parecia continuar pra sempre, forçando nossos corpos e nossa mente com um desespero crescente para nos quebrar. De repente, como se ao passar por uma cachoeira gelada, estávamos livres dele, e cada nervo no meu corpo voltava à vida à medida que a aura repelente sumia. Minha mente se clareou, imediatamente calculando a quantidade aproximada de tempo que perdemos.

Sem dizer nada, ditei o ritmo, com o corpo renovado pela magia de cura de Alice, me sentindo leve como uma pena sem o peso da defesa dos magos antigos.

Uma intenção virulenta entrou pelos túneis atrás de nós, se movendo mais rapidamente do que eu podia imaginar.

Nós começamos a correr.

O chão de pedra áspera se tornou mais polido, exclamações aliviadas vindas da parte de trás ecoaram pelo corredor construído. Eu sabia o que eles estavam vendo: esculturas de pedras preciosas, contando a história de um lugar chamado de Relictombs, feito pelos magos antigos antes de sua queda.

Mas não havia tempo. Nem para explicar para eles, nem pra puxar o fôlego necessário para correr, então apenas empurrei os outros pra frente.

Os passos leves de Virion pararam adiante, mas insisti.

— Vá, nós precisamos de todos lá dentro.

A aura que se aproximava era como uma névoa vermelha na mana, agitando-a.

Apesar de que meus olhos cegos não conseguiam ver a sala, a conhecia bem pelas minhas visões. Um batente arqueado se abria em um grande espaço hexagonal, com uns trinta metros de diâmetro. Bancos íngremes de pedra, parecidos com degraus, desciam até uma plataforma no centro, onde um batente retangular de pedra se erguia.

— Me leve até o centro.

Disse, focando desesperadamente no batente de rocha esculpida. Não havia muito tempo agora. Se não acontecesse logo…

Quando chegamos até a plataforma, me soltei e descansei a mão na estrutura de pedra, passando os dedos pelo entalhe intricado.

Estava frio. Não havia mana ou éter correndo por ele.

— O que é isso?

Madame Astera perguntou enquanto a ajudavam a descer do vínculo de Ellie.

— Você nos trouxe a um beco sem saída!

Outros se juntaram a ela, suplicando para que houvesse algo a mais nesse lugar, qualquer coisa que pudesse salva-los. Alguém bateu na estrutura, como se o batente fosse uma porta, esperando que alguém os deixasse passar. A maioria foi pra parte de trás da câmara, se afastando o máximo da aura que se aproximava.

— Eu trouxe vocês até onde precisam estar para sobreviver

Disse, deixando que meu cansaço e frustração permeassem as palavras.

— Se o plano fosse permitir que vocês morressem, teria sido mais simples ficar onde estávamos.

— Se afastem da porta.

Virion estava dando ordens.

— Todo mundo, pra parte de trás da sala!

Acenei em sua direção.

— Este povo vai precisar de líderes capazes quando isso acabar. Faça como ele disse, Astera. Sobreviva.

Um grito cortou o ar frio, ouvi carne rasgando e ossos quebrando.

Uma figura humana, tão rica com mana que a sua forma brilhava em meus sentidos, passou pelo batente acima. Sua intenção de matar era como um punho assassino envolvendo meu coração, espremendo a vida pra fora de mim.

O mundo pareceu congelar. O único som era um grito semi abafado de terror abjeto, o único movimento era o lento girar da cabeça do recém chegado enquanto escaneava a sala.

— Povo de Dicathen, seguidores do Comandante Virion Eralith, eu sou Taci do Clã Thyestes.

Sua voz era cadenciada e arrogante, as palavras que ecoavam dele pela câmara estavam cheias de desgosto por nós.

— Pela sua falha em ver o caminho adiante e sua inabilidade de entender o mal necessário dessa guerra, Lorde Indrath proclamou que todos vocês precisam morrer para abrir espaço para um futuro mais sensato.

Virion deu um passo à frente. Tolo corajoso, pensei, apesar de que não tentei pará-lo. Nós precisávamos de cada segundo agora.

Mana surgiu de Virion quando ativou sua vontade da besta. Sua voz era um rugido baixo quando disse

— Aliados falsos e traidores. Os Indraths não são melhores do que os Vritra.

Ele correu pra frente, se movendo como um raio. Ouvi a sua espada sair da bainha e cortar o ar, observei a forma radiante de Taci se mover para defender e então a câmara se acender com magia quando uma dúzia de magos jogavam os feitiços que podiam para ajudar Virion.

Prendi a respiração.

O Asura se moveu com a graça líquida de uma vida inteira de dedicação e prática. Contra ele, a velocidade e ferocidade animalística de Virion era impotente. Taci bloqueou vários golpes rápidos e nem se importou com uma dúzia de outros feitiços. Virion se movia de um lado para outro, sempre atacando, como se fosse um furacão negro, mas os seus golpes nunca penetraram a mana do Asura.

De repente, Virion cambaleou e parou. Várias pessoas gritaram. Seu corpo bateu contra os bancos de pedra com um doloroso crack.

Boo soltou um rugido poderoso que foi interrompido, se transformando em um berro de tortura, um peso enorme caiu nas escadas. Atrás de mim, Ellie gritou desesperada.

O Asura passou pela sala como um clarão, fundindo sua assinatura de mana com a atmosfera num piscar de olhos, quando reapareceu houve um som afiado e molhado de lâmina cortando carne. Então, ele despareceu novamente, e novamente, e pra todo lugar que ia uma assinatura de mana se apagava.

Mas o batente do portal permanecia frio e sem vida, desprovido de magia.

— Pare!

Gritei mais alto que o ruído. Dei um passo à frente, me libertando dos braços que tentavam me segurar.

— Taci do Clã Thyestes, eu, Anciã Rinia Darcassan de Elenoir, te ordeno que pare!

O Asura parou, tive que ouvir a sua lâmina deslizar pra fora de um corpo, que caiu ao chão.

— Você deixaria, voluntariamente, que eles te transformassem em uma arma?

Perguntei, dando outro passo à frente.

— Você não seria mais importante para o seu Lorde do que nós somos. Uma ferramenta, para ser afiada, usada e substituída quando necessário.

Ele riu. Um som simples, incrédulo e cruel.

— Fui treinado desde que era uma criança, passando décadas no orbe de éter, para me tornar a arma de meu Lorde. É o meu propósito, vidente.

Pela câmara, as pessoas estavam chorando e soluçando. Alguém estava se engasgando no próprio sangue. Você não pode salvar a todos, disse a mim mesma pela centésima vez.

— Nunca entendi porque nós nos importávamos com vocês menores.

Taci continuou, focando sua aura pela sala, observando as pessoas impotentes e aterrorizadas que estava prestes a assassinar.

— Epheotus não precisa e nunca precisou de nada de vocês. Então por que… por que… um dos seus, um garoto, uma criança idiota, foi treinado entre nós?

Alguém tentou correr até a porta. A lança de Taci assobiou e o sangue se espalhou pelo chão.

— Isso foi uma desonra ao Ancião Kordri. Foi uma afronta contra mim e contra todos que tiveram que treinar com o garoto. Eu—

Ele pausou, senti a força da sua atenção completa em mim. Logo em seguida, ele estava em pé diante de mim e sua intenção era como uma fogueira que ameaçava me consumir.

— Você acha que sou um tolo.

Disse, com a respiração como um vento quente de verão em meu rosto.

— Eu fui avisado sobre vocês, estudante do príncipe perdido. Agora, no entanto, não entendo o porquê. Quaisquer que sejam as artes etéricas que você tiver roubado, você já foi consumida por elas. Você não é nada além de uma folha ao vento.

Sua mão pousou em meu ombro, e então empurrou.

 

POV ELEANOR LEYWIN

Como em algum terrível pesadelo, observei, paralisada, quando Rinia saiu voando até que bateu na estrutura de pedra. Quando estava em Xyrus, uma vez vi um garoto jogar um saco em cima de um rato e então pisar nele. O som era o mesmo.

O corpo dela caiu ao chão, sem movimento. Estava gritando. Minha mãe estava me segurando, tentando me puxar pra longe, me proteger com seu corpo, mas lutei para me libertar, para puxar meu arco. Era como se eu tivesse assistindo tudo de um ponto de vista acima de nós, sem controle nenhum de mim mesma.

Vários dos guardas já estavam mortos. Boo estava jogado em um canto, imóvel, sua respiração curta era o único movimento perceptível. Durden estava sangrando de uma ferida na cabeça, apesar de que eu pensava, tinha esperança, talvez de que eu ainda conseguia sentir sua mana. Jasmine e Angela Rose estavam protegendo Camellia e Emily na parede dos fundos. Não conseguia ver Helen, não tinha certeza de que ela estava bem, mas o fato do arco dela não estar atirando não era um bom sinal.

Os olhos negros do Asura escanearam a sala, repousaram em mim, focado nos meus gritos. Uma flecha se formou em meu arco e saiu voando. Ele se moveu alguns centímetros para o lado e a flecha passou ao lado de sua orelha. Uma segunda flecha saiu do meu arco, pegou essa, quebrando a mana e fazendo ela sumiu com seu toque. A terceira veio ainda mais rapidamente, mas não estava mais lá.

Houve um clarão vermelho, meu arco se quebrou em pedaços na minha mão, dissipando a flecha que estava na corda.

Ouvi os gritos de minha mãe mais altos do que os meus quando a lança vermelha foi levantada como o rabo de uma manticora. Não estava com medo, não de verdade. Sempre soube que eu iria morrer lutando, como meu Pai, como Arthur. Queria ser forte e corajosa como eles. Mas neste mundo, os fortes e corajosos sempre morriam lutando.

O Asura hesitou. Minha mãe me puxou e me apertou, os pedaços do meu arco destruído ficaram dolorosamente presos entre nós.

— Por favor!

Ela gritou, com a voz irregular e cheia de lágrimas.

Seu rosto se fechou ainda mais.

— Você deve ser a irmã do Arthur.

Seus olhos puramente pretos se fixaram em minha mãe.

— E a mãe dele?

A lança se abaixou.

— É uma pena que Arthur não esteja aqui agora. Tem sido uma honra cumprir esta tarefa para meu Lorde, mas eu teria gostado muito de enfrentar seu irmão novamente e mostrar a ele o quão pequeno seu potencial realmente é comparado com a raça do panteão.

Lentamente, o Asura segurou o braço da minha mãe, e a puxou pra longe.

— Não! Me solte! Não toque nela! Ellie!

Ele se fez de surdo para as súplicas de minha mãe e levantou a ponta da lança, perfurando minha lateral abaixo das costelas. Meus joelhos começaram a tremer quando a senti subindo pelo meu corpo, cortando tão facilmente quanto bolo de aniversário.

Bolo de aniversário? Me perguntei, vendo meu rosto refletido nos olhos do Asura. Tá aí uma coisa engraçada pra pensar quando se está morrendo. Mas fazia um pouco de sentido, também. Tinha pensado muito sobre a última festa de aniversário que eu tive antes da guerra. Quando todos estávamos juntos, até mesmo o irmão, quando o mundo não estava acabando.

Fiz questão de não gritar. Tinha decidido, no meio dos meus pensamentos delirantes, que eu não morreria gritando.

A lança saiu de mim tão facilmente quanto tinha entrado. Minhas pernas instáveis falharam, caí ao chão.

Minha mãe se jogou sobre mim, com lágrimas descendo pelo seu rosto me molhando. Minhas costas estavam quentes e molhadas, mas podia sentir uma frieza por dentro, se espalhando lentamente para fora. As mãos da minha mãe estavam brilhando com uma luz pálida.

— Está tudo bem, meu neném, tá tudo bem. Estou bem aqui. Estou junto de você, vou levar a dor embora, minha linda Ellie. Eu vou cuidar de você.

Acima dela, a lança de Taci estava pronta para golpear a sua nuca, mas todo o seu foco estava em mim.

Não, Mãe, corra. Vá embora, eu queria gritar, mas não conseguia puxar ar para meus pulmões.

Taci hesitou novamente. Seu olhar se fixou onde a moldura de pedra se erguia no centro da plataforma, percebi que havia luz saindo dela. Tive que me esforçar apenas para virar minha cabeça, mas dentro do que tinha sido um retângulo vazio de pedra, agora havia um portal roxo brilhante, cheio de redemoinhos etéreos.

Por entre a entoação frenética da minha mãe e os soluços daqueles que esperavam sua vez de morrer, um zumbido rítmico e gentil saía do portal.

A cortina de líquido roxo ondulou como se uma brisa tivesse soprado e duas silhuetas apareceram.

Não consegui ver suas características, mas havia algo na figura e postura que me eram tão familiares. Quase como…

Um sorriso apareceu em meu rosto enquanto meus olhos se fechavam. Me senti segura pela primeira vez em muito, muito tempo.

 

POV ANCIÃ RINIA

O som de soluços vinha de perto, passando pelo tinido em meu crânio. Era um som familiar. Alice. Tentei sentir a Ellie. Ela estava por perto, mas desvanecendo. O Asura estava de pé sobre elas, mas o seu foco estava em outro lugar…

Segui até o brilho etérico de um portal, manifesto mesmo sem minha visão. Mas era uma coisa pálida se comparado com a figura humana dentro dele.

Meu coração ressoou.

O que eu senti estava além do escopo do meu entendimento, mas sabia que não era a minha mente pregando peças. Meu corpo estava quebrado, minha vida estava esvaindo. Este era o momento que eu tinha previsto, onde todas as linhas se acabavam, mas eu nunca tinha conseguido entender como nós seríamos salvos, apenas o onde e o quando. Mas agora, eu sabia o porquê.

— Arthur…

Ele esteve ausente de minhas visões do porvir desde seu desaparecimento, até mesmo quando criança seu futuro nunca esteve muito claro pra mim. Não tinha acreditado completamente que ele estivesse morto, mas não conseguia vê-lo em minhas visões ou encontrar um futuro no qual ele reaparecesse. Apesar de eu ter visto este momento, era como se eu tivesse assistindo através do fundo de uma garrafa grossa: incerto e manchado com minha própria falta de conhecimento e entendimento.

Agora eu conseguia ver ele tão claramente quanto eu via Taci, uma nuvem radiante de luz ametista, e seu calor se espalhava pela câmara como o sol do meio dia de verão.

— Regis, ajude minha irmã.

Um fogo fátuo de luz roxa, uma faísca viva de éter, mergulhou na evanescente assinatura de mana de Ellie e a vida floresceu dentro dela.

Taci deu um passo atrás, mudando a sua arma, que queimava aos meus olhos, para uma posição de defesa.

— Quem… Arthur Leywin?

Sua confusão e incerteza era palpável, audível em seu tom de voz, costurada em sua postura.

A aura de Arthur ficou mais escura, sinais de um vermelho apareceram no meio do roxo. Um feixe de puro éter no formato de uma espada passou a existir, distorcendo a malha da realidade.

Gavinhas de eletricidade de éter engoliram Arthur e o espaço pareceu se dobrar à sua vontade quando reapareceu atrás de Taci. Uma luz roxa se chocou contra uma vermelha quando Taci girou a lança para trás e interceptou o ataque.

— Fico feliz que você esteja aqui, Taci.

Vociferou, sua voz áspera aos meus ouvidos.

— Você não deveria.

Arthur respondeu, com a voz como uma chama fria de ódio.

A espada de éter piscou e desapareceu, então voltou quase no mesmo instante e agora golpeava de baixo pra cima, sob a lança. Mana e éter tiniram uma contra a outra e a espada cortou o Asura nas costelas.

Com um grunhido de dor, Taci deu um passo atrás, novamente desaparecendo e reaparecendo, usando o que só poderia ser a técnica Caminho Ilusório do Clã Thyestes.

Senti o éter inchando dentro de Arthur, ele avançou contra seu inimigo, formando um arco ametista no ar com sua espada. A lança de Taci novamente se ergueu para defender.

A colisão emitiu uma onda de choque que quase me fez rolar para fora da plataforma. Meu corpo reclamou me dizendo que eu estava morrendo, como se eu não soubesse disso ainda.

Arthur pausou e olhou em volta. Alice tinha sido mandada pra trás. Ellie tinha saído rolando. Gritos encheram a câmara quando muitos outros saíram voando pela colisão desses dois titãs.

Taci rodopiou sua lança pra trás em um arco largo e senti uma onda de mana cortante passar acima de nós. Alguns dos gritos pararam, interrompidos e várias assinaturas de mana foram extintas.

Em um instante, Arthur voltou a pressiona-lo, movendo a sua lâmina mais rapidamente do que era possível na mão de um humano, mas Taci se igualou em cada golpe. E com cada colisão, a câmara tremia.

Eles vão derrubar o teto se o Arthur não fizer nada.

Tentei gritar, mas meus pulmões não conseguiram emitir mais do que um sussurro abafado. Ao invés disso, reuni as últimas gotas de meu poder. Não era muito. A mana se acendeu dentro de mim, e eu tentei reforma-la, transforma-la em uma mensagem e enviar diretamente para a mente de Arthur, mas… não havia o suficiente de mim restante.

Pela primeira vez, a possibilidade de falha, apesar de tudo o que eu tinha feito para chegar até esse ponto, parecia terrivelmente real. O mundo já havia, em tantas ocasiões, pedido mais de mim do que eu conseguia entregar e ainda assim tinha doado, mas agora, no fim de tudo, me faltavam as forças para garantir o que eu tinha visto.

Uma seção do teto da câmara caiu.

O fogo fátuo etérico que eu tinha sentido antes emergiu do corpo deitado de Ellie, se jogando contra as pedras para proteger um grupo amontoado de sobreviventes.

Os dois combatentes se mesclaram em uma mistura de cor e poder, luz branca se fundindo com roxa, éter se chocando com mana, suas armas zumbindo uma contra a outra. Por várias vezes eu vi o Arthur se ferir e senti fendas de mana deixadas pra trás onde a lança atingia, mas ele parecia tão disposto e inexorável enquanto pressionava o Asura.

A lança de Taci atingiu o chão de repente. A terra tremeu e a plataforma se rachou. Mais pedras caíram do teto e a câmara se encheu com mana usada para formar escudos pra desviar ou destruir os destroços.

As armas de Arthur sumiram e ele segurou a lança de Taci. Os dois se esforçaram para lutar pelo controle da arma. Taci golpeou com joelhos e cotovelos, carregando mana em seus ataques, cada um deles criando uma outra onda de choque.

Arthur olhou em minha direção. Tinha que fazê-lo entender. Novamente, reuni toda minha mana restante e formei a mensagem. A sala estava cheia de éter, vazando do portal como uma barragem rompida. Tentei alcança-lo, suplicando, implorando para que me ajudasse.

Senti a mente de Arthur se conectar à minha.

— Arthur, use o portal! Leve Taci pra longe daqui. 

Olhei com olhos urgentes, incerta se podia me ouvir e entender.

— Asuras não podem entrar nas Relictombs.

Senti a frieza dura como granito de sua mente através de nossa conexão. Este não era o garoto que eu tinha conhecido. Ele tinha sacrificado tanto para retornar para nós, deixando algo de si pra trás onde quer que estava.

— Apenas confie em mim.

O éter se acendeu ao redor de Arthur, girou a lança acima de sua cabeça, se virando de forma que ele e Taci estava de costas um pro outro, cada um segurando a lança no alto. Os dois brigaram e nenhum deles foi capaz de se impor, mas então Arthur piscou em um clarão de relâmpago etérico, reaparecendo no mesmo lugar, mas virado pra outra direção.

Taci tropeçou para a frente como resultado de sua própria força. Os braços de Arthur envolveram ele por trás, empurrando-o pra frente.

Pra dentro do portal.

E então… eles tinham sumido. Um silêncio extraordinário reinou na câmara, o ar pareceu ficar mais leve e fácil de respirar. Inspirei com dificuldade, sentindo um grande peso no meu peito.

Algo se moveu ao meu lado, uma mão quente envolveu a minha, entrelaçando nossos dedos. Sob o cheiro de suor e sangue, havia um cheiro luz do sol, folhas de bordo e óleo de espada. Me perguntei quanto tempo havia se passado desde que a pele de Virion tinha sido exposta ao sol para que o cheiro ainda permanecesse.

Abri minha boca para falar, mas nada saiu.

— Não fale. Você está machucada. Mas… nós temos, onde está…?

Sua voz grave foi interrompida, pude sentir, pelo seu esforço, que ele estava gravemente ferido.

— Eu preciso de um emissor! Alice?

Sua voz estava desaparecendo, senti algo molhado pingar em minha pele. A dor que inundava meu corpo enfraqueceu… e sumiu, deixando apenas o calor de sua mão ao redor da minha.

Uma pena. Eu queria dizer a ele…

Eu estava feliz que ele estava ao meu lado aqui no final.

 


 

Tradução: Reapers Scans

Revisão: Reapers Scans

QC: Bravo

 

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