POV GREY
Muita coisa mudou depois do acidente de Cecilia na escola. As coisas não estavam tão drásticas como Nico temia depois que o segredo de nossa amiga foi exposto, era o que parecia, pelo menos. Apesar da oligarquia bruta em que estávamos, ainda tínhamos direitos básicos.
Os executores não podiam simplesmente pegar Cecilia e mantê-la para os propósitos que tinham, mas foram capazes de basicamente forçar Cecilia a participar de sessões em uma instalação do governo próxima, para “testes” sob o pretexto de ajudá-la a “controlar suas habilidades”.
Outro problema era que Cecilia era órfã como Nico e eu éramos. Sem um guardião legal disponível depois que a diretora Wilbeck faleceu, mais de uma vez um suposto indivíduo rico ou poderoso mostrou seu desejo de adotá-la.
Gostaria de dizer que estava lá para ajudar minha amiga enquanto sofria os estresses e dificuldades que vinham de estar sob os holofotes, mas isso seria uma mentira.
Com Nico ao seu lado, sendo o ombro para apoiar Cecilia, rapidamente ficou evidente que eles haviam se tornado mais do que apenas amigos. Embora pensasse que minha reação inicial a isso seria um desconforto com o fato de que meus dois amigos de infância estavam no caminho para se tornar amantes, estava realmente feliz por eles. Foi difícil mostrar isso, já que eu quase nunca estava lá com eles.
Treinar com Lady Vera ficou ainda mais intenso quando atingi e até superei suas próprias expectativas. Ela tinha autoridade para me permitir pular a maioria das minhas aulas, já que seu próprio regime de treinamento era várias vezes mais intensivo do que a academia, então minha vida social e juventude foram comprometidas. Se não estava treinando ou disputando, estava aprendendo etiqueta e conhecimentos básicos necessários para o exame de se qualificar para ser rei. Como foi visto, você não poderia ser apenas um bom lutador, precisava do intelecto e carisma para atrair os cidadãos do seu país.
Foi sob a tutela completa de Lady Vera e a equipe de tutores dedicada a ter certeza de que eu tinha uma chance de lutar para me tornar um rei que aprendi que o papel de rei era mais parecido com um mascote glorificado, do que um líder.
Ainda assim, precisava do poder e da voz que vinham com a posição. Ainda não tinha esquecido sobre os assassinos que foram responsáveis pela morte cruel da Diretora Wilbeck.
Também usei esse motivo para justificar minha ausência com Nico e Cecilia. Dias e às vezes até semanas passavam sem sequer ser capaz de ver seus rostos, e enquanto me sentia mal, me enganei na crença de que se tornar um rei resolveria tudo. Se o governo estava fazendo testes obscuros em Cecilia para obter uma melhor compreensão de seus níveis anormais de ki ou os políticos estavam tentando usá-la como uma ferramenta para aumentar seus ganhos, tornar-se um rei me livraria de todos esses problemas.
Não era sensível ou empático como Nico era, nem tinha sentimentos fortes o suficiente por Cecilia para dedicar meu tempo estando lá para ela como melhor amigo. Em todo caso, ainda havia uma pequena parte de mim que culpava Cecilia pela morte da diretora Wilbeck. A mulher que era basicamente minha mãe foi morta protegendo-a.
Não era justo que eu a culpasse, sabia disso. Engoli esses ressentimentos injustificados há muito tempo porque a morte dela tinha sido dura pra Cecilia também, mas ainda assim deixou um pequeno abismo em nosso relacionamento.
Talvez seja por isso que eu nunca poderia retribuir os sentimentos que Cecilia teve por mim. Seja qual for a razão, não importava. Mal tive tempo de dormir, já que minha agenda atual foi planejada até o minuto de cada dia por Lady Vera.
Mas ela não era completamente cruel. Ainda me dava tempo para sair com Nico e Cecilia de vez em quando, e embora muitas das vezes Cecilia não pudesse vir por causa de seu próprio “treinamento”, conversar e brincar com Nico foi uma das poucas alegrias da minha vida.
Tínhamos quase 18 anos, e logo nos tornaríamos adultos, quando Nico trouxe seu plano com Cecilia, enquanto estávamos em uma de nossas saídas, agora mensais.
— Você vai fugir? — Perguntei incrédulo.
— Não… bem, acho, de certa forma. — Nico soltou um suspiro. — Você faz meu plano bem pensado soar como uma espécie de rebelião pré-adolescente.
— Porque meio que é. — zombei. — Você acha que o governo vai mesmo deixá-lo fugir com Cecilia? No que diz respeito a eles, ela é basicamente um patrimônio nacional.
— Confie em mim, eu sei. Mas depois que Cecilia e eu não precisarmos mais de um guardião, podemos largar a escola e ir para outro país. O novo protótipo do limitador de ki que fiz, já é várias vezes mais estável que o anterior e isso considera o crescimento nos níveis de ki dela.
— Quanto o nível de ki dela cresceu? — Uma parte de mim não queria saber a resposta.
Nico se inclinou para trás contra o assento.
— De acordo com seu último relatório, mais do que o dobro.
— O quê?! — gritei, imediatamente chamando a atenção dos outros alunos no refeitório.
— Sim. Aparentemente, não é apenas seu nível de ki inerente que é monstruoso, mas seu crescimento também. Neste ponto, espero que a equipe de pesquisadores que a vigia saiba o que está fazendo, eu imagino que qualquer forma de crescimento explosivo como esse, não seja perfeitamente estável.
— Ainda assim, isso é ridículo. — eu disse, baixando minha voz. Não pude deixar de me imaginar tendo um nível de ki tão alto. A maior parte do meu treinamento com Lady Vera consistia em compensar meus níveis de ki, apesar dos recursos infinitos que ela gastou em medicamentos e suplementos.
Com minhas habilidades de combate e o nível de ki de Cecilia, tornar-se um rei teria sido apenas uma questão de tempo. Podia ver o porquê do governo querer tanto a controlar.
— O treinamento ainda tá pesado?— Nico fez sua pergunta de rotina mais uma vez.
Eu balancei a cabeça, mal conseguindo levar um pedaço de peito de frango grelhado à boca.
— Está ficando um pouco mais suportável agora, mas sim.
Nico normalmente não se intrometia nos detalhes, mas acho que ele não poderia se segurar por muito mais tempo. Baixou o garfo e olhou para mim com os olhos afiados.
— Por que você está fazendo isso a si mesmo?
Continuei a mastigar cuidadosamente minha comida, respondendo apenas com uma testa levantada.
— Eu mal te vejo hoje em dia. Diabos, a Cecilia não está tão ocupada quanto você, mesmo com as sessões de treinamento do governo e políticos a perseguindo. Quando te vejo, ou você está ensanguentado ao ponto que o sangue está escorrendo através de seu uniforme ou você está tão dolorido que mal pode ficar em pé. Ser o rei é tão importante que vale a pena jogar fora seu corpo e juventude?
— Você sabe que não é tão simples assim. — disse com um tom ameaçador.
Nico revirou os olhos.
— É, eu sei. É aparentemente o último desejo da diretora Wilbeck que você a vingue desperdiçando sua vida.
Eu bati meus utensílios na mesa.
— Você já acabou?
Houve um momento de silêncio entre nós dois, enquanto nos encarávamos. Nico cedeu, soltando uma respiração.
— Olha, eu não queria sair como um idiota. Só queria dizer que a diretora Wilbeck não iria querer isso para você. Ela gostaria que você e Cecilia vivessem como estudantes normais e fossem felizes com vidas e famílias normais.
— Você sabe que eu não posso deixar isso pra lá tão facilmente. Não depois que todo o assassinato dela foi encoberto como um acidente. Aqueles assassinos são parte de uma organização maior, só sei disso.
— Então você se torna um rei e, em seguida, apaga a organização que matou a diretora Wilbeck. E depois? — Nico pressionou.
— Então me aposento. Encontro um lugar tranquilo e “vivo feliz com uma vida normal e família” — respondi com um sorriso.
Meu amigo balançou a cabeça impotente.
— Vamos esperar que seja tão fácil.
Ri, estremecendo com a dor que isso trouxe para o meu peito dolorido.
— E você e Cecilia? Você tem um país em mente ou você está apenas contente em ir onde o vento soprar?
— Os engenheiros nunca “vão onde o vento sopra” — zombou. — Tenho praticamente todo o conjunto de planos. E é tudo legal… apenas, modesto.
— Bem, você contou esse plano genial para Cecilia?
— Não inteiramente, mas— oh, falando no diabo. Cecil! Estamos aqui! — Nico de repente gritou, praticamente fugindo de seu assento. Isso me irritou, como a voz dele subia um tom, toda vez que falava com Cecilia. Não foi exagerado, mas ainda assim era bizarro.
No entanto, virei a cabeça e acenei para a nossa amiga com um sorriso. Minha saudação foi casual e descontraída, mas meus olhos examinaram Cecilia com atenção. Ela tinha ficado mais alta, e sua postura muito mais ereta e confiante, apesar da exaustão mostrada em seu rosto. Era fácil dizer que, objetivamente, tinha ficado muito mais bonita. Seja porque seu treinamento rigoroso estava moldando seu corpo em uma figura mais feminina ou por causa de seus genes inerentes que se concretizaram com a idade, ela atraiu os olhares da maioria dos estudantes do sexo masculino ao seu redor.
Estava vestida com um uniforme semelhante ao meu, indicando aos alunos e professores que tínhamos mentores e estávamos isentos de aparecer em sala de aula ou escola. Era uma versão mais extravagante das que os alunos normais usavam, embelezada com guarnições douradas e botões para combinar. Sempre achei estranho em mim, mas em Cecilia, fez a parecer uma nobre saída direto de um conto de fadas.
Cecilia sorriu de volta para nós antes de se sentar em frente a mim do lado de Nico.
— Já faz um tempo, Grey. — disse ela, alisando o blazer. Olhou para mim com os olhos cansados. — Como está indo o treinamento para você?
— Está indo bem. — respondi desajeitadamente. — Como você está?
Cecilia sempre foi uma garota tranquila, mas vê-la cada vez menos tornou nossas interações ainda mais tensas do que o habitual.
Ainda assim, ela era uma garota gentil e altruísta, altruísta o suficiente para dizer que estava bem quando, apesar de seu físico melhorado, sua psique parecia estar à beira de quebrar.
— Aqui, Cecil. Guardei algumas de suas comidas favoritas antes de todas elas acabarem. — Nico empurrou a bandeja de comida intacta em sua direção e observei enquanto ela forçou um sorriso e praticamente empurrou a mistura de frutos do mar com creme garganta abaixo.
Para alguém tão esperto, Nico não fazia ideia.
Assisti por um tempo como os dois conversavam; Nico falou a maior parte da conversa. Cecilia ouvia principalmente, mas respondia genuinamente a todas as perguntas de Nico, terminando o prato de comida.
Apesar da mudança de dinâmica entre nós três, as coisas pareciam normais por um tempo. Éramos três estudantes sentados e conversando durante uma refeição no refeitório da nossa escola. Enquanto minha vontade de me tornar um rei cresceu cada vez mais treinando, ainda sentia falta de passar um tempo assim.
Foi só quando Nico mencionou seus planos sobre fugir do país que as coisas começaram a dar errado. A expressão de Cecilia endureceu, a um ponto em que ela quase pareceu… com medo.
— N-Nico. Eu não acho que deveríamos estar falando sobre isso aqui. — disse Cecilia, olhando ao redor.
Nico levantou uma sobrancelha.
— Vamos, Cecil. Não é como se estivéssemos fugindo. Estamos legalmente autorizados a ir para outros países, você sabe.
— Ainda assim… — A voz de Cecilia se afastou continuando a pesquisar nosso entorno.
Olhei para o relógio amarrado ao meu pulso e levantei do meu assento.
— Meu tempo acabou. É melhor eu voltar para a propriedade de Lady Vera antes que ela dobre meu regime pelo resto do dia.
— Vamos levá-lo até o carro. — Nico levantou-se e Cecilia seguiu.
Nós três saímos do refeitório e para o saguão ainda lotado com estudantes no intervalo do almoço. Os olhos foram atraídos para mim e para Cecilia por causa de nossos uniformes, mas nós três ignoramos os olhares invejosos ao nosso redor e andamos para fora, para a tarde sombria que parecia refletir como eu estava me sentindo.
Nico foi provavelmente o único de nós três que permaneceu normal e um pouco ignorante. Nunca disse a ele sobre ser capturado e torturado, e tinha certeza que Cecilia estava escondendo um pouco de suas experiências no centro de treinamento do governo que não permitia nenhum estranho.
Ainda assim, nós dois provavelmente precisávamos de alguém como Nico em nosso grupo. Apesar de ser órfão como o resto de nós e de perder a diretora Wilbeck, Nico ainda era Nico. Apesar de suas feições afiadas e sua esperteza que muitas vezes nos levou a problemas, ele era brilhante e otimista.
— Eu vou ver vocês dois novamente em breve… espero. — disse quando entrei no carro preto esperando por mim do lado de fora dos portões da academia. Não estava mentindo, realmente queria vê-los em breve, mas eu simplesmente não estava confiante.
Depois de voltar para a propriedade, meu treinamento recomeçou. Lady Vera estava esperando por mim com sua equipe de especialistas empenhada em ter certeza de que eu estava fisicamente e mentalmente dolorido.
Em suma, foi um dia bastante normal. O pouco tempo que pude passar com Nico e Cecilia era o que eu precisava para passar por mais algumas semanas cansativas. Foi só quando me afundei na cama que recebi uma ligação de um número que não reconheci.
Eu respondi ao chamado.
— Olá?
— Sim, este é o Hospital Nacional de Etharia. Estou falando com Grey? — uma voz feminina agradável perguntou.
— Sim, aqui é o Grey.
— Olá, o motivo dessa ligação foi porque você foi listado como contato de emergência de Nico Sever. Ele foi levado para cuidados urgentes há alguns minutos e está sendo preparado para a cirurgia. Precisamos que você venha e…
Desliguei o telefone e desci as escadas tão rápido quanto meu corpo exausto permitiria. Por sorte, consegui encontrar um dos muitos mordomos da propriedade, e ele arranjou uma carona para o hospital para mim.
Tudo estava embaçado até eu chegar à sala onde Nico estava sendo mantido. Mal conseguia me lembrar de preencher os formulários apropriados e esperar a cirurgia terminar. O que eu podia descobrir, no entanto, era o par de algemas interruptoras de ki que prendiam o pulso dele na cama do hospital.
— G-Grey? — A voz grogue do Nico me tirou do meu estado de confusão.
Ajoelhei-me ao lado da cama dele, com cuidado para não tocar no cobertor em cima dele no caso de eu agravar as costelas quebradas.
— Nico! Sim, é Grey. Estou aqui. — disse, deixando minha voz tão baixa quanto um sussurro. — O que aconteceu, companheiro?
Nico ficou vidrado e os olhos meio fechados se abriram com a minha pergunta.
— Cecil! Eles pegaram ela! Acabei de deixá-la e estava voltando quando me lembrei que esqueci de dar a ela o novo protótipo.
— O quê?! — balbuciei, acidentalmente sacudindo a cama.
Meu amigo estremeceu e teve um momento para recuperar o fôlego antes de falar novamente.
— Eu os vi empurrando-a em um carro. Ela estava inconsciente.
— Quem a levou, Nico?
Nico, que tentou se ajustar, finalmente percebeu que estava algemado à cama. Mordeu o lábio enquanto amaldiçoava sob sua respiração. Cobrindo os olhos com o antebraço, soltou uma respiração trêmula.
— Era uma equipe de executores. Foi o nosso próprio governo que a levou.
Tradução: Reapers Scans
Revisão: Reapers Scans
QC: Bravo
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