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O Começo Depois do Fim – Cap. 217 – O peso de uma escolha

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POV TESSIA ERALITH

Se foi pelo alívio que uma lança tinha chegado ou por conta da resposta pelo uso excessivo da minha vontade bestial que tinha finalmente se estabelecido, desmaiei.

O sol tinha se posto quase que por completo, lançando uma tonalidade vermelha para o cobertor espesso de neblina quando acordei. Me encontrei em cima de um pequeno wyvern com vários soldados estacionados ao meu redor com armas sacadas, mas a batalha já tinha terminado.

Meu corpo doía e o próprio ato de manter meus olhos abertos enviou ondas agudas de dor para minhas têmporas. Mas não conseguia parar de olhar para a cena.

A batalha tinha terminado; tínhamos vencido. No entanto, o que eu estava focada eram os soldados feridos da minha unidade sendo levados enquanto os mortos foram enterrados no local. Corpos que deveriam ser levados para suas famílias para uma cerimônia apropriada foram deixados no mesmo local em que foram mortos.

Desci do réptil alado, alarmando os soldados de guarda. Tentaram me ajudar a voltar para cima, pensando que eu caí, mas eu acenei para longe.

A raiva subiu até a boca do meu estômago e se eu tivesse sucumbido ao impulso, poderia ter começado a atacar os soldados enterrando nossos companheiros aliados.

Mas parei, tirando minhas frustrações limpando a sujeira abaixo das minhas mãos. Mesmo que não fosse apropriado, sabia que não havia escolha. Havia um exército de Alacryanos ainda marchando seu caminho para a cidade de Zestier, o coração do meu reino. Não havia tempo de sobra para os mortos quando cada segundo do tempo e esforço seria necessário na defesa contra o cerco.

Um dos guardas gentilmente me ajudou a levantar e gesticulou em direção ao wyvern.

— Líder Tessia. Por favor, permaneça na montanha no caso de que mais alguma coisa aconteça.

Mesmo assim, que direito tenho de ficar com raiva? Não sou eu a culpada pelas mortes que aconteceram aqui? Se não fosse pelo meu egoísmo, quantos dos que estão sendo enterrados agora teriam sobrevivido?

Sabia que não era saudável cair neste poço de auto culpa…, mas com as provocações de Vernett ainda ecoando na minha cabeça, era difícil não o fazer.

Independentemente disso, comecei a subir de volta para a montanha quando algo além do canto do meu olho chamou minha atenção.

Me livrando da guarda, comecei a correr.

Não pode ser.

Passei pelos médicos ajudando os feridos e os emissores fazendo suas rondas para os soldados em condições mais graves. Foi difícil para mim, respirar quando meus olhos ficavam colados ao emissor ajoelhado no chão e o paciente que ela estava ajudando.

Era Caria, inconsciente. Caí de joelhos, mas antes que pudesse chegar mais perto, uma mão bloqueou meu caminho.

Olhei para cima para ver um Darvus de olhos de pedra, olhando para mim com uma expressão que eu nunca tinha visto antes.

— Ela mal foi capaz de dormir com um sedativo. Não a acorde.

Stannard também estava por perto, desgrenhado e coberto de sujeira.

Depois de me ver, porém, desviou o olhar.

Nenhum dos dois teve ferimentos além de alguns arranhões, mas o mesmo não poderia ser dito para Caria.

Assisti, perplexa, enquanto o emissor começou a fechar a ferida na perna esquerda… ou melhor, o que restou dela. O homem tinha as mãos entrelaçadas sobre o toco mutilado, aplicando pressão, mas o sangue ainda jorrava entre os dedos, formando uma piscina vermelha.

Olhei, espantada e horrorizada, ao ver a ferida de Caria rapidamente se curando. A pele em torno de sua ferida aberta começou a fechar em conjunto para formar um nó irregular de carne.

Já sabia que os emissores não podiam regenerar novos membros, mas ver a ferida fechar perto da parte inferior da coxa fez parecer irreversível.

Foi quando me ocorreu.

A brilhante e energética Caria, cujo talento como uma aumentadora só foi ofuscado por seu amor pelas artes marciais, nunca mais seria capaz de andar sobre seus dois pés novamente.

— C-Como… — murmurei, minha visão embaçada das lágrimas subindo.

— Como? — Ouvi darvus retrucar. — Você nos deixa para ir em sua própria luta sozinha e—

— Pare, Darvus. As pessoas estão assistindo. — Stannard o afastou e fixou o olhar em mim antes de mergulhar a cabeça em um arco. — Peço desculpas pela explosão dele, Líder Tessia.

O conjurador loiro que normalmente era tímido e bondoso, se referia a mim friamente.

Balancei a cabeça.

— Stannard…

Meus dois colegas me ignoraram, amontoando-se perto de Caria e perguntando ao emissor como a ferida estava cicatrizando.

Darvus estava certo. A culpa foi minha. Eu tinha um papel que deveria cumprir, mas escolhi sair por conta própria, pensando que poderia ajudar mais com a minha força.

Não. Para ser honesta comigo mesma, provavelmente pensei em um ponto que ser uma maga núcleo de prata me deu direito a batalhas maiores do que apenas defender uma posição.

E por causa disso, abandonei meus companheiros de equipe. Nenhuma tentativa de me convencer de que ela ainda poderia ter sofrido a lesão, mesmo se eu estivesse lá, ajudou a aliviar a pressão terrível pesando no meu peito.

— É hora de ir. — disse uma voz familiar por trás.

Não olhei para trás, meus olhos permaneceram fixos no sono pacífico de Caria. Como isso mudaria quando ela acordasse. Ela me culparia como Darvus e Stannard? Ela me odiaria?

Limpei minhas lágrimas com a parte de trás da minha mão. Tinha que ficar forte. Isso foi só o começo. A batalha para defender a capital de Elenoir seria onde eu poderia compensar meus erros.

— Tessia Eralith.

A voz me tirou dos meus pensamentos. Virando-me, vi a General Aya vestida com uma armadura leve com vários guardas atrás dela.

— O piloto está pronto para partir. Você vai voltar para o Castelo imediatamente, Líder Tessia. —  afirmou a lança elfa enquanto se virava.

— O Castelo? — respondi. — Não entendo. O exército Alacryano está marchando em direção a Zestier agora. Não há tempo para visitar—

General Aya olhou para trás sobre seu ombro, seu olhar afiado cortando minhas palavras.

— Talvez eu não tenha sido clara. Você será retirada da batalha até segunda ordem.

Rapidamente me mexi ficando de pé.

— Espere, general! Ainda posso lutar! Por favor.

O comportamento convidativo e charmoso da lança foi misturado com impaciência, mas manteve sua voz educada.

— Por favor, tenha ciência da sua posição como uma Eralith. Levando em consideração seu estado mental atual, já disse ao Conselho que você está imprópria para a batalha.

Não. Não, eu precisava lutar. Precisava compensar meus erros. Precisava compensar Caria e todos os outros, indo bem na próxima batalha.

Aya começou a ir embora, seu cabelo ondulado escuro balançando atrás dela, quando eu agarrei seu braço.

— General, eu sou uma das poucas magas de núcleo de prata pronta para lutar. Não posso me esconder no Castelo quando sei que todo o reino élfico está sob—

— Seu trabalho era permanecer em formação e aguentar pelo curto período que levaria para os reforços chegarem, mas o número de mortos de sua unidade chegou a mais da metade por causa de suas ambições egoístas. — A lança ergueu meus dedos fora e me respondeu friamente. — O restante de sua unidade que ainda está apto para a batalha se juntará ao restante da minha divisão.

— Irá demorar muito tempo para mais reforços chegarem, General! Até o General Arthur está ocupado com a horda de bestas atacando—

— O que acontece a partir de agora já não é de seu interesse. Você já fez o suficiente, Princesa.

As palavras da lança me atingiram como um tijolo de chumbo reforçado, deixando-me congelada, quando a General Aya entregou ao soldado ao lado do wyvern um pergaminho.

— Leve-a direto para o castelo e leve isso para o Comandante Virion.

Indo em direção à montaria, enquanto seu cavaleiro apertava a sela, eu me permiti um último olhar de volta para Darvus e Stannard.

Nenhum dos dois conseguia me olhar nos olhos. Com os olhos suplicantes, continuei a encarar, esperando que eles pelo menos encontrassem meu olhar. No entanto, até o fim, nenhum olhou para trás.

E a agonia e o vazio que senti naquele momento doeu mais do que todas as lesões que já tinha sofrido como uma soldada companheira lutando ao lado deles.

 

POV VIRION ERALITH

O Castelo.

Foi um caos. Atualizações ao vivo, a maioria vinda da cidade de Zestier, estavam sendo marcadas nos pergaminhos de transmissão mais rápido do que poderíamos classificar e lê-las. Apesar do custo desses artefatos de comunicação, pilhas deles foram espalhadas por toda a sala de reunião enquanto membros do Conselho continuavam a lê-los.

A situação terrível e agitada adicionou óleo às chamas de tensão que já haviam se acumulado na sala.

Um baque repentino virou a cabeça de todos para Alduin, que tinha jogado uma pilha de pergaminhos de transmissão no chão. Meu filho agarrou Bairon Glayder, ex-rei de Sapin, pelo colarinho e bateu-o contra a parede.

— Você está lendo os relatórios de Elenoir também, certo? — sibilou. — Você está feliz? Você está feliz?!

Eu gesticulei para que os guardas que estavam prestes a interferir parassem.

Pela primeira vez, o orgulhoso chefe da família Glayder parecia… envergonhado.

— Era impossível prever que algo assim poderia acontecer.

— Impossível? — Alduin cuspiu, aproximando seu rosto do humano. — Um exército de magos Alacryanos está atualmente se aproximando de Zestier, o coração de Elenoir. Mesmo com as estratégias de evacuação sendo implementadas, o número de mortos já está subindo, de soldados tentando impedir a cidade de ser cercada e você está dizendo que era impossível?

— Entendo sua raiva, mas por favor, este não é o momento ou o lugar para fazer isso. — Merial disse calmamente puxando o braço de seu marido.

Empurrando o braço para longe de sua esposa, balançou um punho selvagem que ainda estava segurando o pergaminho de transmissão enviado pela General Aya, aterrissando diretamente na mandíbula de Bairon.

— Minha filha quase morreu por causa de sua ganância!

Priscilla Glayder ficou de lado, observando toda a cena com dentes rangendo e punhos cerrados, incapaz de ajudar seu marido a sair da culpa.

Buhnd sentou-se à toa, o olhar usual de diversão substituído por uma carranca sombria.

Alduin caiu de joelhos. Bateu o punho no chão de mármore até que sua mão inteira estivesse coberta de sangue.

— Quantas vezes eu pedi para que nossas próprias tropas fossem colocadas de volta em Elenoir? Quantas vezes implorei, porque tinha medo que esse cenário exato ocorresse?! Como você vai assumir a responsabilidade se isso levar a toda a queda do reino élfico!

Nenhum som podia ser ouvido além do grunhido de raiva e desespero que meu filho soltou. Sua esposa gentilmente envolveu os braços em volta dele, confortando meu filho de uma maneira que não pude.

Não tinha o direito. Afinal, o peso de suas palavras não caiu apenas sobre os Glayders, mas também sobre mim. Fui eu quem finalmente concordou com Bairon em manter as tropas élficas em Sapin. Eu era o responsável pelo que estava acontecendo com Elenoir.

Estava super confiante com as defesas mágicas da floresta de Elshire.

Assim como os Glayders.

Estava errado. Um reconhecimento tão simples estava preso no fundo da minha garganta; eu não tinha forças para dizer isso em voz alta.

Como comandante, liderei todas as forças militares de Dicathen. Embora não quisesse essa posição, estava confiante nas decisões que tomei e as ordens que dei. Senti que reconhecer esse erro agora estaria sempre lançando dúvidas em minha mente, independentemente dos comandos que eu desse.

Eu olhei para o rolo de transmissão enviado por Etistin.

Agora não é hora de duvidar de minhas decisões.

Rapidamente virei o pergaminho e coloquei em outra pilha próxima, antes de falar.

— Chega! Agora não é hora de apontar dedos. Saiam e se acalmem, todos vocês! — Enfatizei.

Os membros do Conselho se entreolharam, ainda emotivos, mas mais hesitantes.

— Membros do conselho Alduin e Merial, Tessia deve estar chegando ao castelo em breve. Tirem um tempo e estejam lá para ela.

Voltando o olhar para os Glayders, dei um aceno a cada um deles.

— Façam uma pausa e saibam que o que aconteceu não é culpa de ninguém.

Esperei os guardas escoltarem os membros do Conselho. Alduin e Merial foram os primeiros a saírem e, pelo jeito afiado que os olhos do meu filho brilhavam com indignação e raiva, sabia que ele também me culpava. Talvez a única razão pela qual não expressou, foi porque sabia o quanto eu também me importava com Elenoir.

Bairon, antes de ser retirado da sala, olhou para trás.

— Eu sei que você jurou ser imparcial ao liderar Dicathen nesta guerra, mas eu não te culparei se o que você decidir fazer a seguir for pelo seu reino natal.

Não esperou que eu respondesse saindo com a esposa segurando sua mão.

Era uma resposta que eu nunca esperava do ex-rei humano e fez a minha decisão de escoltar o Conselho para fora desta sala parecer que eu estivesse evitando o confronto que acabaria tendo que enfrentar por minhas escolhas.

Buhnd foi o último a sair; me lançou um olhar que eu não pude interpretar, mas não tive tempo para refletir. Estava agora sozinho.

A sala que estava tão agitada apenas alguns momentos atrás, parecia tão perturbadora. As mensagens escritas nos rolos de transmissão pareciam criar uma pressão cumulativa quase sufocante.

Soltando um suspiro, peguei o rolo de transmissão de Etistin e o li novamente. O conteúdo deste pergaminho e muitos outros em breve, atordoaria o resto do Conselho, tanto quanto estava me paralisando agora.

Não podia deixar isto acontecer. Pelo menos um de nós precisava estar em sã consciência, e foi por isso que escondi isso deles, mesmo que fosse por apenas algumas horas. Precisava desse tempo para decidir como proceder.

Agora havia mais de trezentos navios cheios de soldados Alacryanos se aproximando de nossas costas ocidentais e, sem dúvida, haveria Foices e Retentores entre eles. Levando em conta a intensidade e o timing dos ataques, não pude deixar de temer que essa guerra fosse atingir seu ponto de virada.

Felizmente, Bairon e Varay já estavam por perto, mas apenas ter esses dois não seria suficiente, mesmo tendo todas as nossas cinco lanças, talvez não fosse suficiente. Levar a lança Mica para a costa oeste não seria muito difícil e Arthur deveria ter quase terminado seu papel na Muralha.

Isso só deixou a lança élfica.

Retiraria a general Aya de Elenoir e negaria a eles reforços? Eu essencialmente abandonaria Elenoir tirando a lança ou correria o risco de permitir que outro exército ainda maior pisasse em nossas terras?

 


 

Tradução: Reapers Scans

Revisão: Reapers Scans

QC: Bravo

 

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