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Mushoku Tensei: Reencarnação do Desempregado – Vol. 20 – Cap. 04.3 – Interlúdio – Cerimônia de maioridade.

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Vamos falar sobre minhas irmãs mais novas.

Norn estava dando duro em seu cargo de presidente do conselho estudantil. Ultimamente, para a maior parte dos estudantes, ela era a única pessoa que vinha à mente quando mencionavam esse título. De novo, talvez fosse porque a maioria dos estudantes que presenciaram a era de Ariel já haviam se graduado.

Norn era uma presidente popular. Muitos alunos até chamavam ela de “Nornie”. Ela não parecia gostar disso, mas ei, era fofo! Ariel tinha a reputação de ser uma presidente confiável, ao passo em que Norn tinha reputação de ser fácil de se relacionar, contudo (e isso pode ser fruto da influência de seu fã clube), ela tinha zero perspectivas de romance. além de também ser tratada como uma espécie de mascote da escola. Uma existência inocente, inofensiva, assexuada.

Claro, ela não deixou de dar duro nos seus estudos. Escutei que ela tinha sido reconhecida como no nível intermediário no Estilo Deus da Espada durante suas aulas de esgrima um dia desses. Seu progresso poderia ser um pouco lento, se comparado às pessoas que conheci, mas eu acho que é assim que pessoas normais são. Também era bastante estudiosa sobre magia, além de ter assistido muitas outras aulas. Eu não tinha uma ideia precisa sobre qual era seu currículo, mas na última que vez que pus o pé na universidade, acabei escutando alguém dizer: — Cara, eu vejo a Presidente Norn em todo lugar. — Ela nunca chegava a ser a melhor em alguma coisa, mas era aplicada em uma ampla gama de tópicos para compensar.

Recentemente, Aisha vem se apegando muito a Ars. Embora fosse verdade que as habilidades maternas grosseiras de Eris transpareciam no comportamento de Ars, Aisha achava garotos bebês adoráveis e ela o adorava. Parecia que ela tinha um favorito. Ela adquiriu o hábito de dizer: — Oh, Ars é tão fofo! — ultimamente, e eu não estava certo do que aquilo significava, exatamente.

Lógico, não tem problema mimar um bebê. Apenas tinham algumas partes que me preocupavam, tipo, talvez ela o paparicasse um pouco demais… nos últimos tempos, quando Ars começava a chorar de fome, ela expôs os próprios seios e tentou amamentá-lo. Sua justificativa era que tinha pensado que ele pararia de chorar se desse algo pra ele sugar, mas eu não sei… Ars se animou e começou a rir enquanto era sanduichado por seus seios; então pûde entender de onde vinha seu ponto; mas eu ainda estava bastante receoso. Quando pensei em como ela não tinha ninguém para mostrar os peitos além de um bebê, bem, você sabe.

Eu era pequeno no grande esquema das coisas.

Ela estava lidando muito bem com o bando mercenário. Quando declarei que o bando mercenário iria servir como a “Corporação Orsted Intel Network” e se propagar por todo mundo, ela sequer exigiu uma explicação. Ela logo começou a trabalhar no arranjo de pessoal, propriedade e negociações para construir filiais em outras nações. Também era muito boa em manter Linia e Pursena na coleira, agora, Aisha não era particularmente dotada como uma gerente. Ouvi que ela tendia a ser especialmente dura com o tipo de funcionário incompetente que repete os mesmos erros de novo e de novo. Eram Linia e Pursena quem extraíam o melhor desses empregados, é claro.

Ei, pontos fortes e fracos. Aisha era o cérebro da operação, e ela era muito boa nisso.

Ambas, Norn e Aisha, estavam se aproximando de seus décimos quinto aniversário. Não quero ficar me repetindo, mas, nesse mundo, tratavam aniversários de quinze anos como marcos que deveriam ser largamente celebrados, ainda mais os quinze anos, já que era o ponto em que alguém era considerado um adulto. Era frequente que nobres celebrassem com uma grande festa.

Para os humanos desse mundo, a Cerimônia de Maioridade talvez fosse o dia mais importante de suas vidas. Imagino que isso não precise de explicação, mas planejava celebrar o aniversário das duas. A hora era boa: receberia um pagamento gordo de Orsted, gastaria tudo na maior construção que o dinheiro poderia pagar, convidaria cada amigo e figurão que conhecia, faria-os arrumar os presentes mais incríveis que pudessem e dar um verdadeiro tratamento de princesa àquelas duas.

Com aquele nível de animação, contei tudo para Roxy.

— Eu não sei quanto a Aisha, mas eu acredito que Norn ficaria mais feliz com algo um pouco mais… prático. Talvez devesse repensar isso…

E tudo foi pelos ares.

Basicamente, elas não eram da realeza, então uma festa em casa seria melhor.

No fim, Roxy acariciou minha cabeça e disse: — Você quer fazer de tudo no aniversário delas porque nunca celebrou seu próprio aniversário de quinze anos, não é?

Negativo. Eu nunca me lixei pro meu décimo quinto aniversário…, mas ei, Roxy estava fazendo carinho em mim, então quem eu era para poder objetar? Eu sou um bom rapazinho, hehehe.

Moderação poderia ser boa do seu próprio jeito, afinal, Roxy me permitiu abrir os olhos à essa possibilidade.

— Por enquanto, deveríamos conversar com o resto da família para bolar um novo jeito de celebrar.

E assim, planejamos uma reunião de família secreta com todos exceto Norn e Aisha.

 

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Sediamos a reunião em nosso porão sob o véu da noite. A família inteira, excluindo Aisha e Norn, se juntaram ao redor da luz incandescente de uma vela solitária.

— Bem-vindos, meus cúmplices, a Assembleia das Trevas—

— Hm, Rudy, poderia iluminar um pouco mais? Está difícil escrever assim.

Nossa secretária, Roxy, interrompeu minha introdução dramática com reclamações. Desejei que ela tivesse respeitado o clima.

— Digo, se passar alguma luz pela porta, Aisha pode acabar notando a gente.

— Por que precisamos nos esconder, em primeiro lugar?

— Bem… sabe, o que mais podemos fazer?

Isso não é algo que se deva esconder? Tipo, uma garota não gostaria que um garoto descobrisse o que ela estava planejando pro Dia dos Namorados, certo?

— Vai ser muito mais difícil de preparar tudo se teremos que manter isso em segredo. A menos que tenhamos uma boa razão, eu gostaria de informá-las de antemão — declarou Lilia.

Bem, no fim das contas, ser transparente também faria as coisas mais fáceis. Fazia sentido. Era certo que seria menos estressante fazer isso abertamente, do que em segredo.

—Hmm…

Elas tinham um ponto. Nós não precisávamos manter isso em segredo. Agora que pensei sobre isso, meus próprios aniversários de cinco e dez anos foram festas surpresas, então eu tinha a noção pré moldada de que esse tipo de coisa deveria ser planejada em sigilo. Considerando o que aconteceu da última vez, Norn e Aisha já deveriam ter percebido que iríamos celebrar seus aniversários àquela altura. Não havia qualquer razão para não contar pra elas.

— Muito bem, vamos contar para elas apenas que estamos planejando alguma coisa.

Também iríamos com tudo. Dessa forma, haveria menos preocupações com quais presentes comprar. Aisha era amiga de todos no distrito comercial, sendo assim, caso eles pensassem que eu estava agindo de forma suspeita, poderiam acabar contando para ela: — Ei, Aisha, querida, seu irmãozão veio aqui e comprou algumas calcinhas adoráveis — e acabar com nossa cobertura.

Claro, eu não iria comprar calcinhas pra elas. Foi apenas um exemplo.

Certamente não estava pensando sobre quando comprei um par de calcinhas que queria ver Sylphie usando e acabei sendo achincalhado pela Aisha com um sorriso malicioso no rosto.

— Mas devemos manter os presentes em segredo, pelo menos — comentou Eris, seguido pelos acenos de todos os demais.

— Concordo, mas também acredito que deveríamos decidir o que vamos dar a elas para que não acabemos presenteando a mesma coisa — acrescentou Sylphie.

Esse era um excelente ponto. Dado o quão popular eram aquelas duas, era óbvio que receberiam vários presentes, de várias pessoas que comparecessem a sua festa. Norn tinha o conselho estudantil e um fã clube, enquanto Aisha tinha o bando mercenário e o povo do distrito comercial.

— Então, vamos discutir o que todos planejaram dar enquanto estamos aqui.

Com isso, o tópico de discussão mudou para o conteúdo dos nossos presentes. A maioria já tinha escolhido alguma coisa.

Lilia daria um lenço para Norn e um avental para Aisha. Sylphie daria um livro para Norn e uma caneta tinteira para Aisha. Roxy optou por uma armadura feita sob medida para Norn e uma pá de jardinagem (mágica) para Aisha. Eris presenteria Norn com um boldrié e Aisha com um cinto.

Parecia que todos tinham pensado bastante sobre seus presentes. Eu mesmo também pensei sobre. Meu plano era dar uma estatueta de Paul, a qual eu comecei a fazer apenas alguns dias antes. Norn amava Paul. Se houvesse alguém que ela desejava que pudesse estar lá para vê-la crescer, era Paul. Talvez eu receba uma bela de uma encarada desgostosa pelo presente… mas ei, só atravessamos pontes quando chegamos ao outro lado.

Já com Aisha, estava meio perdido. Não sabia o que ela queria. Sabia que ela gostava de coisas fofas. Seria difícil de imaginar baseado em sua personalidade competente e proativa, mas ela era obcecada com tudo que era femino; amava roupas cheias de babados, acessórios brilhantes e tudo que se encaixava nesse escopo. Algo assim iria funcionar como presente…, mas ela estava recebendo renda pela consultoria que prestava ao bando mercenário, então ela comprava o que queria e quando queria.

— Me diga, qual presente deixou vocês todas alegres quando atingiram a maioridade? — propus as mulheres. Pesquisa era muito importante.

— Foi há um bom tempo atrás, mas eu recebi um acessório de cabelo dos meus pais. Foi a tentativa deles de dizer para eu ao menos tentar parecer uma dama.

Essa foi Lília. Eu não sabia que tipo de pessoa ela era aos quinze, mas ouvi que ela não era exatamente do tipo que combinava com a moda. Ela cresceu em um salão de treino.

— Esqueci em qual dia eu nasci, então eu não tenho… oh, certo! O grupo de Ariel me deu várias coisas, como roupas, sapatos…

Então os presentes de Sylphie foram vestimentas. Tipicamente, ela se vestia de forma simples e masculina, então eles provavelmente deram tudo isso para ela ao menos poder usar em privado.

— Não tive muitos. A Tribo Migurd nunca teve esse tipo de costume.

Muito justo, Roxy. Só pra constar, eu dei um chapéu a ela como presente de casamento, então ela poderia usar isso como exemplo…

— Vejamos, tive Ruijerd me reconhecendo como guerreira… e Rudeus fez, um… aquilo comigo!

Eriz e eu realmente fizemos Aquilo. Foi um pouco embaraçoso dizer isso em voz alta, mas aquela foi a primeira vez em que nós fizemos aquilo. Você sabe, brincar de casinha.

Falando nisso, Aisha parecia ter uma quedinha por mim. Talvez ela gostaria de fazer aquilo. Não, repensando o assunto, eu jamais poderia fazer exatamente aquela coisa com Aisha, mas talvez este fosse um bom presente desde que não fosse longe demais, a ponto de culminar naquilo. Poderíamos ir a um restaurante à beira mar e brindar em nome de seus belíssimos olhos, deleitarmo-nos com qualquer peripécia que o chefe trouxesse à mesa e dar a ela uma noite de Cinderela que acontece apenas uma vez em toda a vida…

O mero pensamento me deixou um pouco embaraçado.

— Hmm, não consigo me decidir sobre o que dar pra Aisha.

— Acho que ela ficaria feliz com qualquer coisa que viesse de você — apontou Sylphie com uma risadinha.

Isso pode ser verdade, mas isso fazia a escolha ser ainda mais importante. Era por isso que eu queria dar algo que faria ela super feliz. Hmm… talvez devesse apostar em um presente luxuoso? Como um diamante de cem mil quilates. Orsted me diria onde achar um se eu perguntasse. Poderia me dizer que eu teria de arrancá-lo da barriga de um behemoth que eu não hesitaria.

— Por que não dar a ela um presente que faria você pular de alegria?

A sugestão de Roxy fez soar um click na minha cabeça. Ela estava completamente certa.

— Entendo… é isso que eu vou fazer.

Acenei profundamente com a cabeça agora que encontrei minha resposta.

Sabia qual seria o presente.

 

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Depois de algumas outras reuniões adicionais, as preparações estavam avançando. Dissemos a Norn e Aisha que faríamos uma festa de aniversário para elas e que deveriam deixar suas agendas livres para o dia.

As duas ficaram felizes por ouvir isso. Eu esperava que Norn dissesse: — Não preciso de nada! — Ou alguma coisa parecida. Invés disso, no entanto, ela baixou a cabeça e disse com sinceridade: — Muito obrigada. — Era raro ver Norn agindo de forma tão submissa… mas pensando mais a fundo, ela só me esnobava quando estávamos na escola. Ela tinha uma reputação a zelar ali, então talvez fosse natural.

Achei que Aisha seria mais direta ao ponto de começar a pular de tão animada que estava, contudo, ela não o fez. Pelo contrário; seus olhos se arregalaram de surpresa conforme murmurava: — Oh, verdade, sou uma adulta agora. — Processando as coisas meio devagar.

Dado o quão inteligente era, talvez algo estivesse se passando por sua mente. Talvez eu pudesse ficar ao lado dela durante a festa e lhe dar algumas lições especiais para adultos… nah, melhor não. Eu não era adulto o suficiente para me auto intitular como um com seriedade. Se eu começasse a contar para ela como o mundo era, qualquer coisa que eu dissesse poderia voltar para puxar meu pé.

De qualquer forma, nós as informamos sobre a situação, agora tudo que faltava era esperar pelo dia especial.

 

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O grande dia finalmente chegou. Norn foi para a escola, como de costume.

— Tentarei voltar o mais cedo que puder — ela disse. Bom, ela devia estar animada.

Aisha saiu cedo naquela manhã, rumo ao escritório do bando mercenário… mas já estava em casa ao meio dia. Ela aparentava ter terminado seu trabalho cedo. Pensei que ela chegaria carregando presentes dos membros do bando, mas acabou voltando de mãos vazias.

— Você não ganhou nada?

— Hmm, eu disse pra eles que era meu aniversário. Talvez seja porque eles são membros do povo-fera e realmente não conheçam o costume.

Dito isso, ela teve muitas pessoas lhe dando parabéns, então estava bem para cima, mas as pessoas do distrito comercial também não deram nada pra Aisha?! Bem, eu acho que ser um cliente não faz de você um membro da família… mas ei, nem todo presente tinha que ser grande coisa. O que importa é que você queira parabenizar alguém. É o pensamento que conta!

— Ei, Irmãozão, posso ver você trabalhar?

— Sim, é claro.

Aisha se sentou à mesa de jantar e assistiu absorta enquanto preparávamos a festa. Ela observou Lilia e Sylphie indo e voltando da cozinha e sala de jantar. Assistiu Eris e Roxy retornarem de sua ida ao mercado com uma montanha de compras. Me viu ajudar um pouco em tudo que poderia para preparar a decoração. Ela contemplou tudo sem dizer qualquer coisa.

Ser observado deixou o trabalho um pouco mais difícil, mas ela era a aniversariante, e eu disse que estava tudo bem, então era meio complicado dizer pra ela para voltar de tarde. Isso, e tudo que ela fez, foi apenas assistir. Aisha realmente não disse nada ou interviu; apenas ficou no mundo da lua enquanto trabalhávamos.

Mesmo quando Zenith se sentou ao seu lado e começou a fazer carinho nela, Aisha não disse nada e continuou assistindo.

Não obstante, quando Leo repousou a cabeça no colo de Aisha, ela não prestou muita atenção e continuou assistindo.

Em algum ponto, Ars começou a chorar. Ela se levantou por pouco tempo e logo retornou para assistir.

Até quando Lucie veio até ali e perguntou para sua Irmãzona Aisha se poderiam brincar juntas, ela apenas sorriu, disse que estava um pouco ocupada no momento e continuou assistindo.

Ela assistiu, e nada além disso. Não consegui dizer o que ela estava pensando. Talvez estivesse contemplando tudo que vem junto da idade, ou quem sabe estava se divertindo com o quão desastrados éramos em nossas tarefas. Fosse como fosse, eu não sabia dizer.

Eventualmente, o crepúsculo chegou. Finalizamos todas as nossas preparações sob o olhar vigilante de Aisha. A sala de jantar estava completamente enfeitada, e em um dos cantos da sala, estava uma montanha de presentes embrulhados que planejávamos dar às garotas. Sobre a mesa, estendia-se um lindamente organizado acervo de comida; planejamos começar a preparar o prato principal quando Norn voltasse.

Tudo que restava era aguardar Norn. Ela estava atrasada? Se ela fosse ficar fora por mais algum tempo, teria sido melhor ir buscá-la. Era nisso que estava pensando quando Norn chegou, cedo, assim como havia dito que faria.

— Olá, estou em casa.

Os braços de Norn rodeavam uma gigantesca e ultrajante pilha de presentes.  Ela carregava um buquê na mão esquerda. Na direita, estava uma caixa de madeira recheada com todo tipo de coisa; desde roupas e acessórios de cabelo a artefatos com formas misteriosas, cujas utilidades eu não poderia começar a imaginar.

— Desculpe, estou atrasada. O pessoal começou a me dar tudo isso quando eu tentei sair… planejei deixar tudo no meu dormitório, mas não consegui colocar tudo dentro do armário. Pensei em trazer esses para casa, mas minha bolsa rasgou no caminho até aqui…

Parecia que uma bela multidão tinha enchido ela com uma quantia igualmente grande de presentes; esse era o tanto de pessoas na escola que queriam desejar um feliz aniversário à Norn. Acho que eles não diziam que ela era a presidente do conselho “fácil de se relacionar” por nada. Apenas desejava que não houvesse nada assustador em meios àqueles presentes, como um biscoito com um emaranhado de cabelos dentro… vamos parar de pensar nisso.

Nós recepcionamos Norn e finalmente começamos a festa.

 

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Era o mesmo tipo de festa de aniversário que dei pra elas alguns anos atrás. Comecei com um discurso de abertura. Ter quinze anos não faria com que as coisas mudassem da noite pro dia, mas agora elas eram adultas aos olhos da sociedade – e assim meus conselhos iam saindo. Era o tipo de discurso que eu me sentia desqualificado para dar, mas falaria do mesmo jeito. Não sei como, mas eu entrei no modo sabichão, embora em uma parte do discurso minha língua tenha escorregado.

Com essa introdução fora do caminho, todos os outros adultos entre nós falaram sobre “se portar como adultos”. Sylphie disse que elas não precisariam mais pedir permissão para a família, mas precisavam ser responsáveis. Roxy às advertiu a nunca deixar de aprender e Eris explicou como sempre deveriam ter um objetivo. Lilia parecia mais emocional que o usual. Ela falou, à beira das lágrimas, sobre os tempos em que Paul e Zenith tinham acabo de começar uma família, e sobre o dia em que as duas garotas nasceram. Zenith acariciou sua cabeça.

Havia um sorriso estampado no rosto de Norn quando ela abriu os presentes que demos a ela. Parecia ter gostado especialmente da armadura que Roxy encomendou de um ferreiro conhecido. Apenas para aquele dia, Roxy pediu uma armadura sob encomenda, que se assemelhava com o velho conjunto de Paul – que agora estava guardado no quarto de Zenith. Ela era moldada para caber no corpo de Norn e reestilizada para ter um ar mais feminino. Quando ela embainhou a espada de confiança de Paul no boldrié que Eris lhe deu, parecia uma espadachim completa. Essas duas devem ter se lembrado de que Norn uma vez disse querer ser uma aventureira.

Em um primeiro momento, ela demonstrou imediata confusão ao ver o modelo de Paul que fiz. Eu estava orgulhoso do meu trabalho, mas isso era uma estatueta de trinta centímetros de altura feita de pedra, então compreendi sua reação. Eu não percebi enquanto a construía, mas isso era o que a sociedade moderna iria categorizar como um presente inútil, embora esse mundo não tenha esses paradigmas.

Depois de encará-la por algum tempo, lágrimas começaram a escorrer dos olhos de Norn. Talvez fosse pelas memórias de Paul que a fiz reviver. — Vou cuidar bem disso — disse, finalmente aceitando.

Quando todos terminamos de dar nossos presentes, Norn falou conosco.

— Um, muito obrigada a todos. Farei o meu melhor para ser uma adulta e seguir em frente. Espero que possam me apoiar nesse caminho como tem feito até agora. Vocês são os melhores.

Seu coração estava explodindo de emoção, mas ela conseguiu expor isso de forma magnífica. Suas palavras fizeram Lilia cair aos prantos mais uma vez. Norn, você realmente cresceu…

Era muito bom ver Norn tão feliz, mas e enquanto a Aisha? Ela parecia feliz, mas algo parecia errado quando olhei para ela. Claro que não tinha feito cara feia ou demonstrado claro desconforto. A cada presente que recebia, ela agradecia dizendo: — Wow, incrível! Isso é tão fofo! Obrigada! — ou então demonstrava seu deleite ao anunciar: — É tudo que eu sempre quis!

Superficialmente, Aisha parecia estar apreciando a festa em sua persona normal e alegre, então o que estava errado? Suponho que a melhor forma de descrever a situação é dizer que algo parecia estar faltando. Aos meus olhos, Aisha parecia um pouco deslocada. Estava forçando seus sorrisos e risadas. Parecia estar atuando. Talvez fosse a forma como tinha agido àquela tarde que me fez sentir assim.

Com minhas suspeitas ainda ecoando dentro de mim, entreguei a ela meu presente: um pingente. O pingente dos Migurd… estava em posse de Ruijerd, então este era uma réplica. Também era caseiro, então não era nem caro nem um artigo original.

— Aisha, isso é algo que me foi dado para comemorar minha própria passagem para a vida adulta. Talvez não signifique nada para você, mas eu queria dar a você como um símbolo do seu amadurecimento.

Tinha ciência de que esse presente significava mais para mim do que para qualquer um que o recebesse, mas, por alguma razão, quis dar isso a Aisha invés de Norn. Não sabia o porquê, mas quando elas me perguntaram qual presente me faria mais feliz, essa foi a primeira coisa que me veio à mente.

— Oh… obrigada.

Não havia vida em seus olhos.

Sua expressão era vazia. Imersa em pensamentos, ela balançou o pingente em sua mão repetidas vezes.

 

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Nós aproveitamos o restante da festa servindo o prato principal e um bolo. Ainda restavam algumas surpresas. Uma vez que o sol se pôs de vez, estudantes começaram a aparecer para dar presentes a Norn. Ao que parecia, tinham descoberto somente hoje que era aniversário de Norn e se apressaram para comprar alguma coisa enquanto podiam.

Houve um monte de alunos assim. Quando notaram que era eu à porta, uma boa parte deles empalideceu, mas não tem problema! Recebi todos eles com um relance do meu bom e belo “Sorriso Resplandecente do Rudeus”. Ah, o sorriso; a recepção mais universal, de fato.

… isso não deu certo.

A visão do meu sorriso fez com que suas feições pálidas congelassem em um terror ainda maior, com alguns até tentando correr. Sylphie os pegou e repassou seus presentes para Norn, enquanto contia a cena que estavámos fazendo ali… sinceramente, que rude!

Vieram tantos deles que, eventualmente, a pilha de presentes de Norn parecia mais uma montanha. Aisha, por outro lado, não recebeu nada além do que demos pra ela. Ela estava mantendo sua fachada, mas parecia bastante aflita agora. Aos meus olhos, estava profundamente magoada.

Eu duvidava que alguém mais além de mim notou que o sorriso de Aisha era falso. Talvez estivesse apenas pensando demais. Talvez Aisha não se importava com a quantidade de presentes, ainda assim, trazer isso à tona para Sylphie soava como uma boa ideia. Enquanto eu titubeava sobre o que deveria fazer sobre Aisha, notei que a área à nossa frente ficou lotada com muitas pessoas reunidas. A conversa turbulenta foi interrompida pelo latido repentino de Leo.

— Temos companhia — anunciou Eris. Sua expressão endureceu e ela apanhou a espada que pendia no canto.

Orsted estava vindo? Não, tinham pessoas demais por aqui. Orsted não era do tipo que trazia uma multidão.

Fui à porta da frente para ter certeza. Quando pus o pé para fora, vi uma massa de arruaceiros fechando um cerco sobre minha casa. Suas silhuetas eram intimidantes, tinham pelo grosso e suas presas estavam à mostra. Todos eles estavam trajados com mantos totalmente pretos. Eram um bando intimidante. Dito isso, pareciam estar bem acabados; alguns estavam machucados enquanto outros usavam vestes quase destruídas.

Quem liderava o grupo não era ninguém mais ninguém menos que a dupla mais diabólica da cidade. As duas sacudiam os cabelos enquanto discutiam entre si.

— A culpa foi sua, Linia. Complicar o fim daquele trabalho ontem fez a gente se atrasar.

— M-Miau?! Mas foi você que jogou aquilo pra mim, Pursena!

— Lá vai tu de novo, culpando todo mundo menos você mesma. Pode confiar, Linia, é tudo sua culpa!

— Vindo de você, que deveria rastrear nossa presa, mas acabou nos arrastando para um churrasco qualquer por acidente?! Tá de sacanagem com miaugo? Seu vacilo foi a razão para termos demorado tanto tempo caçando aquele javali, miau!

— Geh! É-É culpa deles por estarem acampando ali!

Eram Linia e Pursena. Como de costume, cada uma estava se lançando na garganta da outra, mas dessa vez, pareciam estar só curtindo. As pessoas em volta delas pareciam estar acostumadas com isso, já que mantiveram as mãos atrás das costas, em formação.

— Ah, Chefe!

—Ugh? Todos, saúdem imiaudiatamente!

Ao comando um tanto atrasado de Linia, seus seguidores baixaram a cabeça em uníssono. Naquele momento, eu vi o que estava atrás deles. Havia um monte em cima de uma prancha de madeira.

— Chefe! Estamos aqui para celebrar a cerimônia de maioridade da supervisora!

— Estávamos fora caçando essa coisa na floresta desde ontem.

“Essa coisa” se referia a um monstro gigantesco. Um que lembra um javali e vivia nas florestas ao redor dessa área. E o que elas queriam dizer com desde ontem?

— Calma… nenhum de vocês estava no escritório hoje?

— Claro que tinha, miau. Deixamos o miaunimo necessário para manter as luzes acesas.

— É. Agendamos as coisas para que a maioria de nós não tivesse que trabalhar hoje.

Isso significava que Aisha devia ter voltado cedo porque o escritório estava quase vazio. Ela foi toda animada para aproveitar seu aniversário, mas não tinha ninguém com quem celebrar. Nem trabalho, pelo visto. Ela pensou que as pessoas viriam se esperasse, mas mesmo ao meio dia, ninguém apareceu. É, eu não poderia culpar Aisha por refletir sobre sua existência quando algo assim aconteceu.

— Miau! Ei, Supervisora!

— Galera, a supervisora está aqui!

Me virei para ver Aisha em pé logo atrás de mim. Ela parecia completamente estupefata com a visão do javali gigantesco posicionado na frente da nossa casa.

— O que… é isso?

— Supervisora! Feliz aniversário!

Com as palavras de Pursena servindo de sinal, todo o bando mercenário baixou as cabeças uma vez mais. “Parabéns, parabéns”, eles gritavam; ecoando alto o suficiente para que toda a vizinhança reclamasse do barulho. Era como assistir uma cerimônia da yakuza, exceto que a pessoa a qual estavam se curvando era uma garotinha.

—Ah… ahá!

Aisha riu.

Como se aquela visão tivesse expurgado seu humor sombrio, ela riu.

— Não pensem que eu vou comer tudo isso! … Aha, ahahahahahaha!

 

 

 

Dizer isso em voz alta fez ela perder as estribeiras ainda mais. Aisha estava rindo da cara deles, mas pareciam estar confortáveis já que viram o quão feliz ela estava. Todos eles, incluindo Aisha, pareciam estar aliviados e cheios de alegria. Depois de passar o dia todo tendo a popularidade de Norn sendo esfregada na sua cara, Aisha percebeu que ela era igualmente popular no seu próprio pedaço do mundo.

— Ei, Irmãozão, já que eles estão aqui e tudo mais, está tudo bem se todos comermos juntos aqui no gramado?

Vislumbrei os mercenários e vi que alguns rabos estavam abanando com a sugestão. Eu não era um especialista na etiqueta do povo fera, mas quando qualquer caçador traz sua presa até sua casa, eles não vão apenas deixá-la lá e seguir seu caminho. Todos deveriam se juntar à festa. Eu tive duas vezes mais certeza ao ver os estômagos daqueles caçadores roncar e a saliva escorrer pelos cantos de suas bocas.

— Sim, é claro.

O sorriso de Aisha se alargou de orelha a orelha.

 

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Todos se juntaram à refeição no gramado. Mesmo os estudantes que vieram por Norn aderiram. O javali que o povo fera trouxe estava completamente assado, e as bebidas — trazidas por um velhinho que Aisha ajudou quando estava no distrito comercial — escorreram livremente.

Norn suspirou; essa confraternização agitada estava longe da quieta e introspectiva cerimônia que precedeu aquele momento. Notei que Norn, cuidadosamente, manteve seu descontento para si mesma e evitou dizer qualquer coisa que fosse estragar o clima. Provavelmente, fez isso por consideração a Aisha, que estava vivendo o momento de sua vida.

A celebração continuou por um tempo, mas uma vez que o bando mercenário encheu a pança, as pessoas decidiram encerrar a noite. Conforme o amontoado de gente se esvaia, ouvi Aisha murmurar para si mesma:

— O que é um adulto, afinal?

Em contraste com Norn; que alegremente aceitou o peso se sua própria responsabilidade como adulta, a pequena pergunta de Aisha soou um pouco infantil, mas ei, assim é a vida. Adultos possuem diferentes variantes; Norn possuía a dela, e Aisha possuía a sua. Existiam muitas formas de ser um adulto ou uma criança, assim como havia muitos tipos de pessoas. Se você é quem deveria ser, e conseguiu se manter honesto consigo mesmo, então está fazendo tudo certinho.

—  O que é um adulto, afinal, huh? — respondi. Não senti que precisava dizer algo animador para ela.

Foi dessa forma que Aisha e Norn completaram quinze anos de idade.

 


 

Tradução: Black Lotus

Revisão: Akira C-137

 

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Vol. 20 – Cap. 04.3