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Mushoku Tensei: Reencarnação do Desempregado – Vol. 18 – Cap. 05 – Sinais de Uma Família Caindo aos Pedaços

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Dez dias se passaram.

Passei esse tempo morando fora do escritório da empresa e treinando do nascer ao pôr do sol. Quando Orsted estava por lá, eu focava em aumentar minha resistência pela manhã, simulava batalhas pela tarde, e tinha aulas dentro do prédio à noite. Me certificava de limpar meu quarto antes de deitar e organizar meus documentos. O ciclo continuava repetidamente dessa maneira.

Nos dias em que Orsted não estava por perto, eu passava o dia todo treinando. Equipava minha Armadura Mágica e treinava com as diferentes formas que Orsted havia me ensinado até que estivesse cansado demais para continuar. Depois estudava diferentes padrões de ataque coordenado. Sylphie ocasionalmente me trazia comida, e enquanto ela estava por perto, me juntava a ela para ver como me saía com meus ataques coordenados na realidade. Ela não estava aqui hoje, no entanto.

As formas que Orsted me ensinou eram as que o Deus Dragão Urupen desenvolveu e deixou para trás quatrocentos anos atrás. Ele era conhecido informalmente como um dos Três Matadores de Deuses, o que também o tornava um dos camaradas de Perugius.

Entre todos os Deuses Dragão da história, Urupen tinha a menor reserva de mana, pelo menos de acordo com Orsted. Ele era o mais fraco de todos os candidatos ao título de Deus Dragão na época, ninguém pensou que ele seria capaz de conquistá-lo. Mas foi Urupen quem desenvolveu um Estilo Deus Dragão totalmente novo e único. Com isso, ele conseguiu não apenas reivindicar o título para si mesmo, mas também passou a desempenhar um papel fundamental na derrota de Laplace. Urupen era ainda reverenciado nos tempos atuais como o gênio mais proeminente da história.

O Estilo do Deus Dragão de Urupen envolvia usar o mínimo de mana e poder possível para encurralar um oponente. Orsted conseguiu localizar o livro de segredos que ele deixou para trás e o usou com sucesso para aprender sozinho o estilo de luta de Urupen e a técnica quintessencial: Aura do Dragão Sagrado.

A parte sobre não usar mana não era tão útil para mim, mas a ideia de acuar um oponente com esforço mínimo era algo que me interessava. Além disso, seu estilo de tecer artes marciais com magia em combate corpo a corpo combinava bem comigo e com minha Armadura Mágica.

O plano de hoje incluía estimular mentalmente ataques coordenados novamente. Primeiro foi meu Canhão de Pedra. Com um ataque direto, era capaz de até mesmo ferir Orsted. Sua potência era impressionante: no mesmo nível da Espada da Luz. Isso o tornava a peça-chave natural dos meus ataques coordenados.

Em seguida foi o Atoleiro. Eu o havia usado tantas vezes que era o único feitiço em meu repertório que conseguia conjurar mais rapidamente. Era melhor direcioná-lo nos pés do oponente quando ele estivesse vindo na minha direção em velocidade máxima, onde servia como um bom ponto de partida para a ofensiva.

Eletricidade levava um pouco mais de tempo para conjurar do que o Atoleiro, mas era altamente eficaz, uma vez que conseguia perfurar a aura de batalha de uma pessoa e paralisá-la. Havia muitas ocasiões nas quais Eletricidade funcionava contra oponentes não afetados por Atoleiro. Era melhor utilizá-los em conjunto: usar Eletricidade primeiro e depois o Atoleiro. Uma vez que meu inimigo estivesse enraizado no lugar, eu poderia usar Névoa Profunda ou Nova Congelante para desequilibrá-lo.

Canhão de Pedra era, no geral, mais que suficiente para um ataque simples. O resto dos meus feitiços tinham o intuito de parar meus oponentes no local em que estivessem ou tentar limitar seus movimentos. Não importava o que fosse necessário, precisava forçá-los a desfalcar sua defesa para que não conseguissem desviar dos meus ataques ou repeli-los. Então eu os finalizaria com o Canhão de Pedra. Se eu conseguisse fazer com que as coisas acontecessem nesta ordem, a vitória era praticamente garantida contra qualquer oponente… pelo menos foi o que Orsted me assegurou.

O mais importante era tornar essa sequência de ataques uma segunda natureza[1]. Se eu conseguisse isso, não importaria se meu oponente fizesse movimentos que nunca vi antes. Eu ainda conseguiria responder sem demora.

Para recapitular, esse era o esquema principal:

Atoleiro → Inimigo faz um movimento → Uso magia para responder → Ele faz mais um movimento → Respondo com minha magia novamente, prendo-o e o acerto com um Canhão de Pedra.

Sim. Falar é fácil. O problema principal é que alguns espadachins podem simplesmente cortar tanto mana quanto magia, e não havia garantia de que eu os atingiria todas as vezes. Era bastante provável que qualquer magia suplementar que eu lançasse seria ineficaz. Isso tornava tudo mais difícil.

Por acaso, Orsted me ensinou alguns feitiços acima de nível Rei para várias escolas elementares distintas. Entretanto, eu não tinha conseguido muita coisa com aquele conhecimento. A maioria dos feitiços ofensivos acima de nível Rei aparentemente consistia em organizar uma combinação de feitiços de nível Santo ou abaixo.

Usemos o feitiço de água Zero Absoluto de nível Imperador como exemplo. Tudo o que é necessário fazer é aumentar a velocidade e potência de Congelar, que em si era uma combinação de Cascata de Água e Campo Sincelo. Zero Absoluto te permite, em vez de encharcar o oponente com Pancada de Água, congelar uma grande área em um instante.

Eu já conseguia usar Zero Absoluto. Não era tão difícil. Eu já tinha conseguido realizar feitiços até o nível Imperador. Por esse motivo Badigadi disse que eu poderia me considerar um Mago Imperial da Terra quando ele viu meu Canhão de Pedra. Normalmente, não há forma de aumentar a potência do Canhão de Pedra, mas, em teoria, poderia ser fortalecida utilizando o mesmo processo de combinar feitiços como acontece com Zero Absoluto.

Considerando que eu já tinha aprendido feitiços mágicos até o nível Santo em cada uma das quatro escolas ofensivas, pode-se dizer que já conhecia a fundo tudo que havia a se conhecer. Quanto aos feitiços de nível Deus, eu provavelmente não seria capaz de usá-los de toda forma. Ao que parece, é necessário uma enorme quantidade de mana e um controle extremamente preciso dela, além de usar um encantamento insanamente longo e um círculo mágico para ajudar a controlar o feitiço. Segundo Orsted, a potência desses feitiços era tanta que eles podiam modificar a paisagem. Algumas das estranhas características geográficas deste mundo foram, na verdade, resultado de tal magia.

Francamente, eu ainda era bastante medíocre quando se tratava de desenhar círculos mágicos, e não via motivo em usar magia em uma escala tão grande. Fundamentos sólidos, experiência prática e magia combinada: essas eram as três coisas que eu precisava. Melhor começar do zero, como em tudo.

— Rudeus.

Orsted retornou enquanto eu estava imerso em meu treinamento de magia. Imediatamente me virei para prestar reverência a ele.

— Bem-vindo de volta, senhor!

— De fato.

Era dever do empregado se curvar adequadamente para cumprimentar o CEO quando este aparecia no escritório. Ter apenas um funcionário devia ser um pouco desolador para ele, mas tínhamos que aguentar firme até que Cliff concluísse sua pesquisa. Quando, um dia, contratarmos mais funcionários, gostaria de fazer com que todos se curvassem em uníssono ao CEO. Qual o problema se chamassem nossa empresa de sombria como resultado?

— Temos trabalho — disse Orsted.

Quando comecei a me curvar para ele e a agir de maneira educada, ele me mandou “agir normalmente”, mas já havia se acostumado com minhas palhaçadas a essa altura.

— Você vai sair em três dias. Explicarei os detalhes para você agora — anunciou Orsted.

— Seria um prazer efetuar uma missão para você, senhor!

Recebi minhas comissões de trabalho diretamente do próprio Orsted. Parecia que ele já tinha determinado minha próxima tarefa.

— Como de costume, não é um trabalho particularmente desafiador, mas você deve se despedir da sua família antes de ir.

— Sim, senhor!

E então, eu retornei para casa por um tempinho.

— Bem-vindo de volta, miau! Chefe! Uh, não… Chefe não… Mestre!

No momento em que retornei para casa, encontrei nossa criada-gata sentada ao lado da entrada principal, com as pernas cuidadosamente dobradas embaixo dela. O que foi que essa assanhada aprontou agora? Ela bagunçou alguma coisa?

— Sim, é bom estar de volta, Linia. Mas o que é que você está fazendo aqui?

— Mewhaha… Bem, eu fiz uma pequena besteirinha, então estou aqui refletindo sobre minhau mancada — Suas orelhas caíram, tão deprimidas quanto ela soava estar agora.

— Então tá certo. — Se ela estava ocupada pensando no que havia feito, era melhor deixá-la assim. Passei por ela e entrei em casa. — Estou em casa! — declarei.

Lucie espiou da sombra da porta que levava à sala de estar. Ah, ela vai sair correndo de novo, não vai?

Para minha surpresa, ela saiu das sombras e voou em minha direção, seus pequenos passos ecoando conforme ela agarrava minha perna.

— Papai! Bem-vindo de volta!

O que está acontecendo? Por que ela aparenta estar tão feliz em ter-me de volta hoje?

— Sim, Lucie, estou em casa! — Abaixei-me para pegá-la em meus braços, mas ela veio para trás de mim, agarrando forte meu robe. Por qualquer razão que seja, ela estava sendo extremamente afetuosa hoje. Papai não poderia estar mais feliz!

— Mamãe! Papai voltou! — ela gritou.

— Sim, eu escutei! — Sylphie respondeu, sua voz ecoava do banheiro. — Espere um segundo.

— Mamããããe!

Sylphie devia estar lavando as roupas ou limpando a banheira. De toda forma, Lucie chamou por sua mãe de novo e de novo. Por fim, ela se cansou de esperar e largou minha roupa, correndo em direção ao banheiro.

O que foi tudo isso? Bem, quaisquer que fossem suas motivações, não adiantava pensar demais. Crianças são crianças. Sempre fui eu quem a perseguia por atenção, então talvez ela tenha decidido ser gentil e demonstrar algum sentimento por mim, nem que seja uma vez.

Vaguei sem rumo pela casa. Lara e Leo estavam juntos na sala de estar, ela dormia profundamente. Parecia estar saudável hoje. Dali, me direcionei à cozinha, onde encontrei Lilia preparando nossa próxima refeição. Seu rosto estava bastante pesado de exaustão. O que poderia estar cansando-a tanto?

— Senhorita Lilia, estou de volta — eu disse.

— Bem-vindo de volta, meu senhor.

— Você está se sentindo cansada?

— Não.

Seu rosto parecia um pouco mais pálido que o normal, mesmo que ela negasse.

— Acho que talvez você devesse descansar.

Lilia balançou a cabeça:

— Não é nada de mais.

— Tem certeza?

— Sim.

Se ela insistia, então não ia pressioná-la, mas ainda me preocupava que talvez eu a estivesse cobrando demais.

— Se você estiver se sentindo fisicamente mal, por favor, não hesite em tirar uma folga, — falei.

— Agradeço a sua preocupação, mas eu estou bem, de verdade.

Eu acreditava nela, mas se não era exaustão física, talvez fosse algo psicológico. Em outras palavras, ansiedade.

— Algo aconteceu? — perguntei, mudando minha tática.

Após uma breve pausa, ela respondeu:

— Há algum tempo, a senhora Eris foi para a universidade.

— Eris? Por quê?

— Ela disse que vai ensinar esgrima a Senhorita Norn hoje.

 Esgrima, hein? Ah, minha esposa mesmo grávida não para quieta, não é mesmo? Talvez Eris aspirasse a ser instrutora. Eu não me oporia a isso, claro, mas eu gostaria que sossegasse um pouco enquanto estivesse grávida. Ela estava me deixando preocupado.

— Me desculpe — disse Lilia. — Todos tentamos impedi-la, mas antes que pudéssemos fazer qualquer coisa, ela já tinha ido.

— Ah, tudo bem. Obrigado por tentarem.

Eris não era do tipo que fazia o que a mandavam, de qualquer forma. Não me impressionava que Lilia estivesse exausta. Talvez eu mesmo devesse ter uma conversa franca com minha esposa… Mas era discutível se ela daria ouvidos ou não a qualquer coisa que eu dissesse. Hm. Era igualmente improvável que Sylphie a convencesse, mas Aisha era melhor que qualquer um para apresentar um argumento persuasivo, então talvez ela pudesse convencer Eris.

— Isso me lembra… Onde está Aisha? — perguntei.

Lilia forçou um sorriso.

— Ela está no jardim dos fundos.

Como Lilia disse, Aisha de fato estava no jardim dos fundos. Ela estava sentada em um canteiro, de costas, era possível observar que seus ombros tremiam. Por mais forte que fosse, ela parecia estranhamente vulnerável agora. Estava chorando?

— Aisha?

— I-irmãozão… bem-vindo de volta — Aisha olhou para mim por cima do ombro, seu tom de voz estava perfeitamente normal. Analisei seu rosto em minúcia, mas não pude encontrar nenhum sinal de que estivesse chorando. — Haah… — mas ela suspirou de imediato.

Notei que ela tinha uma pá na mão e que estava cavando um buraco no canto do jardim. Quando olhei para dentro do buraco, vi alguns cacos de porcelana. Reconhecia os padrões neles. Havia uma alça de xícara lá, a qual também me lembrava de algum lugar. Eu vi essas peças em um chique conjunto de chá que Aisha comprou há muito tempo com seu próprio salário. Até onde eu sabia, ela tinha grande apreço por aquela xícara. Ela sempre usava quando bebia chá.

Aisha permitiu que eu usasse a xícara uma única vez. Ela possuía um sorriso de felicidade em seu rosto ao declarar:

— Você é a única outra pessoa que deixarei usar esta xícara. — E completou: — Viu? Beber de uma boa xícara não torna o chá muito melhor?

Sinceramente, eu não senti nenhuma diferença. A única coisa que ficou marcada em minha mente era o quão feliz ela estava e que o chá estava delicioso.

E agora, sua xícara amada estava destruída.

— Ei, Irmãozão… — Sua voz era baixa e ameaçadora, como eu nunca tinha ouvido antes.

— …O q-que foi?

Ela estava furiosa, enraivecida, mas calada. Ah, merda. Eu fiz algo de errado? Eu não tinha problemas em pedir perdão se fosse o caso, mas pedir desculpas quando eu sequer sabia o que tinha feito de errado seria como colocar mais lenha na fogueira de sua ira.

O que devo fazer? O que pode ter causado isso?

Enquanto eu tentava raciocinar, Aisha se virou para mim e disse:

— Podemos nos livrar daquela gata?

— Oi?

Aquela gata? Que gata? Ah, espere. Ela devia estar se referindo ao felino sentado na entrada da frente com as pernas cuidadosamente dobradas sob dela.

Aisha balançou a cabeça.

— Ah, acho que seria errado nos livrarmos dela. Podíamos vendê-la àqueles traficantes de escravos… ou melhor, para a família da Senhorita Eris. A julgar pela forma como falaram, sua família pagaria um preço alto por ela, certo? Talvez não recebêssemos mil e quinhentas moedas de ouro asuranas, mas nos pagariam pelo menos a metade, não?

— E-espere um momento. Se acalme. Vamos nos sentar, pode ser? — Conjurei uma cadeira com minha magia da terra e a desloquei em sua direção para ela se sentar.

Aisha retirou um caco do buraco e o atirou aos meus pés, antes de se jogar na cadeira.

— Viu? Não é particularmente caro, mas não é algo que você possa adquirir mais. A pessoa que o fez está morta e a loja faliu.

— Bem, coisas assim quebram um dia, sabe? — Eu disse, conjurando uma cadeira para mim e me sentando em frente a ela. Eu queria tentar acalmá-la um pouco primeiro.

— Eu sei disso. Dificilmente ficaria tão brava assim por conta de uma única xícara.

— Está bem.

A princípio, parecia que Linia tinha quebrado a xícara, o que havia enfurecido Aisha. Ela dizia que não estava brava, mas era claro que estava furiosa.

— É só que… não acho que aquela gata seja apta a ser uma criada na nossa casa. Quando tenta lavar a louça, quebra. Quando tenta limpar a casa, trinca espelhos. Quando tenta lavar as roupas, enche os lençóis de pelos.

— Todo mundo erra quando está começando — relembrei-a. — Linia pode parecer um pouco atrapalhada, mas ela vem de uma família nobre importante, e foi um pouco mimada.

— Bem, eu…! — Aisha levantou a voz e começou a dizer algo, mas engoliu suas palavras. Talvez ela fosse argumentar que nunca fez tais erros quando estava começando. — Quando ela estava limpando a sala de estar, quase derrubou água na pobre Lara, sabia?

— Ela fez o quê? C-como isso aconteceu?

— Ela estava limpando um lugar alto carregando um balde de água em uma mão e um pano em outra. Então, ela de alguma forma perdeu o equilíbrio e começou a cair. — Aisha fez uma pequena pausa e disse. — Bom, acho que acabou por não ser nada de tão grave.

Aquela gata podre não sabe nem como limpar? Pensando agora, lembro de ter ido uma vez ao seu quarto. Lembrava bastante um chiqueiro.

— Não que tenha sido bom ela ter feito isso — Aisha retificou. — Mas eu não protestaria contra o emprego dela por algo tão trivial. Senhorita Norn é ainda pior que isso e ainda por cima demora a aprender.

— Pode parar. Não tem porque criticar Norn assim.

— Criticar? — Aisha franziu suas sobrancelhas. — Bom, não é como se eu estivesse tentando falar mal dela pelas costas ou coisa do tipo. O que quero dizer é que aquele gato não é tão ruim em aprender coisas novas. Uma vez que ela comete um erro, não tende a repeti-lo. Mas ainda assim… — Suspirou —, aquela bola de pelos não pede desculpas.

— Oh? — Ela não pede desculpas? Bem, isso certamente não é nada bom.

— Quando ela erra algo, não age nem um pouco envergonhada e só diz “Mewhahaha! Foi mal, foi mal. Terei mais cuidado da próxima vez, miau!”

Aparentemente, essa provavelmente era a maneira de Linia se desculpar. Mas um pedido de desculpas não tem tanto valor a não ser que a pessoa que o recebe se sinta satisfeita com ele. Se você só irrita a outra pessoa mais ainda, então suas desculpas são inúteis.

— Isso não é bom — eu disse.

— Você também acha, não acha?

Pessoalmente, eu provavelmente perdoaria Linia, mas Aisha era sua chefe. Ela precisava ter um entendimento cristalino quanto a isso.

— Então, vamos lá, Irmãozão. Vamos demiti-la, por favor? Eu te imploro. Não consigo mais trabalhar com ela.

Era raro Aisha falar de forma tão depreciativa de alguém. Sua paciência realmente devia estar no limite. Ainda assim, nada catastrófico tinha acontecido. A xícara espatifada foi apenas a gota d’água de uma série de pequenas e triviais ofensas. Sozinhas, eram fáceis de relevar e perdoar, mas elas se acumularam o suficiente para fazer Aisha perder seus nervos.

Sim, mas ainda assim…

— Eu entendo o que você quer dizer. Linia tem o hábito de se deixar levar pelas emoções, e ela também tem seus defeitos. Ainda assim, esta deve ser uma situação difícil para ela. Provavelmente ela está apenas agindo animada porque está tentando desesperadamente se familiarizar com seus novos arredores. Talvez seja por isso que ela não se sinta nem um pouco envergonhada pelos erros que comete. Mas você disse que ela não repete as mesmas besteiras, certo?

A partir disso, suponho que Linia deve estar dando seu melhor. As pessoas têm o hábito de cometer os mesmos erros, mas era possível reduzir as chances disso acontecer. Esse era o cerne a fim de refletir sobre as ações dos outros. Se Linia não repetiu os mesmos tropeços, então era óbvio que ela estava tentando melhorar. Quando a vi na frente de casa, parecia estar genuinamente pensando no que havia feito. Tive a impressão de que ela também estava se sentindo mal por isso.

— Besteira. Aquela bola de pelos provavelmente não sente um pingo de remorso. Quero dizer, a atitude dela já é toda esquisita, para começo de conversa. Ela age de forma super subserviente em relação à Senhorita Roxy, Senhorita Eris e Leo, mas quando se trata da Senhorita Sylphie, é meio atrevida. Os lábios de Aisha se curvaram conforme fazia beicinho, insistindo que Linia estava errada. Ela conseguia ser bastante teimosa quando queria…

— Você acha que ela trata Sylphie diferente?

— Bem, ela é bem mais irreverente com a Senhorita Sylphie do que com a Senhorita Eris. E às vezes ela a chama de “Fitz” também.

  Foi há um tempo e não durou muito, mas as duas tinham pontos de vista bem diferentes quando frequentavam a Universidade da Magia. De certa forma, provavelmente eram muito menos formais entre si. Dei de ombros.

— Deve ser porque elas se conhecem há muito tempo.

— Espero que seja só isso, mas desde a chegada de Linia, a casa toda tem estado bem esquisita.

Esquisita, hein? Agora que ela mencionou, nunca tivemos esse tipo de problema quando Roxy ou Eris vieram para morar aqui.

— Bom, de toda forma, me certificarei de que ela se desculpe adequadamente caso faça alguma besteira de novo — falei. — Agora, quanto as coisas que ela destruiu, podemos adicioná-las ao seu débito. Também vou dar um sermão sobre como consertar sua atitude e agir como uma criada adequada. Depois de fazer tudo isso, você aceitaria dar uma segunda chance a ela e ver como as coisas se saem? Por mim?

— Ngh… — Aisha grunhiu, seus lábios ainda estavam fazendo um beicinho. Ela fechou os olhos e virou a cabeça. Ao vê-la agir desta maneira, suspeitei que ela estivesse apenas querendo desabafar suas frustrações e que sua ira já havia se abrandado.

— Ei, vamos lá, Aisha. Eu sei que ela é atrapalhada, mas é minha amiga.

Depois de uma pausa muito, muito longa, Aisha finalmente disse:

— Bem, acho que posso perdoá-la desta vez por você. — Ela se levantou e me encarou, — Mas, Irmãozão, mesmo ignorando como eu me sinto sobre o assunto, as coisas não vão terminar bem se continuarem assim. — E então entrou de volta em casa.

Me certifiquei de dar a Linia um sermão completo após isso. Ela me deu um superficial “Sim, senhor, miau”, mas parecia um pouco casual demais para meu gosto. Esperava que ela tivesse realmente levado em consideração o que eu disse.

Mais tarde, quando Eris retornou para casa com Roxy, a orientei para evitar fazer exercícios intensos por um tempo. Ela cruzou seus braços e franziu a testa, bufando:

— Eu sei disso!

Pude perceber que essa era uma situação que ela dizia ter entendido, mas na verdade não tinha. Pelo menos não estava correndo para fora e brandindo sua espada para tudo que é lado. Uma vez que sua barriga e coxas crescessem um pouco mais, ela provavelmente começaria a sossegar. Isso não me impediu de me preocupar, entretanto. Eu esperava que o bebê estivesse firme e forte lá dentro. Você tem Eris como mãe e eu como pai, então tenho certeza de que você vai dar conta. Vai, bebê, vai!

Graças ao mau humor de Aisha, o jantar desta noite foi estranhamente sombrio. Quando terminamos nossa refeição, Sylphie sussurrou para mim:

— Linia não se acostumou a viver aqui ainda.

Ela tinha um olhar de culpa, como se se sentisse responsável. Não havia razão para isso, mas talvez porque eu tivesse deixado a casa sob seus cuidados, ela sentisse que era seu dever.

Conforme Aisha me alertou, talvez as coisas estivessem mesmo indo numa má direção. Seria melhor eu intervir e lidar com isso antes de partir para minha próxima missão? Ou era mais sábio ficar um pouquinho mais por aqui e ver como as coisas se desenrolam? Hmm…

 

Separador Tsun

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Decidi dormir sozinho esta noite, visto que era aquele tempo do mês para Sylphie e Roxy.

— Rudeus.

Como se sentindo as necessidades da minha libido, ou talvez levada pela sua própria, Eris apareceu do lado de fora do meu quarto. Mantinha seus braços cruzados como de costume, pernas abertas em uma forma ampla. Ela estava vestindo pijamas mais quentes ultimamente, mas hoje era claramente uma ocasião especial, visto que ela estava vestindo uma camisola que eu no geral só a via quando estávamos transando. O tecido fino mal cobria sua barriga protuberante.

Tsk, tsk, Eris. Sua barriga vai ficar fria vestindo isso.

— Nós vamos fazer isso — ela declarou.

— Não, nós não vamos.

Nosso bebê era precioso demais. Era regra aqui não fazer sexo enquanto a garota estivesse grávida.

— Mas você quer, não quer? Eu ouvi que Sylphie e Roxy não podem hoje.

— Está tudo bem — eu assegurei a ela. — Eu não vou fazer hoje.

— Você é meu marido. Não há necessidade de você ficar sem. — Eris prontamente segurou minha mão e me colocou de pé. Ela era tão poderosa que não tive escolha além de ser arrastado para seu quarto.

Ah, merda. Eu não estou gostando de como as coisas estão indo. Se fizermos isso uma vez, não seremos capazes de parar por ali. E esse era o problema. Não se esqueça do quanto ela já estava se exercitando durante a gravidez. Não podíamos adicionar mais atividade física.

— Espere, Eris. Vamos parar. Não é bom fazer isso enquanto você está grávida. Nós dois nos arrependeríamos se você tivesse um aborto espontâneo ou algo do tipo. Eu absolutamente não posso aceitar isso. Estou falando bastante sério.

— Eu sei. É por isso que eu tenho tomado cuidado esse tempo todo.

Tomando cuidado? Ir para universidade e passear com o cachorro. Ela chamava isso de “tomar cuidado”? Bem, claro, é provável que seja bom fazer um pouco de exercício em vez de permanecer sedentária o tempo todo, mas, uh, mesmo assim. Talvez fosse uma questão de termos diferentes perspectivas do que era apropriado. Talvez eu só estivesse me preocupando demais.

Não, não. Isso é um assunto completamente diferente.

— E é por isso, aqui! — Eris me arrastou até o lado da cama e puxou o lençol.

— M-miau… — Linia estava embaixo, deitada na minha cama. Ela vestia algo similar a camisola da Eris, parecendo sedutora mesmo conforme curvava seu corpo para dentro.

— Se você não pode me ter, então se vire com Linia! — disse Eris.

— Miauu… — Linia olhou para mim com determinação resignada, como se tivesse desistida de lutar contra isso. O tecido da sua lingerie era tão transparente que quase dava para ver seus mamilos. Ela tinha uma cintura fina, músculos adequados por todo corpo, o que tornava suas pernas bonitas e grossas. Seus olhos de gato brilhavam na escuridão.

Ao invés de ficar excitado por essa visão, eu estava tão espantado que fiquei boquiaberto com Eris:

— O que está acontecendo aqui?

— Eu te disse! Linia!

Minha Eris estava me mandando fazer sexo com Linia? Apesar de suas pretensões de indiferença, ela na verdade era bastante ciumenta e costumava fazer beicinho quando via eu e Sylphie trocando carinhos… mas agora essa mesma garota está me dizendo para ir dormir com outra pessoa?

— Uh, Eris, isso não meio que… Você sabe, contaria como traição?

— Não é traição porque ela é uma escrava. Isso é o que meu avô e meu pai sempre disseram. Além disso, não é segredo, visto que estou bem aqui, então não há problema!

Sauros, Philip, venham até aqui e sentem-se no chão. Mantenham suas costas eretas. Senhorita Hilda? Senhorita Hilda, você está aí? Por favor, repreenda estes dois homens por mim. Seu esposo ensinou à sua filha algumas coisas bastante esquisitas e inapropriadas!

— Ahh, Mamãe e Papai na Grande Floresta… sua pobre menininha se tornou uma escrava e agora será um brinquedo sexual, começando hoje, miau… — Linia murmurou baixinho, fazendo algum tipo de oração.

Então ela não estava disposta, afinal. Era melhor pôr um basta nisso. Eu não podia deixá-la ser arrastada para os caprichos egoístas de Eris.

— Quanto a você, Pursena… vou te deixar comendo poeira, fracassada. A vitória é minha desta vez, miau. Chupa.

Olha só, acho que talvez não estava tão relutante, afinal. Talvez era ok se ela consentisse então?

— Linia — eu disse, estendendo minha mão em sua direção.

Todo o corpo de Linia saltou.

— Miau?! — Ela se eriçou inteira, mas não tentou correr.

Deslizei minha mão pelas suas coxas até seu rabo. Ela tinha o tipo de músculos flexíveis que se esperava de um carnívoro, mas também era macia em todos os lugares que uma mulher devia ser. Minha mão viajou por suas costas, sentindo ao longo sua cintura. Era fina e torneada, o que me tentava.

— É a minha p-primeira vez. Pega leve comigo, miau.

Não respondi a seu pedido.

— M-me dá medo se você não diz nada, miau! Mewhehe, você sabe qu… Estou brincando! Miaaau?!

Reuni minhas forças e a levantei como uma princesa em meus braços. Me direcionei ao quarto do lado enquanto carregava ela, usando meu pé para manipular a maçaneta e abri-la. A escuridão estendia-se diante de mim no frio corredor. E foi então que larguei Linia sem cerimônias.

— Mrooow?!

Ela caiu e fez um barulhão. Bati a porta em sua cara e a tranquei, para garantir. Agora sim. Agora posso descansar tranquilo. O mal foi eliminado.

— Ei! Chefe, você não está sendo um pouco frio?!

Não consigo te ouvir. Não há mais nenhum monstro gato tentador na minha casa. Não, senhor. Minha fidelidade permanece intacta.

— Ei, Rudeus! O que você está fazendo?! — Eris me seguiu, quase agarrando-se ao meu pescoço, mas seus protestos não iam me fazer mudar de ideia.

— Eris, por favor, não tenha uma ideia errada sobre mim. A pessoa que eu quero no meu quarto é você. Eu não quero aquela gata.

— S-sério? Se você tem certeza, então eu acho… mas não posso fazer isso com você até o bebê nascer. Você entende isso?

— Claro, eu entendo.

E aí está.

— Chefe, abra a porta! Se você me deixar aqui assim, vai deixar meu orgulho enquanto mulher despedaçado, miau! — Linia estava batendo na porta, mas eu a ignorei. Até onde eu sabia, ela sequer existia. Sim! Nada lá fora a não ser o vento.

— Chefe! — Linia disse de novo, desta vez levantando sua voz mais ainda. — Eu te imploro, miau! Não aguento mais Aisha me enchendo o saco toda hora!

Talvez ela e Aisha realmente tivessem essas personalidades conflitantes para ela dizer algo assim. Era estranho. Aisha tinha costurado aquele uniforme de criada para ela apenas alguns dias atrás, e elas pareciam se dar bem na época.

— Eu quero ser sua amante para pelo menos subir na hierarquia aqui, miau! Não me importo se você apenas me usar pelo meu corpo, miau. Eu te imploro, Chefe! Por favor! Eu definitivamente não espero engravidar de você para poder dar à luz e me tornar sua quarta esposa, o que em troca apagaria completamente todo o débito que eu tenho contigo. Sério, miau!

Oh. Então é isso que você estava planejando. Mas também, não podia condená-la por isso. Ela nos devia uma quantidade tão exorbitante que levaria mais de uma vida inteira para ela pagar tudo de volta. Ainda assim, não tinha nenhuma intenção de usá-la como escrava sexual. Seria mentira se eu dissesse que não tinha nenhum interesse em fazer coisas safadas com ela, mas Linia era minha amiga. Eu queria que ela permanecesse minha amiga. Eu já tinha duas filhas, e depois daquela conversa que tive com Aisha esta tarde, ela ficaria furiosa se eu dormisse com Linia agora. Roxy e Sylphie provavelmente também não veriam isso com bons olhos. Se eu cedesse à luxúria e as traísse assim, isso poderia causar o colapso de toda a família. Eu não podia deixar isso acontecer.

— Gwaaah! Waaaah! Aaaah!

Um choro ecoou pela casa. Parecia que a gritaria de Linia tinha conseguido acordar Lara. Ótimo, e agora? Talvez eu deva abrir a porta agora e pelo menos calar a boca de Linia.

No segundo que hesitei sobre o que fazer, uma porta do lado de fora foi aberta com violência.

— Ei, Linia! Você tem ideia de que horas são agora? Você acordou Lucie e Lara!

— Meowch! Fitz! M-me desculpe, miau. Eu não queria alcançar nenhum mal com isso, sério, mew!

— Meu nome não é Fitz, é Sylphie! De qualquer forma, é tarde, então fale baixo!

— S-sim.

A bronca de Sylphie foi o suficiente para silenciar Linia. Eu podia ouvir a batida relutante de seus passos conforme ela lentamente ia embora. Era seguro assumir que ela tinha se retirado em direção ao quarto de Eris, onde geralmente dorme.

Lara continuou chorando por um tempo depois disso, mas logo se acalmou. Com isso, silêncio reinou novamente na casa dos Greyrat.

Não pude deixar de me sentir mal por Linia. Embora parte disso fosse reconhecidamente sua culpa, ela estava sendo mantida como um animal de estimação, sem forma alguma de devolver o dinheiro que devia. Sua performance no trabalho era péssima, e tinha dificuldades em trabalhar amigavelmente com a empregada-chefe, Aisha. Sem outra alternativa, pensou em vender seu corpo para seu mestre na esperança de ele tomar gosto por ela, só para ser rejeitada em vez disso. Até onde eu sabia, ela estava chorando no seu travesseiro agora mesmo.

Uma atmosfera de tensão havia caído sobre a casa. Aisha estava triste, Lilia exausta, ouvi Sylphie gritar pela primeira vez em muito tempo, e Lara estava chorando de soluçar. Talvez o passeio de Eris para a universidade hoje mais cedo e suas tentativas de me fazer transar com Linia tenham sido sua forma de lidar com o clima da casa. Não me interpretem mal, suas ações deixaram claro que ela realmente não entendia como lidar com o que estava acontecendo, mas ela estava tentando do seu próprio jeito.

Independente disso, as tensões estavam crescendo. A pior parte era que Linia, a principal culpada, sequer parecia perceber que sua atitude era a causa de tudo isso. Sempre pensei que ela era do tipo que tinha bastante semancol. Talvez ela não estivesse emocionalmente estável no momento, visto que tinha se tornado uma escrava, estava devendo uma quantidade absurda de dinheiro e escapou por pouquíssimo de ser vendida a pessoas que ela nem conhecia. Se este fosse o caso, era meu dever, como a pessoa que despendeu o dinheiro para comprá-la, achar alguma forma de resolver essa situação.

A partir de amanhã, acho que terei que procurar um trabalho para ela que não envolva limpar, lavar ou cozinhar.

[1] De forma instintiva.

 


 

Tradução: gtc

Revisão: Guilherme

QC: Delongas

 

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