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Mushoku Tensei: Reencarnação do Desempregado – Vol. 09 – Cap. 09 – Chuva na Floresta – Parte 01

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Era noite, mas ainda havia três pessoas na sala de conferências dos alunos.

A primeira delas era uma beldade impressionante que chamava a atenção em todos lugares que ia – Ariel Anemoi Asura. A segunda era um jovem cavaleiro de rosto delicado, mas bonito, que encantava mulheres com muita facilidade – Luke Notos Greyrat.

— Então, o que você queria discutir…?

Do outro lado da mesa estava um jovem com cabelos brancos, usando óculos escuros e um uniforme escolar masculino. Seu nome era Fitz. Ele levou as mãos à barriga e brincou com os dedos, ansioso.

Ariel olhou para ele por um bom tempo. Mas ele não parecia inclinado a falar, então ela continuou.

— Outro dia, Rudeus nos encontrou enquanto estávamos fazendo compras. Ele achou “suas” ações bastante suspeitas, Fitz.

— …

— Não muito depois disso, ele o jogou no chão da biblioteca, e depois disso você saiu correndo, declarando-se homem. Ou ao menos é o que dizem os rumores.

— …

— Rudeus provavelmente acredita que isso seja uma mentira. Ele teve a chance de tocar seu corpo por algum tempo, pelo visto.

— …

— No entanto, parece que não tem planos de contar a ninguém sobre o seu segredo. Ele afirma ter medo de me antagonizar, mas, dadas suas habilidades, isso parece altamente improvável. Acredito que está simplesmente tentando fazer o que é esperado de um amigo. Muito admirável, na verdade. — Ariel lançou um olhar penetrante a Fitz. — A questão neste momento é… o que você vai fazer?

Os ombros de Fitz se contraíram com o tom áspero de Ariel, mas ele não respondeu.

— Acho que não tem problemas em tomar o tempo necessário com isso — continuou Ariel. — Entretanto, já passou meio ano e você não fez qualquer progresso. Pode me culpar por querer dizer algo?

Ela esperou que Fitz respondesse. Graças aos grandes óculos escuros que ele usava, não era possível ver o seu olhar. Mas ela reconheceu a maneira como ele estava brincando com as pontas dos dedos. Era um sinal revelador de que estava se sentindo oprimido, algo que só fazia quando não conseguia pensar em nada para dizer. Se ela deixasse que ele continuasse assim por muito tempo, o garoto choramingaria algo como sinto muito ou preciso de mais um pouco de tempo, em busca de adiar essa conversa.

E então, Ariel pressionou.

— Devo dizer, fico quase doente ao ver você hesitar assim.

Isso não era verdade. Ariel gostava de ver Fitz se contorcendo. Ela ficava com um pouco de ciúmes de seus sentimentos por Rudeus, mas com certeza não era contra isso. Entretanto, Rudeus estava passando cada vez menos tempo com Fitz, graças à sua nova amizade com Silente. E Fitz ficava a cada dia mais melancólico. Isso era bem doloroso para ela assistir.

— Acho que está na hora de você ter coragem de dizer a ele quem você realmente é, Fitz… ou melhor, Sylphie.

Fitz apertou os lábios “dele” com força e ergueu a cabeça para olhar para Ariel. E um momento depois, tirou seus grandes óculos de sol.

O rosto por baixo deles era nitidamente feminino. Seria, na verdade, difícil confundir com o de um garoto.

Era o rosto de Sylphiette, amiga de infância de Rudeus.

— Princesa Ariel, eu… — começou ela, aparentemente pronta para falar o que pensava… mas então parou quase na mesma hora, parecendo que ia começar a chorar.

Isso foi o suficiente para denunciar algo a Ariel. Algo que já suspeitava um pouco por muito tempo.

— Sylphie. Esta será a terceira vez que eu pergunto isso, mas… Agora, há algo que você deseja fazer?

Havia. No entanto, Sylphie balançou a cabeça. O que ela queria era impossível, por duas razões diferentes.

Em primeiro lugar, estava com muito medo. Sentia que Rudeus podia ter esquecido de sua existência. Em segundo lugar, se importava muito com os amigos à sua frente. Se escolhesse perseguir este novo objetivo, isso poderia acabar em sua separação de Ariel. Isso seria como trair ela e Luke – esses amigos que lutaram ao seu lado, batalhando para sobreviver e alcançar o seu objetivo. Juntas, essas dúvidas mantiveram Sylphie em silêncio.

Mas, desta vez, Ariel não aceitou um não como resposta.

— Sylphie… você salvou a minha vida muitas vezes — disse ela, sua voz suave e gentil. — Se não tivesse caído do céu nos jardins do Palácio Prata, eu teria morrido na hora. Também foi você quem me protegeu dos assassinos que foram atrás de mim enquanto eu dormia. E você lutou por mim, em números desesperadamente inferiores, na Mandíbula Superior do Wyrm Vermelho. Nos últimos anos, você me ajudou inúmeras vezes.

— Mas eu devia isso a você, Princesa Ariel… isso e muito mais. Quando fui teletransportada para o palácio, não fazia a menor ideia do que estava acontecendo. Se você não tivesse me ajudado…

Ariel balançou a cabeça.

— Qualquer dívida que você me devia foi mais do que paga quando fugimos do Reino. Desde então, estamos em pé de igualdade. Simplesmente tenho te manipulado para me servir.

— Você não está me manipulando! — gritou Sylphie, seus olhos arregalados. — Eu quero te ajudar, quero porque somos amigas!

Em resposta, Ariel sorriu de satisfação e acenou um pouco com a cabeça.

— Tenho certeza de que é verdade, sim. E, pelo mesmo motivo, gostaria de te ajudar. Porque somos amigas, não somos?

— O quê…?

— Eu te conheço, Sylphie. Você deve estar se segurando por minha causa, não é? Mas você não é minha serva, é minha amiga. Não precisa colocar os meus objetivos em primeiro lugar e ignorar os seus. Se houver algo que você deseja fazer, deixe-me e priorize isso.

As amáveis palavras de Ariel foram o suficiente para abalar a determinação de Sylphie. Porém, mesmo quando seu coração vacilou, ela conseguiu gritar uma objeção.

— Mas isso significaria… trair você.

— É claro que não — respondeu Ariel firmemente. — Na verdade, se eu te segurasse, eu que estaria te traindo.

Esta afirmação poderia não deixar de passar por um exame minucioso no caso de ainda estarem no Reino Asura. Lá, Ariel era uma princesa e Sylphie apenas a filha de um caçador de alguma aldeia sem nome. Ela ganhou o título de Maga Guardiã, é verdade, mas ainda estavam longe de ser de classes semelhantes. Entretanto, este era o Reino de Ranoa, e Ariel estava, essencialmente, exilada. Graças a isso, suas palavras soaram verdadeiras.

Se ela tivesse dito algo parecido a Luke, ele sem dúvidas teria veementemente se oposto. O rapaz tinha muito orgulho do seu papel como servente de Ariel, e teria implorado para que ela desse ordens e o usasse da forma que bem entendesse.

Sylphie, por outro lado, não tinha feito um juramento de lealdade eterna. Mas ela considerava a princesa uma mulher digna do seu serviço. Ela a respeitava tanto que teria obedientemente se sacrificado caso Ariel assim ordenasse.

Entretanto, neste momento, não conseguia expressar esses pensamentos. Principalmente graças a toda gentileza com que Ariel falava.

— Diga-me, Sylphie. Você pretende fazer de mim uma traidora, depois de tudo o que fiz por você?

— O quê? Não! — Surpresa com as palavras manipuladoras de Ariel, Sylphie olhou para cima com os olhos arregalados. A princesa encontrou seu olhar com uma expressão severa. Sylphie descobriu-se querendo desviar os olhos, mas conseguiu resistir ao impulso. Entretanto, não pôde evitar de engolir em seco enquanto fazia barulho.

— Mostre alguma coragem e diga o que pensa. O que você quer fazer agora?

— Bem… Eu… — Sylphie mordeu os lábios e apertou os punhos.

Ela sabia o que queria fazer. Tudo o que precisava era da coragem para expressar os seus sentimentos em palavras. Mas, em algum ponto, perdeu toda a coragem. Mas desta vez, enquanto sua boa amiga esperava pacientemente, conseguiu mais uma vez encontrá-la.

— Eu quero… ficar com o Rudy.

— Muito bem. — Ariel sorriu para a sua amiga. Pela primeira vez, não pareceu artificial. Este era o seu sorriso genuíno; um que raramente usava. — Estou feliz por você finalmente dizer isso. Persiga, em primeiro lugar, os seus próprios objetivos, Sylphie. Você sempre pode retornar para me ajudar quando estiver preparada.

Havia bondade também no olhar de Luke.

— Ela está certa. Cuide primeiro dos seus assuntos pessoais e só depois se preocupe com os nossos.

Ele, na verdade, tinha sentimentos um tanto conflitantes quanto a esta situação. Mas estava feliz que sua amiga finalmente expressou seus pensamentos verdadeiros, e queria confiar no julgamento de Ariel.

— Mas… eu não acho que vou aguentar se Rudy não lembrar de mim. — Ariel e Luke trocaram um olhar e sorriram ironicamente.

— Então, que tal pensarmos nessa parte agora?

Com essas palavras gentis de Ariel, uma conferência de estratégia improvisada foi convocada no local.

 

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— Talvez seja melhor manter as coisas simples. Por que só não diz a ele que você é a Sylphiette de Buena Village?

— Eu acho que isso é desaconselhável. Se ele não lembrou dela depois desse tempo todo, o nome pode não surtir efeito.

Luke e Ariel pensaram um pouco sobre o que comentaram. Só para ter certeza, havia uma boa chance de Rudeus não lembrar mais de Sylphie. Fazia oito anos desde que se separaram, o que era tempo mais do que suficiente para esquecer de uma amiga de infância. Sylphie, no mínimo, não tinha ouvido Rudeus mencionando seu nome nenhuma vez em um ano inteiro. Era difícil imaginar que só o seu nome seria o bastante para refrescar a sua memória.

O que poderia fazer para que ele lembrasse dela? Era essa a questão crucial.

Ariel tentou se colocar no lugar de Rudeus. Ela não se lembrava dos nomes de todos os atendentes que a serviram oito anos no passado, mas havia alguns que lembrava. Lilia, por exemplo, que deixou a corte quando ela era ainda bem jovem. Ariel não lembrava muito bem do rosto da mulher, mas lembrava da maneira como ela lutou com um assassino para protegê-la.

— Sylphie, que tipo de memórias você tem com ele?

— Memórias?

— Sim. As pessoas se lembram de nós por nossas habilidades e pelas memórias que compartilhamos. Essa é a razão pela qual os nobres estão constantemente dando festas para se apresentarem. Eles memorizam discursos floreados e praticam danças complexas para deixar pelo menos alguma impressão na memória de seus convidados. Existem muitas pessoas, sabe, então é impossível lembrar de cada uma que já encontrou.

As habilidades de Sylphie com certeza eram bem distintas. Não existiam muitas pessoas pelo mundo que podiam lançar magias não verbais, e nenhuma era tão jovem quanto Sylphie ou Rudeus. Entretanto, mesmo com esse benefício que também era uma dica enorme, Rudeus não tinha pensado nela.

Existiam três razões para essa possibilidade.

Primeira, Rudeus tinha tendência para a autodepreciação. Ele instintivamente acreditava que qualquer coisa que pudesse fazer era fácil o suficiente para qualquer outra pessoa imitar.

Segundo, ele já havia encontrado Ruijerd, Kishirika, Orsted e Badigadi. Seus encontros com esses indivíduos esmagadoramente poderosos o deixaram com a impressão de que o mundo estava cheio de pessoas muito mais fortes do que ele. Em sua mente, parecia razoável que houvesse muitos feiticeiros capazes de lançar magia não verbal por aí.

E, finalmente, havia a própria Ariel. Os feitiços não verbais de Sylphie poderiam parecer mais incomuns caso ela fosse uma estudante qualquer, mas ela era a guardiã de uma poderosa princesa. Para Rudeus, fazia sentido que qualquer mago que servia como guarda-costas real devia ser plenamente capaz.

— Memórias, hein? Uhm… Eu te contei sobre como eu costumava ser intimidada, não contei?

— Sim. Você me contou que eram implacáveis com você graças à cor do seu cabelo.

A propósito, Sylphie nunca revelou a Luke ou à princesa que seu cabelo era originalmente verde. Temia que isso poderia fazer com que a tratassem com suspeita. Não era que não confiasse neles. A ideia de admitir isso era simplesmente assustadora, então decidiu fingir que seu cabelo foi sempre branco. Depois que a mentira foi divulgada, seria difícil voltar atrás. E o seu cabelo não mostrava sinais de que voltaria à cor original, então realmente não precisava mencionar o assunto.

Este devia ser o momento ideal para revelar a verdade até então escondida… mas o bullying que sofreu na infância tinha deixado uma impressão profunda em sua mente, e não tinha coragem de fazer isso.

— A primeira vez que encontrei Rudy foi quando ele me salvou daqueles valentões. É a principal memória que tenho dele.

— Hmm, entendo…

Ariel pensou sobre isso. Poderiam providenciar para que Sylphie fosse atacada por um grupo de idiotas, dando a Rudeus a chance de atacar e salvá-la?

Infelizmente havia um problema nesse plano. Sylphie era uma maga poderosa. Ninguém saberia olhando para ela neste momento, porém, em um combate real, ela era decisiva, rápida e mortal. Uma quadrilha de bandidos comuns não duraria cinco segundos diante dela. Rudeus bem provavelmente também conhecia essa força do seu amigo. Havia algum inimigo em potencial com habilidade o bastante para colocá-lo em algum perigo real?

A resposta era, ne verdade, sim…

A maioria dos aventureiros do clã Raio, conhecidos por sua habilidade em combate, estava atualmente hospedada na cidade. Pelo preço certo, provavelmente poderiam ser convencidos a fingir que agrediriam Sylphie. Entretanto, existia o boato de que tinham relações amigáveis com Rudeus. Alguém afirmou ter recentemente visto o “Rudeus Atoleiro” tomando chá com Soldat do grupo Líder Escalonado em alguma cafeteria. Elinalise Dragonroad e Cliff Grimoire também estavam lá. Com base neste fato, contratar o Raio não era uma opção adequada.

E Ariel achava que escolher algum grupo de aventureiros aleatório para esse papel não seria aconselhável. Rudeus provavelmente tinha mais conhecidos naquela comunidade do que Ariel suspeitava. Mesmo que ela tentasse encontrar um grupo que não o conhecesse, havia uma boa chance de que já tivessem se encontrado em algum outro lugar.

Isso poderia complicar as coisas. E bagunçar tudo. Alguém poderia acabar até se machucando, e ela com certeza não queria correr esse risco.

— Você tem alguma outra memória com ele?

— Uhhh… Ah, sim. Uma outra coisa vem à mente…

O rosto de Sylphie ficou vermelho e ela parou por um momento antes de continuar.

— No começo, Rudy pensava que eu era um garoto, sabe? Um dia começou a chover enquanto praticávamos magia, então fui até a casa dele para tomar um banho. Mas ele, uhm, começou a tirar as minhas roupas…

No meio da sua história, Sylphie olhou para Luke. Ele prontamente cobriu os ouvidos com as mãos. Podem dizer qualquer coisa sobre o homem, mas ele conseguia entender um sinal.

— Uhm, e então… e-ele puxou minha calcinha… e viu minhas, uh, partes íntimas. Foi assim que descobriu que eu era uma garota… — Sylphie então passou a explicar como Rudeus passou algum tempo deprimido por causa disso.

Ariel já tinha, na verdade, ouvido o suficiente a respeito desse incidente. Para ele parecia possível que esses eventos tinham algo a ver com a decisão de Rudeus de manter silêncio a respeito do gênero de Fitz. Mesmo se ele não lembrasse muito bem de Sylphie, aprendeu uma lição que ainda lembrava: não se deve expor as pessoas à força e sem o consentimento delas.

— Essa é… uma bela história — disse Ariel, sorrindo. Por dentro, entretanto, estava pensando: É isso. Só precisavam criar uma situação idêntica e então fazer Rudeus despir Sylphie com as próprias mãos. Com a excitação de ambos os lados aumentando, ela poderia superar a ansiedade e deixar a verdade escapar. — Muito bem. Vamos seguir com isso. — Ariel havia se decidido e não haveria nenhum debate. — Luke, tire as mãos dos ouvidos. Agora vamos discutir o nosso plano.

Nesse ponto, entretanto, a princesa se lembrou de seu segundo maior problema: a tendência de Sylphie para a auto sabotagem. Se não tomassem algumas precauções, a covardia dela condenaria o plano ao fracasso.

— Antes de entrarmos em detalhes, porém, há um ponto que quero ter certeza de que está claro.

— C-certo…

— Sylphie, você nos disse que queria ficar com Rudeus. Mas eu gostaria de saber exatamente o que isso significa para você.

Sylphie considerou a pergunta. O que, exatamente, ela queria de Rudy? O que ela queria fazer com ele? Bem, queria ao menos estar ao seu lado. Ela estava apaixonada por ele já há algum tempo, e esses sentimentos, após o reencontro, só ficaram mais fortes.

Mas às vezes também se entregava a algumas fantasias bem específicas. Costumava, por exemplo, sonhar acordada sobre como seria a vida deles depois de casados.

Nessas fantasias, a casa em que moravam era a mesma que a família de Rudy possuía em Buena Village, ou pelo menos uma do mesmo tamanho. Os dois compartilhavam a mesma cama, naturalmente. Quando ela acordava todas as manhãs, Rudy estava deitado ao seu lado. Ele a cumprimentava com um “bom dia” e um beijo, depois se vestia e ia fazer o treino matinal.

Depois de descer as escadas, Sylphie tomava conta do café da manhã. Afinal, era um dos seus trabalhos domésticos. Não era nada muito sofisticado, mas Rudy tinha sempre um grande apetite, então ela preparava bastante comida. Quando tudo ficava pronto, ele já estava de volta. Comia tudo e dizia algo parecido com “deliciosa como sempre” assim que terminava. Entretanto, ele não falava enquanto comia. Sylphie o observava enquanto se alimentava, servindo uma segunda porção sempre que ele pedia.

Assim que acabava o café da manhã, Rudy saía para trabalhar. Ela entregava uma marmita e acenava um tchau, depois, saía para se encontrar com a Princesa Ariel. Ambos tinham empregos, assim como os pais de Rudy. Ela não tinha pensado em nenhum trabalho específico para ele, mas era só uma fantasia, então isso não importava tanto.

Quanto Sylphie terminava os seus trabalhos do dia e voltava para casa, se encontrava com Rudy bem na entrada. Ele sorria assim que a via, limpava a neve dos ombros dela e a puxava para um abraço. Depois, entravam juntos e acendiam a lareira. Em pouco tempo, ficavam com o banho pronto. Depois de se limparem e se aquecerem, era a hora do jantar. Enquanto Sylphie cuidava disso, Rudy fazia estatuetas perto da lareira ou coisa do tipo.

O jantar era um pouco diferente do café da manhã. Um dos pontos era que Rudy ficava mais falante. Ele contava para ela tudo sobre o seu dia e as coisas que vira no serviço. As suas histórias eram sempre incríveis… incríveis demais para ela conseguir imaginar. E ela ria das piadas e ficava impressionada com os seus feitos.

Assim que terminavam a refeição, passavam algum tempo juntos no sofá, pertinho da lareira. Sylphie se aninhava contra Rudy, e ele passava o braço ao redor de seus ombros. Às vezes, conversavam; às vezes não diziam qualquer palavra. Em pouco tempo, começavam a se olhar nos olhos e a aproximar os seus rostos. Quando Rudy pegasse Sylphie nos braços, suas sombras ficariam sobrepostas, então ele apagava a lareira e a carregava para o quarto.

Rudy às vezes é meio pervertido, sabe? Ele pode dizer “Quantos filhos você quer ter?” ou algo assim. Mas então eu diria: “Quanto você quiser me dar, Rudy!” Ele provavelmente ficaria rindo e diria “Isso pode ser muito”, e então começaria a tirar as minhas roupas… e então, eu diria “Então é melhor começar!” Hee hee hee!

— Hee hee hee…!

— Ahem.

— Gah! — Voltando à realidade graças ao pigarro diplomático de Ariel, Sylphie parou com o seu monólogo interno, corou até ficar vermelha brilhante e olhou para o chão enquanto brincava com as orelhas.

— Pois bem — disse Ariel suavemente. — Agora pegue essa sua fantasia e imagine outra mulher no seu lugar.

Sylphie tentou imaginar Nanahoshi assumindo o papel de esposa de Rudeus. Ela se imaginou morando na casa ao lado, observando-os pelas janelas enquanto passavam o dia juntos. Mas quando Rudy e Nanahoshi a percebiam, sorriam um pouco e fechavam as cortinas…

— Você não gosta dessa ideia, não é?

— N-não! Nem um pouco!

— Muito bem. — Com um aceno firme de cabeça, Ariel fitou os olhos de Sylphie. — O sucesso ou fracasso dessa operação depende inteiramente de seus esforços, Sylphie.

— C-certo!

No caso de isso não ser o suficiente, Ariel escolheu insistir no ponto principal.

— Não vou permitir que você se acovarde de novo. Não desta vez. Se voltar e disser que não teve coragem de falar o necessário, nunca mais irei ajudá-la com isso. Na verdade, vou fazer pior do que isso. Pela minha autoridade como Ariel Anemoi Asura, Segunda Princesa do Reino Asura, vou proibi-la de voltar a entrar em contato com Rudeus Greyrat.

Sylphie engoliu em seco. Ela entendia, é claro, que Ariel estava apenas tentando empurrá-la para frente. Isso estava menos para uma ameaça literal e mais para uma ordem para levar isso muito, muito a sério.

Vendo a tensão no rosto de Sylphie, Ariel lentamente disse as suas palavras finais sobre o assunto.

— Dê tudo de si nisso.

— Uh… sim, madame!

— Muito bom. — Ariel balançou a cabeça mais uma vez e começou a traçar o plano.

Sylphie

Não perdemos tempo para colocar nossa operação em ação.

Estava na hora do almoço e eu estava no primeiro andar do refeitório. O lugar estava lotado de alunos “comuns”: ex-aventureiros, gente-fera, demônios e todos os tipos de pessoas.

Os alunos de nascimento nobre costumavam zombar implacavelmente desse grupo sempre que tinham alguma oportunidade. Mas a maioria dos seus insultos eram baseados em nada mais do que preconceito. A Princesa Ariel achava isso um absurdo; ela gostava de apontar que, há apenas quatrocentos anos, algumas das tribos das quais eles agora tanto zombavam quase levaram à derrota total da humanidade.

Mas não era como se isso fosse agora lá tão relevante.

Avistei Rudy sentado em uma mesa ao fundo, conversando casualmente com um grupinho de amigos. Ele estava com Zanoba, o Rei Badigadi e Julie, que estava sentada na outra extremidade da mesa segurando um copo com as duas mãos e lançando olhares aos outros três.

— Diga, Sir Badi. Em sua opinião, quais são as qualidades mais importantes de uma estatueta?

— Precisam ser mais fofas do que a coisa real! E o mais importante, devem ser sexy o suficiente para excitar qualquer um que ver!

— Ah sim, o elemento erótico! Seus gostos são verdadeiramente refinados, sua Majestade. Aqui, tome outra bebida…

Badigadi estava engolindo grandes quantidades de cerveja. Sua pele escura parecia ligeiramente corada. Rudy e Zanoba observavam com enormes sorrisos em seus rostos, enchendo as suas canecas regularmente. Isso era estranho. Este refeitório sequer servia álcool. Tinham saído para comprar um pouco?

— A propósito, Sir Badi, o que você pensaria sobre eu fazer uma figura da Imperatriz Kishirika? Uma bem sexy, é claro.

— Você deseja retratar a minha noiva? Mas nem sabe como ela é quando está crescida, garoto.

— É exatamente esse o ponto. Quando ela voltar ao normal, não verá mais a encantadora versão em miniatura dela! É por isso que precisamos preservar a sua aparência atual para a posteridade.

— Entendo! Você tem um bom argumento. A mulher às vezes é um pouco descuidada, inclusive é conhecida por ter se matado de uma forma bem abrupta. Imagino que cedo ou tarde ela vai voltar à forma menor.

— Mas a decoração do castelo com certeza ficaria muito melhor com uma exibição da Imperatriz Kishirika em várias idades!

— Você é um humano, garoto. Não viverá o suficiente para vê-la em todas as suas idades.

— Certo, então o problema é esse. Se quisermos realizar esse sonho, terei de passar minhas técnicas de confecção de estatuetas para as gerações futuras. E é por isso que realmente espero contar com o seu apoio, vossa majestade! Ehehehe.

— Bwahahaha! Apesar de todo o seu poder, você é estranhamente bom com essas bajulações de vendedor! Eu aprovo a sua ganância escancarada, garoto. Então, o que é que você deseja? Dinheiro? Homens?

— Ah, não é nada disso. Só estava esperando que você pudesse às vezes falar bem de mim…

Rudy estava mais uma vez com um sorriso maligno. Isso com certeza o fazia parecer com um verdadeiro vilão. Ele não sorria com muita frequência, mas quando o fazia, tendia a parecer assim. Essa era uma coisa que não mudou desde que o conheci.

Havia também uma pessoa que sorria desse jeito na corte real – um homem conhecido como Ministro Darius. Ele era o nosso inimigo mortal e o responsável pela nossa expulsão do país. Mesmo o sorriso dele parecendo com o de Rudy, nunca vacilei, desde quando ele se voltou contra nós. Talvez fosse algo que fazia parte das pessoas inteligentes.

Rudy e Zanoba pareciam realmente dedicados ao hobby de usar a magia da Terra para fazer pequenas esculturas de pessoas. Para mim, era difícil comentar sobre a qualidade do trabalho deles, mas as estatuetas eram, no mínimo, muito detalhadas e precisas. Quando Rudy me mostrou uma escultura de Wyrm Vermelho na qual eles estavam trabalhando, fiquei seriamente impressionada.

Eles também estavam treinando Julie, que se provou ser uma anã talentosa, para ajudá-los. E agora também estavam tentando atrair um Rei Demônio para o negócio. Era óbvio que estavam falando sério sobre este projeto. Eu queria me juntar e ajudar, já que também era uma maga muito boa, mas essa não parecia ser uma opção. Precisava guardar a minha mana para proteger a Princesa Ariel.

— Olá, Rudeus.

— Ah! Olá, Mestre Fitz. — Quando chamei por ele, Rudy olhou para mim com uma expressão satisfeita. Recentemente estive agindo de um jeito meio estranho quando perto dele, mas não parecia que estava desconfiando de mim ou coisa do tipo. Sério, às vezes ele conseguia ser bem desatento.

Ainda assim… parecia uma prova de que confiava completamente em mim. Isso me deixava feliz.

— O que posso fazer por você?

— Uhm… — Hesitei por um momento. Era meio difícil abordar o assunto enquanto Zanoba e o Rei Demônio me observavam. — Er, se importaria de dar uma volta comigo por um minuto?

— De forma alguma. Zanoba, pode cuidar do resto?

— Claro, Mestre! Deixe os detalhes todos comigo.

Rudy e Zanoba com certeza tinham se tornado próximos. Não pude deixar de sentir um pouco de ciúme.

Conduzi Rudy para fora da sala de jantar e encontrei um local tranquilo e isolado para conversar. Era hora de ir direto ao ponto.

— Vá em frente, por favor — disse Rudy. Ele parecia tão bonito com aquela expressão séria no rosto. Isso não era justo.

— Uhm… na verdade, tenho um grande favor a te pedir.

— Tem? Bem, fique tranquilo! — disse Rudy, batendo o punho no peito. — Vou fazer tudo o que puder, é claro!

— Espera um segundo. Ainda nem falei o que vou pedir…

— Se for para você, não vou recusar, Mestre Fitz. Bem, não vou, a menos que seja completamente necessário.

Uau. Isso foi tão fofo, sério. Fez eu me sentir péssimo por enganá-lo assim. Não conseguir contar sequer quem eu era já era ruim o suficiente…

— Certo, então… lembra de quando eu te disse que a Princesa Ariel estava passando alguns dias na casa de um nobre que ela conhece? Bem, eles têm um guarda-costas lá, e ele parece ser muito forte.

— Ah. Então quer ajuda para lutar com esse guarda-costas?

— O quê? Não, não!

— Ah, entendo. Então isso é bom. Não sou muito de lutar.

Não é muito de lutar…? Isso devia ser uma piada? Eu deveria estar rindo? Bem, vamos continuar…

— A Princesa Ariel começou a ficar irritada com o quanto este nobre se gabava desse guarda-costas. Ela insistiu que “seu Fitz” era ainda mais forte.

— Ahah. Entendi.

— Então o nobre disse: “Meu guarda-costas enfrentou a Floresta do Granizo com um grupo de apenas quatro pessoas, e voltou com a flor que cresce nas suas profundezas”, em um tom bem orgulhoso mesmo…

Rudy colocou a mão no queixo e acenou com a cabeça, pensativo.

— Uma flor que cresce nas profundezas da Floresta do Granizo… ela deve estar se referindo à Franja Congelada, certo? As pétalas podem ser usadas para fazer um tônico poderoso, mas é conhecida por crescer só por lá, e só no inverno.

Uau. Esse é o nosso Rudy. Ele sabia isso de cabeça? Ainda bem que dedicamos algum tempo para fazer uma pesquisa e escolher uma planta que realmente existia.

— A Floresta do Granizo é perigosa no inverno — continuou Rudy —, mas se você entrar lá com um grupo de quatro aventureiros de rank A, acaba não sendo nada tão impressionante. Contanto que se movam todos com cuidado, pode pegar a flor sem correr muitos riscos.

Ele continuou recitando os nomes dos vários monstros que viviam na Floresta do Granizo: Vespas da Neve, Pumas Brancos, Entes Mostarda e assim por diante. Fiquei um pouco impressionada com a forma como tirou essa informação do nada. Como é que tinha memorizado isso tudo?

— Uhm, certo. Enfim… A Princesa Ariel não conseguiu recuar, então disse: “Fitz poderia fazer isso com um grupo ainda menor!” E nem me consultou primeiro.

— Agora entendi. Então o problema é esse, huh? — Rudy assentiu com um olhar de satisfação. — Vou entrar em contato com um aventureiro amigo meu e pedir para que te venda as flores por um bom preço. Esse nobre nunca saberá que você não foi lá.

— O quê?! Isso seria trapaça, Rudeus! Eu devia supostamente fazer o trabalho!

— O poder é avaliado de muitas formas. E possuir conexões é uma delas. Tenho muitos amigos aventureiros, e também sou seu amigo. Você só estará usando os relacionamentos que estabeleceu. Essa é uma maneira bem válida de fazer as coisas.

Ah, uau, olha só ele brincando com palavras. Do que é que está falando?!

— Sinto muito, mas não posso fazer isso. Se a notícia acabasse se espalhando, eu acabaria humilhando a Princesa Ariel.

— Hm, então tá. Então vamos nós mesmos buscar as flores.

Rudy mudou de ideia com bastante facilidade. A ideia de enfrentar aquela floresta perigosa com um grupo de dois não parecia intimidá-lo nem um pouco.

Ou assim pensei, até que a próxima frase saiu da sua boca…

— Me dê três dias e irei atrás de alguns caras que conheço. Com um grupo de dez pessoas ajudando, isso deve ser bem simples. Não se preocupe, o Líder Escalonado ainda está na cidade. Tenho certeza de que consigo alguns deles para isso.

E então fiquei completamente perdida.

— O quê? Rudeus, não! Ariel disse que eu iria com um grupo menor! Por que levaríamos dez pessoas conosco?

— Ah, não se preocupe com isso. Vão coincidentemente entrar na floresta algumas horas antes de nós. Alguns deles talvez estejam reunindo materiais por lá, e outros caçando monstros para um serviço. Podem acabar cuidando de todas as ameaças pelo caminho, mas nenhum deles vai tocar nas flores. Vamos pegá-las sozinhos.

Uh… uau. Mas que sorrateiro. Era assim que os aventureiros faziam as coisas?

Não, não. Rudy tinha sido um aventureiro por vários anos, e aprendeu o quão perigosas as florestas eram. Só estava preocupado com a possibilidade de eu me machucar, já que era uma amadora nesse tipo de coisa. É, só podia ser isso. Provavelmente.

— Olha, p-precisamos mesmo desse tanto de gente? Aposto que eu e você poderíamos cuidar disso sozinhos, Rudeus.

— Ah, espera… Você só está pedindo para eu ser o seu guarda-costas, Mestre Fitz?

Não foi isso que eu falei desde o começo? Bem, talvez não…

— S-sim, isso mesmo! Você pode me ajudar, Rudeus?

Rudy colocou a mão no queixo e pensou por um momento antes de concordar.

— Então tá bom. Você já me ajudou de tantas formas, Mestre Fitz. Não seria correto se eu recusasse.

— O-obrigado, Rudeus! Fiquei um pouco nervoso em ir lá sozinho.

Apesar de alguns foras, consegui superar o primeiro obstáculo. Porém, sério, parecia que ele aparecia com um plano novo sempre que eu abria a boca. Rudy era mesmo fora do sério…

A operação passou para a sua segunda fase. Rudy e eu estaríamos indo para a Floresta do Granizo. Isso ficava a cerca de três dias de viagem, ao norte de Sharia, acabando bem na fronteira com Basherant.

Eu parti com meu equipamento padrão de viagem, mas Rudy parecia usar equipamento pesado. Estava carregando uma mochila enorme, que parecia estar cheia de suprimentos e rações de emergência. Eu disse que esperava que ele viesse de mãos vazias, dado o quão forte era… mas ele respondeu: “Você não deve subestimar os perigos de qualquer floresta. Existem alguns monstros por aí que podem se esquivar de um Canhão de Pedra mesmo no meio do ar.”

Isso me pareceu um completo absurdo, mas quando insisti no assunto, Rudy disse que havia toneladas de criaturas assim nas florestas do Continente Demônio. No começo presumi que devia ser algum tipo de piada, mas seu rosto estava totalmente sério.

Os monstros que apareciam na Floresta do Granizo eram, na pior das hipóteses, ameaças de rank B. Eu devia poder lidar com eles sem problemas…

— Sinto muito, Rudeus. Parece que joguei todo o trabalho e preocupação para você.

— Não precisa se desculpar. Quando você está em uma missão de guarda-costas, isso faz parte do trabalho.

Espera. Se ele estava pensando nas coisas dessa forma… iria me pedir dinheiro ou alguma outra coisa quando acabássemos?

— Uhm… então eu deveria pagar pelos seus serviços?

— Não seja bobo. Estou fazendo isso porque somos amigos. Não quero nada.

Rudy, por alguma razão, enfatizou bastante a palavra “amigos”. Eu não tinha certeza do que isso queria dizer.

— Digo, eu posso te pagar, caso queira. Isso não é grande coisa. — Ariel me pagava um salário regular, mas não era dos mais altos. Eu não tinha muito com o que gastar o meu dinheiro, então minhas economias estavam se acumulando há algum tempo. Poderia pagar ao menos por alguns dias do Rudy.

Ah, mas… ele supostamente já é um mago de nível Rei, certo? E-eu tenho mesmo o suficiente?

— Heh. Eu não sou barato, sabe.

— B-bem, imagino que não, mas… — Por algum motivo, me peguei lembrando do mercado de escravos e imaginando Rudy subindo nu a um palco. Comprar ele… pode ser divertido…

Uma sensação estranha correu pela minha metade inferior. Senti meu rosto esquentar de vergonha.

— Uh, de qualquer forma! Vamos começar!

— Certo.

Juntos, avançamos para a Floresta do Granizo.

À primeira vista, parecia um bosque perfeitamente comum, do tipo encontrado em todos os Territórios Nortenhos. Estávamos cercados por árvores altas cobertas de neve. Entretanto, havia algum tipo de anormalidade mágica nesta área que fazia com que o granizo caísse com bastante regularidade. Quando pisava na neve do local, ela fazia um som bem distinto de esmagamento.

— As flores desabrocham em um penhasco do outro lado da floresta. Vamos direto para lá enquanto limpamos a neve pelo caminho. Siga-me e fique de olho em nosso entorno, por favor.

Com este anúncio, Rudy começou a marchar firmemente adiante, derretendo a neve à frente enquanto avançava. Também tentei ajudar, mas não consegui pegar o jeito. Eu tinha que assumir que ele estava usando magia de fogo, dada o alcance limitado do efeito… mas não era fácil gerar calor o suficiente para derreter uma camada espessa de neve por todo o tempo. Se quisesse, poderia fazer isso, mas me custaria muita mana. Rudy começou a gastar as suas reservas de magia sem nem pensar.

A neve era profunda o suficiente para bater nos nossos ombros, mas ele continuou limpando tudo enquanto avançávamos. No início, fiquei preocupada com a possibilidade de as nuvens de vapor d’água atraírem monstros, mas, de alguma forma, nenhum deles estava aparecendo. Quando perguntei como ele estava fazendo isso, Rudy disse que, se controlasse a temperatura com cuidado, poderia aquecê-la apenas o suficiente para fazer a neve derreter sem produzir nenhuma nuvem de vapor. Quanta prática seria necessária antes que pudesse fazer algo assim?

Foco, Sylphie. Isso não é tão importante agora.

Estava na hora de começar com o plano. Respirando fundo, apontei para o cajado que Rudy carregava.

— Lembro de ter levado isso para você no outro dia, Rudeus. É um cajado incrível. Nunca vi um feito sob encomenda, ainda mais com uma pedra mágica colorida e fora da corte real.

— Sim. A jovem senhora para a qual eu estava dando aulas particulares me deu de presente no meu décimo aniversário.

Rudy parecia por algum motivo meio triste. Pensando bem, ele nunca me falou muito sobre o que aconteceu enquanto dava aulas particulares a essa jovem senhora. Ele parecia não querer falar sobre ela. Por tudo o que ouvi, ela parecia ser uma garota bem violenta… ele talvez tivesse algumas memórias ruins daquele tempo da sua vida.

— Acha que eu poderia tentar segurar ele por um tempo? Só tenho a minha varinha de iniciante, sabe. Sempre quis usar um cajado desses.

— Sério? Achei que se o guarda-costas da princesa pedisse, dariam a ele um bom cajado.

— Disseram que eu não precisava de um, já que podia lançar feitiços não verbais. Uns mãos fechadas, hein?

Claro, essa não era a verdadeira razão para eu ter ficado com a minha varinha por tanto tempo. Rudy me deu ela de presente, então significava muito para mim. Era só um tipo comum de varinha. Mas eu não poderia culpá-lo por não a reconhecer.

— Bem, vá em frente. Pegue bem no meio, aqui.

Por algum motivo apareceu um sorriso estranho no seu rosto quando disse isso. Havia algo de engraçado que eu não estava entendendo nisso? Sentindo-me um pouco perplexa, apertei o cajado de Rudy em minhas mãos. Segurar essa coisa foi um pouco estranho. Minhas mãos eram pequenas demais.

— Sim, é super grosso. Você não devia segurar com as duas mãos?

— Talvez… Acho que queriam ter certeza de que eu poderia continuar usando mesmo depois que crescesse.

— Hmm…

Sorrindo para si mesmo, Rudy retomou sua marcha à frente e as tarefas de limpeza de neve. Eu o segui de perto, ainda segurando o seu cajado.

Certo. Até agora tudo bem. Está na hora da próxima etapa…

Levando o anel que eu usava no meu dedo mindinho até a boca, sussurrei a palavra-chave, “torre Vermelha”, tão suavemente quanto pude. A pedrinha incrustada nele mudou de azul para vermelha.

Este anel era um dos implementos mágicos que a Princesa Ariel sempre usava. Quando pronunciada a palavra-chave, a cor da pedra mudava – e o mesmo acontecia na pedra do anel de meu companheiro. O efeito não funcionava em distâncias muito grandes. Mas, neste momento, o outro anel do conjunto estava esperando pelo meu sinal, lá do lado de fora desta floresta.

Isso vai mesmo funcionar?

Olhei para o céu, nervosa, e esperei pelo começo do próximo estágio do nosso plano.

Apesar da minha ansiedade, logo aconteceu. O céu começou a ficar nublado com uma velocidade não natural. Até o momento estava correndo tudo bem.

— Hm? — Não demorou muito para que Rudy percebesse a mudança no clima. Olhando para cima, ele murmurou: — Nuvens de chuva? Isso é estranho — para si mesmo.

Quase nunca chovia pelos Territórios Nortenhos nesta época do ano. Assim sendo, o equipamento de proteção que a maioria das pessoas usava não servia muito bem contra isso. O material pesado que vestíamos era feito de pele de Ouriço da Neve. Era possível tirar a neve dele antes que derretesse, então era bem útil no inverno. Mas a chuva iria passar direto por isso. E uma vez que ficasse encharcado, uma única rajada de vento ártico serviria para congelar uma pessoa.

— Parece que vai chover, Mestre Fitz — gritou Rudy para mim, franzindo a testa.

Quando algo assim acontecia, suas únicas opções reais eram criar um abrigo improvisado no local ou se refugiar em uma caverna. A última opção era considerada um pouco mais segura e confiável. Rudy era muito bom em magia da Terra, é claro, mas não gostaria de continuar gastando mana só para nos manter secos até que a chuva parasse. Esse era um trabalho bem tedioso. E então, eu tinha uma alternativa a oferecer.

— Uhm, vejamos. Olhando para o mapa, acho…

Há uma caverna logo à frente, então vamos nos abrigar lá…

Mas antes que eu pudesse pronunciar as palavras, Rudy balançou a cabeça e interrompeu.

— Não se preocupe. Acabo com essas nuvens em um momento.

Ele então ergueu as mãos em direção ao céu.

Ah, merda!

Naquele instante, percebi que cometi um erro grave. Rudy era um mago da Água de nível Santo; manipular o clima era algo quase natural para ele. E a Princesa Ariel me disse que contratou dois magos da Água de nível Avançado para esse trabalho, mas não seriam páreos para o Rudy. Ele provavelmente nem suaria para sumir com essas nuvens.

O que eu faço? O que eu faço? Se não chover, o plano todo vai pelo ralo!

Agindo por reflexo, comecei a canalizar mana para o cajado que segurava em minhas mãos. Eu podia o sentir amplificando o meu poder em um grau notável. Eu talvez pudesse fazer isso.

— Hmmm? — Ainda com as mãos para cima, Rudy inclinou a cabeça, perplexo. Provavelmente estava confuso com a recusa teimosa das nuvens de se dispersarem. O que ele não sabia é que eu estava lutando para mantê-las firmes. Não sei se Rudy não estava dando tudo de si ou se o cajado me deu uma vantagem, mas nós dois estávamos basicamente cancelando um ao outro. O que significava que os dois magos de nível Avançado fora da floresta poderiam manter o controle de tudo.

Sussurrando orações silenciosas para ninguém em particular, canalizei mais e mais mana para cima. Visualizei as nuvens de chuva ficando mais pesadas e se espalhando pelo céu. Fiz exatamente como Rudy havia me ensinado – juntando umidade, resfriando-a até condensar e deixando-a cair!

— Hmm… — Rudy voltou a franzir a testa. Um momento depois, as primeiras gotas de chuva fria caíram sobre nós. — Sinto muito, Mestre Fitz… Parece que hoje não estou com um bom desempenho. — Ele parecia um pouco chateado com este desenvolvimento, isso era compreensível.

— T-tudo bem, Rudeus. Provavelmente é porque eu estava segurando o seu cajado.

— Mesmo sem meu cajado, eu deveria ser capaz de cuidar disso sem problemas — murmurou ele, olhando para as mãos. — Acho que faz um tempo que não faço isso… será que enferrujei? Ou será…

Tive a impressão de que ele suspeitava que aquelas nuvens de chuva pudessem ter sido criadas intencionalmente. Ainda assim, nem devia ter pensado que eu poderia ter ativamente interferido em sua tentativa de dispersá-las.

— Ah, bom. Não há muito que possamos fazer agora que está chovendo. Há uma caverna à frente, não é? Vamos nos abrigar nela.

— S-sim! Boa ideia!

Balancei a cabeça vigorosamente e voltamos a nos mover. Nosso equipamento de Ouriço da Neve sugava água como se fosse uma esponja. Em pouco tempo, estávamos ambos congelando de frio.

Tudo de acordo com o plano.

— Ai está! — Finalmente, tremendo e encharcados, tropeçamos para o nosso abrigo. Era uma caverninha natural, com não mais do que dez metros de profundidade. E era, também, o nosso verdadeiro destino.

 


 

Tradução: Pimpolho

Revisão: PcWolf

 

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