Roland havia subido mais de dez andares sem parar. Quando ele relaxou os músculos, sentiu suas pernas fadigarem.
Não havia elevadores nesse edifício antigo. Embora fosse um sonho, Roland se sentiu grato por não ter que viver no vigésimo segundo andar, já que para sair ele teria que descer vinte e duas escadarias seguidas.
Sem dúvida alguma, Zero deve ter sido a criadora disso tudo, mas algo deve ter saído do controle. Afinal, por que ela se esforçaria tanto para criar um sonho tão bizarro apenas para me deixar testemunhar o fracasso dela? Isso não apenas apagou as memórias dela como bruxa pura, como também a transformou numa estudante frágil.
Nesse momento, várias ideias perversas passaram pela mente de Roland. Afinal, Zero não passava de uma garotinha inofensiva agora.
O que poderia ser dito neste momento era que Zero de fato fez algo que criou uma distorção irreversível de memórias. Contudo, o resultado final foi algo que ela nunca havia esperado.
Esse edifício antigo de apartamentos provavelmente reflete as memórias de Zero, tentando adequar-se ao mundo moderno1O que eu acho que Roland quis dizer foi: esse edifício antigo pode representar o que Zero sabe sobre arquitetura, mas só que trazido para o mundo moderno, entenderam? E é bem possível, pois a Torre de Babel é bastante alta, então há sim pessoas que detém o conhecimento para construir um edifício tão grande, e como Zero absorveu mais de duas mil pessoas, é bem provável que uma delas, ou mais de uma, possua conhecimentos de construção. Pelo menos foi isso que entendi da análise dele.. Já os arranha-céus à distância, os carros modernos, as TV’s coloridas e outras tecnologias, pertencem às minhas memórias, já que sou uma alma que veio do mundo moderno. Zero e as pessoas que ela devorou apareceram neste sonho como pessoas modernas. Isso testifica que o plano dela falhou.
Essa seria a explicação mais lógica.
Mas e quanto a mim?
Roland pensou em várias teorias enquanto descia as escadas lentamente.
Ele não pertencia a este lugar, ou pelo menos, ele não pertencia a este edifício. Uma prova óbvia disso era que sua memória permanecia intacta, e ele sabia que isso era um sonho e que poderia sair a qualquer momento que quisesse.
Claro, na próxima vez ele teria que criar um método mais conveniente de cair, afinal, ele ainda sentia um pouco de dor na parte de trás da cabeça, o que indicava que a autenticidade desse sonho já poderia se comparar com a realidade.
Roland retornou ao apartamento 0825 e examinou novamente a residência.
A residência tinha uma divisão normal de três quartos, um banheiro, uma cozinha e uma sala de estar sem varanda. Dos três quartos, um era de Roland, outro era de Zero, e o última era usado para guardar coisas. Nesse quarto de guardar coisas havia uma bicicleta velha sem rodas, uma máquina de costura e uma porta enferrujada. Essas coisas estavam tão velhas e acabadas que nem serviriam para reciclagem.
Roland caminhou em direção ao quarto de Zero. Chegando lá, ele viu uma placa que dizia: “Não entre!”
Mas Roland não respeitaria algo assim.
Ele empurrou a porta sem hesitação, e logo uma fragrância agradável entrou em seu nariz.
O quarto era pequeno, mas extremamente organizado. A cama estava bem arrumada; a escrivaninha, perfeitamente organizada; e o chão, bem limpo e lustroso.
Roland caminhou pelo quarto, e um diário no canto da escrivaninha chamou sua atenção.
Ela tem um diário?
Essa seria uma ótima oportunidade para saber das experiências passadas de Zero.
Ele pegou o livrinho rosa e logo notou que havia uma fechadura de plástico ao lado.
Mas isso não seria o suficiente para detê-lo.
A fechadura de plástico servia apenas como um conforto emocional para crianças. Isso não impediria uma pessoa de dar uma espiada no diário. Roland pegou dois palitos de dente, enfiou-os no buraco da fechadura e os moveu para lá e para cá. Após algumas tentativas, ele logo conseguiu abrir a fechadura de plástico.
Roland abriu o diário na primeira página. A caligrafia parecia imatura, mas não havia muitos borrões ou rasuras. Aparentemente, ela tratava esse diário com muita seriedade.
— 16 de Fevereiro: Devido à transferência de escola, tive que me mudar pra cidade. O dono da casa se chama Roland, um tio muito bagunceiro. Ele trabalha num bar e sempre dorme durante o dia. Sai de casa ao anoitecer e só volta tarde da noite. Ele sempre tá fedendo a álcool. Eu não quero viver aqui, mas minha família disse que tio Roland só cobra o mínimo pra eu ficar na casa dele. Minha família também disse que vai me mandar de volta pro interior se eu fizer outra reclamação.
— Que enredo absurdo é esse? — Roland ficou irritado. Em sua vida antiga, ele raramente ia no bar, mas neste sonho ele trabalhava num bar? Além de tais absurdos, o sonho em si era um lugar sem sentido que frequentemente conectava numerosos fragmentos sem relação alguma, sendo que ninguém no sonho notaria algo de estranho.
Sabendo disso, Roland sentiu que não precisava mais ser tão cauteloso nesse sonho.
— 27 de Fevereiro: A escola começou. Parece que tio Roland foi demitido. O jantar de ontem foi um miojo que eu comprei.
— 2 de Março: Eu gastei toda minha mesada em miojos recentemente. Isso não é um bom sinal. A revista disse que aos 12 anos o corpo está em fase de desenvolvimento e precisa de nutrição suficiente para o crescimento. Eu tenho que conversar com tio Roland. Se ele me bater, eu… Eu ainda assim vou suportar. Não quero voltar pro interior.
— 3 de Trial: Ele concordou com minha ideia. Isso é ótimo! Todo mês ele vai me dar uma certa quantia de dinheiro pra comprar comida fresca. Mas quando eu não estiver na escola, serei a responsável por preparar as refeições. Quem é que tá tomando conta de quem mesmo? Eu sinto que ele deveria me dar um salário por isso. Mas deixa pra lá, eu sempre fazia as tarefas de casa lá no interior também. Já estou acostumada com isso.
— 8 de Junho: Já faz três meses que eu cheguei nesta cidade. Eu fiz um monte de amigas. Eu também tenho as melhores notas da sala. Embora tio Roland seja bagunceiro e descuidado, ele não é um cara ruim. Pelo menos ele não me bate. O único problema é que ele ainda não arranjou um emprego. Parece que ele tá desistindo de procurar, e isso não é um bom sinal. Não vamos conseguir sobreviver só com o dinheiro que a família do tio Roland manda pra ele. Eu tenho que ajudá-lo.
— 22 de Junho: Poxa… É tão difícil ganhar dinheiro. Eu vendi alguns desenhos de anime para os estudantes do reforço escolar, mas só consegui 15 yuan. Isso não dá nem pra dois dias de comida. Será que estou sendo rude com tio Roland? Eu sei que ele já é um adulto, mas sinto que fui mal educada com ele hoje. Tem hora que eu simplesmente não consigo me controlar. Será que eu cheguei na fase rebelde?
— 25 de Junho: Jesus Cristo! Eu fiquei tão assustada hoje. Eu cheguei em casa e vi tio Roland caindo de uma montanha de cadeiras. Ainda bem que tinha um sofá embaixo dele. Será que ele queria cometer suicídio? Eu fiquei tão aflita. E se ele se machucasse? Isso só pioraria as chances de ele arranjar um trabalho! Enfim, amanhã vou perguntar a ele o que aconteceu.
Ignorando os detalhes triviais, Roland só gastou meia hora pra ler todo o diário. Ele agora entendia por que Zero morava com ele.
O sonho criava histórias de origem para cada um, adaptando-os para uma identidade moderna. Sem dúvida alguma, essa era uma estrutura bem complexa. Não foi à toa que ele ficou em coma por quase dois meses após a Batalha das Almas.
Ao colocar o diário de Zero de volta no lugar, Roland notou algo que o deixou um pouco intrigado.
Havia uma pilha de livros perto da escrivaninha. Parecia que eram os livros didáticos da garotinha.
O primeiro livro didático era de literatura e o segundo era de ciências sociais. Quando Roland viu o terceiro livro didático, ele perdeu o fôlego por um momento.
Era um livro didático de química da oitava série.
O conteúdo era simples, com apenas algumas palavras. A maior parte do livro era composta de gravuras. Ao pular para o final do livro, Roland notou que a última página estava dobrada.
Roland desdobrou a página e uma tabela periódica completa apareceu diante de seus olhos.
Tradução: Kabum
Revisão: Kabum
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