Império Tearmoon – Vol. 01 – Cap. 45 – A Princesa Mia não é uma isolada.

Para constar, Mia não era solitária. Como compatível aos seus status como a Princesa de Tearmoon, era frequentemente cercada pelo cortejo de outras garotas.  Apesar de seus números terem diminuído comparado à última linha do tempo — uma consequência de Mia fechar as portas para qualquer um que já tenha dito algo ruim sobre Anne — ainda representavam o maior grupo de sua sala.

Falando de grupos, vale a pena comentar a composição da classe na qual o grupo de Mia reinava supremo. Seja através de clubes, laços familiares ou algum fator em comum, estudantes eventualmente formavam laços entre si. Um sentimento honesto de camaradagem ou um eventual interesse comum fazia com que esses estudantes passassem mais e mais tempo juntos, eventualmente separando a sala em panelinhas. Obviamente, sempre haverão aqueles que não pertencem a nenhum grupo — os que falham em encontrar suas panelinhas inevitavelmente receberão o rótulo de isolado.

A sala de Mia tinha uma garota assim. Seu nome era Chloe Forkroad, uma garota tímida cujas principais características eram o curto cabelo preto e óculos bem grossos.

Um sino tocou, sinalizando o fim das aulas.

— Haah…

Enquanto outros estudantes comemoravam suas libertações, Chloe soltava um suspiro profundo e fatigado. Ela veio de uma família de mercadores que dirigem um negócio bem grande. Seus pais foram de caravanas ambulantes para o estabelecimento de uma empresa, então usaram suas realizações para obter o título de nobreza. Eram comerciantes do povo e sabiam como se relacionar com eles. A filha deles, no entanto, tinha uma personalidade muito mais reservada. Preferindo livros às brincadeiras, sempre foi uma garota tímida. Seus esforços em trazê-la durante suas viagens para conhecer todos os tipos de pessoas apenas piorou sua introversão. Com receios sobre seu futuro, decidiram enviá-la para a melhor escola do continente, a Academia São Noel. Após uma extensa campanha de donativos e pauzinhos mexidos, conseguiram matriculá-la com sucesso.

Entretanto, assim que Chloe compareceu à academia, se deparou à dura realidade dos nobres obsessos sobre linhagens e tradições. Sendo a caloura cujo título fora obtido através do dinheiro, acabou se tornando a ovelha negra. Portanto, começou sua vida solitária na escola.

Para aqueles que não se encaixavam, o pior período na sala de aula era o intervalo. Nem um dia se passou sem que ponderasse em como gastar essa pausa — um tempo designado a se socializar com amigos — completamente sozinha.  Para este fim, os livros que trouxera se tornaram sua salvação. Sendo uma condensação dos ramos do conhecimento, livros vendiam bem e alcançavam altos preços no mercado. Até mesmo a família de Chloe, operando como Companhia Comercial Forkroad, pôs um foco contínuo nos livros como um de seus produtos principais. Crescendo cercada por eles, desenvolveu um amor pelos livros e trouxe vários com ela para a academia. No entanto…

Este é o último… Passando cada intervalo mergulhada nas páginas rapidamente esgotou seu estoque.

O que vou fazer amanhã?

Com apenas vinte páginas para terminar seu último livro, não importava quão lenta o lesse, acabaria terminando amanhã.

Talvez eu deva tentar falar com alguém? Dúvido. Não consigo criar coragem para fazer isso. Mesmo se conseguisse, deveria ter feito isso quando as aulas começaram. É muito tarde agora que todos já formaram seus grupos.

Ela achatou seu rosto contra a mesa.

Queria poder simplesmente… desaparecer…

Não estava triste. Pelo menos não pensou estar. No entanto, seus olhos se umedeceram em lágrimas. Foi quando ouviu uma voz.

— Com licença…

Não percebendo que estavam falando com ela, Chloe simplesmente suspirou e continuou a pressionar seu rosto sobre a mesa.

— Com licença, você teria um tempinho?

— …Huh?

Chloe lentamente olhou para cima. Enquanto piscava para expulsar suas lágrimas, a figura de uma garota surgiu.

— …Hein?!

Ela paralisou com o tipo de choque que alguém sente quando a excluída que ninguém gosta percebe que a criança mais legal da sala está falando com ela. Era uma metáfora adequada, já que a garota em questão era a estrela isolada da sala e uma verdadeira celebridade em seu ano. A Princesa do Império Tearmoon, Mia Luna Tearmoon, estava falando com ela.

— Éé… Huh… Hein?

As palavras lhe falharam enquanto lutava para sair da própria confusão.

Enquanto isso, o olhar de Mia caiu no livro de Chloe, aberto sobre a mesa.

— O que você está lendo?

— Oh, hum, isso? Esse é um… é… livro ilustrado sobre plantas que crescem no deserto e… explica como conseguem a água que precisam e… coisas desse tipo e…

Chloe sentiu que estava tendo sua primeira conversa válida desde que chegou à Academia. Em sua sede por novas interações, começou a se inclinar mais e mais para frente, articulando com a intensidade frenética de alguém apavorado com a simples ideia de parar para respirar durante o diálogo.

Enquanto Mia escutava, suas sobrancelhas começaram a franzir.

— … Você acha isso interessante?

— Sim! É, hum… na verdade, isso pode não ser muito interessante para se ler. Digo, eu acho interessante, mas… talvez outras pessoas não achem isso, então…

— Hmm… Você parece ler livros o tempo todo, leu alguns livros de histórias?

— Oh, hum, sim. Li. Gosto de uma que é sobre é… uma história de amor entre um príncipe de um pequeno reino e uma princesa.  Mas, eu, é… terminei todos os livros que trouxe comigo, então…

Foi quando, por algum motivo, um brilho de excitação cintilou nos olhos de Mia e ela olhou para Chloe como um gato faminto olharia para um rato. A situação assustou Chloe um pouco, e ela se afastou, apenas para perceber que seu braço não se moveu junto. Sua visão foi guiada em direção ao seu ombro, então para seu punho, onde um par de mãos pousava segurando firmemente as suas. Então, finalmente viu o rosto do seu captor.

Mia sorriu radiantemente.

— Tenho procurado por alguém como você. Gostaria de ser minha amiga?

Sem sombra de dúvida, essa era a última coisa que Chloe esperava ouvir.