A paisagem passou lentamente pelos nossos olhos.
— Como você acha que é o templo?
— Hmmm. Se fosse imaginar como seria, como esperado, seria como aqueles templos gregos?
— Essa é uma imagem muito grosseira que tem aí… Não que eu não entenda por que imaginou dessa forma…
Olhando pela janela da carruagem, Yuzuki conversava comigo com uma intensidade um pouco maior, enquanto a calma e composta Kusunoki se junta à conversa.
Hmmm. Acho que o poder do arroz branco é incrível, afinal. Sinto que o constrangimento de nossas conversas anteriores agora é uma mentira. Poderia ser aquilo? Parece que meu poder de comunicação aumentou de nível e me tornei um pouco mais sociável.
Nesse momento estamos fazendo uma pequena pausa depois de tomar nosso café da manhã, pois estamos indo para o templo onde Deus vive para receber sua bênção.
— Falando nisso, Lilia. Esqueci de perguntar antes, mas o que exatamente uma benção faz?
— Ah, também estou curiosa a respeito!
— Vejamos… Para simplificar, você receberá a Proteção Divina de Deus… Seria mais fácil imaginar se pensasse nisso como um tipo de magia voltada para a defesa que lançam em você? Como estamos indo para o Templo da Saúde dessa vez, acho que poderia pensar como sendo uma magia que previne doenças.
Entendo, colocando dessa forma fica mais fácil de imaginar.
E embora as bênçãos recebidas de sacerdotes, em outras palavras, um humano comum, sejam em suma apenas feitiços, diz-se que as bênçãos lançadas diretamente por deuses têm um efeito definido.
No entanto, há uma taxa… Vou repetir. Pelo visto, há uma taxa para uma benção. É bem materialista da sua parte, oh deuses…
— Você tem que pagar por ela, hein?
— Errr, acho que sei o que está pensando… Mas já que essa é a principal fonte de renda do templo…
— A propósito, a bênção de um sacerdote é definida ao custo de uma moeda de ferro. Quanto à bênção de um Deus, dependem em sua maioria da classificação do próprio Deus que a realiza, porém o custo médio seria uma moeda de ouro.
Deixe-me pensar, já que as moedas de ferro são 10R, se não me engano… A bênção de um sacerdote é cerca de 1000 ienes. Quanto à bênção de um Deus, elas custam o impressionante valor de 10.000R… O que dá cerca de um milhão de ienes. É tão caro que teria de ser um nobre para poder pagar.
— Só adicionando um pouco mais de informação, estamos indo para o Deus da Saúde, então é uma moeda de ouro, contudo a bênção do Deus do Amor que minha dama recebeu antes foi paga com cinco moedas de ouro.
— Tão caro? — perguntaram os três, surpresos.
— Lu-Luna?
— Temo que não tenha funcionado.
— Gunununu…
Devido à Lunamaria adicionar mais informações desnecessariamente, o que pode ser dito como um evento recorrente já, o rosto de Lilia foi tingido de vermelho num piscar de olhos.
Ela com certeza parece fofa, entretanto a atmosfera dentro da carruagem ficou meio… Ah, por sinal, havia algo que me incomodou antes, e posso usar isso para sair do nosso tópico atual…
— A-A propósito! Você mencionou antes que o custo é baseado na classificação do Deus, mas os deuses também têm classificações próprias?
— Lu… Hã? Sim… Existem três níveis, deuses de nível baixo, deuses de nível alto e os deuses supremos. Então, há também aquele que está acima de todos, o Deus Criador. Os deuses que têm templos no Reino Humano são em sua maior parte deuses de nível baixo, porém quando se trata das bênçãos dos deuses de nível alto, sua reputação é mais importante para eles do que dinheiro, então a única pessoa que pode recebê-la é o rei.
Parece que consegui desviar a conversa, Lilia parou de reclamar sobre Lunamaria e voltou sua atenção para responder à minha pergunta. Não, não estava tentando ajudá-la, apenas queria mudar de assunto para que a atmosfera na carruagem não piorasse… Então guarde esse polegar para cima, sua empregada inútil!
— Quanto aos Deuses Supremos… As Três Grandes Deusas do Tempo, Destino e Vida, é altamente improvável que consigam ver seus rostos, muito menos receber suas bênçãos, exceto no Festival do Herói. São raríssimos os eventos no qual venham para o Reino Humano, então, a menos que tenha muita sorte…
É verdade que apenas seus títulos “Deus do Tempo” e “Deus do Destino” transmitem o fato de que são seres extraordinários.
Contudo, agora que penso um pouco mais a fundo, os Seis Reis, os Três Grandes Deuses, o Deus Criador e todo o outro pessoal reunido para o Festival do Herói, quão grande será esse festival? Por mais emocionante que soe, também parece meio assustador.
Pouco tempo depois, a carruagem chegou em frente a um enorme e majestoso templo…
— Aquele que mora aqui deve ser uma pessoa incrível.
Ouvindo o comentário baixo de Kusunoki, concordei com um gesto enquanto olhava para a cena na minha frente.
Se for criar um paralelo, essa bênção que estamos tomando agora é como o Hatsumode no Japão, então se consegue imaginar o segundo, deve ser capaz de imaginar a cena que estamos enfrentando agora.
Estava quase convencido de que era algo único do outro mundo, todavia Lilia e as outras também revelaram olhares cheios de surpresa em seus rostos.
— Isto é… O que está acontecendo?
— É bastante estranho. Vou dar uma conferida.
Deixando essas palavras, Lunamaria foi em direção a uma pessoa vestida como uma freira… Seria uma sacerdotisa? Vou ir junto para ver o que está acontecendo.
— Hmm, Lilia. Essa enorme multidão de pessoas é algo incomum?
— Sim, deixando de lado o detalhe da igreja ser próxima da cidade, este é o santuário principal. A maioria das pessoas que vem aqui nesta época do ano são apenas nobres para serem abençoados pelos deuses… E como o 4º dia do ano novo costuma ser o dia mais movimentado, nós adiamos a visita e viemos no 5º dia do ano novo, mas…
— Está dizendo que todos pensaram em evitar o dia lotado?
— Se for esse o caso, o 5º dia deveria ter sido muito mais tranquilo do que o normal. No 5º dia de cada ano, os deuses de alto escalão são convidados ao Palácio Real para o Rei receber suas bênçãos… Muitos nobres e sacerdotes devem se reunir lá para a rara oportunidade de ver o deus em questão…
Entendo, tenho a imagem de nobres como pessoas que valorizam conexões e a oportunidade de conhecer um deus de alto escalão que não vive no Reino Humano deve ser uma preciosa chance. Nesse caso, é compreensível que todos fossem para o Palácio Real.
É por esse motivo que Lilia deve ter pensado em receber nossa bênção neste dia, quando o templo estaria vazio, porém quando chegamos, para sua surpresa, estava lotado…
Então, enquanto recebia uma explicação de Lilia, Lunamaria retornou com um olhar um tanto perturbado.
— Minha dama! Descobri o motivo de todo esse tumulto… Escolhemos um momento bem inoportuno para vir a este lugar.
— O que quer dizer?
— Na verdade, ainda não foi confirmado, pois é apenas um boato… Ouvi que a Deusa do Tempo pode passar por aqui hoje…
— A Deusa do Tempo?
Se não me engano, ela era um dos Três Deuses Supremos que ficavam atrás apenas do Deus da Criação no Reino dos Deuses.
— Sim, ouvi dizer que os próprios sacerdotes também não sabem dos detalhes da situação, no entanto… Talvez ela tenha vindo para verificar o círculo mágico de invocação porque algo fora do comum aconteceu dessa vez, e enquanto está nisso, acho que também virá ver os deuses dessas terras…
— Entendo… Se for o caso, não apenas os nobres vizinhos, como também muitos sacerdotes vieram para este lugar, hein. Esse é um evento inesperado.
— Acho que não podemos só voltar mais tarde, hein? Já informei o templo sobre nossa visita usando o nome do nosso Ducado…
— Sim, como esperado, aqueles que não estão recebendo a bênção não poderão entrar no santuário principal, então vamos para lá por ora.
Talvez haja uma grande diferença entre um deus de alto escalão e um deus supremo. Em vez dos deuses de nível alto que sempre visitam o palácio real todos os anos, muitas pessoas podem estar pensando em ver o Deus Supremo, cuja chegada não é uma coisa certa, exceto quando o Festival do Herói acontece. Especialmente para os sacerdotes que servem aos deuses, esta pode ser uma situação em que eles jogariam outras coisas de lado para correr em direção a este lugar.
Tenho certeza de que não andamos muito, entretanto nos custou um pouco de força só para atravessar a multidão horrenda de pessoas e chegar ao templo. Apenas nos movimentarmos foi uma experiência um tanto fatigante.
— Ueeggghhh… Estou começando a me sentir enjoada com o grande número de pessoas aqui.
— Posso entender como Hina se sente. Como esperado, até para mim já é um pouco…
— Embora seja apenas um boato, ainda é uma oportunidade para um Deus Supremo se lembrar do seu rosto. Para começar, é muito incomum que um deles visite o Reino Humano fora do Festival do Herói, então esse tipo de situação acontecendo é algo que não pode ser remediado.
Em resposta aos resmungos de Yuzuki, como se estivesse farta, Lilia concordou com suas palavras.
— Kusunoki, você também está bem?
— Sim, muito obrigada. Estou feliz que Miyama esteja andando na minha frente.
Assim como Lilia disse, não há tantas pessoas dentro do templo em comparação com o lado de fora, mas mesmo assim, parece haver muito mais pessoas no templo em comparação com o que se esperaria normalmente.
A impressão que tive olhando pelos arredores foi que havia muitas pessoas que pareciam sacerdotes, e todos tinham nítidos semblantes nervosos. Suas reações podem contribuir mais para a credibilidade do boato de que um deus supremo estaria visitando.
Todavia, as bênçãos seguem ocorrendo como de costume, e Lilia e Lunamaria estavam cuidando dos procedimentos. Seremos guiados por um sacerdote e, no caminho, serei o único que será separado de Lilia e das outras.
Como há uma regra de usar vestimentas especiais ao receber as bênçãos, os homens e as mulheres são separados para que possam trocar de roupa.
Esperava que usássemos roupas leves pelo fato de sermos separados por gênero, porém quando me troquei na sala para onde fui levado, descobri que as vestes eram quase como roupas íntimas, feitas de um material semelhante à seda fina.
Não é que seja transparente, contudo é uma roupa que mostra um pouco da minha linha corporal porque é branca e clara… Para ser sincero, sinto que é uma pena não poder ver Lilia e as outras com essas roupas.
Além disso, depois de trocar de roupa, ficaremos esperando em uma sala espaçosa e seremos chamados para receber nossa bênção. O que significa que vou ser levado a um lugar cheio de homens vestidos com roupas que se parecem com este vestido branco que estou usando agora… Como devo dizer… estou meio tentado a dar meia volta e ir embora.
Pelo que ouvi do sacerdote que me guiava, não está lotado, no entanto, ao que tudo indica, ainda há dezenas de pessoas esperando sua vez lá, e é provável que tenhamos de esperar por mais de uma hora. Esqueça a bênção, é quase uma tortura para mim.
Quando chegamos diante de uma porta no corredor, o sacerdote fez uma profunda reverência, como se tivesse outra pessoa para guiar, e saiu em seguida.
Sinceramente, quero sair sem abrir esta porta que leva a uma festa de salsichas, mas depois de respirar fundo algumas vezes, decidi ir em frente e abri a porta, entrando.
— …
Quando entrei, a cena que vi na minha frente… não era a festa de salsichas que pensei que encontraria.
Podia sentir o sopro da suave brisa acariciando minhas bochechas, trazendo o perfume das flores junto com ela.
— Hã?
Flores coloridas florescem lindamente na minha frente e depois de mover meus olhos ao redor, pude ver a fronteira entre o céu azul e a terra. O cenário tem uma atmosfera linda, majestosa, como se eu estivesse olhando para a terra…
— Hã? Hãããããã?
Ninguém respondeu ao grito que saiu da minha boca. Na verdade, pelo que posso ver não há mais ninguém neste lugar além de mim.
Quando abri a porta do templo, me vi… em um jardim flutuante.
Não, não é como se estivesse fazendo uma piada ou coisa do tipo. Estou falando sério, quando abri a porta e entrei, o que vi diante de mim foi um jardim flutuante sem ninguém à vista. E a porta pela qual acabei de passar, pela qual deveria ter passado há apenas um minuto, desapareceu.
Para ser honesto, minha mente segue sem entender, contudo… Hein? Será que esta é a sala de espera? Talvez seja só eu que não saiba e seja a norma por aqui… Não, como esperado, não é possível. Quero dizer, como diabos alguém poderia chamar esse lugar de sala?
— …
— Hã?
E assim como foi muito repentino me encontrar neste lugar, de repente vi alguém lá como se estivesse ali desde o começo.
Sim, antes que percebesse, sem nem mesmo fazer um som ou sentir sua presença, parada a alguns metros na minha frente estava uma mulher… Não, há “algo” parado ali de uma natureza que desconheço.
Ela tem a aparência de uma beleza incomparável… Não consigo pensar em mais nada para dizer. Cabelo longo e liso, branco-prateado, sem cachos que chegam até os joelhos, eles até parecem estar emitindo um leve brilho, e seus olhos dourados não possuem nenhum indício de nebulosidade.
Seu corpo, que tem cerca de 160cm de altura está vestido com vestes brancas, é tão bonito que pensaria que sua existência incorpora as proporções divinas perfeitas… No entanto, acima de tudo, ela é meio assustadora.
Quando conheci Kuro, pensei que sua aparência enquanto stava contra o pôr do sol era como arte, mas a aparência da mulher na minha frente é arte em si, não apenas uma metáfora que a descreve.
Sim, tudo é perfeito demais para a mulher na minha frente, ao ponto que me dá uma sensação inexplicável de estranheza.
Deveria estar bem na minha frente, porém não parece real, como se eu estivesse apenas olhando para uma pintura finalizada. Meus instintos estavam me dizendo que o ser na minha frente está em um nível diferente de mim… Seria talvez esse ser um Deus?
— Prazer em conhecê-lo, Miyama Kaito, o humano de outro mundo encontrado por Kuromueina. Eu sou Shallow Vernal, prazer em conhecê-lo.
— …
Sua voz soou tão agradável ao alcançar meus ouvidos que pensei que fosse a verdade absoluta, todavia, ao mesmo tempo, senti uma forte sensação de desconforto que não consigo expressar em palavras.
Não demorou muito para entender por que me sentia assim. É porque me era difícil acreditar que as palavras que acabei de ouvir emanavam da mulher na minha frente.
— Suponho que esteja surpreso com a brusquidão da situação. Eu o trouxe a este lugar a pedido de Kuromueina. E, como eles disseram, quanto melhor for a vista dos arredores, mais calmo será.
— …
Se apenas me atentasse às palavras, não acho que teria encontrado nada de estranho entre elas… Mas não consigo sentir nenhuma entonação em sua voz. Embora ela seja maravilhosa, ter o mesmo volume, velocidade e intensidade faz parecer que não há emoção, como se fosse apenas uma máquina falando comigo… Não, sua voz é tão constante que até uma máquina teria mais emoção se falasse.
Além do mais, suas expressões faciais não mudaram em nada, como se não tivesse nenhuma emoção desde o início. Não tenho certeza se seus olhos dourados estão olhando para mim, ou se é como se eu não existisse, e estão apenas olhando para o fundo.
Foi dito que os humanos têm medo das coisas que não entendem, e é provavelmente isso que estou sentindo nesse momento, a razão pela qual estou sentindo um arrepio na espinha.
— Sua mente parece estar em um caos, você está bem?
— Eh? Ah, si-sim… Sinto muito.
— Não precisa se desculpar. A culpa é minha por trazê-lo aqui de repente.
Como esperado, cada uma das palavras de Shallow Vernal foram ditas sem nenhuma mudança em sua expressão ou voz. Chacoalhei minha cabeça, que estava congelada no lugar, e respondi às suas palavras.
— E-Eu sou Miyama Kaito. Pra-Prazer em conhecê-la. Errr, Deusa Shallow Vernal…
— Pode me chamar de Shiro se quiser. É assim que Kuromueina, Kuro, me chama.
— Nã-Não, mas, errr…
— Pode me chamar de Shiro se quiser. É assim que Kuro me chama.
— Errr… Deusa Shiro?
— Esse “Deusa” é desnecessário.
— Não…
— Esse “Deusa” é desnecessário.
— Como esperado, não posso só descaradamente…
— Esse “Deusa” é desnecessário.
— Ah, sim… Shiro.
— Bom.
Farei o que você disser, então, por favor, pare de soar como um disco arranhado. Sério, é assustador.
Para ser honesto, não me senti muito confortável chamando um ser que está obviamente em outro nível comparado a mim de tal forma, porém tendo que ouvir as mesmas palavras repetidas várias vezes com sua expressão e voz imutáveis, só pude desistir e mudar a maneira como a chamava.
— E-Então, mais uma vez… Shiro disse que Kuro pediu algo a você… mas por que fui convocado para este lugar?
— Essa é uma boa pergunta a se fazer. Bem, então lhe darei minha bênção.
— Hã? Hein?
Arehh? Isso é estranho… Ela não me ouviu fazer essa pergunta? Só porque me disse o que pensa sobre essa pergunta, não significa que explicou alguma coisa, sabia?
Depois de falar comigo em uma voz sem nenhuma inflexão, Shiro apontou levemente a mão para mim sem responder minha pergunta.
— Deus o abençoe.
— ?
Depois de suas palavras curtas e sem emoção serem ditas, meu corpo pareceu brilhar por um instante.
No entanto, não houve nenhuma outra mudança e a luz diminuiu logo depois. Arehh? É tudo?
— Agora, vamos tomar um chá?
— O quê?
Espere um segundo, estou implorando, por favor, explique a situação um pouco. Nem tenho ideia do que está acontecendo.
O que Kuro pediu para Shiro fazer? A bênção acabou com isso? E por que diabos estamos tomando chá agora? Tudo bem se não quiser entrar em detalhes minuciosos, mas poderia me explicar?
— Kuro me pediu para lhe conceder minha bênção. Ela está completa. Porém, levará algum tempo até que a bênção para suas companheiras também esteja, então vamos tomar uma xícara de chá para nos conhecermos.
— Ah, sim.
Pensei que só deixaria a explicação de lado, entretanto Shiro explicou tudo de forma bem concisa! Realmente não estou entendendo essa pessoa… Todos os deuses são assim?
Sinceramente, quero segurar minha cabeça entre as mãos agora, mas antes que eu percebesse, uma mesa de jardim e cadeiras apareceram na minha frente. E Shiro já estava se sentando.
Se não me sentar, sinto que acabaria metido naquele loop infinito outra vez, então me sento em uma das lindas e simples cadeiras de jardim brancas, de frente para Shiro.
E agora, como se fosse a coisa mais natural a se ocorrer, uma xícara de líquido cor de âmbar surgiu na minha frente.
— …
— …
E-Estranho. A combinação de seu silêncio e inexpressividade tornou tudo muito estranho. Uma conversa… Nós deveríamos ter alguma conversa, pelo menos…
Embora estivéssemos sentados frente a frente… Sem ter conversa nenhuma, fiquei um pouco impaciente, o que me fez virar a bebida colocada na minha frente enquanto procurava uma pista para iniciar nossa conversa… Wow, isso é delicioso! O que é esse chá preto? Mesmo não sendo tão conhecedor de chá, posso ver que é escandalosamente delicioso. Devo dizer que é de se esperar do chá servido por um deus, hein… É uma boa, que tal começarmos com este chá…
— E-Este chá é delicioso, não é?
— Fico feliz que tenha gostado.
— …
— …
Não consigo levar a conversa adiante de jeito nenhum! Ou melhor, mesmo se tentar, com a combinação de sua completa falta de expressões faciais e entonações de voz, não conseguiria levar a conversa adiante de jeito nenhum.
Em primeiro lugar, sou do tipo de pessoa que responde ao que os outros dizem e meu poder de comunicação é baixo.
O que aprendi na minha longa e solitária vida é como me adaptar ao que a outra pessoa está dizendo… Em outras palavras, a conversa inicial é deixada para a outra parte, e me limito apenas a me adaptar ao tópico, mantendo a conversa fluindo sem forçá-la.
Essa técnica de conversa é eficaz para a maioria das pessoas, ainda mais para o tipo de pessoa como Kuro, que está disposta a falar comigo.
Por infelicidade, há uma falha fatal nessa tática. Não funciona bem se eu estiver falando com o mesmo tipo de pessoa, que é justo o que está acontecendo nesse momento com Shiro.
Posso ser capaz de avançar alguns tópicos se estivesse falando com uma pessoa normal, contudo Shiro é uma adversária difícil, pois não sei o que está pensando, nem sei como me dirigir a ela em primeiro lugar… Shiro, qualquer coisa está bem, você não tem nada sobre o qual possamos conversar?
— Nesse caso, deixe-me fazer uma pergunta… O que quis dizer com “poder de comunicação”?
— Resumindo, é um termo que se refere à habilidade de ter uma boa conversa com os outros.
— Entendo… E o que significa ser um solitário?
— Significa basicamente alguém estar sozinho… A propósito, Shiro. Será que, por acaso, pode ler a minha mente?
— Eu posso ler sua mente.
— Ah, é mesmo?
Ela apenas afirmou como se fosse óbvio que pudesse? Significa que leu tudo o que acabei de pensar? É meio embaraçoso…
Nesse caso, acho que é melhor deixar Shiro assumir a liderança nessa conversa…
— Ah, não vai funcionar se não tivermos alguns bolinhos de chá, certo?
— …
Tenho pensando nisso já faz um tempo, mas você tem seguido seu próprio ritmo todo esse tempo. Você é tão livre assim? Ei, você é livre assim?
Shiro sequer se importa com a nossa situação atual, e apenas mudou de uma conversa para outra com a mesma expressão no rosto e na voz. É um ditado comum em todas as eras e culturas, porém parece que os deuses de fato não entendem os sentimentos das pessoas.
— Por favor, aproveite sua refeição.
— Shiro, até você também, hein…
Para ser honesto, tive um mau pressentimento quando soube que era uma conhecida de Kuro, contudo diante de mim eles surgiram, como se fosse a norma desse mundo ou o doce mais popular por aqui, bolinhos castellas.
Não tendo mais energia para reclamar, peguei um bolinho castella, com o qual já estou acostumado a comer, e coloquei na boca…
— !?
E senti vontade de desmaiar de agonia.
No momento em que dei uma mordida, um picante penetrante se espalhou pela minha boca e ficou preso não apenas na minha língua, como também nas minhas narinas.
Nã-Não me diga, isso é… Wasabi? Hein? Por que tem wasabi num bolinho castella? Shiro está me assediando? O wasabi não está em um vetor de existência oposto ao doce? Essa deveria ser uma combinação que não poderia existir… Além do mais, não está num nível em que colocou apenas um pouco, é tanto quanto os recheios de feijão vermelho em um manju.
Um bolinho castella cheio de wasabi… Um gosto bizarro e desproporcional de doçura e picância começou a se espalhar na minha boca. Comecei a despejar chá na minha boca, querendo quase desesperado que o gosto violento e nojento fosse lavado.
E bem quando movi meu olhar para a pessoa que trouxe à tona a crueldade encarnada dos bolinhos que esculpiram um novo trauma dentro de mim, Shiro trouxe um à sua própria boca sem nenhuma mudança particular em sua expressão…
Por que está comendo essa coisa? Não vai me dizer que não estava tentando me assediar e é apenas um bolinho castella normal para ela? E-Essa pessoa… Não me diga que não apenas seu próprio ser, até seu próprio paladar é estranho?
— Shi-Shiro?
— O que é?
— Isso é gostoso?
— Não, é tão ruim que preferiria comer terra.
— …
Então, pelo menos mostre um pouco desse tipo de sentimento em sua expressão ou em sua voz!
Quero dizer, em primeiro lugar, por que diabos fez esse tipo de coisa e serviu como bolinhos de chá? Diga!
— Kuro uma vez me deu isso de presente, dizendo “Tentei fazer algo novo, só que ficou incrivelmente ruim, então vou te dar”.
— No entanto Shiro também achou que tinha um gosto horrível, certo?
— Sim. É difícil acreditar que uma comida tão terrível quanto essa exista neste mundo.
— Sendo assim, por que o ofereceu junto com o chá?
— Kuro me disse que “bolinhos castellas são a melhor coisa para comer com chá”, e como quero aprofundar minha amizade com Miyama Kaito, servi o que ouvi dizer que era a melhor coisa para recebê-lo.
— Entretanto, o que Shiro pensa sobre esses bolinhos castellas?
— O gosto é tão ruim que acho que sua própria existência deveria ser um pecado.
— …
Acho que agora entendo um pouco sobre essa pessoa. Ela provavelmente é… Uma completa cabeça oca.
Não só é inexpressiva e sem emoção, como até é uma cabeça de vento terrivelmente desagradável. Gostaria que devolvesse toda a reverência que senti por você uns minutos atrás…
— Não acha que seria muito difícil para mim retribuir, já que não é tangível?
— É apenas uma metáfora.
A conversa com Shiro… A Deusa com um belo rosto, proporções perfeitas, uma voz linda e parâmetros que poderiam fazer até a Deusa da Beleza fugir de sua superioridade, mas que também possui uns fatores problemáticos escandalosos, pois é inexpressiva, sem emoção e uma cabeça oca… Continua.
— …
— …
Não, por favor, continue com nossa conversa. Poderia ser aquilo? Esse padrão em que não funciona a menos que eu mesmo toque o assunto?
— Sim.
— Ainda que fosse mentira, gostaria que negasse.
— Bem, então, isso pode ser mentira, porém agora vou mudar de assunto.
— Ah, sim.
— …
— …
Realmente era mentira? O que devo fazer com essa Deusa… O-Olha, já que pode ler minha mente de qualquer maneira, poderia usar esse poder a seu favor para abordar um assunto para nossa conversa.
Deve haver muita coisa sobre a qual podemos conversar, certo? Poderíamos até falar sobre coisas do meu mundo anterior ou coisas do tipo…
— Bem, então, vamos falar sobre o livro chamado “Os Documentos dos Joelhos Pretos como Azabache Volume II”.
— Whoehh!
Ei, idiota! Pare aí mesmo… Não pode só sair por aí desenterrando a história sombria de alguém dos tempos de escola bem entende!
Sério, pare, por favor, vou morrer de vergonha aqui.
— Esse livro realmente é intitulado como “Escuridão Azabache? Por que o Azabache nesta série é escrito como “joelho” em vez de “laca1漆黒 / Azabache. No livro (que não foi escrito por Kaito), foi escrito como 膝黒. 膝=joelho, 漆=laca.”?
— ???
PARE COM ISSOOO! Não comece a corrigir o kanji errado! Tenho certeza de que não é algo que deveria tocar! Meu coração está a um fio de se despedaçar!
Por que é que de todas as coisas que pode ler na minha mente, mirou nessa memória que estava enterrada lá no fundo? Foi de propósito, né?
O fluxo atual da conversa não é bom. Um tópico, devo pensar em qualquer tipo de tópico…
— Fa-Falando nisso! Ouvi dizer que as bênçãos funcionam de forma diferente para diferentes deuses! Qual o efeito da sua benção, Shiro?
— Não sei.
— Não sabe?
Se eu deixasse Shiro assumir o controle da conversa, tenho medo que minha mente quebrasse, então mobilizei ao máximo o insignificante poder de comunicação que me resta para tentar iniciar outro tópico, contudo… Começo a duvidar se meus olhos e ouvidos estão funcionando direito. É que, por algum motivo, acho que ouvi essa Deusa dizer “Não sei” enquanto inclinava a cabeça com aquele rosto inexpressivo, como se não soubesse o efeito de sua própria benção… Está só brincando, né?
— Não, é só que esta é a primeira vez que dou minha bênção a alguém, então não sei qual efeito teria.
— Esta é sua primeira vez dando uma bênção?
— Sim. Afinal não visito o Reino Humano.
Era o esperado, já que ela é alguém que Kuro conhece, no entanto… Talvez Shiro possa ser uma deusa de nível alto. Ou quem sabe poderia ser uma dos três Deuses Supremos? Suponho que deveria perguntar. Se bem me lembro, cada um dos Deuses Supremos governa o tempo, o destino ou a vida…
— Vou mudar a pergunta. O que é que Shiro governa?
— Não governo nada, sabe?
— Hein?
Pensei que todos os deuses tivessem autoridade sobre algo, tendo o título de “Deus de OOO” ou algo do tipo, entretanto pelo que vejo, esse não é o caso… Nossa, poderiam levá-la embora, essa Deusa, quero dizer.
O que devo fazer, minha capacidade mental está próxima de zero agora… Também não tenho confiança para continuar essa conversa por mais tempo…
— Bom, nesse caso, vamos voltar para a série que mencionei antes…
Ah, espere. Acho que ainda posso continuar. Vou continuar nossa conversa, então, por favor, não traga esse tópico de volta.
— Os humanos realmente anseiam por um poder tão grande?
— Hã?
Esperava que a conversa voltasse para a revelação da minha história negra, todavia o que Shiro me fez foi uma pergunta.
Ainda não havia inflexão em sua voz, e sua expressão seguia sem qualquer sinal de mudança… Mas, por algum motivo, esta soou como uma dúvida sincera a respeito, ao contrário de antes.
— …
Talvez seja por essa razão que não fui capaz de lhe dar uma resposta imediata. Se os humanos anseiam ou não por um grande poder… Essa pode ser uma pergunta que Shiro pode fazer como uma deusa que nasceu com grande poder.
Como devo responder? Não, como pode ler minha mente de qualquer maneira, não há sentido em tentar inventar uma fachada falsa. Nesse caso devo apenas dizer o que penso…
— Acho que ansiamos. Grande poder, sabedoria incrível, riqueza e prestígio… Houve muitas vezes em que eu mesmo ansiava por tudo isso.
— Bem, vou concedê-los a você.
Tradução: Shuraragi
Revisão: Pride
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