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Como um Herói Realista Reconstruiu o Reino – Vol. 03 – Cap. 08 – Crime e Castigo

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Início do 11° mês, 1.546° ano, Calendário Continental – Meia-Noite

Aconteceu no domínio de certo nobre dentro do Reino de Elfrieden.

No feudo do nobre importante que era o lorde daquele domínio, doze figuras sombrias realizavam um encontro secreto em meio à escuridão.

— O que acham dessas invocações? — perguntou um deles.

— De todos os nobres locais, nossas quatorze famílias foram convocadas. O reino provavelmente… nos pegou.

— Também surgiram relatos de cães de robe preto farejando ao nosso redor.

— Então, a intenção desta convocação é…

— Para dar um exemplo aos outros, sem dúvidas…

— Para dar um exemplo? Isso não é uma armadilha? — questionou alguém em uma voz histérica.

Outro riu secamente.

— Heh heh heh. Ao contrário dos nobres que se envolveram com corrupção, não fomos pegos fazendo nada. Sem nenhum crime pelo qual nos condenar, aquele rei e o do robe preto não podem nos levar à justiça.

— Entendo… É por isso que ele está dando um exemplo aos outros.

— De fato — concordou alguém. — Para nos manter na linha, fazendo pensarmos: “Amanhã pode ser eu”.

— Dois dos três duques caíram e os nobres que não participaram da última guerra perderam influência. Se ele puder só nos manter quietos, não haverá mais nada para impedir aquele rei.

— Hmph… Tudo conforme planejado pelo rei — disse um deles. — Ou foi o do robe preto?

— Não importa quem foi. Mas, se olharmos de outra perspectiva, podemos dizer que isso é o melhor que o rei poderia fazer contra nós.

— Heh heh heh, você está certo — riu outro. Ele acrescentou, revelando um sorriso de escárnio: — É por isso que, por enquanto, devemos nos calar. Devemos agir de uma forma que não irrite aquele rei, que não dê motivos para que nos puna. Não, dependendo, devemos inclusive cooperar com o que o rei faz.

— Isso me irrita — disse outro, irado.

— Não importa… Duvido que isso dure muito — respondeu o zombador. — Assim que todos os obstáculos forem removidos, tenho certeza de que o rei avançará com políticas revolucionárias em um ritmo ainda mais rápido do que antes. A reforma executada muito rapidamente criará resistência. Só precisamos apoiar essas pessoas pelas sombras. Quando mais deles forem executados, mais aquele rei será visto como tirano, e isso só irá gerar mais resistência.

Os outros homens concordaram, impressionados com essas palavras.

— Entendo. Então ele não vai aguentar muito tempo.

— De fato. Quando chegar a hora, vamos tirar o rei do poder e colocar alguém mais maleável no trono.

— Quando isso for realizado, podemos voltar as coisas a como eram sob o reinado do Rei Albert.

— Por enquanto, o momento está do lado daquele rei. Não devemos ser apanhados por isso. Enquanto esperamos, devemos fazer o que o rei exige. Mas, no devido momento…

Os homens riram sombriamente.

Então um deles fez uma pergunta:

— O que fazemos com as casas de Jabana e Sarraceno? Os chefes não mudaram?

— Deixe eles. Se desagradam ao rei e não podem mais manter as próprias casas, isso é problema deles, não é algo com que devamos nos envolver.

— É claro. Agora, cavalheiros, peço que todos sigam o plano que acabamos de firmar.

— Sim. Para retomar nossa era.

— Para retomar nossa era.

Porém, não perceberam que havia um observador na escuridão.

Era uma tarde ensolarada. Eu estava mais uma vez ajudando Souma com seu trabalho administrativo.

— Certo, Liscia — disse Souma. — Entregue esses documentos para Hakuya por mim.

— Entendido.

Pegando os documentos de Souma, fui saindo do escritório, até que…

— Liscia! — Souma me chamou.

Imaginando o que poderia ser, me virei. Ele parecia estar tentando dizer algo, mas não estava conseguindo. Ou estava tentando me dizer algo e não conseguia encontrar as palavras certas, ou estava abrindo a boca para falar e hesitando.

— O que é? — perguntei.

— Ah…! Não, hm… não é nada.

— Tá… Bem, então estou indo.

Deixei Souma para trás e saí do escritório de assuntos governamentais. Quando fechei a porta, apesar dos pesares, suspirei.

Souma provavelmente se sentia obrigado a me dizer algo graças ao que aconteceu com o Duque Carmine.

Nossa… Não é algo pelo que Souma devesse se sentir responsável…

Mesmo quando me disseram que o Duque Carmine cometeu suicídio na masmorra, não perdi a compostura. Aquele homem que respeitei como um pai e professor estava morto, mas eu me sentia estranhamente calma. Isso me surpreendeu.

Não que eu não estivesse triste. Na verdade, senti como se meu coração tivesse sido despedaçado. Mas, ainda assim, fui capaz de agir como sempre. Com certeza era… porque tive uma espécie de premonição de que isso aconteceria. Que o Duque Carmine que eu conhecia escolheria o caminho da ruína, levando consigo toda a escuridão que infestava este país. E que Souma aceitaria a sua determinação em fazer isso.

Georg Carmine e Souma Kazuya.

Georg Carmine era um grande homem por quem eu tinha muita estima. Ele era forte e nobre, um guerreiro que resumia tudo que eu deveria aspirar a ser. Eu o respeitava e achava que seria como ele.

E, quanto a Souma… foi ele o homem que decidi, por vontade própria, apoiar.

Eu tinha vivido uma vida totalmente desligada de amor e romance, então não tinha certeza do que sentia por Souma. Como membro da casa real, nunca tive grandes expectativas de como seria meu casamento.

Mas quando vi o sorriso radiante de Aisha quando ela se tornou a segunda noiva dele, ou o sorriso de Juna quando ele disse aquelas palavras, “Eu juro, vou tomá-la como minha esposa”, senti um pouco de dor no peito.

Eu já sabia… Provavelmente era esse tipo de sentimento. Eu tinha uma opinião forte o suficiente a respeito de Souma para ter esse tipo de emoção.

Isso era algo que dois homens importantes para mim haviam decidido. Mesmo que fosse triste, se fosse doloroso, eu tinha que aceitar, ou estaria zombando dessa decisão. Decidi acreditar na decisão deles.

Foi por isso que, quando soube da morte do Duque Carmine, não descontei minhas frustrações em Souma.

O Duque Carmine não gostaria de prejudicar o nosso relacionamento. Por isso, se eu ficasse bem ao lado de Souma, como de costume, seria uma homenagem a ele. Era assim que eu me sentia.

Eu continuaria acreditando em Souma. Não importa qual decisão ele tomasse, eu aceitaria e ficaria ao seu lado.

Era o dia do julgamento do Duque Vargas e Carla. Como amiga dela, meu desejo de poupar Carla continuou inalterado, mas independentemente da decisão que Souma tomasse, eu estava preparada para aceitá-la. Não importa a que conclusão trágica isso pudesse levar.

Mesmo assim…

Ei, Souma, pensei. Por que você está com uma expressão de dor no rosto?

Uma estranha atmosfera caiu sobre o grande salão do Castelo Parnam.

Este era o lugar onde a sentença de Castor e Carla estava prestes a ser proferida.

Em resposta aos apelos da Duquesa Walter, que havia contribuído muito para o recente esforço de guerra, Souma assumiu o direito de julgá-los nos tribunais, e faria isso pessoalmente. Inserir-se nos assuntos das cortes não era um ato louvável para um rei, mas a Duquesa Walter foi longe ao ponto de renunciar todas as recompensas por seus serviços para fazer esse pedido, então ele foi capaz de fazer um esforço.

Neste momento, Souma poderia julgar os dois pessoalmente.

As pessoas estavam posicionadas mais ou menos onde estariam na sala de audiência.

Souma estava sentado mais alto do que os outros, usando uma cadeira que, embora não fosse o trono, ainda era bastante impressionante, com Aisha e eu de cada um de seus lados. A posição de Aisha como guarda-costas não era mais diagonalmente atrás dele, mas logo ao seu lado, uma mudança efetuada para refletir sua nova posição como candidata a rainha. Isso inevitavelmente significava que ela estava no centro das atenções de todos, então parecia tensa.

Olhando para o chão, estavam o antigo General da Força Aérea, Castor Vargas, e sua filha, Carla, ambos ajoelhados e com as mãos amarradas nas costas. Os dois, talvez porque tivessem decidido aceitar o destino, estavam sentados eretos.

Entre eles estavam o Primeiro-Ministro Hakuya e a Duquesa Walter, um de frente para o outro. O papel de Hakuya era exigir que fossem processados por seus crimes, enquanto a Duquesa Walter deveria defender Castor e Carla. Em um julgamento normal, o promotor e a defesa discutiriam se um crime foi cometido, mas nesta ocasião os crimes já eram de conhecimento público.

Graças a isso, o trabalho de Hakuya era buscar punição pelos crimes deles, enquanto o trabalho de Excel era defender suas ações e buscar uma punição mais leviana. Se sua defesa fosse bem-sucedida, a punição seria aliviada e, se falhasse, enfrentariam a punição almejada por Hakuya. Portanto, não poderia haver nenhuma declaração de inocência.

Além disso, para observar este julgamento, havia uma grande mesa voltada para o lado com quatorze nobres sentados em uma única fila. Souma me disse que pediria a opinião deles durante o julgamento.

Disseram que a seleção foi aleatória, mas… foi mesmo? Os nobres pareciam sussurrar uns com os outros.

Não importa o que vá acontecer, não ficarei surpresa, pensei. Afinal, trata-se de um julgamento que foi idealizado por Souma.

Embora não houvesse muitos casos em que o rei tomava o direito de julgar nos tribunais, isso já havia acontecido. Entretanto, nesses casos, o rei normalmente dava um veredicto que não poderia ser contestado. Esse formato, em que o rei realizava um julgamento no qual seria o juiz, era inédito. Era uma forma de julgamento sem precedentes. Não pude prever nada que poderia acontecer.

 

 

— Pois bem, vamos dar início ao julgamento de Castor e Carla — declarou Souma em voz baixa.

Hakuya leu os crimes dos quais eles eram acusados.

— O Ex-General da Força Aérea e sua filha, Vossa Majestade, resistiram à sua autoridade e até ignoraram seu ultimato, voltando suas espadas contra o Exército Proibido. Neste caso aplica-se o crime de traição. Portanto, acredito que seja apropriado que suas terras e bens sejam apreendidos e que sejam sujeitados à pena de morte.

Claro que estava… Traição era um crime grave o suficiente para levar todos os parentes com até três graus de consanguinidade à pena de morte.

O número de pessoas afetadas estava sendo reduzido ao mínimo absoluto, já que o Duque Vargas acatou o conselho da Duquesa Walter e fez um rompimento formal de seus laços familiares. Além disso, em reconhecimento ao ilustre serviço da Duquesa Walter na guerra, foi decidido que o irmão mais novo de Carla, Carl, que havia sido renegado e deixado aos cuidados da Casa de Walter, herdaria a Casa de Vargas com apenas a Cidade Dragão Vermelho e a área circundante como seu feudo. A filha de Excel, que também era mãe de Carla e Carl, seria sua conselheira.

Quando Hakuya terminou de apresentar a punição que buscava, foi a vez de Excel defender os dois e pedir uma punição mais branda.

Em deliberações anteriores, a oferta da Duquesa Walter de “oferecer minha cabeça em troca de suas vidas, ou entregar o Ducado Walter, com exceção da Cidade Lagoon” já havia sido rejeitada. Arrancar a cabeça dela estava fora de questão, e se ele destruísse todos os três ducados, isso colocaria o resto dos nobres em guarda contra Souma.

— Castor e Carla se rebelarem contra Sua Majestade foi tolice — disse Excel. — Porém, eles com certeza não o fizeram na tentativa de usurpar a sua posição. Foi sua lealdade ao rei anterior, Sir Albert, e amizade com o General do Exército, Georg Carmine, que se desviaram. Claro, o trono foi formalmente cedido por Sir Albert, e é impensável que algum de seus vassalos tenha dúvidas a respeito disso.

“No entanto, a mudança repentina de governantes confundiu não apenas Castor, como muitas outras pessoas. Carla apenas seguiu Castor, sendo sua filha. Nenhum dos dois tinha ambições próprias. Felizmente, não houve qualquer vítima entre seus súditos ou no Exército Proibido durante a batalha na Cidade Dragão Vermelho. Não poderia poupar suas vidas?”

Curvando-se, a Duquesa Walter procurou reduzir a gravidade dos crimes deles.

Souma só ficou lá, ouvindo ela falar.

Ele estava tão inexpressivo que era impossível ler, por sua expressão, o que poderia estar pensando. Acho que, provavelmente, estava suprimindo suas expressões para que não transparecessem.

Tendo ouvido os argumentos da acusação e da defesa, Souma abriu a boca.

— Castor. Você tem algo a dizer em sua defesa?

— Não — disse o Duque Vargas com firmeza. — Não há necessidade de um comandante derrotado falar. Por favor, arranque esta cabeça dos meus ombros.

— Entendo…

— Só uma coisa — disse o Duque Vargas. — Fui eu quem começou a guerra. Carla apenas seguiu ordens. Aceitarei o castigo dela também. Não me importo se você me torturar ou me humilhar em público. Mas, por favor, não pode poupar a vida de Carla?

Ainda amarrado, o Duque Vargas se curvou de modo que sua cabeça quase tocou o solo.

Vendo seu pai orgulhoso fazer isso, Carla arregalou os olhos de surpresa.

— Pai!

Souma, entretanto, soltou um suspiro, sua expressão permanecendo impassível.

— Ouvi dizer que quem liderou a Força Aérea naquela batalha foi Carla. Não posso deixar esse crime passar impune, posso? Você devia saber que isso poderia acontecer desde quando se levantou para uma rebelião.

— Urgh… — O Duque Vargas mordeu o lábio. Ele, entretanto, não disse mais nada.

Desta vez, Souma olhou para Carla.

— Carla. Você tem algo a dizer em sua defesa?

— Não… — Ela debilmente balançou a cabeça.

— Isso é tudo? Você não tem mais nada a dizer?

— Nesse caso, há uma coisa. Peço desculpas por minha falta de sabedoria. Lis… A princesa tentou fazer a mediação entre nós, mas ainda assim nos recusamos a escutar. — Com essas palavras, Carla baixou a cabeça.

Enquanto ela estava na prisão, disse que não queria se tornar um fardo nos fazendo interceder por ela. Provavelmente continuava se sentindo da mesma forma.

— Você não vai implorar por perdão? — perguntou Souma.

— Não vou. Julgue-me como achar melhor.

— Entendo…

Souma desviou o olhar dos dois e disse aos nobres sentados mais atrás:

— Agora, eu gostaria de ouvir o que vocês têm a dizer. Essas pessoas, em sua negligência, ergueram-se em rebelião contra mim, o atual rei. Qual vocês acham que é o julgamento apropriado para esses tolos? Gostaria muito de ouvir suas opiniões, e não precisam se conter.

Souma disse isso com um olhar que, até aos meus olhos, parecia um pouco assustador. Por um momento, algo me pareceu estranho. Do jeito como ele disse, foi como se já tivesse decidido. Embora dissesse que queria ouvir as opiniões, era como se dissesse: “Não posso imaginar que algum de vocês se atreveria a se opor à execução desses traidores, não é?” a fim de intimidá-los. Era como se estivesse agindo para constranger os nobres que assistiam ao julgamento…

Normalmente, Souma ouvia qualquer opinião, implementando-a no caso de achar adequada, mas o que estava fazendo neste momento era o exato oposto.

Quando levei isso em consideração e olhei para os nobres, eles eram todos de casas com rumores sombrios a seu respeito, ou de casas que haviam repetidamente se recusado a se envolver com crises que apareciam. Será que Souma pretendia usar Carla e seu pai para dar um exemplo e forçar essas pessoas a jurar lealdade a ele?

Estava exibindo seu poder e dizendo: “Se não querem que isso aconteça com vocês, obedeçam.” Foi essa a impressão que eu tive.

Então, um dos nobres se levantou e ergueu a voz.

— Vossa Majestade! Quando você fala assim, parece que a punição deles já está decidida!

O orador era um jovem com o rosto másculo. Ele devia ter mais ou menos a mesma idade de Halbert. Mas não tinha a mesma aspereza de Halbert. Parecia ser um jovem sério e bem-humorado.

— Quem é essa pessoa? — perguntou Souma.

— É o chefe da Casa dos Sarracenos, Piltory Sarraceno — disse Hakuya.

Piltory disse:

— Entendo que este seja um lugar para determinar o peso do crime deles. Se você fizer isso, forçando sua vontade sobre o resto de nós, então este julgamento não terá propósito!

— Ga ha ha! Muito bem, jovem Sarraceno! — disse outro dos nobres, levantando-se. Com o cabelo acinzentado penteado para trás e uma barba densa da mesma cor do cabelo, era um homem grande e musculoso que começava a mostrar os sinais da velhice.

Hakuya semicerrou os olhos, chamando o nome daquela pessoa.

— O chefe da Casa de Jabana, Sir Owen Jabana.

— Ó Primeiro-Ministro do Robe Preto — respondeu o homem. — O Duque Vargas ali defendeu este país por mais de cem anos, ou seja, por mais tempo do que eu vivi. Ele pode não ter maturidade, mas duvido que seus sentimentos em relação a este país tenham mudado. Ele se levantou contra Sua Majestade não por ganância pessoal, mas por estar preparado para morrer por sua amizade com Georg Carmine.

— Sugere que a traição dele não poderia ser evitada porque foi feita em nome da amizade? — Hakuya olhou feio para ele.

— Não, não — disse Owen, balançando a cabeça. — Não é isso que estou dizendo. O trono havia sido formalmente passado para Sua Majestade, Rei Souma, então só posso dizer que o Duque Vargas agiu precipitadamente. Não é um crime que possa ser perdoado. No entanto, o Duque Vargas foi destituído de sua posição, sua fama, suas terras e seus bens. Não é, talvez, exagero demais tirar, além disso tudo, a vida dele e de sua filha?

— “Perdoe o traidor”, é isso que você está dizendo?

— Por mais velho que eu seja, acho que seria lamentável se não o fizesse — disse Owen. — O Duque Vargas é uma pessoa que poderia comandar tropas por mais duzentos, trezentos anos. Há alguém neste país que poderia liderar a Força Aérea tão bem quanto ele?

Talvez encorajado pelas palavras de Owen, Piltory voltou a argumentar vigorosamente:

— Senhor! Você mesmo disse: “Se tiverem um talento, eu o colocarei em uso”, não foi?! Vai abrir mão de um talento raro como o dele?! Não posso acreditar que o Duque Vargas, um homem que mostrou suas presas para você por ter confiado em um amigo, seja de alguma forma inferior a nós, nobres, que fomos oportunistas e nos recusamos a tomar um partido! Imploro, faça o que a Duquesa Walter disse e abrande a sentença!

Depois de ouvir essas palavras, Souma fechou os olhos por um momento, e então… deu a ordem.

— Leve-os…

Em um instante, os soldados cercaram os dois e os removeram do salão. Owen silenciosamente obedeceu os soldados com uma expressão desapontada, enquanto, em contraste, Piltory continuou gritando: “Senhor! Por favor, reconsidere!”, mesmo enquanto estava sendo escoltado para o lado de fora.

Assim que foram levados, um silêncio desagradável caiu sobre o salão. Todo mundo prendeu a respiração, incapaz de dizer qualquer coisa, até que Souma quebrou o silêncio.

— Alguma outra opinião?

As opiniões dos demais nobres eram todas algumas variações de “sentenciar os dois à morte.”

— Lei é lei.

— Se deixar isso passar, será um péssimo exemplo para os outros vassalos.

— Qualquer idiota que se oponha a Sua Majestade seria inútil.

E assim foi… Embora o que estivessem dizendo parecesse razoável, estava claro que estavam pensando: “Não queremos desagradar o rei igual aqueles dois.”

Eu… estava com dificuldades para entender isso. É verdade que os nobres que permaneceram temiam Souma e teriam muita dificuldade em conspirar contra ele. Porém, ao comparar os dois expulsos com os doze que ficaram, tive que questionar qual grupo realmente traria mais benefício para Souma e para o país.

Não… Não duvide dele. Decidi acreditar no Souma, não foi?

Belisquei as minhas coxas. Enquanto tentava desesperadamente suprimir meu conflito interno, ouvi Souma sussurrar:

— Isso é algo… que precisa ser feito.

Souma?

— Entendo suas posições. — Ele se levantou e ergueu a mão direita bem alto.

Ao ver esse gesto, a Duquesa Walter arregalou os olhos, os nobres prenderam a respiração e Castor e Carla baixaram a cabeça, resignados.

Souma cortou o ar com a mão ao dar uma ordem rápida.

— Façam.

No instante seguinte, houve o som de lâminas cortando o ar e um jato de sangue. E então…

Doze cabeças caíram no chão…

O livro a que me referi ao decidir como deveria agir como rei foi O Príncipe.

O Príncipe de Maquiavel era chamado de “o livro do diabo” e, por centenas de anos após ser lançado, foi atacado pela igreja cristã. As partes que mais se destacavam eram o “Capítulo VIII – Sobre Aqueles que Obtiveram um Principado por Maldade” e o “Capítulo XVII – Sobre Crueldade e Clemência, e Se é Melhor Ser Amado do Que Temido.”

O Capítulo VIII tinha como tema: “Embora um governante bom e honesto possa perder seu país, aquele que conquistou seu estado por meios vis e traiçoeiros pode, a partir de então, viver o resto de sua vida em paz, sem enfrentar a revolta de seu povo.” Nele, Maquiavel disse: “Acredito que isso decorre de crueldade sendo mal ou adequadamente usada.”

Além disso, no Capítulo XVII, ele argumentou que os homens são criaturas egoístas e, se solicitados a fazer mal a uma de duas pessoas, escolheriam prejudicar uma pessoa que amam a uma que temem. Isso significava que “é muito mais seguro ser temido do que ser amado.”

Ele também disse: “Quando um príncipe está com seu exército, é absolutamente necessário que desconsidere a reputação de crueldade”, observando que “Aníbal de Cartago1Aníbal Barca​, conhecido também apenas por Aníbal, foi um general e estadista cartaginês. É considerado um dos maiores estrategas militares da história. A vida de Aníbal decorreu no conflituoso período em que Roma estabelecia a sua supremacia na bacia mediterrânica, superando outras potências. não enfrentou dissensão entre suas tropas ou contra si mesmo, seja na vitória ou na derrota. Isso surgiu de nada mais do que sua crueldade desumana.”

A igreja cristã, que pregava o amor, atacou esses trechos, dizendo: “Qual é o significado disso? Recomendar que os príncipes, que deveriam governar pela virtude, se envolvam em atos de crueldade!” Isso os irritou e O Príncipe foi banido.

Então, em parte por causa da reputação estabelecida como o livro do diabo, seu conteúdo não foi levado em consideração, com as declarações extremas recebendo todo o foco. Chegou a um ponto em que interpretações errôneas como “O Príncipe aprova o uso da crueldade” ou “O Príncipe diz para massacrar todos que apresentam oposição” não foram contestadas. Também passou por apelos ocasionais para reavaliar essa tendência.

No entanto, o que quero firmemente dizer é: Maquiavel não entrou em detalhes sobre a crueldade.

No Capítulo VIII, ele disse: “Um usurpador deve examinar todas as crueldades necessárias de perto, e cometê-las todas de uma só vez, para não ter que repeti-las.” Mas quando se trata do conteúdo, listou apenas exemplos históricos, e em momento algum Maquiavel disse algo como “Faça assim!”

O mesmo se repetia no Capítulo XVII. Ele creditou os feitos maravilhosos de Aníbal à sua crueldade desumana, mas não elaborou o que era crueldade. Agora, o que eram essas crueldades que Maquiavel disse que deveriam ser feitas de uma vez, ou a crueldade que era o fardo que um príncipe deveria suportar?

Primeiro, Maquiavel disse no Capítulo XVII que “Um príncipe deve inspirar medo de tal forma que evite ódio”, e observou que, para evitar ser alvo de ódio, “Ele deve se abster da propriedade de seus cidadãos e súditos e de suas mulheres.” Então, na mesma seção, disse: “Quando necessário proceder contra a vida de alguém, deve fazê-lo com a devida justificativa e por causa manifesta.”

Isso poderia ser reformulado como: “Mesmo que um príncipe tenha uma causa justa, não deve tocar nas terras, bens ou mulheres de seu súdito, e matar só é permitido com uma causa adequada. (O que quer dizer que matar sem uma causa adequada não é permitido.)”

Em outras palavras, quando Maquiavel falou sobre o “uso das crueldades”, ele se limitou a “matar aqueles por quem você tem justa causa.” Portanto, até que ponto essas mortes justificáveis podem ser permitidas? Ele estava dizendo, conforme condenado pela igreja, que deveriam “matar todos os inimigos”?

Estou bem ciente de que as opiniões estão divididas nesse ponto, mas acredito que a resposta seja “Não.”

Isso porque, no Capítulo XX de O Príncipe, o próprio Maquiavel disse o seguinte:

“Príncipes, especialmente os novos, encontram mais fidelidade e ajuda naqueles homens que no início de seu governo eram indignos de confiança do que entre aqueles que eram confiáveis desde o início.”

Com aqueles que podem ter sido hostis no início, se precisassem de ajuda para se sustentar, poderiam ser facilmente conquistados. Uma vez conquistados, trabalhariam desesperadamente para dissipar a má impressão deixada, e por isso eram muito mais úteis do que aqueles que, não tendo se oposto ao novo príncipe no princípio, viviam em segurança.

Para um exemplo na história japonesa, o feroz general que serviu sob Oda Nobunaga, Shibata Katsuie2Shibata Katsuie ou Gonroku foi um samurai japonês e comandante militar durante o período Sengoku. Ele serviu Oda Nobunaga como um de seus generais de confiança., deve servir como um bom exemplo.

Quando o irmão mais novo de Nobunaga se rebelou contra ele, Katsuie ficou do lado do irmão mais novo, mas depois se rendeu e se tornou um vassalo. A partir daí, Katsuie prestou serviços distintos a Nobunaga e tornou-se seu principal retentor. Entretanto, se seus esforços tivessem sido considerados insuficientes, poderia ter sido banido como Hayashi Hidesada3 Hayashi Hidesada era um samurai japonês e retentor do clã Oda, que viveu durante o período Sengoku. Ele também era conhecido como Michikatsu. Seu título na corte era Sado no Kami., que se rendeu com ele. Isso devia ser parte do motivo pelo qual Katsuie trabalhou com tanto desespero.

Agora, voltando ao assunto, o que Maquiavel quis dizer quando falou em “crueldade” não era “Certifique-se de matar todos que se opõem a você” ou qualquer coisa do tipo.

Portanto, o que exatamente ele quis dizer?

Para responder a isso, devemos olhar para os exemplos históricos que Maquiavel usou de “crueldades sendo bem usadas.”

Quando Siracusa4Siracusa é uma cidade na costa jónica da Sicília, na Itália. É conhecida pelas ruínas antigas. foi atacada pelos Cartagineses, Agátocles5Agátocles de Siracusa foi um tirano de Siracusa e foi rei da Sicília. enganou e matou os senadores e pessoas influentes e, depois de solidificar seu próprio poder, rechaçou o ataque cartaginês.

A fim de se apoderar do governo de sua cidade natal de Fermo, Oliverotto6Oliverotto Euffreducci, conhecido como Oliverotto de Fermo, foi um condottiero italiano e senhor de Fermo durante o pontificado de Alexandre VI. Sua carreira é descrita no Il Principe, de Niccolò Machiavelli. enganou e matou seu tio, que era seu patrono, junto com os cidadãos influentes, então manteve Fermo por apenas um ano.

Quanto ao homem que Maquiavel considerou seu príncipe ideal, César Bórgia7César Bórgia, foi um príncipe, cardeal e nobre italiano da Renascença europeia.Era filho de Rodrigo Bórgia, eleito Papa Alexandre VI em 1492, com Vannozza dei Cattanei., ele assassinou aqueles com quem se reconciliou e solidificou seu poder. Entre os que matou estava o já mencionado Oliverotto.

Maquiavel aprovou essas ações. E o que podemos ver com esses exemplos é que o alvo das crueldades eram aliados dentro de seu próprio campo.

Os senadores, que poderiam ter sido aliados como membros do mesmo campo, teriam atrapalhado as políticas.

O pai que impedia alguém de se tornar um príncipe.

E, por fim, aqueles que se reconciliaram e se tornaram seus aliados, mas em quem não se podia confiar que não se voltariam contra eles.

Esses tipos de aliados problemáticos, ou para dar mais ênfase, inimigos em potencial dentro do próprio campo, eram o alvo das crueldades de Maquiavel.

O mesmo pode ser dito da “crueldade” no Capítulo XVII.

Aníbal era temido por seus homens devido à sua crueldade desumana, mas se formos julgar a qualidade dessa “crueldade”, olhando para o exemplo contrastante que ele dá de Cipião8Públio Cornélio Cipião Africano, mais conhecido apenas como Cipião Africano, foi um general, estadista e político romano da família dos Cipiões da gente Cornélia da República Romana eleito cônsul por duas vezes, em 205 e 194 a.C., com Públio Licínio Crasso Dives e Tibério Semprônio Longo respectivamente., o que ele quer dizer começa a transparecer. Cipião era um grande general, mas seus homens o traíram e o povo sob seu governo se rebelou contra ele. A razão era que sua tolerância excessiva o impedia de punir seus seguidores quando se envolviam em abusos.

Em suma, Maquiavel dizia que Aníbal, que era o oposto de Cipião, era capaz de condenar seus aliados da devida forma, o que o tornava temido por aqueles que serviam sob seu comando e, independentemente de ter ganhado ou perdido, nunca o traíram.

Se pensarmos no alvo para o “uso adequado de crueldades” de Maquiavel como sendo aliados que podem no futuro se tornar inimigos, junto com sua outra afirmação em O Príncipe de que quando estados vizinhos estão em guerra, deve indicar claramente de que lado está, porque se tentar permanecer neutro, geralmente falhará, podemos começar a ver quais eram os pensamentos subjacentes de Maquiavel.

Basicamente…

— Não confie nos oportunistas que se juntam ao lado que está ganhando.

É isso…

Maquiavel havia servido como diplomata em uma época em que a Itália era cheia de intrigas e traição.

Devia ter visto inúmeros casos em que as coisas foram varridas para debaixo do tapete, já que alguém não queria dar muita importância a elas, apenas para ver aqueles cujas transgressões haviam sido esquecidas se tornando uma grande fonte de problemas. Por isso ele disse que, mesmo que fosse considerada “cruel”, a fonte da doença precisava ser arrancada pela raiz.

Foi por isso que mandei decapitar os doze nobres.

Mais de dez homens vestidos de preto estavam atrás dos doze nobres decapitados. Seus rostos estavam cobertos por um pano preto e usavam roupas pretas que pareciam roupas de ninja. Em suas mãos seguravam espadas ensanguentadas, deixando claro que foram eles que decapitaram os nobres.

A repentina intrusão seguida por assassinato fez todos os presentes engolirem em seco. Minha expressão permaneceu inalterada. A de Hakuya também não mudou. Éramos os únicos ali.

— Huh?! Souma! — exclamou Liscia.

— Senhor! Seus patifes, quem são vocês?! — gemeu Aisha.

Liscia e Aisha sacaram suas lâminas e avançaram para me proteger, mas eu só coloquei a mão em cada um de seus ombros.

— Está tudo bem. São meus subordinados.

Liscia murmurou:

— Seus subordinados… Huh…?

Enquanto ela parecia confusa, um dos homens de preto se aproximou. Enquanto todos os outros homens usavam roupas pretas indescritíveis, este único usava uma armadura preta laquê. Ele tinha quase dois metros de altura, com uma construção muscular que era aparente até mesmo através de sua armadura. Do pescoço para baixo, parecia uma espécie de cavaleiro das trevas, mas seu rosto estava coberto com uma máscara negra de tigre. O homem com a máscara de tigre se ajoelhou diante de mim, curvando a cabeça.

— Mestre. A missão está completa.

O homem com a máscara de tigre tinha uma voz baixa que combinava com sua aparência.

Liscia inalou em surpresa.

— Essa vo… Ai!

Liscia começou a dizer algo, mas agarrei seu ombro com força. Ela olhou para mim, surpresa, mas quando balancei a minha cabeça… parecia que ela tinha descoberto o que estava acontecendo. Ela silenciosamente embainhou sua espada.

Quando olhei para Excel, ela parecia também ter compreendido a situação. Havia um pouco de raiva não totalmente escondida em seu sorriso.

“Depois… vou insistir em uma explicação adequada para isso tudo.” Ela parecia estar dizendo essas palavras, mas em silêncio. Quando uma beldade como ela ficava com raiva, era algo incrível de se ver.

Senti um arrepio correr pela minha espinha enquanto tocava no ombro de Aisha, que ainda não havia baixado a guarda.

— Aisha, guarde sua espada também.

— M-Mas…

— O nome dele é Kagetora… “tigre das sombras.” Ele é o líder da agência de inteligência, os Gatos Pretos, que se reportam diretamente a mim.

Quando falei isso, os agentes dos Gatos Pretos ergueram suas espadas ao mesmo tempo.

Eu tinha sido pego pelo serviço secreto do Império em Van, a capital da Amidônia, então organizei esta unidade sob meu comando direto para se concentrar em operações de inteligência.

Para ser mais preciso, aumentei muito o número de agentes que Hakuya já tinha, refinei suas habilidades, consegui Kagetora com suas habilidades soberbas como comandante para a liderança e, em seguida, os reorganizei em uma unidade sob meu comando direto.

 

 

Eram uma unidade com muitos mistérios. As identidades dos membros eram desconhecidas. Também não estava claro por que, embora a unidade só tivesse sido há pouco tempo formalmente organizada, poderiam agir todos ao mesmo tempo.

O maior mistério era a identidade de Kagetora. A maneira como comandava sua unidade como se fossem seus próprios braços e pernas… era quase como se fosse algum tipo de general veterano, mas havia alguém assim neste país?

Quem poderia ser? Ninguém sabia sua verdadeira identidade.

— Ei, Souma… — disse Liscia lentamente. — Sobre Kagetora…

— Ninguém conhece sua verdadeira identidade. Entendeu?

— Ah, certo…

Liscia parecia não saber o que dizer, mas balançou a cabeça. Na mesma hora dei uma ordem para Kagetora e os Gatos Pretos.

— Assim que os corpos dos nobres forem eliminados, entrem em contato com as unidades do Exército Proibido que estão à espreita em torno de suas mansões. Eles devem se apressar para esconder as evidências. Se houver qualquer resistência, eliminem.

— Como desejar — disse Kagetora.

Os Gatos Pretos começaram a eliminar os corpos, partindo de imediato.

Kagetora olhou uma última vez para Liscia e saiu do grande salão. Depois que eles saíram, ela me lançou um olhar ligeiramente severo.

— Você vai me explicar isso tudo, certo…? — demandou ela.

— Eu sei — falei. — Mas não tenho certeza de por onde começar…

— Você talvez queira começar explicando por que matou os nobres.

— Bem, sim, essa tinha que ser a primeira pergunta… — falei.

Comecei a lentamente explicar minhas razões para esses assassinatos.

— Agora, quanto ao motivo pelo qual aqueles doze tiveram que morrer, eles também estavam ligados à Amidônia — falei. — Isso é algo que Hakuya e Georg confirmaram por meio de suas investigações independentes.

— Quer dizer que eram espiões da Amidônia? — perguntou Liscia.

Balancei a cabeça.

— Não é exatamente assim. Eu falei “também”, não? Eles estavam ligados à Amidônia, aos nobres corruptos, e também ao nosso lado.

— Hein? O que você quer dizer…

— Eram oportunistas — falei. — Ficavam do lado que estava ganhando.

Esses nobres sempre cooperaram com quem estava do lado vencedor, tudo para evitar problemas.

Quando o reino estava em declínio, tinham conexões secretas com o Principado da Amidônia. Quando a guerra civil estourou, apoiaram os nobres corruptos por baixo dos panos, enquanto permaneciam sem se envolverem. Sempre fomentaram o descontentamento enquanto garantiam, assim, sua própria segurança. Pensando apenas em seu próprio lucro e em autopreservação.

— Lucraram fornecendo suprimentos e pessoal para grupos de resistência e, se o lado vencedor fosse o outro, esmagariam seus aliados para ganhar aclamação para si mesmos — falei. — Se a suspeita recaísse sobre eles, fomentariam a rebelião em outro lugar, de modo a evitar que a investigação chegasse a eles. Parece que fizeram isso várias vezes sob o reinado de seu pai.

Tendo descoberto o que estava acontecendo nos bastidores durante o reinado de seu pai, Liscia ficou sem palavras.

— Não…

— Agora, o que os tornava perigosos é que nunca se rebelaram de forma direta — falei. — Quando a vantagem ficava do nosso lado, agiam quase como vassalos leais, então era difícil levá-los à justiça. Isso porque, quando as coisas corriam do nosso jeito, faziam o trabalho deles.

“Quanto mais confiante um governante está em sua habilidade de manter o poder, quanto mais tolerância ele tem, quanto mais deseja confiar em seus vassalos, mais cairá em uma armadilha dessas. ‘Se eu conseguir estabelecer uma administração estável, está tudo bem. Não preciso reduzir meu número de aliados’, pensaria ele.”

— Mas… você os matou, certo? — perguntou Liscia.

— Isso é porque não vejo minha lei sendo sempre estável — falei. — Na verdade, acho que algum dia serei forçado a acabar na encruzilhada do destino. Quando chegasse a hora, garanto que aqueles oportunistas me golpeariam pelas costas. Não quero que você, ou Aisha, ou Juna, ou qualquer outra pessoa de quem eu goste se machuque e então pense: “Se eu tivesse me livrado deles naquela época…” Se isso acontecesse, eu provavelmente ficaria louco. É por isso que, aqui e agora, decidi cortar o mal pela raiz.

Em O Príncipe, Maquiavel disse o seguinte: “Considero verdade que a Fortuna é o árbitro de metade de nossas ações, mas ela ainda nos deixa para a outra metade para dirigir, ou talvez um pouco menos.”

Neste mundo, a ascensão ou queda de uma pessoa é decidida pelo fato de suas ações serem adequadas à época em que vivem. Entretanto, isso só pode ser julgado por aqueles que vierem depois. Oda Nobunaga, Napoleão… Mesmo que fossem gênios em seu tempo, uma vez que os tempos não conviessem mais, seriam destruídos.

Maquiavel comparou a fortuna a um rio caudaloso.

Ele disse que, embora a mudança repentina da fortuna não possa ser interrompida, se alguém se preparar para essa mudança com antecedência, seu fluxo pode se tornar menos desenfreado e perigoso.

O importante era não ser otimista em relação à situação, mas ser resoluto e fazer o que fosse preciso, quando preciso.

A respeito disso, Maquiavel disse: “A fortuna é uma mulher, e se você quiser mantê-la sob controle, é preciso bater e maltratá-la”, ou seja, incomodaria qualquer feminista que ouvisse isso. Colocando sua escolha de palavras de lado, a fim de garantir que as raízes da calamidade não permanecessem, eu tinha dado a ordem de derrubar doze nobres.

Quando ouviu minha explicação, Liscia assentiu lentamente.

— Entendo o seu raciocínio, Souma. O que você vai fazer com as Casas dos Sarracenos e Jabana, aquelas que deixou passar?

— Permita-me explicar isso — disse Hakuya, dando um passo à frente. — As Casas dos Sarracenos e Jabana trabalharam ao lado dos outros doze sob as ordens de seus chefes anteriores, mas a conexão entre eles foi quebrada com suas mortes. O atual chefe da Casa dos Sarracenos, Sir Piltory, é um jovem excelente que se destaca tanto com a pena quanto com a espada, enquanto o chefe da Casa Jabana, Sir Owen, é um homem sóbrio e honesto com o sangue quente. Pode-se contar com eles para servir Sua Majestade sem duplicidade. Acredito que você pode ver isso pela forma como agiram enquanto eram conduzidos para fora do grande salão.

— Então você mostrou alguma discrição em relação a quem seria executado… — disse Liscia.

— Isso mesmo. — Hakuya acenou com a cabeça. — Os executados eram todos envolvidos em uma coisa ou outra. Agora estamos investigando suas mansões na capital, coletando evidências do que cada um deles fez. A punição pelo crime e a constatação de provas estão na ordem errada, algo que não é digno de elogios, mas peço que entendam.

Com isso dito, Hakuya baixou a cabeça.

Ele provavelmente estava tentando me apoiar. Ao dizer a ela que eu não tinha assassinado doze pessoas apenas por suspeitas, ele estava tentando evitar que isso afetasse meu relacionamento com Liscia.

Ela também parecia entender isso, então não insistiu mais no assunto.

— Certo, entendo os doze, mas e se os outros dois tivessem concordado com você, Souma? Também teria os eliminado?

Hakuya balançou a cabeça.

— Nesse caso, o plano seguiria com uma provocação minha. Porém, se eles tivessem tentado obter o favor de Sua Majestade, assim como as outras doze casas, não teríamos uso para eles.

— Você já tinha pensado até nisso… — Liscia olhou para mim, escandalizada.

Não, esse tipo de plano que envolve ler os caprichos do coração das pessoas é o departamento de Hakuya, pensei. Não tenho uma personalidade tão desagradável… Eu acho.

Ao me ver desviar os olhos, Liscia soltou um suspiro de resignação.

— Então, e quanto a Carla e o pai dela?

— Estou chegando lá… — Me aproximei para ficar na frente de Castor, ainda amarrado.

Tendo visto tudo o que tinha acabado de se desenrolar, ele parecia estupefato. A lâmina que esperava baixar em seu próprio pescoço baixou sobre outros. Não era de se admirar que estivesse tão confuso.

— Castor Vargas — falei. — Por você ter se recusado a atender ao meu ultimato, você é culpado por traição.

Castor baixou a cabeça.

— Entendo…

Ele então curvou a cabeça ainda mais do que antes, desta vez esfregando a testa contra o chão.

— E por isso, imploro. O crime é só meu. Então, por favor, poupe Carla.

— Não é você quem decide isso — falei friamente. — Este é o seu julgamento. Seu crime de traição está claro. Entretanto, como Piltory e Owen disseram antes, reconhecerei sua contribuição a este país nos mais de cem anos de serviço. Já tomei seu posto, suas terras, seus bens e até mesmo seu sobrenome. Portanto, vou poupar sua vida, e apenas a vida.

Virei para Excel, que estava observando em silêncio, vendo como as coisas se desdobravam.

— Castor ficará sob sua custódia. Entretanto, está proibido de entrar no antigo Ducado de Vargas, e também de entrar em contato com seu filho Carl, ou com a mãe do garoto, Accela. Excel, foi seu genro quem fez tudo isso, então você deve ficar de olho nele.

— Ah! Sim. Será como ordenado. — Quando me fez uma reverência adequada, havia lágrimas se formando nos olhos de Excel.

Quando ela ergueu o rosto, vi sua boca formar a palavra “Obrigada” para mim. Não demonstrei nenhuma reação, passando para Carla.

Mesmo que seu pai tivesse sido poupado, Carla continuava com uma expressão tranquila.

— Carla — falei —, você é culpada do mesmo crime. Além do mais, não tem o histórico distinto de Castor de ter protegido o país por cem anos. Fico triste em dizer isso, mas não vejo uma forma de amenizar a sua punição.

— Entendo… — disse ela calmamente.

— E-Espera! Então me mate! — exclamou Castor, esfregando o rosto contra o chão, desesperado. — Carla apontou a lâmina contra você por ordem minha! Então deixe meu histórico ser usado por ela…

— Levem-no.

Meus assistentes o arrastaram para fora da sala. Ele continuou gritando “Vou ficar no lugar dela!” até que estivesse fora da sala, mas eu não tinha obrigação de ouvi-lo.

Depois que as coisas ficaram mais calmas, continuei:

— Está claro que você cometeu o crime de traição. Porém, se eu deixar o mentor, Castor, viver, não seria bom matar sua filha. Portanto, pouparei sua vida, mas você viverá como escrava. Seus donos serão a família real, ou seja, Liscia e eu.

A segunda punição mais pesada neste mundo era o trabalho forçado como escravo condenado. Não existia prisão perpétua. Aqueles que se tornavam escravos condenados, a menos que recebessem anistia, seriam obrigados a fazer trabalhos forçados sem fim nas minas de carvão. No caso de Carla, porém, por eu ter decidido dar sua propriedade à família real, ela seria poupada das minas de carvão e seria mantida na casa real como uma serva que tinha que ser completamente submissa.

— Certo. — Carla aceitou meu pedido, balançando a cabeça debilmente.

Excel estava prestes a dizer algo, mas se conteve. Ela devia ter decidido que isso era ao menos melhor do que a morte. Hakuya fechou os olhos em silêncio, enquanto Aisha ficava perturbada com a atmosfera na sala. E, por fim, Liscia observou o que eu faria em silêncio, sua expressão imutável.

— Depois vou te dar mais instruções, mas, por enquanto, tenho uma ordem — falei.

— Como desejar…

Me aproximei de Carla, que estava de cabeça baixa, me agachei e sussurrei certa ordem, baixinho, para que só ela pudesse ouvir. Carla arregalou os olhos.

Quando Souma sussurrou a ordem, bem baixinho, duvidei de meus próprios ouvidos.

— Se precisar, me mate.

Quando ele viu meus olhos arregalados de surpresa, Souma me olhou com uma expressão séria no rosto.

— Agora não, claro. Se eu me tornar um tirano, quero que você me impeça. Com sua habilidade marcial, poderia me matar facilmente, certo?

Matá-lo caso se torne um tirano…?! Por que ele de repente me disse isso?!

Mantive minha voz baixa, perguntando:

— Por que você diria isso? E por que para mim, de todas as pessoas?!

— Porque Liscia e os outros podem não conseguir — sussurrou Souma, um sorriso perturbado em seu rosto. — Em algum momento, me vi cercado por muitas pessoas de quem gosto. Recentemente, até mesmo fiquei noivo de outra pessoa além de Liscia. Da Aisha ali.

Ele ficou noivo daquela elfa negra sem que eu soubesse?, pensei, atordoada. Liscia aceitou isso? Bem, conhecendo a personalidade dela, ela deve estar sendo pragmática a respeito disso…

— Bem… Parabéns? — sussurrei.

— Obrigado — sussurrou ele de volta. — Então, sabe, tenho cada vez mais gente de quem gosto. Isso, em si, é algo bom, mas quando penso no que aconteceria se, um dia, eu ficasse embriagado pelo poder e me tornasse um tirano… isso começaria a me assustar. Se algo assim acontecer, fico preocupado sobre Liscia e as outras conseguirem me impedir como deveriam, sabe?

— Liscia iria te parar — sussurrei. — Você conhece a personalidade direta dela.

— Ela iria? — respondeu ele, ainda sussurrando. — Claro, se eu começasse a me entregar a muita devassidão, ou começasse a massacrar o povo da cidade, ela me repreenderia por isso, mas e se eu tivesse uma boa justificativa, como desta vez? Expurgos individuais, por si só, não são um grande problema. Mas quando acontecem várias vezes, você eventualmente chega a um ponto sem retorno. Quando se trata disso, Liscia e os outros vão conseguir me abandonar?

Isso… Não, provavelmente não, percebi.

— Minha função não é dizer isso, mas… Liscia está perdidamente apaixonada por você — sussurrei. — Se você decair tanto assim, tenho certeza de que ela estará bem ao seu lado.

Liscia era uma garota muito séria e dedicada. Provavelmente, não importa o que acontecesse, seguiria Souma com lealdade até o amargo fim.

Souma balançou a cabeça.

— Eu sei, viu? Aisha está mais ou menos na mesma situação. Acha que Juna poderia fazer isso? Enfim, tem muita gente que tentaria sofrer ao meu lado. Não quero isso. Se houvesse uma revolução em resposta ao meu governo tirânico, não seria apenas eu que seria executado, mas Liscia e o resto também. Não quero que Liscia e as outras acabem como Maria Antonieta9Maria Antônia Josefa Joana de Habsburgo-Lorena foi uma arquiduquesa da Áustria e rainha consorte da França e Navarra..

Maria… quem?

Enquanto eu continuava com um ponto de interrogação pairando sobre minha cabeça, Souma sussurrou com um olhar sério:

— É por isso, Carla, antes que aqueles de quem eu gosto possam sofrer comigo, quero que você assuma o papel de acabar comigo.

— Agora sou uma escrava… — sussurrei. — Se eu matar meu mestre, a coleira vai me matar, sabe?

— Sim — sussurrou ele de volta. — Então, por favor, só faça isso se também estiver preparada para morrer. E, se eu conseguir passar a coroa para a próxima geração, irei libertá-la.

Este homem… ele diz coisas incríveis como se não fossem nada. Fiquei surpresa.

Souma me disse, se ele se tornasse um tirano, para eu me tornar a lâmina que o cortaria. Então, depois de matá-lo, eu morreria. Ao me manter ao seu lado como sua escrava, ele esperava me usar como um impedimento pessoal contra ele se tornar um tirano.

— Você realmente… não demonstra misericórdia — sussurrei.

— Só me seguro por aqueles que me importam — sussurrou ele de volta.

— Quis falar por você mesmo — sussurrei. — Embora eu suponha que o significado ainda tenha sido transmitido.

Eu tinha pensado a mesma coisa na batalha contra a Amidônia, mas este homem se tratava muito mal. Se ele não cuidasse melhor de si mesmo, causaria infinita preocupação para aqueles ao seu redor.

Liscia, você se apaixonou por um cara realmente problemático… pensei comigo mesma.

Isso mesmo. Para evitar que a vida amorosa da minha melhor amiga se deparasse com um futuro triste, decidi agir como seu impedimento.

Após ficar ereta, me curvei profundamente.

— Recebi seu pedido. Até que chegue o dia em que deverei agir, irei dar o meu melhor por você, rezando para que esse dia nunca chegue.

Souma balançou a cabeça, satisfeito com a minha resposta.

— Neste momento, não temos nenhum serviço destinado exclusivamente a uma escrava. Por enquanto, você irá se juntar à força das criadas… Mas… Bem… Uh, obtenha você mesma os detalhes com a criada chefe.

Quando ele me deu essa ordem, pareceu um tanto quanto hesitante. Imaginei o que estava acontecendo, então segui o olhar de Souma para me deparar com uma bela criada que parecia ter cerca de 20 anos, sorrindo.

Quando me perguntei o que havia com ela, percebi que Liscia estava olhando em minha direção, uma expressão de absoluta pena em seu rosto.

Ahn…?

Com o julgamento de Castor e minha amiga Carla encerrado, Souma, Aisha e eu estávamos voltando ao escritório de assuntos governamentais quando, de repente, ele tropeçou na nossa frente.

— Souma! — lamentei.

— Senhor! — gritou Aisha.

Quando Aisha e eu tentamos apoiá-lo, Souma colocou a mão na parede.

— Estou bem. Só cambaleei um pouco — disse, gesticulando para que parássemos com a sua mão livre.

— Mas… — falei.

— Está tudo bem — disse ele. — Eu gostaria de ficar sozinho por um tempo…

Depois, ele foi para o escritório de assuntos governamentais.

Pela visão que tive do perfil de seu rosto, ele parecia bem pálido e indisposto. Deixada sozinha no corredor, comecei a falar com Aisha, que também foi deixada para trás e ficou parada ali, atordoada.

— Há um momento ele estava como sempre — falei. — O que acha que aconteceu tão de repente?

— Também não tenho certeza — disse Aisha. — Mas…

— Mas?

— Ele parecia um soldado voltando da primeira batalha — disse ela, parecendo preocupada. — Como um… que acabou de matar pela primeira vez.

— Quer dizer que ele está se sentindo mal por ter matado os doze nobres? — perguntei.

Mas Souma fez aquilo por acreditar ser necessário, não? Nesse caso, ele não tinha nada do que se arrepender. Além do mais, Souma havia passado por sua primeira batalha na guerra contra o Principado da Amidônia. Ele derrotou o Príncipe Gaius VIII da Amidônia e após isso mandou executar os nobres corruptos. Não era a primeira vez dele.

Quando mencionei isso, Aisha balançou a cabeça.

— Isso é só especulação da minha parte, mas aquilo com Gaius foi um caso de “matar ou morrer”. Os nobres corruptos deixaram suas intenções de se rebelar bem claras. Entretanto, no caso daqueles doze, eles não representavam uma ameaça imediata à Sua Majestade. Mesmo sabendo que deixá-los vivos seria prejudicial, ele questiona se matá-los foi ou não a decisão correta. Em seu coração, talvez não consiga chegar a um acordo a respeito disso.

Aisha olhou para o escritório de assuntos governamentais, preocupada.

Ele não consegue chegar a um acordo a respeito disso… huh.

Sim… Achei que a interpretação de Aisha estava correta. Ouvi dizer que Souma era de um mundo pacífico. Fazia algum tempo que não aconteciam guerras por lá.

Por ter vindo de um mundo assim, ele sentia um ódio absoluto pela morte das pessoas. Mas não estava tão otimista a ponto de pensar que poderia resolver tudo sem sacrifícios. É por isso que as políticas que Souma adotava sempre se concentravam em minimizar os sacrifícios e, ao mesmo tempo, maximizar as recompensas.

Era um estado de espírito natural para o governante de uma nação. No entanto, no coração de Souma, ele não era tão insensível a ponto de aceitar até mesmo os sacrifícios mínimos.

— Ei, Aisha — falei. — O que você faz para apoiar um soldado assim?

— Bem… Nunca fiz parte do exército, então não sou especialista nesse tipo de coisa… mas costumo ouvir que é melhor fazê-los esquecer disso.

— Fazê-los esquecer disso? — repeti.

— Ouvi dizer que os oficiais superiores e os soldados veteranos os convidam para tomar vinho e chamam mulheres para ajudá-los a espairecer — disse Aisha. — É o tipo de coisa que só o tempo pode curar, então evitam que eles pensem muito no assunto e acabem colapsando.

Vinho ou outra coisa… hein, pensei comigo mesma. Nesse caso…

O julgamento começou ao meio-dia. E já estava definitivamente de noite.

Fiquei deitado sozinho em minha cama, o escritório de assuntos governamentais completamente escuro e com todas as luzes apagadas.

Eu tinha muito trabalho a fazer. Mas, só por este dia, pedi a Hakuya que me deixasse escapar de minhas obrigações. Eu simplesmente não sentia vontade de fazer nada. Hakuya entendeu isso. Eu só queria dormir. Mas, ao contrário do que eu queria, estava bem acordado.

Se usasse um pouco a cabeça, isso poderia ajudar, então decidi pensar sobre a execução ser justificada ou não.

Pensei que executar os doze nobres tinha sido o correto, examinando as coisas a longo prazo. Se eu os deixasse vivos, e se alguém acabasse ferido pela semente da calamidade que eles semeassem, eu tinha certeza de que me arrependeria. Mas, bem, agora estava desesperadamente segurando meu peito, tentando não me arrepender por tê-los matado.

“Todas as crueldades devem ser cometidas de uma só vez.”

“Um príncipe não precisa se preocupar com a reputação de crueldade.”

“Para evitar a destruição, é melhor escolher lutar.”

“Quando chegar a hora de sua morte, será tarde demais para arrependimentos.”

Repassei as ideias de Maquiavel inúmeras vezes na minha cabeça. Mas tudo que eu estava fazendo era procurar uma desculpa.

Se ia me arrepender de algo, preferia que tivesse escolhido um caminho que não machucasse aqueles de quem mais gostava. Achei que tinha me convencido disso antes de tomar a decisão, e fiquei ressentido com meu próprio coração por ainda hesitar, apesar de tudo.

Enquanto eu pensava, a porta de repente foi aberta. Virei minha cabeça para verificar, e lá estavam Liscia e Aisha.

Em trajes bem provocantes.

— Hein?! — Reagi em choque.

As duas estavam vestindo o que parecia ser um roupão de banho de tecido fino que só ia até um pouco acima dos joelhos.

Elas talvez não estivessem usando nada por baixo dos roupões, já que o decote começava por onde deveria estar a gola, e suas coxas nuas, saindo lá por baixo, também eram cativantes. À luz que entrava pelo corredor além da porta, suas silhuetas se acentuavam de forma provocante. Isso fazia com que a altura de Aisha e seu corpo bem torneado se destacassem ainda mais, enquanto o corpo bem equilibrado de Liscia também era lindo.

Foi um pouco demais para eu conseguir assimilar de uma vez, e fiquei algum tempo encarando, em transe.

Sério, se eu não estivesse me sentindo tão para baixo no momento, toda a minha razão poderia ter pulado pela janela. Entretanto, em meu atual estado de espírito, parecia ser tudo uma piada de puro mau gosto.

— O que vocês pensam que estão fazendo? — questionei.

Meu tom saiu tão assustador que até eu me assustei. Não, não era isso que eu deveria estar dizendo, e eu sabia disso. Era como se estivesse descontando minha frustração nelas.

Acalmei meu tom, o máximo possível, e me corrigi.

— Acho que pedi para vocês duas me darem algum tempo.

— Não podemos te deixar sozinho enquanto você está assim, podemos? — Liscia não deu atenção às minhas objeções, aproximando-se e sentando na beira da cama em que eu estava deitado.

Aisha também resmungou algo como “S-Sinto muito pela intrusão” e deu a volta para o lado oposto a Liscia, antes de se sentar educadamente.

Quer eu virasse a cabeça para a esquerda ou direita, veria o traseiro de uma linda garota. Tudo que pude fazer foi cobrir os olhos com um braço, olhando diretamente para cima.

— O que é isso…? O que vocês querem…?

— Isso, bem… acho que poderia dizer que queremos te ajudar a esquecer… — disse Liscia.

— Como é? — perguntei, incrédulo.

— Enfim! Pode fazer o que quiser conosco! — explodiu Liscia.

— É-É a minha primeira vez fazendo algo assim, então conto com você, Vossa Alteza! — gemeu Aisha.

“Pode fazer o que quiser conosco…”, “Conto com você”… o que essas duas estão dizendo?!

— Ouçam… Agora não estou no clima — falei.

— Ahh, se Madame Juna estivesse aqui conosco — disse Aisha, parecendo desapontada.

Não, Juna está ocupada passando pelo procedimento de transferência da Marinha para cá, certo? Suspirei… Ah, que seja. Tenho certeza de que estão fazendo isso porque estão preocupadas.

Enquanto eu pensava nisso, Liscia começou a ficar inquieta.

— Hm, Souma…

— Oi? — perguntei.

— Está um pouco frio, então podemos ficar debaixo das cobertas com você?

Ela está tremendo, hein… Bem, já está quase no inverno. Devem estar sentindo frio com essas roupas.

 

 

Antes que eu pudesse dizer que isso não seria problema, caso estivessem vestidas direito, as duas se apressaram para debaixo das cobertas. Era uma cama de solteiro, o que a tornava pequena para três pessoas. Inevitavelmente, as duas acabaram pressionadas contra mim. Perto o suficiente, pude sentir seus corações batendo.

— Uff — gemeu Liscia. — Isso é bom e quente, hein.

— De fato — concordou Aisha. — Assim eu posso até dormir.

— Este é meu quarto e escritório, sabe… — Só pude sorrir de forma irônica em resposta aos comentários delas. Mas, bem… estava realmente quente.

Minhas preocupações de antes pareciam estar derretendo. Isso mostrava o quão grande era o calor delas. Só por ter alguém ao meu lado, meu coração ficou mais leve.

Eu poderia me lembrar de que estava as protegendo. Que queria protegê-las.

— Vocês duas — falei.

— Hm? — disse Liscia.

— O que é? — perguntou Aisha.

— Obrigado.

Quando falei isso, as duas sorriram, cada uma de um lado meu.

Então, talvez porque estivéssemos cansados, nós três logo caímos no sono.

 


 

Tradução: Taipan

 

Revisão: Sonny Nascimento (Gifara)

 


 

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