Dark?

Como um Herói Realista Reconstruiu o Reino – Vol. 03 – Cap. 01.3 – Projeto Lorelei

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— Aquele rei, ele usou um truque realmente desagradável…

Em Nelva, uma cidade-fortaleza no sudoeste da Amidônia, alguém que se misturou aos espectadores para assistir à transmissão murmurou essas palavras. Essa pessoa usava uma capa com um capuz que cobria todo o seu corpo, tornando impossível identificar a sua expressão. A única coisa que poderia ser vista era que, em comparação com os demais ao redor desta pessoa, ela tinha um corpo pequeno e uma voz provavelmente feminina.

Um homem semelhantemente encapuzado, ao seu lado, fez uma pergunta:

— Um truque desagradável?

— Isso é nojento — disse a garota. — Afinal, ele está dando, de uma só vez, a todos, todas as coisas que meu velho deliberadamente tomou. Sem chances que meu irmão será reintegrado depois disso… Bem, para as pessoas, isso pode ser o melhor.

Ditas essas palavras, a garota encapuzada deu de ombros, como se acrescentando: “Minha nossa.”

O homem encapuzado ao seu lado olhou para ela, confuso.

— Hm, princesa, o que você está dizendo que Lorde Gaius tomou do povo?

— Liberdade, é isso, Sr. Colbert — disse a garota encapuzada.

Ela era a filha de Gaius VIII, Roroa Amidônia. O homem ao seu lado era o anterior Ministro das Finanças, Colbert.

Roroa apontou para o vídeo.

— Usando a Transmissão de Voz da Joia assim, com mulheres se vestindo como querem e homens loucos por garotas bonitas em plena luz do dia, nada disso seria permitido no principado de antes, certo? Isso porque nem o príncipe nem o povo queriam que a ideologia dos fracos se propagasse. Mas aquele rei, com esta transmissão, está mostrando que todas essas coisas são permitidas no reino.

— Em outras palavras… exibindo a “liberdade” — disse Colbert.

Roroa concordou com a cabeça.

— Isso mesmo. E é isso que torna tudo nojento. Liberdade “gratuita”. Isso não custa nada para Souma. Agora, se tentar tirá-la, apresentarão resistência. Mesmo se ele pegar o poder do Império e conseguir tomar Van de volta, vê meu irmão como sendo capaz de deixar que mantenham essa “liberdade”? Eu não… O governo dele será uma repetição do que meu velho exerceu. Haverá caos, não existem duas formas de fazer isso.

— Não.. quer dizer que Souma levou tudo isso em conta antes de fazer esta transmissão?! — exclamou Colbert.

— É isso que me parece.

Colbert arregalou os olhos. Ele ficou chocado por essa garota, que quando tirava o capuz apresentava adoráveis olhinhos redondos como os de um tanuki, ver através dos planos do Rei Souma, o homem que fez até mesmo Gaius VIII de idiota.

Se o governante da Amidônia não fosse Gaius ou Julius, e sim Roroa, o mundo poderia ser um lugar muito diferente. Não, não existem dúvidas de que seria. Quando pensou nisso, Colbert não pôde deixar de sentir um profundo arrependimento.

Entretanto, parecia que a própria Roroa sequer pensava nisso.

— Isso significa apenas que meu velho não era páreo para ele. Afinal, aquele velhote não tinha jeito quando se tratava de qualquer coisa além de batalhas. Sinceramente… Eu disse para ele que, se não estimulasse a ânsia de gastar e colocasse a economia para andar de novo, essa crise econômica iria durar para sempre, mas ele nunca ouviu o que eu falava.

Ao ouvi-la falar com tanta amargura, Colbert se apressou a responder.

— Hm, princesa… quanto ao seu pai…

— Ah, não se preocupe com isso — disse ela. — Não estou tão incomodada com isso.

Na batalha recente, as forças da Amidônia sofreram uma grande derrota pelas mãos das forças de Elfrieden, e o pai de Roroa, Gaius VIII, foi abatido pelo Exército Real sob o comando de Souma Kazuya.

Quando Colbert tentou mostrar alguma simpatia pela perda dela, Roroa apenas balançou a mão para que parasse.

— Me pergunto: por quê? Ouvi dizer que meu velho morreu, mas não me sinto triste com isso. Acho que, no final, nunca me dei bem com ele ou com meu irmão…

— Princesa… — murmurou Colbert.

— No máximo… Fico chocada por não estar chocada com isso — disse Roroa. — Eu devia querer vingança contra Souma, mas tudo que sinto a respeito dele é curiosidade. A maneira como ele reconstruiu aquele velho país e a forma estranha como usa a Transmissão de Voz da Joia, me pergunto em que tipo de mundo aquele homem vivia para aprender a fazer isso tudo. Eu gostaria de conhecê-lo e conversar sobre isso. Ei, Sr. Colbert. Acha que eu sou alguém sem coração?

Pela primeira vez, seus olhos, por trás do capuz, pareceram incertos. Seus olhos úmidos eram como os de um cãozinho abandonado. Quando Colbert a viu assim, apressou-se a dizer: “Não!” E depois balançou a cabeça.

— Você só estava tentando salvar este país de uma forma diferente da de Lorde Gaius! — declarou ele. — É por isso que nunca se deu bem com Gaius ou Julius, que colocam a ideologia acima do povo, e você sente afinidade pelo Rei Souma, que sempre encara as coisas pela perspectiva do povo! Essa é a verdadeira prova de que você é a princesa deste país!

Quando Colbert disse isso, Roroa, que até momentos antes parecia um cãozinho abandonado, disse:

— Certeza? Então tá bom. — E ela começou a rir para si mesma.

F-Foram lágrimas de crocodilo?!

Mesmo o gentil Colbert estava a ponto de brigar com ela por causa disso, mas reconsiderou a ação. Roroa era capaz de fingir tristeza, mas também era capaz de fingir que fingiu que estava triste. Apenas ela sabia o que realmente sentia. Então… ele não disse nada.

E, de repente, Roroa puxou o capuz dela. com suas trancinhas penduradas para os lados, seu adorável rosto apareceu. Colbert arregalou os olhos de surpresa.

— O que você pensa que está fazendo?! Estamos nos escondendo, lembra?! E se alguém te ver?! — exclamou ele.

— Todo mundo está ocupado assistindo o programa de música — disse ela. — Não vão olhar para a nossa direção. Mas, antes de falarmos sobre isso, como o homem que vou enfrentar, pensei que deveria queimar a imagem do rosto de Souma em meus olhos.

Aos olhos dela, Souma era um jovem simples e comum, do tipo que se encontra em qualquer lugar. Ela, entretanto, também estava ciente de que havia mais nele do que parecia. Uma pessoa normal não poderia restaurar um reino em declínio ou derrotar os três duques e o principado. Ele era um oponente difícil de avaliar, isso precisamente por parecer tão normal.

Roroa voltou a abaixar o capuz, puxando Colbert pelo braço enquanto se afastava.

— Pois bem, agora temos que cuidar dos nossos próprios preparativos. Souma se move mais rápido do que eu pensava.

— Ah…! Sim senhora! — disse Colbert.

Pensando que era nesse ponto que as coisas de verdade começariam, ele colocou uma expressão séria no rosto. Enquanto caminhava, Roroa virou-se, olhando a imagem de Souma projetada pelo receptor, e soltou uma risadinha.

Agora que você nos colocou no clima, não pense que vamos te deixar fugir enquanto está ganhando, pensou ela. Você vai ter que assumir a responsabilidade por isso. Ah, sim, você vai. É bom se preparar, Souma! ♪

Terminada a música de Juna, foi a vez de Pamille de novo. Ainda não tínhamos suficientes loreleis, então, nesta transmissão, cada uma delas cantaria duas canções.

Quando a vez de Pamille passou, esperei que Nanna começasse sua segunda música e arrastei Aisha para um lugar fora de vista, onde não apareceríamos na transmissão.

— O-O que foi, senhor? — perguntou ela. — Ainda estamos ao vivo, lembra?

— Eu disse que havia algo me preocupando durante essa transmissão, certo? — falei. — É o que vem depois da Nanna.

Ao ouvir essas palavras, Aisha assumiu uma expressão séria.

Falei calmamente para ela:

— Quando o próximo ato começar, conto com você como minha guarda-costas.

— Quê?! Você não quer dizer que Madame Juna faria algu… mmmph.

Embora ainda estivéssemos no meio da transmissão, Aisha começou a elevar a voz, então cobri a sua boca com a mão.

Depois que ela se acalmou, eu silenciosamente balancei a cabeça.

— Não é a Juna. Entre as segundas músicas de Nanna e Juna, temos uma cantora que apareceu de último minuto para participar.

Mmph… Não ouvi falar sobre isso! — resmungou Aisha.

— Como eu disse, ela apareceu no último minuto — falei. — Decidimos do nada, um pouco antes de ficarmos ao vivo. Além disso, se eu tivesse te avisado com antecedência, pensei que ficaria ocupada demais pensando nisso e erraria as suas falas.

— Murrgh… Não posso negar que isso aconteceria — disse ela.

Ah, fala sério… pensei.

Ainda assim, dei um tapinha no seu ombro.

— Então, tudo bem. Se necessário, conto com você. Você é uma das apresentadoras, então não pode ficar com a sua espada larga, mas quer manter uma arma menor com você?

— Não, nesse caso, prefiro ficar de mãos vazias… Espera, essa pessoa é tão perigosa assim?! — exclamou Aisha.

— Nah… Acho que provavelmente não causará problemas — falei. — Só quero manter a segurança.

— Segurança, entendo… Entendido. Te protegerei até a morte, senhor.

Aisha deu uma batida no peito. Isso normalmente faria um barulho metálico graças à sua armadura, mas desta vez ela estava usando um vestido de festa. Os seios fartos que costumavam ficar escondidos sob sua armadura balançaram, então me virei, envergonhado, já que não sabia para onde olhar.

Pois bem… Vamos ver como isso se desenrola.

Este programa musical é mesmo bom… disse alguém na multidão.

Quando terminaram de ouvir a segunda música de Nanna, um clima relaxado se instalou sobre os telespectadores Amidonianos. Eles estavam sinceramente gostando do programa. A julgar pela ordem como as coisas estavam correndo, Juna Doma seria a próxima. Estavam ficando inclusive animados para ouvi-la cantando novamente.

Entretanto, aquele clima foi soprado para longe no instante seguinte.

Uma mulher apareceu na tela. Ela parecia ter entre trinta e quarenta anos. Tinha quase dois metros de altura, com uma constituição tão musculosa que eles ficavam aparentes até mesmo através do uniforme militar que estava usando. Havia um brilho intenso em seus olhos e seu cabelo estava penteado para trás, então era difícil dizer qual era o seu gênero.

Na verdade, os únicos que sabiam que ela era uma mulher eram os espectadores do principado. Descobriu-se que os telespectadores do reino pensaram que tratava-se de um cara travestido.

Souma e Aisha apareceram ao lado da mulher na tela. Ele ainda estava com um sorriso forçado, mas Aisha estava a encarando com bastante cautela.

— Agora, temos uma participante surpresa — disse Souma. — É a comandante Amidoniana, Margarita Maravilha. Enquanto as tropas guarnecidas em Van estavam se retirando, a Sra. Maravilha permaneceu para monitorar se estávamos respeitando o acordo de não fazer mal às pessoas.

O povo de Van balançou a cabeça em concordância. Isso parece ser a cara da Madame Maravilha, pensaram.

Apesar de viver no Principado da Amidônia, onde era difícil para as mulheres fazerem carreiras de sucesso para si mesmas, sua extraordinária proeza marcial e habilidade de liderar permitiram que ela alcançasse o posto de general, e era agora uma guerreira experiente. Sua habilidade marcial e aparência severa a tornavam temida pelo povo, mas também conquistou a confiança deles graças à sua reputação de pessoa justa e honesta.

Ainda assim, isso tornava tudo ainda mais difícil de entender. O que a Madame Maravilha estava fazendo ali, ao lado de Souma?

— A Sra. Maravilha é uma prisioneira de guerra, mas o motivo de sua captura foi um mal necessário, e apenas a mantivemos em prisão domiciliar — disse Souma. — Entretanto, quando soube sobre esta transmissão, ela disse: “Eu gostaria que também me deixassem cantar” e se ofereceu para participar.

Souma falava em um tom alegre, mas a própria Margarita estava calada. Essa diferença de entusiasmo entre os dois era notável, e enviou um súbito arrepio pela espinha dos residentes de Van.

— Ei… vai acontecer alguma coisa? — perguntou alguém no meio da multidão.

— Você acha que a Madame Maravilha usaria isso como uma chance para tentar matar Souma, não é?

— Não, a Madame Maravilha jamais se rebaixaria a fazer algo tão dissimulado assim…

— Mas olha para a expressão daquela elfa negra. Ela está em guarda.

— Souma está sorrindo, mas dá para ver que ele também está nervoso.

Mesmo que os eventos estivessem se desenrolando no castelo, as pessoas em Van podiam notar o clima de inquietação e isso assustava todos. Sob essa atmosfera, Souma continuou falando enquanto sorria.

— Agora, vamos ouvi-la cantar. A música da Sra. Margarita Maravilha será… “Através do Vale Goldoa”.

Quando ouviram o título da música, o ar flutuando ao redor da plateia pareceu congelar.

A canção anunciada, “Através do Vale Goldoa”, era o hino nacional da Amidônia. Ela iria cantar o hino na Van ocupada, bem na frente de Souma, o rei da potência ocupante.

O povo da Amidônia entendeu o significado por trás disso em um instante.

Madame Maravilha estava preparada para enfrentar a morte.

Assim que Souma e Aisha saíram de cena, uma peça solene de música em tom menor começou a tocar. Então, finalmente, Margarita começou a cantar.

— Na terra além das montanhas, onde Úrsula amanhã nascerá ♪, É a terra que deu à luz nossos antepassados, a terra à qual temos de voltar. ♪ Continuem, Ó cavalos, escalando a colina de nossos camaradas caídos. ♪ Continuem, Ó bravos guerreiros, para se tornar a terra de além terra. ♪

Era uma canção poderosa cantada em uma voz rouca. O povo do principado naturalmente se prostrou com orgulho.

O canto poderoso de Margarita lembrou ao povo do principado que eram cidadãos da Amidônia, incluindo aqueles de Van.

Estiveram sentindo uma crescente admiração pela “liberdade” desfrutada pelo povo do reino, mas a canção dela foi como uma geada que fez com que seus botões, a ponto de desabrochar, voltassem a fechar.

Que música intensa…

Eu estava em um canto, ouvindo.

Embora tenha havido uma ligeira comoção por parte dos soldados na plateia assim que ela começou a cantar, já que eles tinham ordens estritas de “Permanecer sentados, não importa o que aconteça, e ouvir a música em silêncio”, ninguém fez bagunça por causa disso.

Entretanto, era difícil culpá-los por estarem inquietos.

Afinal, essa música era sobre uma invasão do Reino de Elfrieden.

O trecho “Na terra além das montanhas, onde Úrsula amanhã nascerá”, referia-se às terras a leste das Montanhas Úrsula que uma vez fizeram parte da Amidônia, mas que agora pertenciam a Elfrieden.

Exigia que seus cavalos e bravos guerreiros avançassem para lá.

Em outras palavras, o hino nacional era uma canção sobre a travessia do Vale Goldoa para invadir o Reino de Elfrieden.

Sei lá… Será que eles tinham mesmo que levar isso tão longe? Isso mostrava o quão vingativo um estado militarista poderia ser, ao ponto em que até mesmo o hino nacional servia de incitação ao povo.

Enquanto eu pensava nisso, Aisha me perguntou em voz baixa:

— Está tudo bem? Quer deixá-la cantar isso?

— Bem, é o que eu já esperava… — respondi em um sussurro, com meus braços cruzados. — Alguém que era general do exército adversário de repente disse que queria participar do meu programa musical. As únicas razões que consegui perceber foram “para incitar o patriotismo dos telespectadores” ou “esperar uma chance para se aproximar de mim e então atacar”. Depois de uma investigação rápida sobre que tipo de pessoa ela era, esperava que fosse a primeira opção. É por isso que te pedi para me proteger, Aisha.

— Você sabia que isso aconteceria?! — exclamou Aisha. — Nesse caso, não seria melhor proibi-la de cantar?

— Bem, apenas observe… — falei. — Vou colocar esse plano contra ela.

Enquanto eu falava isso, Margarita terminou de cantar. Assim que fez isso, ela sentou-se no local.

Quando nos aproximamos, a mulher disse:

— Mostrei a vocês o orgulho do povo Amidoniano. Agora, corte a minha cabeça.

Ela se entregou. Como pensei, já estava preparada para isso. Ser decepada ali provavelmente fazia parte do seu plano. Na verdade, se eu tocasse em Margarita, a transmissão toda se tornaria em um esforço desperdiçado.

É por isso que sorri e disse:

— Por quê? Achei que você canta bem.

Talvez por não ser a resposta esperada, Margarita arregalou os olhos.

Me senti mal por fazer isso com ela enquanto a sua determinação era tão forte, mas não estava disposto a seguir os seus planos.

— Sua voz é boa, acho que serviria bem para um R&B1R&B contemporâneo (ou simplesmente R&B) é um gênero musical que combina elementos do rhythm and blues, soul, funk, pop, hip hop e dance. Alguns cantores conhecidos do esitlo: Michael Jackson, James Brown, Usher, Beyoncé… — falei. — Conheço algumas músicas que gostaria de ouvir na sua voz. Tenho certeza de que o povo pensa da mesma forma.

Quando falei isso de forma improvisada, Margarita me encarou.

— Eu cantei o hino nacional Amidoniano, percebe… Se você deixar esse ultraje passar, as pessoas questionarão sua autoridade como o Rei de Elfrieden.

— Não chame isso de ultraje… mas, e daí? — perguntei. — Não há qualquer lei em Elfrieden proibindo de cantar o hino nacional de outros países. Não somos a Amidônia.

Desviei o olhar de Margarita, voltando-me para a Transmissão de Voz da Joia e dizendo:

— O que é um bom país? Não é uma pergunta simples de responder. Entretanto, de qualquer forma, acho que um país que deixa seu povo cantar o que quiser é um bom país. Se um país permite que cantem canções alegres, canções tristes, canções de amor, canções locais, canções estrangeiras, canções militares e canções anti-guerra em liberdade, acho que isso o torna bom.

Em seguida, estendendo a mão em direção à joia, perguntei:

— O que vocês, espectadores, acham?

Havia uma torre no lado oeste do Castelo Van.

Essa torre coberta de musgo e com sua presença bizarra e imponente era um local de prisão, usada para confinar criminosos de posição elevada (nobres, cavaleiros e superiores a isso). Embora fosse uma prisão para pessoas de posição elevada, não era uma suíte luxuosa. Lá ficava uma típica prisão suja.

De acordo com as leis Amidonianas, apenas os presos políticos ficavam confinados ali. Aquelas pessoas que supostamente conspiravam para derrubar o estado ou se opunham ao rumo tomado pela nação.

Embora possa ter sido dito que fizeram essas coisas, se fizeram mesmo era outra questão. Às vezes, esses tipos de crimes políticos eram usados para derrubar um rival político.

No subsolo ficava uma câmara de tortura usada para extrair confissões. Parecia que os nobres falsamente acusados eram forçados a confessar lá, e depois eram enviados para o bloco de execução, assim como suas famílias. Caso se aproximasse desta torre à noite, poderia ouvir os gemidos dos prisioneiros que eram torturados durante o dia, então ela em algum momento ficou conhecida como Torre dos Gemidos.

Em uma das celas da Torre dos Gemidos, Liscia e Carla estavam sentadas no chão, olhando uma para a outra através de um conjunto de barras de ferro. Carla, que estava sendo mantida como refém contra a Força Aérea, estava atualmente presa nesta torre.

Liscia levou um receptor simples da Transmissão de Voz da Joia e estava assistindo ao programa de Souma junto com ela. No começo pensaram que seria um simples programa de entretenimento, mas quando aquela general Amidoniana apareceu, as duas perceberam o verdadeiro objetivo dele.

— Se ele tiver calculado que aquela general usaria a transmissão para incitar o patriotismo… — começou a dizer Carla.

— Então mostrou a liberdade e magnanimidade que lhe permite aceitar esse patriotismo…? — terminou Liscia.

As duas suspiraram, admiradas.

Liscia traçou a borda do receptor simples com o dedo.

— Souma mostrou ao povo da Amidônia que em Elfrieden as pessoas são livres para cantar o que quiserem. Não, não são apenas canções. Música, literatura, pinturas, esculturas… Mostrou que todas as formas de expressão artística são permitidas.

— Autoexpressão, hein… — disse Carla. — Não consigo pensar em nada que o principado odeie mais do que isso.

Em um estado militarista como o Principado da Amidônia, era mais fácil governar se as pessoas fossem todas iguais. Dessa forma, poderiam obter o apoio do povo ao simplesmente pedir a queda de Elfrieden. Se permitissem um discurso político diverso, as pessoas poderiam começar a sugerir coisas como: “Devemos fazer as pazes com Eflrieden, negociar com eles e coexistir.” Essa era a ideia mais assustadora de todas para aqueles da casa principesca, então qualquer um que abordasse esse tipo de assunto era totalmente reprimido.

Entretanto, com a derrota na guerra e a morte de Gaius VIII, a casa principesca perdeu autoridade. Souma escolheu um momento como esse para fazer sua transmissão, ensinando ao povo do principado a existência daquilo que era conhecido como “liberdade de expressão”.

Poderiam cantar o que quisessem, desenhar o que quisessem e escrever as histórias que quisessem.

Ele mostrou ao povo de Van que as pessoas que os impedia de fazer essas coisas já haviam partido.

— Daqui em diante… mesmo que o príncipe coroado, Julius, consiga retomar o poder, duvido que ele consiga governar como antes — disse Liscia. — O povo de Van já experimentou a felicidade de poder se expressar. Se ele quiser tomar isso, terá que reprimir todos.

— Se fizer isso, só irá alienar ainda mais o próprio povo… huh. — Carla suspirou, apoiando as costas nas barras. — Acho que finalmente entendi o que Souma quis dizer quando falou que “O trabalho do rei é sempre antes e depois da guerra”. Para ele… a luta ainda continua.

— A luta… — murmurou Liscia. — Entendo, é por isso que ele escolheu Aisha como parceira. — Liscia soltou um suspiro, recostando-se nas barras. As duas estavam agora de costas juntas, mas com as barras entre elas. — Fico feliz por ele não querer que eu me machuque, mas fico com um pouco de ciúme. Queria que ele confiasse mais em mim…

— Ha ha ha… — Carla riu. — Isso só mostra o quanto ele se preocupa com você.

— É mesmo?

— É, sim — assegurou-lhe Carla. — Quando ele estava reclamando para mim no campo de batalhas, disse que não podia deixar você e os outros ouvi-lo fazendo essas coisas. Uma vez, minha Avó disse que quanto mais um homem se preocupa com alguém, mais orgulhoso ele fica perto dessa pessoa.

— A-Acha mesmo…? Ah, espera, Carla, ele estava reclamando para você? — perguntou Liscia.

— Isso é porque não significo nada para ele, aposto. Afinal, me levantei contra ele.

— Carla, Souma é…!

Quando Liscia se virou e olhou para o rosto de Carla, ficou sem palavras. A expressão dela não parecia nada com aquela tão desafiadora de sempre; estava de alguma forma solitária, com um ligeiro ar de pacífica resignação.

— Eu sei, Liscia — disse Carla. — No campo de batalha, ele me obrigou a ver o peso que está sobre os ombros dele. Ele não é uma imitação barata, é um rei esplêndido. Você e o Rei Albert acertaram no julgamento. Fomos nós que não vimos direito.

— Hein?! — exclamou Liscia. — Se você percebeu isso, então…

— É por isso que não posso deixar que você interceda em meu nome.

Liscia se levantou e bateu nas barras.

— Carla! Você tem alguma ideia de pelo que a Duquesa Walter e eu estamos passando…?

— Não — disse ela. — Não é isso, Liscia. — Carla balançou a cabeça em silêncio. Então, cruzando as mãos no colo, forçou-se a dizer: — Nós cometemos um erro. É por isso que não quero te causar mais problemas. Se tentar nos ajudar a sobreviver, estará colocando Souma em uma posição complicada. Ele já está se esforçando muito para ser o rei, então não quero sobrecarregá-lo ainda mais.

— Carla… — Lisica parecia estar sofrendo.

Carla revelou um sorriso fragilizado.

— Não quero continuar sendo um fardo para você e para a pessoa que você ama.

— Pois bem, pessoal, acho que ficaremos com esta pessoa para finalizar o programa por nós — falei. — Aqui está a cantora número um, a Prima Lorelei, Juna Doma!

Tendo terminado a introdução para a última música, deixei o palco e fui para um lugar onde a joia não me pegaria. Quando cheguei lá, encontrei Margarita ajoelhada e Aisha olhando para ela com uma expressão sombria no rosto.

— Rei de Elfrieden… — rosnou a Amidoniana. — Você sabia o que eu ia fazer? — Quando me aproximei, ela parecia estar extremamente frustrada.

— Sim, mais ou menos — falei. — No mundo de onde eu vim teve uma pessoa que tentou a mesma coisa.

Embora fosse em um filme. Era um musical antigo, mas meu avô adorava, então o vi várias vezes.

Margarita abaixou a cabeça.

— Entendo… Se alguém já tentou isso, então não é de se admirar que eu tenha falhado.

Coloquei a mão no ombro dela.

— Apesar de ser do exército Amidoniano, você não dependeu da força bruta e revelou uma voz maravilhosa para cantar. O que acha? Por que não tenta se tornar uma cantora de verdade no nosso país? Quem sabe uma cantora de R&B.

— Você me envergonha com essas palavras gentis para uma pessoa derrotada… — disse ela com amargura. — Não tenho certeza do que esse… ar endi bi é, mas dado como falhei militarmente, talvez seja algo bom.

— Sim, podemos nunca conseguir cantores suficientes — falei. — Você seria mais do que bem-vinda.

Um sorriso preocupado tomou o rosto rígido de Margarita.

— Deixe-me pensar nisso…

Margarita Maravilha ainda estava hesitante, mas, não muito depois, fez sua estreia como cantora de R&B da Amidônia. Seu canto poderoso com aquela voz rouca recebeu a admiração principalmente das pessoas de meia-idade.

Além disso, com a personalidade extraordinária que moldou no campo de batalha e a coragem para enfrentar qualquer homem, assumiu a posição de apresentadora do programa, tornando-se um dos pilares da indústria de entretenimento do reino.

Apesar de tudo, as cortinas finalmente foram fechadas após a movimentada primeira transmissão do programa musical.

 


 

Tradução: Taipan

 

Revisão: Sonny (Gifara)

 


 

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