Dark?

Como um Herói Realista Reconstruiu o Reino – Vol. 01 – Cap. 04.1 – Um Dia de Folga em Parnam

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Algumas semanas após o primeiro episódio de O Brilhanche do Rei ter sido transmitido.

Naquele dia, uma petição foi entregue ao Primeiro-Ministro Hakuya Kwonmin.

Ela foi preparada pelo departamento pessoal, mas incluía nomes da Guarda Real, da força da limpeza e de todos os outros grupos de dentro do palácio. Marx, que era agora um camareiro, e Ludwin, o chefe da Guarda Real, também anexaram seus nomes a ela.

Imaginando o que poderia ser, Hakuya logo leu o conteúdo para descobrir…

— Ah, entendi…

Apesar de tudo, ele concordou com a petição.

— Então, aqui está. Insistirei para que você tire uma folga, majestade — disse Hakuya.

— Que eu tire exatamente o quê? — perguntei. — Ainda não consegui entender o que está acontecendo.

Enquanto eu estava trabalhando no escritório de assuntos governamentais, Hakuya apareceu de repente e disse: “Tire uma folga.” Então, por acaso, deixou cair o maço de papéis que segurava na mesa em que eu estava trabalhando.

— Esta é uma petição que recebi do departamento pessoal — informou. — De acordo com isso, “Quando os que estão no topo não descansam, os que estão abaixo acham difícil tirar uma folga.” Você verá os nomes de Sir Marx e Ludwin assinados, e eu, seu humilde servo, acrescentei também o meu.

Ah… Agora que ele está mencionando, não tirei nenhuma folga desde que fui invocado, não é? pensei.

Não é que eu não estivesse descansando. Recentemente me acostumei a usar os Poltergeists Vivos, e às vezes deixava as papeladas com a minha habilidade e ia fazer coisas como bonecos no quarto de Liscia. Se deixasse parte da minha mente trabalhando enquanto a outra descansava, poderia trabalhar 24 horas por dia, 7 dias por semana, sem me sentir exausto. No entanto, de acordo com Hakuya, o problema não era esse.

— Mesmo quando está descansando, você está sempre no palácio, correto? — perguntou ele.

— Aham, só para o caso de acontecer alguma coisa.

— O que eu quero dizer é que, quando você faz isso, não parece que está de fato descansando. E, por não parecer que está descansando, todo mundo acha difícil descansar. Por favor, entenda.

— Dizer isso é fácil… — falei.

— Normalmente, eu gostaria que você tirasse um bons dias de folga para descansar — disse ele —, mas…

— Temos esse tempo todo? — perguntei.

— Não temos.

— Imaginei…

Na verdade, havia uma montanha de coisas que precisavam ser feitas. Expandir e fortalecer a força militar, encontrar-se com os VIPs, criar documentos para uso externo, levar todo tipo de reforma adiante… a lista poderia continuar para sempre. Até o pedido de Aisha para que eu fosse para a Floresta Protegida por Deus o mais rápido possível estava até o momento em espera. Embora eu tivesse ao menos os ensinado como funcionava o desbaste periódico. Neste país atormentado por questões internas e externas, não podíamos desperdiçar tempo.

— Mas, se isso diminuir o moral e, como resultado, a eficiência do trabalho, acredito que seu esforço contínuo pode ser contraproducente — explicou Hakuya.

— Bem, então o que você quer que eu faça? — perguntei.

— Vou dar um jeito de encontrar tempo para lhe dar um dia de folga — disse ele. — Por que não o usa para passear por algum lugar?

Um passeio, hein…

— Já que não tiro muitos dias de folga, e se eu disser que quero usá-lo para ficar no meu quarto? — perguntei.

— Pedido negado. Devo pedir que tire sua folga de uma forma que seus súditos possam ver que está se divertindo.

— E você ainda chama isso de folga…?

Na minha opinião, só é um dia de folga se puder fazer o que bem entender. Dei um olhar significativo a Hakuya para tentar transmitir meu pensamento, mas fui recebido com completa indiferença.

— Esta não é a oportunidade perfeita? Pode usar o tempo para ver a cidade-castelo com a Princesa Liscia.

— Você está me mandando para um encontro? — perguntei.

— Vocês estão noivos, então, por favor, saia e mostre às pessoas o quão próximos são.

— Ah, vamos lá, agora isso está começando a parecer parte das minhas funções oficiais — protestei. Quer que façamos coisas como aquelas que fazem no programa de  TV, Álbum da Família Imperial1Programa televisivo que vai ao ar desde 1959, mostrando como é a rotina da família imperial japonesa. O programa já conta com mais de 3.000 episódios.?

— E o que faremos a respeito da minha proteção…? — adicionei.

— Não é para isso que a Aisha serve? — respondeu ele.

— Primeiro você me manda para um encontro, agora está dizendo para levar outra mulher comigo?!

— Ora, será como ter uma flor em cada mão — comentou Hakuya. — Sinto até inveja.

— Isso não pode ser sério…

Uff… Bem, com certeza faz muito tempo que não descanso. Acho que posso me entreter com a ideia de que vou sair para me divertir com alguns amigos. E também posso conhecer todos os lugares da capital em que tenho interesse. Vejamos… verificar aquele café cantante em que Juna trabalha pode ser bem legal.

— Certo… Tá bom, vou tirar um dia de folga — falei.

— Sua compreensão é apreciada.

Enquanto Hakuya se curvava em uma reverência, dei um olhar frio a ele.

— Então tá, onde está a Liscia? — perguntei.

Queria que ela soubesse que teríamos um dia de folga, mas ela não estava em seu quarto. Isso normalmente indicava que estava em algum lugar das instalações de treinamento do palácio. Quando subi ao trono, a posição de realeza dela foi pelos ares. Agora, tudo o que lhe restava era a sua patente militar, então atuar como minha conselheira (o que, sabe,  é um trabalho bem duro) era tudo o que podia fazer. Ultimamente ela tinha reclamado sobre como não tinha nada para fazer além de se juntar ao treinamento dos guardas reais, não é?

Primeiro fui ao campo de tiro, depois ao campo de treinamento interno. Por fim, quando visitei o jardim interno, encontrei Liscia no meio de uma troca de golpes de espadas com Aisha.

— Hahhhhhhhhh! — Com um grito alto, Aisha brandiu uma espada que era tão grande quanto ela.

Em contrapartida, Liscia leu os ataques de sua oponente em silêncio, golpeando com sua rapieira. Um amador teria dificuldades para descobrir qual delas estava com a vantagem. Era Aisha, que estava desencadeando um ataque que paralisaria assim que acertasse? Ou Liscia, que se esquivou daquele ataque, desencadeando três estocadas sequenciais com sua rapieira?

Era Aisha, que pressionava usando nada mais do que a garra de sempre? Ou Liscia, que usou a abertura que foi deixada para pisar na enorme espada de Aisha, impedindo que sua oponente a erguesse?

Isso é mesmo uma partida de treino…? A luta com espadas delas era tão intensa que eu não tinha certeza de quão sérias estavam.

— Vento Sônico!

— Montanha da Espada de Gelo!

E ainda por cima começaram a usar magia e habilidades!

O Vento Sônico de Aisha parecia ser uma habilidade que liberava um “vento cortante” de sua espada grande. Quando Liscia se esquivou, aquilo cortou a árvore que estava atrás dela ao meio com um único corte diagonal.

Enquanto isso, a Montanha da Espada de Gelo de Liscia parecia ser uma habilidade que instantaneamente congelava o solo para ficar parecido com um ringue de patinação e atirava espinhos de gelo para fora daquilo, mas Aisha cortou todos os espinhos que pareciam poder alcançá-la com a sua espada.

O que há com essa batalha de vida ou morte…?

Eu já tinha visto a magia deste mundo. Recentemente, a fim de praticar minha habilidade de manipular bonecos, estava usando um manequim para sair e caçar monstros, então costumava ver os aventureiros que encontrava usando magia (embora normalmente fosse quando meu manequim era confundido com um monstro e atacado).

No entanto, com a magia que os aventureiros comuns usavam, o máximo que podiam fazer era coisas como atirar chamas, atirar gelo ou curar ferimentos menores. Nunca pensei que a magia também poderia ser algo tão incrível assim.

Aisha era forte, mas Liscia também parecia bem capaz. Enquanto as duas lutavam, seus olhos demonstravam estar cheios de vida, brilhando como se tivessem descoberto uma rival digna.

Então, isso que são guerreiras, hein… Espera, se eu deixar continuarem, vão destruir o castelo!

— Vocês duas… parem com isso!

— Sim, senhor! Espera, quê?! — As duas voltaram a si, pousaram no chão, então escorregaram no gelo e caíram de bunda ao mesmo tempo.

— U-um encontro?! — exclamou Liscia.

— Aham.

Quando expliquei que teria um dia de folga e que Hakuya havia recomendado que o usasse para ter um encontro com ela, Liscia ficou pasma.

— Espera… Isso é algo que deveríamos fazer porque alguma outra pessoa mandou?

— Me sinto da mesma forma, mas… na mente de Hakuya, encontros reais devem ser parte de nossos deveres.

— Que maneira mais desumana de pensar — murmurou ela.

— “Antes de ser um humano, sou o primeiro-ministro.” Ele provavelmente diria algo assim.

— Ha ha ha! — riu Liscia. — Diria mesmo.

— Então, antes de sermos humanos, ele quer que sejamos, basicamente, rei e rainha.

— Sinto muito… Disso eu não posso rir.

Nós dois suspiramos ao mesmo tempo.

Hakuya era astuto, confiável e levava seu trabalho a sério, mas às vezes levava a lealdade ao cargo longe demais. Bem, isso não queria dizer que não tivesse um lado mais tranquilo. Recentemente, começou a dar aulas particulares a Tomoe assim que ela pediu.

— Bem, eu gosto da ideia de um dia de folga e acho que dar uma saída não faz mal, não é? — perguntei.

— Acho que sim — concordou ela.

— Oh, oh! Nesse caso, por favor, vamos à minha floresta! — Aisha ergueu a mão, tentando chamar a nossa atenção, mas balancei a minha cabeça.

— Ainda tenho uma pilha de trabalhos oficiais para finalizar. Precisa ser um lugar ao qual podemos fazer uma viagem de um dia.

— Ahh… Mesmo a cavalo, leva três dias para chegar à Floresta Protegida por Deus…

Pois é, isso está fora de questão.

— Desta vez você terá que ceder. Mas já ensinei a fazer o desbaste periódico, não ensinei?

— Sim. Mas existem alguns entre os elfos negros que são teimosos feito pedras… “Que absurdo é esse? Como pode sugerir para nós, elfos negros, protetores da floresta, que derrubemos árvores?” eles dizem.

Ah. Sim, esse tipo de gente existe em qualquer mundo mesmo.

Eu respeitava o desejo deles de proteger a natureza, mas quando esse desejo vai longe demais, atinge um nível de arrogância e pode se tornar um verdadeiro problema. A natureza não é tão fraca a ponto de precisar que humanos cuidem dela e a “protejam”. De qualquer forma…

— É por isso que quero que você visite, majestade — explicou ela. — Para dar um bom sermão neles.

— Entendi… No momento em que ficar livre, irei.

Parece que o número de coisas que preciso fazer está só aumentando, mas… falar isso não vai servir de ajuda alguma, vai? pensei.

— Por favor. Se isso for ajudar, por favor, use meu corpo, minha vida, da maneira que achar melhor — disse Aisha, curvando a cabeça.

— Bem, então eu quero te pedir um favor agora mesmo…

— Sim, majestade! Quer que eu atenda as suas necessidades? — perguntou ela na mesma hora.

— Por que essa é a primeira coisa que você tem em mente?!

— Bem, acabei de te prometer o meu corpo.

— Souma… — disse Liscia perigosamente.

— Claro que não vou pedir isso! Liscia, pare de me dar esse olhar! — Quando Aisha se animava demais, parecia se deixar levar. — Só queria te pedir para ser minha guarda-costas enquanto estivermos na cidade-castelo — expliquei.

— V-você quer que eu me junte a vocês dois no encontro? — perguntou ela.

— Bem, se fôssemos apenas eu e Liscia, estaríamos em apuros caso algo acontecesse — falei. — Podemos até chamar isso de encontro, mas na verdade só vamos andar juntos pela cidade, então não precisa se sentir incomodada.

— Mas isso me incomoda… — Por algum motivo, Liscia estava franzindo os lábios.

Será que queria que fôssemos sozinhos ao encontro? Nah, não pode ser… Digo, embora estivéssemos noivos, isso era só formalidade.

— Bem, é assim que é — falei. — Quando a hora chegar, contarei com vocês duas.

— Sim, majestade! Entendido! — disse Aisha, entusiasmada.

— Certo, entendi… — Em contraste com o entusiasmo de Aisha, Liscia parecia de alguma forma insatisfeita.

E, assim, nosso dia de folga chegou.

Eu, Liscia e Aisha estávamos caminhando por uma rua comercial na cidade-castelo de Parnam. Hakuya dissera: “Por favor, saia e mostre às pessoas o quão próximos são”, mas pelo visto foi só uma piada, já que, quando o dia chegou, pediu para sermos discretos. Bem, para a comissão do rei visitando a cidade-castelo, Aisha provavelmente não era segurança o suficiente.

Então usei um uniforme da Academia de Oficiais Reais de Parnam e me fiz passar por um estudante. O que realmente era, já que no meu mundo ainda estava na faculdade…

A propósito, eu e Aisha estávamos vestindo uniformes escolares, mas percebemos que as pessoas poderiam reconhecer Liscia, então ela prendeu o cabelo em tranças e usou óculos de aro, dando-lhe um disfarce de estudante de honra. Com isso, se alguém olhasse para nós, tudo que veria seriam três estudantes tirando o dia de folga na cidade.

— Ei, parceiro, cê tá com umas belezinhas aí! Se cê é homem de verdade, que tal comprar uns dos meus produtos pra dar de presente e mostrar como cê é generoso? — disse um cara de meia-idade com  um sotaque de Kansai, ele estava em uma barraca com acessórios sendo exibidos. Pelo visto, o modo de falar dos comerciantes deste mundo foram interpretados como um sotaque de Kansai artificial aos meus ouvidos.

Enquanto dispensava o homem com um sorriso educado, conversei com Liscia.

— Liscia, você com certeza fica bem de óculos.

— E-eu fico? …Obrigada.

— Majestade! O que acha de mim em um uniforme escolar? — Aisha rapidamente levantou a mão. Nos últimos tempos ela estava sendo bem agressiva ao fazer isso.

— Uh, bem, isso não combina muito com você… — falei.

— Por que não?!

Sim… o uniforme da Academia de Oficiais era parecido com um blazer, e isso não combinava com sua pele morena e seu cabelo prateado. Não sei como dizer, mas parecia que eu estava olhando para alguém fazendo um cosplay de algum personagem de anime ambientado em uma escola. Tipo, como não existem garotas de cabelo rosa na vida real, e mesmo quando elas tingem o cabelo dessa cor, não fica bem antinatural? Pode-se dizer que isso era um choque entre realidade e fantasia…

— Pessoalmente, não acho que fica tão mal assim nela, sabe? — disse Liscia.

— Princesa! — exclamou Aisha.

— Ah. Bem, tenho certeza de que provavelmente é porque eu estava julgando pelos padrões do meu próprio mundo — falei.

Sério, este é um mundo bem diversificado e com muitas raças. Devo tentar me acostumar com isso o quanto antes.

Tri, tri, tri…

— E, de qualquer forma, Souma, não é a Aisha que está me incomodando, mas sim essa coisa que você está arrastando por aí — disse Liscia.

— Hm? Está falando desse saco com rodinhas?

— Isso é um saco? Mas tem rodas nele!

— Sim — falei. — Tem rodinhas por baixo, isso facilita o transporte de coisas pesadas.

— Nossa, mas que coisa mais conveniente para se ter. — Aisha estava com os olhos arregalados. Não era de se surpreender, já que isso ainda não era comum neste país.

Eu tinha encomendado esta unidade com um artesão da cidade-castelo. A pessoa que fez disse que queria vender mais dessas coisas, e eu permiti, desde que não tentasse manter o monopólio do conceito. Se houvesse demanda, talvez em alguns anos não seria algo tão incomum assim.

— Mas, majestade, se quiser que sua bagagem seja transportada, só precisa pedir… — protestou Aisha.

— Estamos supostamente disfarçados de estudantes. Seria impróprio que um cara fizesse uma garota carregar as coisas dele — falei. Além disso, ali havia um monte de equipamento de autodefesa. Eu não podia deixar isso para lá. — E mais, Aisha, pare de me chamar de majestade. Tecnicamente falando, devemos passar por desconhecidos para os outros.

— Sim, majestade! Mas então como devo te chamar…?

— Só fale normalmente, sem um título formal. Se quiser, pode até usar o meu nome, “Kazuya”.

— Hein? — disseram ambas as garotas.

Hã? Por que a Liscia também ficou confusa?

— Mas… Souma, seu nome não é “Souma”? — perguntou Liscia.

— Hã? Souma é, obviamente, o meu sobrenome. Meu nome é Kazuya.

— Mas você disse que se chama Souma Kazuya, não disse?

— Ah…

Certo. Neste país seguem o estilo europeu, então o nome vem primeiro. Eu devia ter dito o meu nome como Kazuya Souma. Ah, entendi! É por isso que todos me chamam de Rei Souma. Agora que paro para pensar, é estranho ter o título de “rei” acompanhando um sobrenome. Se fizer assim, em um sistema hereditário, haverá um enorme número de reis com o mesmo nome.

— E-está tarde demais para corrigir isso? — perguntei.

— Provavelmente? Todos pensam que você se chama Souma, e acho que todas as suas correspondências foram enviadas com o nome de Souma Kazuya.

— Augh! E pensar que cometi um erro tão terrível… — gemi.

— Bem, isso talvez não seja tão ruim, não é? — perguntou Aisha. — Por que não usar um nome em público e outro em particular? Então, em ocasiões como hoje, vou te chamar de “Sir Kazuya”.

Com Aisha procurando maneiras de acobertar o meu erro, fiquei ainda mais deprimido.

— Agora tenho a Aisha, dentre todas as pessoas, tendo que me dar cobertura…

— Mas o que você pensa de mim, Sir Kazuya?!

— O que eu penso, você pergunta…? Uma elfa negra decepcionante?

— Mas que maldade! — disse ela.

— Sério, vocês dois, parem com essa brincadeira estúpida e vamos continuar — pediu Liscia enquanto eu ainda estava lidando com uma Aisha de olhos marejados.

Tá… Certo, vamos indo, mas não escolhemos nenhum destino específico, pensei.

— Há algum lugar ao qual vocês querem ir?

— Não — disse Liscia.

— Aonde quer que você vá, eu o seguirei, Sir Kazuya — acrescentou Aisha.

— Certo. Vocês duas deviam ao menos fingir pensar nisso.

Se empurrassem a decisão para mim, eu não saberia o que fazer. Parando para pensar, era a minha primeira vez andando pela cidade-castelo. Da última vez que estive nela, só passamos cavalgando.

Hmm… Nesse caso, talvez seja mais uma boa razão para dar uma olhada pelos arredores. Mesmo se apenas vagarmos, ainda será tudo novo para mim.

— Bem, então vamos dar uma volta — falei.

Parque Central de Parnam.

Um enorme parque no centro da capital real, Parnam.

Embora fosse chamado de parque, não havia nenhum parquinho ou coisa do tipo. Apenas árvores, arbustos e flores que foram lá plantados, mas o terreno tinha três vezes o tamanho do Tokyo Dome2É um estádio muito famoso do japão, é inclusive a sede do Hall da Fama de Baseball Japonês, um dos esportes mais populares por lá.. No centro do parque havia uma fonte impressionantemente grande com um receptor da Transmissão de Voz da Joia. Quando a transmissão estava acontecendo, podia projetar uma imagem grande o suficiente para ser vista a 100 metros de distância. Havia assentos ao estilo de um anfiteatro ao redor da fonte, e durante a última transmissão de Voz da Joia, parece que uma multidão de dezenas de milhares se reuniu lá.

Sabe, fazer um concerto ao vivo aqui pode ser interessante, pensei. Assim que o programa de Juna, usando a Transmissão de Voz da Joia, for ao ar, eu realmente gostaria de planejar algo do tipo. Algum dia, esta fonte da praça pode se tornar um palco no qual os cantores de Elfrieden aspiram em subir, como o Budokan3Budokan é uma arena que fica no centro de Tóquio, também muito famosa. É o lugar onde acontecem os maiores concertos do Japão.ou o Teatro ao Ar Livre Hibiya4Um dos teatros a céu aberto mais populares de Tóquio..

Bem, já chega dessas fantasias… De qualquer forma, fomos ao Parque Central.

— Este é um adorável lugar cheio de belezas naturais — disse Aisha.

— Apesar de estar no meio da cidade, o ar é bem limpo — comentou Liscia. — Mmm.

Aisha olhou para os lados cheia de curiosidade enquanto Liscia se espreguiçava.

— Hã? Mas não lembro de antes o ar estar tão limpo… — murmurou ela.

— Bem, sim, eu trabalhei um pouco para isso — falei.

— Você trabalhou para isso? Você fez alguma coisa neste parque?

Liscia parecia confusa, então estufei o peito e expliquei:

— Não apenas no parque. Preparei a infraestrutura de todo o subsolo de Parnam, e poderia ir ainda mais longe e dizer que também fiz algumas preparações ao modificar algumas leis. Se você comparar as coisas a como elas estavam há alguns meses, acho que verá que a higiene no geral melhorou bastante.

Para ser franco, antes dos meus preparativos, a higiene neste país estava no mesmo nível da Europa da Idade Média. Ou seja: estava nojenta.

Estrume de cavalo era deixado nas ruas como se isso fosse perfeitamente normal, e as pessoas sempre despejavam o esgoto de suas casas em valas ao lado da estrada. Ouvi dizer que durante o verão o cheiro era horrível.

Como o conceito de higiene não existia, esses problemas estavam sendo deixados de lado. Mas quando o esterco do cavalo seca, se transforma em um pó que se mistura com o ar. Quando chega aos pulmões das pessoas, causa uma variedade de doenças respiratórias.

Era por isso que a primeira coisa que fiz foi instalar um aqueduto e um sistema de esgoto.

— Um aqueduto e um sistema de esgoto — engasgou-se Liscia. — Quando você arrumou tempo para fazer isso?!

— Na verdade, não precisou de tanto tempo ou esforço — falei, dando de ombros. — Para começo de conversa, havia passagens subterrâneas correndo por Parnam toda, sabe. Tudo o que fiz foi jogar a água do rio nelas.

— Espera aí, aqueles eram túneis de fuga para a família real! — gritou ela, indignada.

Assim como Liscia disse, no caso de a capital ser atacada e a queda da família real se tornar algo inevitável, aqueles túneis serviriam para auxiliar na fuga. Mesmo que o inimigo os encontrasse, foram construídos como um labirinto só para impedir a perseguição, e cobriam Parnam toda. Além do mais, foram construídos em três camadas. Isso tudo foi muito conveniente para reaproveitar como um aqueduto e sistema de esgoto.

Primeiro, a água do rio que corria perto de Parnam era puxada para a primeira camada, que servia como um aqueduto subterrâneo. Essa água estava agora sendo usada em poços e casas de banho público que antes dependiam de água subterrânea. A terceira camada era usada como esgoto, despejando tudo em tanques de sedimentação que ficavam fora da capital, onde o esgoto seria filtrado antes de ser jogado de volta no rio. O sistema foi projetado de forma que a água que percorria toda a cidade pela primeira camada acabasse drenando a terceira camada. Tampamos a segunda camada e preparamos as coisas de forma que os odores ruins da terceira camada não alcançassem a primeira.

— Se você transformou eles em um aqueduto e sistema de esgoto, o que planeja fazer em caso de emergência?! — demandou Liscia.

— Se chegarmos ao ponto em que a família real precisa fugir da capital, o país já estará acabado, não é? — perguntei. — Se dependesse de mim, provavelmente me renderia no mesmo momento que o inimigo começasse a chegar perto daqui.

— Com tanta facilidade? — exclamou ela.

— Liscia, enquanto um rei tiver o povo ao seu lado, ele estará seguro.

Essa era mais uma das lições de Maquiavel. Segundo ele, a melhor fortaleza existente é não ser odiado pelo povo.

Um príncipe tem dois tipos de inimigos. Os internos, traidores, e os externos. Se conseguir o apoio do povo, os traidores não conseguem reunir apoiadores ou incitar o povo à rebelião, então simplesmente desistem. Por outro lado, se for odiado pelo povo, não faltarão estranhos dispostos a ajudar em uma eventual rebelião. É o que diz Maquiavel.

— Mesmo se eu perder o meu título, enquanto as pessoas continuarem aqui, há uma chance de restauração — falei. — Por outro lado, se o rei for o único sobrevivente, sem ninguém para apoiá-lo, será devorado por algum outro inimigo.

— É um mundo duro, hein… — murmurou Liscia.

— Isso é a realidade. Bem, de qualquer forma, o aqueduto e os sistemas de esgoto foram fáceis de fazer, mas os lagos de sedimentação… Ah, vamos sentar em alguma sombra.

Não fazia muito sentido ficar parados enquanto conversávamos, então fomos nos sentar à sombra de algumas árvores do parque.

Pouco depois de nos sentarmos, Aisha se encostou em uma árvore e estava começando a cochilar. Provavelmente não conseguia acompanhar um assunto tão complicado. Tive que questionar se não havia problemas em alguém que devia ser minha guarda-costas fazer isso, mas, bem, conhecendo Aisha, ela provavelmente poderia me proteger mesmo dormindo. Continuei falando:

— Eu não podia deixar o esgoto escoar para o rio sem tratamento. Isso normalmente tem muitas bactérias patogênicas e parasitas, sabe. Para nos proteger contra isso, precisamos deixar a água se assentar em um lugar onde possa filtrar através da areia e de seixos… em outras palavras, em uma lagoa de sedimentação.

— B-bactérias patogênicas? — Liscia inclinou a cabeça para o lado. Parecia que essas palavras ainda eram desconhecidas para as pessoas deste mundo.

Bem, provavelmente não havia necessidade de se mobilizar quanto a isso no momento. O povo deste país não tinha noção do que é poluição. Isso porque, com o padrão de vida e nível de tecnologia local, mesmo que despejassem o esgoto não tratado no rio, não faria muita diferença.

Entretanto, conforme o país crescia e sua tecnologia avançava, com certeza apareceriam problemas com poluição. Quanto antes eu resolvesse esse problema, melhor. Os japoneses aprenderam a respeito da poluição após provar a Doença de Minamata5É uma síndrome neurológica causada pelo envenenamento por mercúrio, um metal pesado, extremamente tóxico., a Doença Itai-itai6Doença caracterizada por fraqueza e sensibilidade óssea. Itai-itai poderia ser traduzido como “ai ai”, as pessoas que sofrem com essa doença estão sempre passando por múltiplas fraturas espontâneas em seus ossos. e a Asma de Yokkaichi7Refere-se a casos de doença pulmonar crônica, bronquite crônica, enfisema pulmonar e asma brônquica, que pode levar a falência múltipla dos órgãos respiratórios.. Não havia necessidade para as pessoas deste país passarem por algo parecido.

— Então, aconteceu algo com essas lagoas de sedimentação? — perguntou ela.

— Certo, eu usei o Exército Proibido para cavar buracos para as lagoas de sedimentação…

— O que você está obrigando Sir Ludwin e seus homens a fazer? — exclamou ela.

Bem, se eu tivesse contratado alguns trabalhadores, sairia caro, e eu queria ensinar aos soldados do Exército Proibido as habilidades de “engenharia de combate”. Cavando buracos, enchendo-os e os reforçando. Era a chance perfeita para aprender a cavar trincheiras. Parecia que as batalhas deste mundo ainda eram travadas em campo aberto, então um grupo que pudesse usar táticas de guerra com trincheiras, assim como na I Guerra Mundial, ficaria bem acima dos demais.

Mas, só estou divagando.

— Enquanto eu os fazia cavar, encontramos uma enorme pilha de ossos de monstros.

— Ossos? — perguntou ela.

— Sim, ossos. Ossos de dragão, ossos gigantes, todos os tipos de ossos.

É como um cemitério de monstros, disse um dos soldados que estava cavando. Dragões, gigantes, gárgulas e muito mais. Havia uma enorme quantidade de ossos que claramente não eram humanos espalhados por lá.

A propósito, das criaturas que acabei de listar, dragões eram os únicos que não eram monstros.

Eles tinham um grau de poder mágico incomparavelmente maior do que os wyverns, eram inteligentes e pelo visto podiam até mesmo assumir forma humana. Tinham um pacto de não agressão mútua com a raça humana e construíram seu próprio país na Cordilheira do Dragão Estrela. A chefe da Cordilheira do Dragão Estrela, a Mãe Dragão, era forte até mesmo para os padrões dos dragões. Ela era considerada um espécime incrivelmente bonito, e até mesmo era adorada por algumas pessoas. Os dragões eram, basicamente, aterrorizantes feras divinas, mas também eram outra raça, assim como os humanos e os dragonatos.

De qualquer forma, vamos voltar à história.

De acordo com os estudiosos que investigaram os ossos, eles estavam em um estrato geológico de milhares de anos atrás.

— Então, havia uma masmorra lá? — Liscia inclinou a cabeça interrogativamente, mas eu balancei a minha.

— Falei que eles estavam em um determinado estrato geológico, não? Há milhares de anos, aquele lugar devia ser a superfície.

— A superfície…? Não, você não pode querer dizer que… Às vezes, os monstros saem de uma masmorra, mas nunca em uma escala tão grande. Fora do Domínio do Lorde Demônio, os monstros nunca aparecem aos bandos na superfície como… Ah! — Liscia engasgou, balançando a cabeça como se estivesse tentando limpar o pensamento que acabara de lhe ocorrer. — Espera! O Mundo Demoníaco apareceu pela primeira vez há apenas dez anos!

— Em outras palavras, isso significa que, mesmo antes disso, houve uma era em que os monstros vagavam pela superfície — falei. — Se você pensar nisso, vai perceber que existem masmorras cheias de monstros por todo o continente. Por alguma razão, os monstros que viveram neste continente há milhares de anos desapareceram, e uma pequena parte deles sobreviveu ao se isolar em masmorras. Foi a essa conclusão que os estudiosos chegaram.

Foi como descobrir que ainda existiam dinossauros vivendo em alguma região inexplorada do mundo. Ou como se deparar com uma pandemia de um vírus que devia ter sido erradicado. Porém, se essa hipótese era correta ou não, ainda era preciso discutir.

— Bem, e então?! Os monstros e os demônios que destruíram os Países Nortenhos não “vieram para cá”, eles “voltaram”, é isso?!

— Quanto a isso, não sei — falei. — Chegar a essa conclusão cedo assim seria perigoso.

Contra o que estávamos tentando lutar? Quais eram os nossos inimigos? Era uma questão em que escolher uma resposta fácil não seria o bastante.

— Além disso, há mais uma coisa que me incomoda… — continuei.

— Tem mais?!

— Mesmo deixando a questão dos ossos de lado, eu precisava fazer aquela lagoa de sedimentação. Assim sendo, pedi aos estudiosos para que mantivessem os registros arqueológicos dos ossos que foram desenterrados em segredo. A questão é que um dos maiores e mais bem preservados esqueletos desenterrados, sumiu. Embora eu saiba que ele foi desmontado e enviado para ser armazenado no Museu Real de Parnam…

— Foi roubado, e então? — perguntou Liscia.

— Há uma boa notícia… Bem, não é uma boa notícia, mas que seja. Sendo um esqueleto de dragão completo com 20 metros de altura, mesmo se você o desmontar, não vai ser fácil cuidar do transporte. Apesar disso, não há qualquer sinal de que tenha sido retirado de Parnam. Entretanto, os ossos ainda estão sumidos. É como se o conjunto completo de repente tivesse começado a se mover, levantando as asas e voado para longe.

— Ah! Não, não pode ser isso! Um dragão de ossos?! — gritou ela.

— Esse é o resultado indicado pelos estudiosos.

Um dragão de ossos. Pelo visto, existiam monstros do tipo.

Dizem que um dragão furioso pode destruir um reino inteiro. Eles têm um vasto estoque de poder mágico em seus corpos, e essas reservas permanecem mesmo após a morte. Normalmente, o poder mágico é drenado aos poucos, mas quando um dragão morre com arrependimentos (ou, melhor, quando seu corpo é deixado em um ambiente ruim por muito tempo), em ocasiões bem raras, pode se transformar em um dragão de ossos.

Esses dragões de ossos são apontados pelo país como criaturas nocivas de Classe Especial A. Aqueles com asas podem voar, mesmo não tendo membranas em suas asas, e espalham um miasma que resulta na morte de todos os seres vivos. Também podem usar a técnica do Sopro do Dragão desde quando estão vivos, então quando um deles aparece, é um desastre vivo (morto?) que requer a total mobilização dos militares de um país para que o derrotem. Isso, por si só, era motivo para os países menores irem até a Cordilheira do Dragão Estrela, onde vivem os dragões, em busca de ajuda.

Desta vez, porém, as coisas eram diferentes.

— Se fosse assim, Parnam já estaria envolvida pelo miasma — falei. — No final das contas, os estudiosos fizeram um teste mágico para ter certeza de que não há risco de isso acontecer. Não devia ter sobrado magia nenhuma naquele fóssil.

— Entendo… Isso é bom.

— Então, é por isso que eu não entendo. Como foi que aqueles ossos de dragão desapareceram?

Já fazia quase um mês desde que os ossos sumiram. Apesar disso, ainda não havia sinal deles, então isso significava que tinham sido de alguma forma carregados para além das muralhas? Em caso afirmativo, por qual propósito? Pelo visto, havia pouco uso para os ossos após a magia os deixar. Eles tinham perdido o seu valor como catalisador mágico. O melhor que poderia ser feito com os ossos seria colocá-los em um museu (claro, para isso eu precisaria da permissão da Cordilheira do Dragão Estrela) e usá-los como atração turística.

Não entendi isso. E por isso fiquei incomodado.

Me deitei de lado. Liscia franziu a testa para mim, mas não me importei.

— Você percebeu que está sujando as suas roupas? — comentou ela.

— Elas podem ser lavadas. Além disso, levando a minha posição em conta, posso pedir para alguém lavá-las para mim.

— Um rei não pode ficar todo sujo — disse ela.

— Sim, tenho certeza de que a dignidade é importante e blá blá blá… isso é um porre.

— Como uma das pessoas que forçaram isso a você, não é minha função dizer, mas desista e aceite.

— Tá, tá. Nossa, ter um tempo pra ficar completamente relaxado é bom mesmo. — Estiquei meus braços e pernas. Como era relaxante não ter nenhuma parte minha focada em trabalho.

Parando para pensar nisso, tenho trabalhado sem parar desde que cheguei a este mundo. Havia muito a fazer, coisas que eu não tinha escolha a não ser fazer, pilhas e mais pilhas delas, então usava a minha cabeça o tempo todo. Tirar um tempo para não precisar pensar em nada… era o melhor.

— Ahh… Eu gostaria de poder derreter e retornar ao solo… — murmurei.

Liscia ficou em silêncio. Depois de me ver assim, ela pareceu pensar por um momento, então, hesitante, disse:

— Você quer… descansar a cabeça no meu colo?

 


 

Tradução: Taipan

 

Revisão: Roelec

 


 

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