Por volta da época em que a comoção da reunião de pessoal de Souma havia se acalmado, uma certa história de fantasmas começou a se espalhar na cidade-castelo da capital Parnam.
Segundo os contos, havia um manequim que perambulava pelas ruas durante a noite. Era o tipo de boneco que se via nas lojas de roupas: sem rosto, com articulações de braços e pernas. Carregando espadas em ambas as mãos, vagava nas ruas noite após noite, caçando animais e monstros.
Um aventureiro disse o seguinte:
— Um tempo atrás, eu aceitei uma missão da guilda para escoltar um mascate e estava andando pelas ruas à noite, sabe, foi quando tivemos o azar de ser cercados por algumas subespécies de gelin (aquelas coisas de gel). Individualmente eles são fracos, mas daquela vez eram muitos, e a batalha estava indo mal. Então, um manequim carregando espadas em ambas as mãos cambaleou da direção do palácio e atacou os gelins. Foi uma visão tão assustadora que fugimos na mesma hora, mas… Me pergunto o que estava havendo com aquilo.
Outro aventureiro disse o seguinte:
— Foi há uma semana. Aceitei uma missão da guilda que dizia: “Um grupo de hobgoblins cruzou a fronteira ao norte e está viajando para o sul. Queremos que você os intercepte.” Estávamos esperando em um vale ao longo da rota deles para interceptá-los, mas, por mais que esperássemos, nunca apareceram. Algo parecia estranho, então saímos em busca deles e o que encontramos foi um manequim de pé no meio de uma pilha de corpos de hobgoblins brutalmente assassinados. Pensando que era algum novo tipo de monstro, eu e meu parceiro guerreiro o atacamos, mas ele se defendeu com as duas espadas que carregava. Quando nosso mago tentou acertá-lo com fogo, ele saiu correndo a uma velocidade incrível. Aquela coisa… provavelmente é uma nova arma autônoma criada pelo rei demônio, não acha?
Aconteceram muitos avistamentos e, embora muitos dissessem que era só uma história de fantasmas, era quase certeza que existia. No entanto, quando a guilda dos aventureiros reconheceu sua existência e foram lançadas missões para capturá-lo ou destruí-lo, todos os avistamentos pararam.
Depois disso, alguns se perguntaram se não tinha sido uma brincadeira de alguém.
— Então, bem, há rumores como esse circulando na cidade-castelo, sabe…? — contou-me Liscia.
— Ah sim, agora existem? — perguntei.
Enquanto eu deitava no sofá, não parava a mão que manuseava uma agulha e respondia a ela, Liscia, que estava sentada na cama, assumiu um tom ligeiramente chateado.
— O quê…? Histórias como essa não te interessam?
— Não, não é isso, mas…
— Souma, você é o rei, então as histórias que estão causando inquietação na cidade-castelo não deveriam ser importantes para você? — disse ela.
— Não precisa se preocupar com isso. Aquele manequim não vai mais aparecer.
— Você sabe algo sobre isso…?
— Sim, tipo…
Guardei o “algodão” enquanto dava respostas vagas. Agora, só tinha que costurar a parte de trás e estaria pronto.
— E, espera aí, o que você está fazendo, Souma…?
— O quê? Exatamente o que parece. Costurando.
— Não, estou perguntando por que você está vindo ao meu quarto para costurar!
— Bem, para onde mais eu iria? Afinal, meu quarto ainda é o escritório de assuntos governamentais.
Recentemente, a quantidade de trabalho a ser feito diminuiu um pouco, então enquanto meus Poltergeists Vivos canetas estavam funcionando, meu corpo principal poderia descansar assim. Embora, dito isso, o escritório de assuntos governamentais onde ficava minha cama sempre recebia muitos funcionários entrando e saindo, então era um pouco difícil relaxar por lá.
— Além disso, você sabe como Aisha tem estado ultimamente… — adicionei.
— Posso imaginar… — disse ela.
Recentemente, Aisha tinha se tornado tão pegajosa que nunca saía do meu lado.
Pelo visto, quando um elfo negro jura lealdade a alguém, se orgulha de ficar ao lado dessa pessoa e protegê-la até o dia em que ele mesmo morre. Foi por isso que Aisha se autointitulou como minha guarda-costas e, fosse hora de trabalhar, de comer ou de dormir, ela tentava me seguir aonde quer que eu fosse, até mesmo no banho ou no toilet. Achei problemático ter alguém que ainda não tinha sido oficialmente contratado tão próximo do rei, mas ela era linda, bem leal e suas habilidades eram conhecidas, então Ludwin e os guardas reais fizeram vista grossa. Quanto a Hakuya, que assumiu o cargo de primeiro-ministro de Marx, ele disse:
— Ficar rodeado por beldades não é adorável? A princesa, Madame Aisha, Madame Juna… não me importa qual você escolher, mas, por favor, ande logo e nos dê uma criança. Isso trará estabilidade para a casa real.
Aquilo foi uma coisa terrível para se dizer com tanta facilidade. Minha nossa.
Enquanto eu pensava nisso, Liscia se aproximou e me cutucou nas costas.
— Aposto que você realmente não se importa com a atenção, não é?
— Dá um tempo. Quando eu finalmente consigo descansar um pouco… Espera, hein? Parando para pensar nisso, onde está a Tomoe?
— Tomoe está no quarto da Mamãe e do Papai. A Mamãe gostou dela…
Há apenas alguns dias, Tomoe tinha chegado ao castelo para viver como irmã adotiva de Liscia. Claro, como prometemos, sua família estava lhe fazendo companhia.
A propósito, a mãe de Tomoe trabalhava na creche do palácio, que tínhamos estabelecido como um experimento para ajudar a incentivar o avanço das mulheres na sociedade. Ela ficava com as amas de leite, cuidando das crianças de outras pessoas enquanto cuidava também das suas. A creche foi um sucesso entre as criadas, que disseram: “Agora posso me casar sem me preocupar.”
Com a licença-maternidade não existindo no momento, as mulheres muitas vezes eram demitidas assim que engravidavam. Por isso, a menos que se tornassem amantes do rei, a maioria das criadas passava a vida inteira solteira.
Mas, voltando ao assunto. Basicamente, significava que Tomoe tinha duas mães no palácio. No começo ela parecia um pouco confusa, mas agora ambas a adoravam.
Liscia se levantou e, apoiando as mãos nas costas do sofá, espiou por cima do meu ombro.
— Ainda assim, quando você tem folga, você costura…? Isso é um boneco?
— Ah, isso? É o Pequeno Musashibo.
Terminei de costurar as costas do boneco, apresentando para Liscia.
— Pequeno Musashibo?
— Sim. Ele é do meu mundo… Algo como uma besta rara e exótica, sabe?
O Pequeno Musashibo era um mascote da cidade onde eu morava, super-deformado e fofo, baseado em Musashibo Benkei1Foi um guerreiro japonês que serviu sob o comando do samurai Minamoto no Yoshitsune. Ele geralmente é descrito como um homem de grande estatura, muito forte e leal, além de ser um dos personagens mais populares do folclore japonês.. Um rosto de seda branca. Uma estola2A estola é uma faixa com símbolos religiosos que os sacerdotes usam sobre suas vestes. de sacerdote budista e japamala3Japamala é uma pulseira budista com contas de madeira.. Sobrancelhas grandes e espessas que pareciam imponentes, mas com adoráveis olhos de bolota logo abaixo. As pessoas gostaram desse destaque, então ele foi bem recebido.
A propósito, a cidade onde eu morava não tinha absolutamente nenhuma conexão com Musashibo Benkei. Então, por que Benkei, você pode se perguntar? Bem, “porque há muito tempo a Prefeitura de Saitama era conhecida como Província de Musashi.” Essa era a única razão.
Agora, pode se perguntar: “Então, Musashi Miyamoto4Foi um espadachim, ronin, ex-samurai, criador de uma técnica de espadas e escritor do tratado sobre artes-marciais, o livro dos Cinco Anéis. ou Musashimaru não teriam funcionado tão bem quanto?” ou, “Se for por causa da Província de Musashi, isso não cobre Saitama5Saitama é uma prefeitura da região de Kanto da ilha Honshu. toda?” mas fazer isso seria grosseiro.
Você não pensa, você sente. É assim que funcionam os personagens mascotes.
— Urkh… O tanto que isso é fofo me deixa louca — disse Liscia, olhando para o Pequeno Musashibo. — Ainda assim, por que você faria algo do tipo?
— Bem, na verdade… parece que meus Poltergeists Vivos funcionam muito bem em bonecos.
Com essas palavras, me concentrei, e o Pequeno Musashibo começou a se mover diante de nossos olhos. Ele usou seus braços e pernas curtos para dançar break. O fato de ele ser bom nisso só tornava as coisas ainda mais surreais.
Liscia ficou olhando, pasma.
— O que é isso…?
— Quando eu uso em uma caneta, tudo que posso obrigá-la a fazer é flutuar, mas com um boneco, posso movê-lo quase como se estivesse dentro dele. Além do mais, com os bonecos, posso ignorar os limites de distância.
Até então, eu só conseguia manipular objetos a até 100 metros de distância, mas com bonecos, era capaz de enviá-los não apenas para a cidade-castelo, como também para além das muralhas.
— Isso com certeza é impressionante, mas… O que você vai fazer, se tornar um artista de rua? — Liscia olhou para o Pequeno Musashibo exasperada.
— Ha ha, essa é uma ideia e tanto. Talvez eu deixe de ser rei e comece a ganhar a vida na estrada.
— Não seja tolo. Não vou deixar você abandonar o trabalho pela metade.
— Eu sei disso… Enfim, aqui está a parte importante.
Dei ao Pequeno Musashibo duas espadas curtas. Quando o fiz, apesar de ser feito de feltro e recheado com algodão, ele conseguiu segurar as duas espadas que pareceriam pesadas até nas mãos de um homem adulto. O Pequeno Musashibo posou como Musashi Miyamoto com suas duas espadas.
Liscia arregalou os olhos.
— Sem chances… Isso é um boneco, não é?
— Parece que quando um boneco segura algo, isso conta como um adereço opcional dele. Além do mais, pode usar livremente qualquer item com que eu o equipar. Como teste, dei algumas armas para outro boneco e tentei enviá-lo para lutar contra monstros. Ele conseguiu lutar muito bem.
— Um boneco lutando contra monstros. Espera… O manequim dos rumores!
— Sim. Fiz um experimento com um que encontrei por acaso por perto do palácio.
Mas nunca imaginei que apareceriam rumores sobre isso. Eu tinha tentado fazer meus testes à noite, quando não haveria ninguém por perto para ver, mas isso talvez só tenha feito que parecesse ainda mais com algo saído de uma história de fantasma.
— Graças a isso, descobri que podem se defender dos monstros. Além disso, quanto mais experiência ganham, melhor se movem.
Assim que eu disse isso, o Pequeno Musashibo abriu os braços com os quais segurava as espadas curtas, girando em círculos rápido o suficiente para que se esperasse que um efeito sonoro de “whoosh” soasse. Ele parecia um grande pião giratório, mas na verdade era como uma serra giratória virada de lado, então era mais perigoso do que parecia.
— O treinamento feito pelos bonecos se reflete em seu corpo principal? — perguntou Liscia.
— Se isso acontecesse, essa seria uma habilidade desbalanceada. Infelizmente não; mesmo que o boneco aprenda a usar uma técnica, não consigo reproduzi-la sozinho. Será que é porque não tenho força muscular para isso? Meu corpo ainda é fraco.
— Hmm… Por que não pratica exercícios?
— Acho que controlar os meus bonecos vai resultar em um melhor uso do meu tempo do que se eu tentar ficar mais forte sozinho. Não importa o quanto eu malhe, não vou ficar forte o suficiente para ser melhor do que três bonecos fortes ao meu redor.
— Não é assim que um herói luta — disse Liscia, exasperada.
Infelizmente, tive que concordar com essa avaliação.
Em trabalhos de fantasia do meu antigo mundo, minha classe de trabalho provavelmente teria sido Mestre dos Bonecos ou Titereiro. Esses tipos de trabalhos tendiam a ser usados por suportes de alcance médio. Isso continua bem longe da impressão esperada por um atacante de curto ou médio alcance que as pessoas têm de um herói.
— Quando eu te vejo, sinto que o que eu imaginava de um herói está sendo feito aos pedaços… — disse Liscia.
— Ha ha ha… — gargalhei. — Não se preocupe. Me sinto da mesma forma.
Quase um mês desde que fui convocado, tudo que fiz foi política interna. Já que tudo o que planejava fazer nos próximos meses era mais política interna, realmente poderia me considerar um herói? Não, não poderia. (Pergunta retórica.)
De repente, ouviu-se uma batida à porta.
— Com licença — disse alguém, entrando com uma reverência.
Era a criada chefe do palácio e assistente pessoal de Liscia, Serina. Uma beldade intelectual cinco anos mais velha que Liscia, tão talentosa quanto aparentava, uma mulher que sabia fazer o seu trabalho.
Quando Serina viu meu rosto, abaixou a cabeça em uma reverência.
— Vossa Majestade, Sir Hakuya manda dizer que “Sir Poncho e os outros foram reunidos.”
— Estão aqui, hein? Estive esperando! — Levantei da cadeira ansiosamente, pegando Liscia pela mão. — Vamos, Liscia.
— Hã? O quê?!
Quando de repente peguei a mão dela, Liscia corou.
— Ah, minha nossa, Princesa — disse Serina. — E pensar que você ficaria vermelha só por darem as mãos… Com tanta inocência, como você vai cumprir seus deveres noturnos com Vossa Majestade?
— Serina?! O que você está dizendo?!
— Por favor, deixe-me segurar sua criança logo. Você sabe como os bebês são feitos, não sabe?
— Augh! Você sempre fica me provocando!
Serina era uma criada capaz, mas tinha o péssimo hábito de ser totalmente sádica com garotas bonitas… Sua mestra Liscia não era exceção a isso. Bem, acho que significava que seu vínculo de confiança era forte o suficiente para permitir essas ações. Contanto que não voltasse aquele sadismo contra mim, era uma trabalhadora muito capaz.
— Bem, já estamos indo — falei.
— Ei, espera, Souma — objetou Liscia.
— Cuidem-se! — disse Serina. Quando saímos do quarto, ela se despediu com uma reverência.
Pegamos Aisha no meio do caminho e, quando chegamos à sala de reuniões, todos os que haviam sido convocados estavam reunidos.
Na mesa redonda no centro da sala estavam Hakuya, o primeiro-ministro, Tomoe, minha cunhada, Juna, a lorelei, e Poncho Ishizuka Panacotta. Se excluíssemos Ludwin, que estava ocupado com outro assunto, e Marx, que havia renunciado ao título de primeiro-ministro a Hakuya e agora administrava o palácio, todos os que estiveram presentes para a reunião de pessoal estavam presentes.
— Vossa Majestade — disseram todos ao se levantarem.
— Por favor, permaneçam sentados — falei a eles, estendendo a mão. — Fui eu que chamei todos vocês aqui.
Liscia e eu também nos sentamos. Aisha foi a única que continuou de pé, pairando atrás de mim para que pudesse agir de imediato no caso de algo acontecer. Honestamente, ela ficando ali me incomodava, então pedi para que se sentasse, mas recusou graças à sua teimosia.
Você não deveria seguir as ordens do seu mestre? Pensei, aborrecido.
Bem, por enquanto vamos deixar isso de lado…
— Todos, obrigado por terem vindo — falei. — Agradeço de coração.
— N-n-n-n-não precisa! N-n-n-n-não foi nada! — gaguejou Poncho.
— Senhor, não abaixe sua cabeça tão facilmente — disse Hakuya. Ao lado do Poncho perturbado, ele tinha uma expressão de desaprovação no rosto. — Se aquele que está no topo se rebaixar assim, pode haver aqueles que aparecerão para desprezá-lo.
— Qualquer dignidade que eu só posso manter ao atuar como alguém cheio de si é dignidade de que não preciso. Além disso, penso em todas as pessoas nesta sala não como apoiadores ou cidadãos, mas como camaradas.
— Você é muito gentil, Vossa Majestade. — Juna fez uma breve reverência. Esses pequenos gestos dela sempre formavam uma bela visão.
Tomoe, por outro lado, estava tão nervosa que ficou rígida. Da última vez suas roupas estavam caindo aos pedaços, mas agora usava o que parecia uma roupa de miko6Miko é um termo japonês que antigamente indicava uma “xamã, medium, profeta ou sacerdotisa” que transmitiam os oráculos divinos, atualmente é usado para designar as “noivas de santuário; virgens consagradas a deidades” que servem nos santuários xintoístas. com uma minissaia, que aparentemente era algo tradicional entre os lobos místicos.
— E-eu também sou sua camarada, meu rei?
— Não, não, Tomoe, você é minha cunhada, lembra?
— Ah, certo.
— Aham. Portanto, não me chame de seu rei, chame de “Irmão Souma”.
— Ah, nada justo! Então também me chame de “Irmã”! — exclamou Liscia.
— Um… Irmão Souma. Irmã Liscia — disse Tomoe com os olhos virados para cima.
— Legal! — Eu e Liscia levantamos os dedos, entusiasmados com a reação fofa de Tomoe.
Pá! Pá!
Levamos golpes com um leque de papel na cabeça. Foi Hakuya quem fez isso.
— Vocês dois, está demorando uma eternidade para continuarmos com as coisas, então, por favor, parem com isso.
— Sentimos muito… — Pedimos, ambos, desculpas sinceras.
A propósito, aquele leque de papel foi algo que eu dei a Hakuya quando ele assumiu a posição de primeiro-ministro, dizendo: “Se eu sair da linha, não hesite em usar isso para bater na minha cabeça.” Tinha sido uma piada para tentar fazer o sempre sério Hakuya sorrir, mas como se esperaria do homem que era o maior gênio da história de Elfrieden (ou assim afirmava Marx), ele estava dando um uso brilhante ao leque.
— Então, como um apoiador esbofeteando seu rei com um leque de papel contribui para a dignidade real? — perguntei.
— Me dói fazer isso, senhor, mas esta é uma ordem real, sabe — disse Hakuya com um olhar frio no rosto. — Deixando isso de lado, senhor, você terá que explicar a todos por que foram chamados aqui.
— Ah, sim, é mesmo… Poncho.
— S-siiiiim!
Com a conversa repentinamente voltada para ele, Poncho pançudo se levantou com tanto vigor que quase derrubou a cadeira. Ele estava tão redondo quanto sempre, mas mais bronzeado do que durante a audiência real do outro dia.
— Você preparou o que eu pedi? — perguntei.
— S-sim! Com sua cooperação, senhor, fui capaz de visitar todos os lugares que antes levei oito anos para ir em questão de duas semanas.
— Cooperação… O que você fez por ele? — Liscia olhou para mim em dúvida.
— Ah, ele quis falar sobre como eu esclareci as coisas com os países envolvidos e o deixei usar um dos wyverns de visita da família real para se locomover.
Os wyverns de visita real eram usados pelo rei quando ele viajava para o exterior. O Exército Proibido tinha apenas um punhado deles. A tarefa de Poncho exigia transporte rápido, então eu lhe emprestei um. A maioria dos wyverns pertencia à força aérea, mas com seu almirante, Castor, não cooperando, pedir que nos emprestasse um deles provavelmente não teria dado certo. Foi uma grande dor de cabeça…
— Pois bem, Poncho, mostre-nos o que conseguiu — falei.
— S-sim! Aqui, senhor, eu tenho os “ingredientes que não se costumam comer neste país” que você pediu, sim! — Com essas palavras, Poncho pegou um grande saco.
Quando Liscia viu, arregalou os olhos.
— Ei, esse é o Saco do Herói!
— Sim. Cabe muito mais coisas nele do que parece e, além disso, os alimentos colocados ali dentro não apodrecem tão facilmente. Achei que seria perfeito para guardar os ingredientes, então o emprestei.
— Mesmo assim, você não deveria… Ah, tanto faz. — Liscia encolheu os ombros em resignação. — E então? Ingredientes que não se costumam comer neste país?
— Mais precisamente, são “Ingredientes comidos em países estrangeiros e regiões seletas de nosso próprio país, mas que não se costumam comer neste país” — falei.
Lugares diferentes têm alimentos diferentes e pessoas diferentes têm gostos diferentes. Você costuma ouvir falar de coisas que são jogadas fora como não comestíveis em um lugar e apreciadas como iguarias em outro. Mesmo no Japão, em algumas regiões, poderia encontrar coisas que o fariam dizer: “Hã? Você come isso?” A ponto de já existirem programas como o Ken**n Show7Não consegui encontrar qual programa é esse, mas são aqueles programas em que as pessoas forçam umas às outras a comer coisas estranhas. que focam no tema.
— No momento, nosso país cultiva coisas como algodão, chá e tabaco, então estamos substituindo-os por alimentos — expliquei. — Entretanto, não veremos mudanças antes de pelo menos o outono chegar. Portanto, para evitar que as pessoas morram de fome até lá, é necessário um plano com efeitos imediatos.
Para resolver a crise alimentar, seriam necessárias grandes reformas por um longo período de tempo. No entanto, durante esse tempo, haveria pessoas passando fome, e havia a preocupação de que alguns morressem de fome nesse ritmo. Além disso, os primeiros a morrer seriam os bebês em idade de amamentação, com suas constituições fracas e alta necessidade de nutrição.
Crianças eram um tesouro nacional. Não poderia deixá-las morrer de fome.
Dito isso, mesmo que eu quisesse entregar comida a todas as pessoas famintas do país, havia limites para quanto apoio o país poderia oferecer. É por isso que, ao lado das estratégias de longo prazo, seriam necessárias contramedidas de curto prazo com efeitos imediatos.
— E são esses ingredientes que não temos o costume de comer? — perguntou Liscia.
— Eles são consumidos em outros países, mas não temos o costume de comê-los aqui — falei. — Se desenvolvermos esses costumes, será mais difícil morrer de fome. Afinal, isso simplesmente aumenta o suprimento de alimentos.
— E existe algo tão conveniente assim? — perguntou ela em dúvida.
— É o que estamos verificando…Agora, então, vamos para outro local.
— Outro local? Qual? — Vendo Liscia inclinar a cabeça para o lado interrogativamente, respondi com uma risada.
— Estamos decidindo se podemos usar esses ingredientes ou não. Então vamos para o refeitório, é óbvio.
— Ei, Souma. Eu entendo por que você quer usar o refeitório, mas… não temos muitas pessoas? — perguntou Liscia.
Como ela havia apontado, o refeitório estava barulhento, mas de uma forma diferente do normal. Naquele que era usado pelos guardas e criadas (e recentemente, até pelo rei), normalmente havia mais de trinta longas mesas montadas para acomodar um grande número de pessoas comendo ao mesmo tempo. No entanto, no momento, todas as mesas compridas, exceto uma, foram retiradas para liberar um enorme espaço aberto. Apesar disso, o refeitório estava cheio de pessoas e equipamentos, e havia apenas um pouco de espaço livre ao redor da longa mesa.
A enorme joia flutuando no cômodo estava ocupando uma quantidade particularmente grande de espaço.
— Outra transmissão de Voz da Joia? — perguntou Liscia.
— Usar algo assim só para ler as declarações de guerra é um desperdício horrível — falei. — Temos que fazer um uso melhor disso.
Esta Transmissão de Voz da Joia era uma espécie de televisão. Poderia transmitir informações ao povo instantaneamente, portanto, a exibição de alguns programas de entretenimento com certeza ajudaria a ganhar o apoio do povo. Suponho que existam algumas falhas, pois a falta de tecnologia de gravação indica que todas as transmissões precisam ser ao vivo e a imagem só está disponível em cidades maiores (embora aparentemente as transmissões apenas de som estavam disponíveis até mesmo nas menores das aldeias rurais). Essa era apenas uma coisa para a qual eu teria que esperar até que a tecnologia (magia?) avançasse.
Estava pensando em começar com Nodo Jiman8Nodojiman é um programa real de cantores amadores no Japão., o concurso de canto amador, como nosso primeiro programa de entretenimento. Através do café cantante onde Juna trabalhava, vinha chamando as pessoas que tinham aparecido para mostrar seu “dom de cantar” durante minha reunião de pessoas talentosas, e estávamos fazendo os preparativos para que estreassem como cantores e ídolos.
Primeira emissora pública de Elfrieden, hein… pensei. Os sonhos são ilimitados.
— Por que você está sorrindo? — perguntou Liscia friamente enquanto eu imaginava as várias possibilidades. — Você parece assustador.
Eu tossi.
— Ahem. …Para o nosso projeto atual, o objetivo é introduzir o costume de comer alimentos que não são consumidos habitualmente neste país. Anunciá-los para as pessoas ao mesmo tempo será mais eficiente, certo? É por isso que também trouxe algumas belas moças para cá.
— Tipo a Juna?
— E você também, Liscia. Ah, e a Aisha e a Tomoe também. Dizem que o ABC visual dos desenhos são animais, beldades e crianças. É por isso que tenho Liscia, uma bela garota ortodoxa, Juna cujo encanto maduro desmente sua juventude, Aisha com sua pele morena saudável e Tomoe, que tem orelhas de animal, é uma beldade e também uma criança. Com tantos espécimes bonitos aqui, os olhos das pessoas ficarão grudados na tela.
— E-eu também… — Liscia estava ficando vermelha. Quanto às outras três:
— É uma honra, senhor — disse Juna.
— Sim, Vossa Majestade! Vou me esforçar para atender às suas expectativas! — acrescentou Aisha.
— Tá! F-farei o meu melhor! — gemeu Tomoe.
Cada uma delas mostrou o seu entusiasmo. Enquanto isso, Hakuya estava rapidamente colocando as coisas em ordem para a transmissão e Poncho checava os ingredientes rapidamente. Quando os vi assim, senti como se tivesse reunido um bom grupo de pessoas. Claro, eu ainda queria mais.
Dei a ordem a todos.
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