Dark?

Como um Herói Realista Reconstruiu o Reino – Vol. 01 – Cap 00 – Prólogo

A+ A-

— Kazuya… por que você acha que as pessoas formam famílias?

Em um dia tranquilo de outono, Vovô me fez essa pergunta. Foi logo depois do funeral budista realizado para marcar o sétimo dia após o falecimento da minha avó. Só estávamos nós dois no jardim, comigo olhando distraído para o céu.

Não entendi a pergunta, fiquei tentando pensar em uma resposta, e o Vovô respondeu. Ele parecia estar passando por uma epifania.

— A resposta é simples, para não morrerem sozinhas. Pensei sobre esse assunto várias vezes enquanto estava cuidando de sua avó. Embora tenhamos perdido nosso filho e sua mãe cedo, você ainda ficou aqui conosco. Por causa disso, tivemos uma sensação de vitória em nossas vidas. Os laços que formamos vão continuar mesmo depois que nós não existirmos mais. Para qualquer ser vivo, não existe orgulho maior que esse.

— Vovô…

— É sobre isso que quero conversar com você. Kazuya, forme uma família e a proteja, mesmo que isso custe a sua vida. Você é um menino sensato. Não, suponho que devia dizer que você tende a ser muito racional…

Fiquei em silêncio.

— Mas ouça, você não deve pensar desse jeito nas questões de família. Depois de dar a mão com alguém, nunca a solte. Coloque sua vida em risco e proteja isso até o fim, não importa o que aconteça. Se fizer assim, tenho certeza que no final dirá “eu vivi uma vida boa”. Assim como sua avó… e como eu.

— O senhor está fazendo isso soar como se fosse suas últimas palavras… — falei brincando, mas o Vovô assentiu com seriedade.

— Estou envelhecendo. Essas podem ser as últimas palavras que deixarei para meu neto, que um dia poderá estar sozinho.

Naquela época, não consegui respondê-lo.

E depois, como se só estivesse esperando até eu entrar na faculdade, o Vovô faleceu e foi viver ao lado da Vovó. Na casa onde agora eu ficava sozinho, sussurrei para mim mesmo:

— Eu sei. Não esqueci do seu último pedido, Vovô.

Formar uma família e protegê-la, mesmo que isso custe a minha vida.

Com essa promessa em meu coração, começarei uma vida nova. Era assim que supunha que deveria ser.

— Ó, Herói! Que bom que você atendeu à minha convocação — disse um homem de meia-idade que acabara de aparecer diante de mim. Ele tinha uma constituição mediana e parecia estar tentando soar majestoso. Acho que devia ter entre quarenta a cinquenta anos. Usava uma capa vermelha grossa, que poderia ser usada como casaco, e no topo de sua cabeça havia uma coroa dourada brilhante. Dando uma olhada simples, parecia ser um rei.

Então a jovem de aparência gentil parada ao seu lado era a rainha? Ela era uma linda mulher com cabelo loiro platinado, usando um lindo vestido. Parecia ter uns trinta anos.

Vamos fazer um balanço da situação, pensei. Um teto desnecessariamente alto, pilares de mármore e, abaixo de mim, um tapete vermelho. Soldados em posição de sentido de cada lado, e misturados com eles uma pessoa que se parece com um primeiro-ministro estereotipado.

Era um lugar que parecia ter saído de um RPG. Havia um rei, um palácio e a frase “Ó, Herói” que ouvi.

Beleza, calma…, disse a mim mesmo. O pânico não vai mudar a situação. A primeira coisa a se fazer é… Certo, vou começar reunindo as informações.

— P-por que você está me olhando assim? Está chateado por eu ter te convocado aqui? — disse o Rei com nervosismo enquanto eu olhava para ele.

— Não é isso… Simplesmente não tenho noção da situação em que estou. Poderia explicar?

— V-Você está realmente calmo. Que invejável…

— Vossa Majestade… — Comecei a falar.

— N-não é nada!

O primeiro-ministro pigarreou e o rei deu um pulinho. Vendo aquela pequena interação, a rainha soltou uma risadinha e os soldados olharam com sorrisos irônicos. Depois de ver isso, pude concluir que o rei era realmente o homem de boa índole que parecia ser. Senti que ele não tinha a aura de comando exigida para um governante, mas que era o tipo de pessoa amada pelo povo. Ainda assim, isso era irrelevante.

Fiz minha pergunta com calma para não intimidá-lo:

— Então, se sou o herói, isso significa que existe um lorde demônio ou algo assim?

— Você com certeza entende rápido. É exatamente como você diz.

Fiquei sem palavras. Sério…? Não estou sonhando, né? Não, eu só queria acreditar nisso. Posso distinguir um sonho da realidade. Não é o mesmo sentimento de quando estou sonhando. Todos os meus quatro sentidos, excluindo o paladar, me relataram que era o mundo real.

Isso é… a realidade… Deixa eu dizer de novo. Sério…?

— A-Algum problema, herói? Por que você começou a segurar a sua cabeça do nada?

— Não, não se preocupe. Só me senti um pouco tonto. — Minha cabeça começou a doer, mas por enquanto, teria que aguentar. — Já estou bem. Por favor, explique a situação.

— V-você tem certeza? Certo, vou explicar.

O rei então iniciou uma longa explicação sobre a história do mundo, era bem parecida com a de um RPG antigo. Isso foi tão prolixo que, se fosse um jogo, eu teria pulado os diálogos, então vou resumir um pouco para vocês, leitores.

Primeiro, ele falou sobre este mundo.

O mundo era formado pelo supercontinente Landia e várias ilhas de tamanhos variados. No supercontinente Landia, havia muitos países, grandes e pequenos. Além de humanos, também eram povoados por homens-fera, elfos, anões, draconatos e outras raças. Havia países onde essas raças coexistiam, países onde uma raça tinha tratamento preferencial, países que proibiam a entrada de outras, exceto uma raça específica, e mais. Esses países assumiram muitas formas e às vezes lutavam uns contra os outros pela supremacia. Contudo, desde que o Domínio do Lorde Demônio apareceu, parecia que todos esses países haviam, superficialmente, assumido uma posição de cooperação mútua.

Depois disso, o rei falou sobre o Domínio do Lorde Demônio e o Lorde Demônio em si.

Há uns dez anos, no extremo norte do supercontinente Landia, uma dimensão chamada “Mundo Demoníaco” apareceu, e monstros de muitos tamanhos e formas surgiram, jogando os Países Nortenhos no caos. Os países formaram uma aliança e organizaram uma força punitiva para enviar a este Mundo Demoníaco.

Porém, essa força punitiva foi aniquilada. No Mundo Demoníaco, havia “monstros” que tinham inteligência mínima (ou, alguns teorizariam, nenhuma), assim como “demônios” que eram lutadores inteligentes e também poderosos. Foram os demônios que aniquilaram a força punitiva. Além disso, embora ainda não tivesse sido verificado, as pessoas sussurravam sobre a existência de um rei que governava os demônios, um “Rei Demônio”.

Depois daquela batalha, os países perderam suas principais forças de combate, e com isso, ninguém mais conseguia se defender contra os monstros que surgiram do Mundo Demoníaco. As forças demoníacas, que até então controlavam apenas o equivalente a um pequeno país, devastaram os Países Nortenhos e passaram a governar um terço do continente. Este território agora era chamado de “Domínio do Lorde Demônio”. Mesmo com o avanço momentaneamente parado, foi dito que isso ocorria porque a expansão das linhas de frente havia espalhado os demônios e monstros, tornando possível que os países individuais se mantivessem contendo seus avanços. Isso não significava que a humanidade tivesse uma maneira decisiva de virar a mesa. Nos países da linha de frente, as coisas chegaram a um impasse.

Após essa explicação, o rei falou sobre este país.

Este era o Reino de Elfrieden, uma nação de tamanho médio no sudeste do continente. Era governado por uma monarquia. Tratava-se de um país originalmente fundado por muitas raças trabalhando juntas e, embora o rei fosse um humano, os de outras raças eram aceitos sem discriminação. Independentemente da raça, todos tinham cidadania, e independente do “rei”, poderiam aceitar qualquer trabalho que desejassem. Até o primeiro-ministro que havia censurado o rei era meio-elfo, com ascendência humana e élfica.

Por não fazerem fronteira com o Domínio do Lorde Demônio, havia poucos ataques de monstros. No entanto, o país estava fraco e o tesouro nacional não estava, como posso dizer, bom das pernas. A escassez de alimentos estava especialmente ruim nos últimos anos, e isso só havia agravado o problema dos refugiados despojados pela expansão do Domínio do Lorde Demônio.

Havia nuvens escuras de tempestade nas frentes locais e internacionais.

Aparentemente, as relações com o Império Gran Caos, o maior país no continente, excluindo o Domínio do Lorde Demônio, estavam tensas. O Império era o país que compartilhava a fronteira mais longa com o Domínio do Lorde Demônio. E o país que dirigiu a primeira invasão ao Domínio do Lorde Demônio. Depois de sua derrota contra o Domínio do Lorde Demônio, o Império aparentemente estava solicitando subsídios de guerra dos outros países. Para simplificar, estavam solicitando que os países que estavam longe do Domínio do Lorde Demônio fornecessem suporte financeiro para aqueles que estavam próximos. Embora fossem “solicitações”, quando eram feitas pelo país mais poderoso de toda a humanidade, era mais como um ultimato. Um desses pedidos chegou a este reino, mas nas atuais circunstâncias, seria difícil de pagar.

Finalmente, o rei falou sobre a “convocação do herói”, que me trouxe a este mundo.

Pelo visto, no pedido de subsídios de guerra que o Império fez, havia um palavreado que dizia: “Se você não tem como pagar, realize o ritual de convocação de heróis que é repassado em seu país, e entregue o herói convocado para o Império.” Estava perfeitamente claro que o país não tinha como pagar, e talvez essa tivesse sido a intenção do Império desde o início. Talvez quisessem usar um herói, ou quisessem dissecar um e estudá-lo, ou não tivessem nenhum interesse para começo de conversa, e apenas queriam usar o fracasso do Reino em responder ao seu pedido como um casus belli[1] para invadir. Sem ter como saber o que o Império queria, a especulação levou apenas a mais especulação, e o reino passou a suspeitar de tudo.

Em resposta à situação deles, o reino decidiu realizar o ritual de convocação do herói. Ainda não haviam decidido se entregariam o herói ou não, mas se conseguissem, isso lhes daria pelo menos uma carta de negociação. Para isso, precisavam responder ao pedido e mostrar que pretendiam realizar o ritual.

Agora que você já sabe de tudo, aposto que provavelmente já adivinhou que o rei nunca pensou que poderia realmente conseguir convocar um herói…

— Ei! — gritei com ele sem querer, e o rei deu um pulo para trás, assustado.

— Eek! Eu sinto muito!

— Ah, desculpe —  falei. — Perdi a compostura por um segundo.

Mesmo agindo desse jeito, ele ainda é um rei. Vou ter que me abster de qualquer grosseria.

Ainda assim… Eu realmente fui convocado por coincidência, sem que realmente esperassem algo de mim? Depois de me acalmar, perguntei:

— Então…, o que o senhor planeja fazer?

— S-Sobre o quê?

— Sobre a coisa de “me entregar ao Império”.

— Isso… O que eu devo fazer? É um verdadeiro problema. — O rei realmente parecia preocupado.

Isso me surpreendeu um pouco. Eu esperava um “O Império é assustador! Por favor, vá e sirva a eles por nosso reino!” enquanto ele chorava e me implorava para fazer isso. O rei, na verdade, me parecia muito abatido.

— Por que tanta preocupação? — perguntei. — O senhor tem medo do Império, não estou certo?

— Sim, eu tenho medo! É exatamente por isso que estou preocupado!

— Se possível, deixe-me explicar direito — disse o meio-elfo primeiro-ministro, dando um passo à frente. — No momento atual, há uma clara diferença de poder entre nosso país e o Império. Simplesmente não estamos em posição de dizer não quando o Império pede algo. Embora estejamos presos nessa situação, você é a única carta na manga que temos em mãos. No entanto, depois de usarmos essa carta, não teremos mais nada para usar ao negociar com o Império. Mesmo se pudermos sobreviver desta vez fazendo o que eles pedem, o que faremos na próxima vez que algo acontecer? Da próxima vez, só poderíamos ter sucesso ao desistir de nossa única carta.

Fiquei em silêncio. Não era difícil entender o que ele estava dizendo.

O que aconteceu ao norte de Fujiwara depois que desistiram de sua única carta, Minamoto no Yoshitsune[2], era um bom exemplo disso. Aqueles que cedem à intimidação, largando a única carta que têm, terão apenas um fim trágico os esperando.

— O que é um herói, afinal? — perguntei.

— Dizem que herói é “aquele que lidera a mudança de uma era” — respondeu o primeiro-ministro.

Hmm… Então não é apenas alguém que mata o Rei Demônio?

— Isso não é um pouquinho vago? — perguntei.

— Veja bem, não temos muitos documentos arquivados.

— Por favor, não faça um ritual em um caso desses…

— Não posso pedir desculpas suficientes por este assunto — disse formalmente o primeiro-ministro.

Dar o pedido de desculpas burocrático de rotina não vai ajudar… Mesmo assim, é um problema. Não há informações suficientes. O que significa que aquilo que mais precisamos agora é tempo.

— Senhor, tenho uma proposta.

— Qual seria? Você pode falar livremente.

— Podemos conversar sobre o que vai acontecer daqui em diante? Não aqui, acho que seria melhor em algum lugar reservado para conversar longas. Só eu, o senhor e o primeiro-ministro.

— Hm. O que você acha, Marx?

— Isso seria bom. — O primeiro-ministro, cujo nome era Marx, concordou com a cabeça.

Com os dois de acordo, fiz outro pedido.

— Por favor, reúnam também todo o material que puderem sobre este país. Com um foco particular no balanço de pagamentos, relatórios, bem como materiais sobre agricultura, silvicultura e pesca, economia, comércio e indústria, e terras, infraestrutura e transporte. Talvez possamos conseguir o dinheiro que o Império está exigindo. Além disso, gostaria dos materiais que vocês têm sobre heróis… mas, bem, isso pode esperar.

— Muito bem. Vou reunir tudo agora mesmo — disse o rei.

Fizemos uma pausa, e depois de um tempo fui chamado ao escritório de assuntos governamentais do rei.

Sentado em um sofá confortável em frente ao rei e ao Primeiro-Ministro Marx, fizemos uma longa reunião. Ou seja, conversamos basicamente sobre tudo o que havia para conversar. A indústria, a economia, o sistema tributário, a política agrícola, os preparativos militares, as relações exteriores do país… discutimos tudo.

As reuniões duraram dois dias inteiros. Em parte, porque fiz perguntas sobre cada detalhe minucioso dos materiais que reuniram e, em parte, porque eles se agarraram às políticas que eu estava propondo em um grau bizarro. No meio da reunião, o rei estava prestando muita atenção em mim, como se tivesse se tornado uma pessoa totalmente diferente.

Passaram-se dois dias. Os soldados que guardavam a porta, depois diriam a todos que, quando o rei saiu daquela sala, sua expressão estava estranhamente brilhante e alegre, e que seu rosto era o de um homem que havia tomado uma decisão.

No dia seguinte ao fim de nossas reuniões, o rei reuniu os VIPs do castelo na sala de audiência e proclamou em alto e bom tom:

— Meu povo, peço que prestem atenção às minhas palavras.

“Eu, o décimo terceiro rei de Elfrieden, Albert Elfrieden, abdico de meu trono em prol do herói convocado, Souma Kazuya! Além disso, anuncio o noivado de minha filha, Liscia Elfrieden, com Sir Souma.”

A sala ficou em silêncio. Todo mundo ficou sem palavras. A única pessoa presente que permaneceu calma foi, talvez, a rainha.

Este anúncio bombástico me surpreendeu completamente.

 


Notas: 

1 – Na terminologia bélica, casus belli é uma expressão latina para designar um fato considerado suficientemente grave pelo Estado ofendido, para declarar guerra ao Estado supostamente ofensor.

2 – Tinha a família Minamoto e a família Fujiwara, até então aliadas. Essas duas famílias se aliaram pra destruir os Taira. No meio do processo, os Taira conseguiram matar quase todos os membros da família Minamoto. Yoshitsune que na época da aniquilação da sua família ainda não era um adulto, a família Fujiwara o acolheu. No final das contas, Yoshitsune resolveu se aliar a um membro da família Go, que seria o Go-Shirakawa, só que não deu certo, pois os Fujiwara não queriam um exilado como Imperador. Depois disso o traíram e mataram.

📃 Outras Informações 📃

 

Apoie a scan para que ela continue lançando conteúdo, comente, divulgue, acesse e leia as obras diretamente em nosso site.

 

 Quer dar uma forcinha para o site? Que tal acessar nosso Padrim :ZeroTwo8:

Padrim

Acessem nosso Discord, receberemos vocês de braços abertos.:kenislove:

 

 

Tags: read novel Como um Herói Realista Reconstruiu o Reino – Vol. 01 – Cap 00 – Prólogo, novel Como um Herói Realista Reconstruiu o Reino – Vol. 01 – Cap 00 – Prólogo, read Como um Herói Realista Reconstruiu o Reino – Vol. 01 – Cap 00 – Prólogo online, Como um Herói Realista Reconstruiu o Reino – Vol. 01 – Cap 00 – Prólogo chapter, Como um Herói Realista Reconstruiu o Reino – Vol. 01 – Cap 00 – Prólogo high quality, Como um Herói Realista Reconstruiu o Reino – Vol. 01 – Cap 00 – Prólogo light novel, ,

Comentários

Vol. 01 - Cap. 00