Shimitsu Morioka, Declive Profundo, Tarde.
Pude sentir o ódio correndo por minhas veias, queimando meu sangue.
— Onde conseguiu isso? — minha voz estava mais para o rugido de uma besta.
— O que foi? O que faria um aleijado como você espumar desse jeito ao ver uma espada? Sei que é bonita e tal, mas nada para você tremer desse jeito. — dizia o homem brincando com a katana, sua luz roxa me deixando hipnotizado, eu me sentia prestes a explodir. — Aquela aberração que a trouxe para mim nem pôde brandi-la contra mim.
Nesse momento o mundo parou.
Levei minha mão esquerda a uma de minhas espadas, enquanto uma explosão de energia vermelha surgia de onde deveria estar meu braço direito, materializando um novo membro, já empunhando a outra.
Enquanto avançava em direção ao meu inimigo, vi as pessoas se afastando em pânico, ao mesmo passo que eu perdia o controle sobre meu disfarce.
Meus pelos brancos voltaram a aparecer, manchados de azul e vermelho, meu rosto se alongou em um focinho e as duas caudas surgiram.
Utilizando uma das posturas de combate que aprendi com minha mestra, imbuí minhas armas em chamas.
Assim que o som de metal contra metal ressoou, mal pude entender o que a voz de meu alvo dizia, meu único foco era matá-lo.
Arthur.
De repente Shimitsu se lançou como um raio na direção do inimigo, enquanto mudava de forma.
Ouvi Thorian se virando para os civis que se juntaram em um canto da taverna, enquanto buscava seu tridente.
— Quem são esses dois?
— Strog e Strug, dois criminosos.
Jack se posicionou na frente dos indefesos, com seu grande escudo e espada em mãos.
— Não se preocupem. — disse Sanir, o seguindo.
Enquanto o local explodia com o som de metal colidindo, comecei a me mover em direção ao combate.
— Lá vem mais um, Strog. — disse aquele com o cajado.
O homem que enfrentava Shimitsu estava apenas se defendendo, enquanto olhava em seus olhos.
— Sabe, ela era mais forte que você.
— Calado! — o Kitsune rugiu de volta.
— Eu posso levá-lo até ela. Ela está sendo um ótimo objeto de estudos, juntos vocês poderiam dobrar meu rendimento. Duas aberrações combinando, apesar de você ser mais colorido.
Decidi que era a hora de intervir.
Shimitsu.
O único ponto que focava em minha visão era o sorriso maníaco do inimigo. Um sorriso faminto por sangue.
As vozes ao meu redor estavam distantes, abafadas pelo calor que corria pelo meu corpo.
Fui atingido no peito por uma força que eu nem pude ver.
Procurei por sua origem e vi o outro homem apontando seu cajado para mim, balbuciando alguma coisa.
Quando meus olhos se fixaram na lâmina purpura que se aproximava de mim em um movimento mortal, outra espada a interceptou.
Me concentrei para entender o que aquela voz dizia.
— …-er dizer que você gosta de aberrações?
Olhei para Arthur, o vi preparando um segundo golpe.
Assim que tentei pegar nosso oponente desprevenido, senti outra explosão em meu ombro enquanto Arthur trocava golpes com o homem.
Me voltei para o mago, avançando em direção a ele com minhas lâminas baixas.
Um escudo de energia translúcida surgiu à sua frente, bloqueando meus ataques.
Essa droga vai quebrar em algum momento.
Continuei golpeando freneticamente, até que o inimigo balançou seu cajado e uma onda de choque me arremessou pela taverna.
Arthur
Ao mesmo passo em que me sentia mais próximo de acertar um golpe, mais rápido e forte aquele chamado de Strog parecia ficar.
Shimitsu passou voando ao meu lado, logo antes de atingir uma mesa do outro lado do bar.
No momento em que me distraí, o homem desferiu um golpe vertical, do qual quase não consegui esquivar.
Enquanto me recuperava, uma luz cruzou minha vista, atingindo Strog acima da cintura.
Thorian brandia seu tridente, agora vestindo também seu capacete.
Mais um lampejo hostil veio em nossa direção, mas dessa vez vi o feitiço chegando. O ataque não foi capaz de abalar meu companheiro.
— Cuidado!
Me movi de forma que um inimigo ficasse entre o outro, ao mesmo tempo que eu e o Golias flanqueávamos o Guerreiro.
Aproveitei enquanto o inimigo recuperava seu equilíbrio após a chegada de Thorian e o golpeei horizontalmente, atingindo-o no ombro.
Seu sorriso ficou ainda mais largo.
— Você tem algo de especial, não é? Eu quero!
Jack.
Thorian e Arthur enfrentavam Strog.
Eu e Sanir estávamos a postos para caso algo pudesse ferir os civis.
Shimitsu se levantava e corria de volta em direção à batalha. Agora as chamas em uma de suas espadas se comprimiam em relâmpagos, que percorriam seu braço de energia, dando a ele uma mistura de cores vermelhas e azuis, assim como sua pelagem.
— Vocês devem sair, mantenham-se atrás de mim. — Disse, segurando firme meu escudo e guiando o grupo até a porta.
Shimitsu.
Aquele filho da puta.
Enquanto me movia, direcionava para meu braço direito toda a energia que eu podia acumular, me preparando para um golpe carregado de magia.
Quando cheguei na metade do caminho até o mago, meu alvo preparava um projétil mágico e o apontava em minha direção. Não era como os feitiços anteriores.
No mesmo instante em que ele o liberou, o ataque já estava prestes a me atingir com uma velocidade insana.
Eu já não enxergava nada além de meu objetivo. Um único alvo. Um único foco.
A espada em minha mão esquerda pareceu se mover sozinha. Atingi o projétil com minha lâmina, que foi arrancada de minha mão, mas eu não parei. A outra katana ainda carregada de chamas que se condensavam em eletricidade.
O inimigo estava no alcance de meu ataque.
Thorian
Eu e Arthur encurralávamos Strog, mas ele parecia interessado de mais em Arthur. Algo sobre ele ter algo de especial.
Eu mesmo tenho algumas sensações enquanto estou com ele. Como se ele fosse mais que um simples homem.
Agora não é hora de pensar nisso.
Uma chama branca nasceu em meu tridente, ao mesmo passo que eu recomeçava minhas preces de batalha.
Enquanto Arthur atacava de um lado, eu atacava de outro. Mas o inimigo ainda parecia manter a vantagem, mesmo flanqueado.
Então notei, suas feridas já estavam se curando.
Strog girou e encaixou um chute em meu estômago. Vacilei por um único segundo, vi sangue espirrar. Não o meu, mas o de Arthur.
Ele tinha um corte diagonal que cruzava todo o peito.
Ouvi o som de algo pequeno caindo no chão. Arthur olhava para seu pingente verde em forma de espiral que agora estava no chão.
Nesse momento uma mistura de sentimentos me atingiu.
A pele e os cabelos de Arthur começaram a ficar divididos entre o negro profundo e o branco pálido. Um de seus olhos ficou vermelho como o sangue, enquanto o outro ficava em um azul tão profundo como o oceano. Além disso, um chifre despontava do lado negro de sua cabeça, formando uma espécie de meia-coroa.
Ele exalava uma mistura de sentimentos tão conflitantes quanto o “bem” e “mal”.
O choque me atordoou por alguns instantes, até que a parte de trás de sua camisa se rasgou com as duas asas que abriam caminho pelo tecido. Uma preenchida de penas brancas, enquanto a outra era coberta por penas negras.
Sua presença se assemelhava em parte à de um demônio, mas ao mesmo tempo era reconfortante.
— Consegue se manter em pé? Vou segurar ele por enquanto. — disse para Arthur assim que me recompus.
Strog começou a rir. Se seu sorriso abrisse mais um pouco seu rosto rasgaria.
— Você é lindo! Vai encaixar perfeitamente!
Arthur segurou suas espadas em posição defensiva enquanto usou suas asas para se impulsionar para trás.
— Mas antes, eu vou ter que matar seu amigo aqui.
Shimitsu.
Assim que me preparei para dar o golpe final, um cheiro chegou até mim. Um cheiro cheio de dualidade.
Empurrei meu oponente com um jogo de corpo e o fiz girar. Quando ele estava vulnerável, eu tinha visão de ambos os criminosos e de um Arthur mudado e ferido.
Thorian estava sozinho contra o Guerreiro.
Tudo o que eu preciso fazer é acertar esse golpe.
Minha espada estalava com eletricidade. Eu havia colocado toda a minha energia naquele único ataque.
Segurei a katana como se eu estivesse prestes a sacá-la de uma bainha invisível e firmei meus pés no chão.
É agora ou nunca.
— Morra!
Cada centímetro do meu corpo estava em combustão. Em um ímpeto de fúria, minha lâmina estava carregada de toda energia que eu ainda tinha sobrando em forma de eletricidade.
O mundo girava lentamente enquanto meu alvo mudava. Sua guarda estava baixa.
Pulei com meus dois pés contra a parede, pronto para me lançar pela taverna.
Deixei que parte de minha energia se desviasse de minha espada para minhas pernas, assim dando mais força e velocidade ao meu ataque.
Postura do relâmpago: saque rápido.
Atravessei a taverna em um instante, meu braço energético fundido em energia crepitante. Passei pelo mago surpreendido e fui em direção àquele empunhando a espada de Trégua.
Ele estava distraído com Thorian, agora que Arthur havia recuado.
Atingi meu inimigo nas costas e um clarão iluminou o local, seguido de um trovão.
A eletricidade se espalhou por suas costas e nuca, queimando suas roupas e pele. A energia que se ramificava escalava pelo corpo do homem e o tomava.
O sangue jorrou pelo grande corte em diagonal e um gemido de dor e surpresa foi reprimido quando o criminoso caiu, tendo alguns espasmos, mas morto.
— Strog! — o outro gritou.
— Fique tranquilo. Eu vou levá-lo até ele.
Minha visão começou a ficar turva. Eu não tinha mais forças e vacilei. Antes que atingisse o chão, senti a grande mão de Thorian me segurando pelo ombro. Sua mão era facilmente do tamanho da minha cabeça.
— Você está bem?
Mal pude entender sua voz. Minha cabeça doía como se fosse eu quem tivesse sido atingido por um raio.
— Jack, cuide dele. Eu lido com o último. – O Golias se virou para o outro paladino, que acabara de evacuar o último civil.
Ah, como eu queria ver a cara desse filho da puta quando ele morrer.
Minha visão desfocava e voltava a todo instante, mas pude ver quando o cadáver foi puxado por uma longa mão translúcida até os pés do outro.
— Nos veremos de novo. — ele disse, enquanto apontava com seu cajado para o teto da taverna. Uma série de estalos foi ouvida na madeira e o prédio começou a desabar.
Thorian.
Eu observava enquanto Sanir curava os ferimentos de Arthur, logo depois que deixamos o local, agora em escombros. Ele não parecia ter receio ou incerteza enquanto conversava com o jovem.
Notei que Jack também tinha sua atenção presa à dualidade novamente oculta sob o disfarce de Arthur. Ele sentiu o mesmo que eu.
A rua começou a ficar movimentada enquanto o alvoroço crescia e a multidão observava a cena. Pude ouvir suspiros e sussurros, todos sabiam quem eram os culpados.
— Precisamos ir. Vamos nos preparar para encontrar o último fugitivo. Você também vem? — Completei, me virando para Shimitsu, ainda em sua forma bestial, que descansava sentado nos escombros, apoiado na grande espada de lâmina roxa que Strog empunhava durante a batalha.
— Eu preciso encontrar minha mestra. E fazer aquele arrombado pagar com cada gota de seu sangue.
Caminhei em direção aos outros e apontei na direção de uma pousada.
— Precisamos conversar em um lugar mais reservado.
Não pude evitar de olhar para Arthur, deixando minha dúvida transparecer mais do que gostaria.
Arthur.
A primeira impressão que tive de Thorian se mostrou certeira. Um homem generoso, que faria de tudo para proteger um inocente. Sempre foi uma presença calorosa, mas agora tinha desconfiança em mim. Seu olhar denunciava isso.
Por um instante, um sorriso ameaçou aparecer no focinho branco de Shimitsu, mas logo se dissipou, tomado pelo medo e fúria. Os gêmeos estão com alguém importante para ele.
Jack ainda mantinha seu capacete, com um braço descansando no punho da espada em sua cintura. Captei algumas trocas de olhares entre ele e o Golias.
Na estalagem, Thorian pagou por um único grande cômodo no andar superior, onde poderíamos conversar.
Era um lugar limpo e arrumado, com três camas e logo me sentei em uma.
— Por que toda essa comoção? — Shimitsu começou, se sentando também, já não parecia dar importância ao seu disfarce — E por que eu fui arrastado pra cá?
— Pode sair se quiser, mas você parece ser o mais curioso — respondeu Sanir.
— Hum, já que já estou aqui vou descansar um pouco.
Talvez movido pelo nervosismo, me voltei para ele.
— Sabe Shimitsu, é legal saber que você também não é normal.
Minha resposta veio precedida de um sorriso de canto.
— É. Ninguém aqui é, né?
Então Jack se aproximou de mim até que pude ver meu próprio reflexo em sua armadura de metal.
— Quem é você?
Ele tinha uma voz fria que chegava a ser intimidante.
Suspirei e olhei em seus olhos para responder.
— Eu sou um Nyxar.
— Um vagabundo que não sabe o que quer da vida? — Sanir deu um pulo. — Isso eu já tinha percebido.
— O que quer dizer com “Nyxar”?
— “A canção de Nyxar” fala de um homem que cresceu em um reino, mas ficou preso em um outro que não conseguia entender, até morrer de fome por não se encaixar em lugar nenhum. — O Halfling continuou.
Jack voltava a guiar o rumo da conversa, ignorando os comentários do garoto.
— Responda.
— Eu sou filho de uma deusa e um demônio. Por isso uso esse colar para me esconder.
— Os deuses não pisam em nossa terra há milênios. Como você poderia ser o filho de um? E ainda com um demônio.
Enquanto Jack falava, pude ver Thorian forçando sua expressão para tentar esconder sua dúvida e principalmente desconfiança.
— Eu não tenho culpa do que acontece com os deuses, eu só sou um resultado disso. Além disso, fazem muitos anos que não vejo minha mãe, e também nunca conheci meu pai.
— E que deusa estaria aqui, enquanto nenhum outro esteve? — Perguntou Thorian.
— Meryl.
— As Ondas da Selva?
Shimitsu atravessou a conversa, ainda deitado, se voltando para Sanir.
— Moleque, você sabe magia de cura, não sabe? Faz alguma coisa pra eu não cair morto antes de matar aquele mago, eu tô saindo em cinco minutos, com ou sem vocês.
Thane, noite da destruição de Vale Cinza.
— Aí chefe, eu juro que se qualquer um me oferecer mais uma gota de cerveja barata eu vou cortar a cabeça dele.
Thorn tinha seus pelos laranja levantados e mostrando os dentes, como uma verdadeira besta.
— Podemos achar um lugar melhor por essa noite, ninguém vai tentar nos atacar com a recompensa do jeito que está. — Mank sussurrou para mim.
— Só por essa noite, mas pelo menos tenha o mínimo de controle, sua raposa alcoólatra. Não quero ver você tocando em seu machado essa noite.
— Tira meu machado de mim, mas não pode arrancar meus dentes.
Estávamos chegando em uma taverna próxima ao centro da cidade quando recebi a notícia de que alguém poderoso se aproximava. Meu corvo era capaz de se comunicar comigo mesmo à distância.
Quando Thorn estava abrindo a porta do bar, já com a língua fervendo, parou.
— Aí chefe, tem uma puta energia se acumulando bem em cima da gente.
Assim que também senti o poder que se concentrava, me preparei para nos proteger.
Aquele não seria um ataque direcionado. A cidade toda é o alvo.
— Thane! É aquele grupo na outra taverna do fim da rua! Eles vão suportar isso sozinhos? — Mank estava apontando em direção aos aventureiros que tentaram nos capturar, aqueles com meu amuleto de contato.
— Deixa eles se virarem, tira a gente daqui chefe. — Thorn rugia.
Um olho roxo e triangular se formava acima de nossas cabeças.
— Venham! Não fiquem para trás.
E comecei a correr em direção ao grupo, agora paralisado com a cena.
Faltava apenas uma dezena de metros quando senti o impacto chegando. A terra começou a tremer e a onda de energia a varrer o telhado das casas.
— Não vai dar tempo! Um deles se afastou!
— Vai sim. — sussurrei para mim mesmo, dividindo meu foco entre cronometrar nosso tempo de fuga e criar um escudo em volta dos aventureiros, mas eu apenas poderia salvar aqueles cinco.
Isso é tudo o que posso fazer. Sinto muito, Elfo.
Dois dias depois.
O único som durante meu turno de vigia em nosso acampamento noturno era o assobio do vento contra as árvores.
Passamos por Vinar no dia anterior, onde reabastecemos nossos suprimentos e conseguimos novos cavalos, já que tudo o que tínhamos foi perdido em Vale Cinza. Agora nos dirigíamos em direção à capital, onde encontraríamos o Rei para explicar o que descobrimos e sobre os riscos que ele corria.
Em até dois dias chegaríamos em nosso destino.
Thorn tinha o rosto enfiado em seu saco de dormir, enquanto Mank apenas apoiava a cabeça em sua mochila, ambos dormindo.
Me levantei e fui esticar as pernas. Chamei meu corvo, ele surgiu das sombras. Estiquei o braço para que pousasse, e assim que o fez coloquei minha mão em suas plumas, que começaram a mudar. O pássaro tornou-se uma grande coruja-de-igreja.
— Sei que nossos novos amigos ainda estão vivos. Encontre-os.
A ave levantou voo e desapareceu no céu noturno.
Autor: HaltTW
Revisão: Bravo
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