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Bruxa Errante, a Jornada de Elaina – Vol. 5 – Cap. 09 – Duas Aprendizes

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— Se você seguir para o oeste, há um local chamado de Cidade Livre de Qunorts, e hoje temos uma encomenda direta para transportarmos isso para o porto de lá.

A bruxa de cabelo preto – convocada para uma filial da Associação Unida de Magia em um certo país – recebeu essas instruções enquanto sua mestra pressionava uma pequena caixa contra ela.

— O que é isso…?

A caixa parecia um pouco antiga e valiosa. Não era possível ver nem mesmo uma rachadura no elegante recipiente, além de ser completamente suave ao toque. Não havia nenhuma chave na tampa, a qual parecia abrir com um pouco de força. Nenhum barulho era feito, mesmo quando a chacoalhava. O lado de dentro provavelmente foi feito com capricho, assim como o lado de fora.

Conforme a bruxa examinava a caixa cuidadosamente, sua mestra removeu o longo tubo da boca e soprou um monte de fumaça de fumo. A bruxa fechou seus olhos por causa da fumaça, a qual era muito fedida.

Sua professora disse:

— Farei um pequeno desvio antes de ir para Qunorts. Você deve ir primeiro e entregar isso para a filial da Associação Unida de Magia. Não a abra durante o caminho, entendeu? Parece que tem algo realmente horrível aí dentro.

— Tá, tá bom! — Ela não tinha absolutamente nenhuma noção do que havia na caixa, mas seu trabalho era para apenas transportar aquela coisa. Parecia dinheiro fácil.

Mamão com açúcar.

A bruxa riu sozinha, internamente… Quem ela poderia ser?

Isso aí. Eu mesma, Saya.

— Ah, certo, lembrei…

Quando estava prestes a sair do escritório da Associação Unida de Magia, minha professora me chamou de novo pelas minhas costas.

— Sua irmã mais nova está se infiltrando em uma certa organização na mesma cidade… Bom, após você chegar, acho que está tudo bem se conversarem um pouco em segredo. Faz um tempo que não se veem, não faz?

 

 

O território conhecido como a Cidade Livre de Qunorts, ao qual cheguei naquele dia, ficava isolado no litoral.

            Não havia nada ao seu redor, somente grama que se balançava com o vento. Seu verde pálido se estendia abaixo do céu outonal e, do outro lado da cidade, estavam expostos o azul do céu e do mar. Esse cenário era absolutamente deslumbrante, mas parecia que eu conseguiria vê-lo em qualquer lugar.

Também não sabia dizer se a própria cidade era algo parecido com o que existia em outras partes do mundo.

Não parecia ter algo peculiar sobre a visão da cidade e, quando passei pelo portão, fui recebida pelos prédios claros com vidros quadrados – perfeitamente alinhados a uma distância igual entre eles. Se baseando somente na aparência da visão exterior, não havia nada de estranho.

Uma inspeção mais detalhada revelou que a cidade estava passando por turbulências.

MAGOS SÃO PERIGOSOS? MAIS VIOLÊNCIA DA FACÇÃO DOS ANTIQUÁRIOS, dizia a manchete do jornal que estava na livraria que espiei. Ocupava toda a primeira página e um bando de idosas estavam tagarelando como um grupo de hienas que sentiram o cheiro de algo gostoso.

— Ah não… a Facção dos Antiquários está atacando magos de novo, pelo que parece.

— Meu deus! Meu marido é um mago, sabia?

— Assustador.

Elas estavam preocupadas com um assunto importante para os magos.

A única coisa que entendi com certeza foi que havia alguma organização secreta operando na cidade, e que se eu andasse por aí parecendo uma maga, provavelmente chamaria alguma atenção desnecessária dessa “Facção dos Antiquários” ou sei lá o que.

— …

Naquele dia, assim que encontrei uma pousada, tirei minha capa e chapéu pontudo e troquei para um conjunto simples de saia longa e camisa. Uma aparência bem outonal.

Neste traje, ninguém vai pensar que sou uma maga.

Com isso resolvido, andei pela cidade tranquilamente, com meu cabelo cinza balançando em minhas costas e torcendo para encontrar algo interessante nessa cidade.

Fiz meu turismo por Qunorts sem fazer muito barulho.

Comprei pão em uma tenda na beira da estrada e passeei um pouco pela cidade. Não havia quase nada que valesse a pena mencionar sobre o local, nada estranho ou interessante, exceto que as pessoas que caminhavam pela cidade pareciam ter medo de algo que não podiam ver.

— Estão muito perturbados, né…?

Eu não sabia quanto poder aquela Facção dos Antiquários tinha, mas pelo menos os magos da cidade pareciam estar com sérios problemas com o grupo.

Eu sabia porque em todos os becos, ou nas vitrines das lojas, panfletos e cartazes foram colados, contendo muitas frases difamatórias.

AFRONTEM OS MAGOS!

MAGOS SE ACHAM PORQUE CONSEGUEM USAR MAGIA! QUE ULTRAJANTE!

CAIAM FORA, MAGOS!

Por ninguém estar retirando esses cartazes, ficava claro que a Facção dos Antiquários estava crescendo e ficando mais forte.

Não tenho um bom pressentimento sobre isso…

Olá, senhorita. Não te vi por essas redondezas antes. É uma viajante?

Depois de caminhar um pouco, ouvi a dona de uma tenda me chamar. A mulher duvidosa, com um chapéu pequeno em sua cabeça, tinha dentes visivelmente tortos, os quais faziam parecer que ela tinha presas. Seus caninos rebeldes faziam com que parecesse anos mais nova.

Hã?

Quando parei de repente, ela disse:

— Ho-Ho… Você é uma idiota para visitar essa cidade em tempos tão perigosos — e gargalhou.

Aha, está me provocando? Devo comprar briga?

— Parece que essa organização, “Antiquários” está incitando a violência nessa cidade.

— É verdade. Minha nossa. Eles são a razão de não termos nenhum negócio. Graças a eles, tem cada vez menos turistas ultimamente e, mesmo se eu abrir a loja, ninguém vem comprar nada. É um problemão.

— O que você vende…?

— Hm, não consegue ver? Parece que temos uma idiota aqui.

Ah, entendi, está vendendo insultos, né?” Foi o que eu quase disse, mas silenciei esses pensamentos limpando minha garganta e olhando ao redor. Assumi que espadas e armas estariam forrando as estantes, mas a loja estava cheia de blocos de notas, canetas e outros artigos de papelaria. Também havia outros objetos do dia a dia, como lenços e espelhos. Resumindo, parecia que tinha todo tipo de coisa fútil.

— Então você é uma catadora de lixo? — perguntei.

— Está me zoando?

— Não, perguntei a sério.

— … — A moça com presas suspirou profundamente. — São para autodefesa. Esse território está meio agitado ultimamente, então estou vendendo objetos para se proteger. Que tal? Quer um?

— Na verdade, não.

— Não fale isso, compre um. Nunca se sabe quando vai ser atacada por uma facção perigosa, hmm?

Posso me proteger sem comprar essas coisas.

— Não sou maga nem nada assim, então não acho que preciso me proteger — falei.

A Facção dos Antiquários está atrás dos magos, não? Temo que eu não seja uma maga no momento… Se essa é minha história, não preciso de proteção, preciso?

Como te disse, estou bem. Enfim, tenho que ir

E então, virei minhas costas para a loja.

Ah, espera. A mercadora me chamou pelas minhas costas. Aqui, uma amostra grátis. Pegue.

Me virei para a voz dela e, nesse mesmo momento, ela jogou algo para mim. Uma única bala viajou pelo ar e caiu na minha mão estendida. Quando segurei com meus dedos e a levantei, vi em sua embalagem, escrito em letras chamativas, VISITE NOSSA LOJA PARA SE PROTEGER!

— É uma amostra por vir à minha loja. Se tiver algum problema, venha de novo. Vou ter exatamente o que precisar

— Obrigada…

Abri a embalagem e joguei o doce em minha boca.

 

 

Logo após chegar na Cidade Livre de Qunorts, fui tomada por uma sensação estranha.

— É uma maga…!

— O que ela está fazendo aqui…?

Escutei vários sussurros.

Será que estão falando alto de propósito para eu escutar? Hm…

Me sentindo desconfortável, caminhei depressa pela cidade.

Vamos rápido para o porto para terminar o trabalho

Ei, espera. Você. Você aí, garota. Qual é a pressa?

Justo quando está com pressa, você é pego em algum obstáculo. Uma voz chamou em algum lugar atrás de mim conforme me apressava pela cidade.

Ignora, finge que não ouviu. Não tenho tempo para conversar com qualquer um.

Eeei! Estou falando com você, Bruxinha Fofa!

Ah, está falando comigo?!

Opa. Eu me virei.

— Estou, estou. Aonde vai com tanta pressa? Essa cidade é perigosa a essa hora. Principalmente se está vestida assim. Nunca se sabe quando pode estar em perigo.

A mulher que me chamou de dentro de uma tenda na beira de uma estrada tinha uma aparência que era… difícil de descrever. Seu cabelo era vermelho e longo, mas isso era a única característica visível ao olhar. Ela vestia um gorro puxado para seu rosto, para que seus olhos não fossem vistos, e tudo abaixo de suas orelhas estava coberto com uma peça de roupa, então nenhuma outra parte de seu rosto estava visível.

Ela deve ter vergonha da própria aparência. Coitada…

O que foi? Não gostei do jeito que me olhou. Hunf. — A mulher bufou pelo seu nariz, como se não estivesse feliz. Para que veio para essa cidade? Vir aqui parecendo com uma maga é pedir para te atacarem, sabia?

Aqui é tão perigoso assim…?

É absurdamente perigoso.

Absurdamente? Parece ser sério.

Uhum. E, por causa disso, você vai precisar de alguma proteção personalizada para continuar vivendo aqui

Ah, não dou atenção para vendas agressivas assim, então… Me virei rapidamente.

Ei, espera um pouco! A mulher elevou seu tom conforme batia em uma prateleira da loja.

Quando me virei, ela estava com seu braço levantado e havia jogado algo para mim. Aquilo voou um pouco e bateu em meu peito antes de cair no chão. Uma bala.

— Minha loja está vendendo produtos para defesa… Venha sempre que quiser.

Peguei a bala e a guardei em meu bolso.

— Obrigada… — De alguma forma, tive a impressão de que se eu comesse na frente dela, as pessoas iriam ter uma impressão ruim de mim, por exemplo: Uau, aquela garota está comendo algo que pegou do chão! Que porca!

E então virei minhas costas para a loja e comecei a andar de novo.

— Tenha cuidado. Se quiser ficar viva nessa cidade, é melhor não confiar em ninguém.

A dona da loja disse algo que parecia importante, depois riu rudemente.

Caminhei para longe da loja, descendo a rua principal da cidade.

Como esperado, os olhares dos moradores eram desconfortáveis, o suficiente para me fazer querer trocar minhas roupas de bruxa assim que possível.

— … — Entre os olhares frios, podia sentir um grupo de olhos diferentes me seguindo.

Quando percebi, estava perdida em uma rua vazia. Não havia uma única pessoa na rua além de mim, mas eu ainda conseguia sentir aqueles olhos atrás de mim.

O que será?

Parecia com a maneira feroz com a que um caçador olharia para sua presa, como um olhar obsceno que me lambia do topo da cabeça até as pontas dos meus pés.

Um enorme calafrio me percorreu. Alguém estava vindo atrás de mim. Daquilo eu tinha certeza.

Comecei a preparar minha varinha.

Eu me virei lentamente…

Então vi alguém – alguém assustador estava com sua boca coberta por um pano.

Após isso, um braço rapidamente deslizou ao redor de meu pescoço, algo cobriu a minha boca e eu fui arrastada de lá.

…! Mmph! Nmmhh..!

Ah, isso é ruim. Talvez eu morra…!

Meu coração começou a acelerar pela sensação de perigo, batendo como se fosse um alarme. Enquanto eu estava chutando e me debatendo, ouvi uma voz bem em minha orelha.

Fique quieta, irmãzona… aqui é perigoso. Precisamos escapar.

Eu conhecia essa voz gentil e acolhedora.

Mina…?

Em minha frente estava o rosto de minha irmã mais nova, a qual eu estava vendo pela primeira vez em muito tempo… Por mais que eu não pudesse realmente vê-la, devido à roupa.

Perambulando por aí com essas roupas, você deve ter um desejo de morte disse ela. Nunca tinha visto esse seu lado.

Nos dirigimos para a parte de trás de uma viela estreita e deserta.

Puxada pela minha irmã mais nova, Mina, passei pela viela escura de trás, onde havia uma porta isolada no final. Fui puxada para dentro da pequena sala atrás dela. Independente da maneira como a situação fosse vista, eu era um rato em uma armadilha.

Mina suspirou e removeu o tecido que cobria sua boca, revelando seus sedutores lábios cor de pêssego. Quando retirou seu chapéu, seus longos fios de cabelo se soltaram. Conforme balançava a cabeça, seu cabelo flutuava. Havia algo sensual nessas ações.

Em comparação com meu corpo pequeno e feio, minha irmãzinha parecia estar irradiando feromônios. Que frustrante.

Ela realmente cresceu durante o período em que estivemos separadas. Angustiante.

— Ah, Mina, há quanto tempo…

Já que fazia tanto tempo, levantei minha mão para cumprimentá-la.

— … — Em troca, recebi um olhar ameaçador. Minha irmãzinha conseguia ser tão fria. — Por que está aqui…?

Para piorar as coisas, fui imediatamente tratada como um incômodo.

— Trabalho. Estou aqui por causa do trabalho. — Retirei a caixa da minha bolsa por um segundo.

Mina e eu, nós duas, trabalhamos para a Associação Unida de Magia, mas, infelizmente, não nos encontramos com frequência. Passo meu tempo viajando sozinha, sem rumo, enquanto Mina fica ocupada com suas infiltrações e investigações. Então, mesmo se quiséssemos, não conseguiríamos nos ver.

Uff… Então o mago que viria com a caixa era minha irmã… — Mina suspirou exageradamente. — De todas as pessoas…

Hunf. Qual é a desse comentário?!

— Mina, você não está no meio de uma investigação? Não tem problema estar aqui assim? — Estava incomodada com a fala dela, então tentei dar o troco.

— Claro que tem. Você fez algo estúpido, por isso corri o risco de vir te parar.

— … — Ela parecia estar me repreendendo por andar pela cidade com uma capa. — Eu planejava trocar de roupa depois de entregar a caixa no porto, sabia?

— Já seria tarde demais.

O que? Inclinei minha cabeça para o lado, o que fez Mina me olhar fixamente com olhos frios.

— A “Facção dos Antiquários” que está enraizada nessa cidade é um sorrateiro grupo de ladrões que tem objetos especiais em sua posse. Eles são movidos por seu ódio por magos, mas não são diferentes de ladrões comuns que roubam ou atacam mercadores.

— Hmhm.

Falando nisso, você tem um pouco de água? Está muito quente aqui. Não? Tá.

— Recentemente, a Facção surgiu com um plano de purificar a cidade dos magos. O que você trouxe hoje é, na verdade, uma das ferramentas para fazer isso.

— Ou seja…?

Inclinei minha cabeça a questionando, então Mina espiou minha bolsa, a qual deixei aberta.

— Em outras palavras, a Facção dos Antiquários já sabe sobre essa caixa. Na verdade, é possível que tenham agido para trazê-la até aqui.

— …

— Não sei que tipo de poder pode ter, mas tenho certeza de que não é nada bom, porque o líder da facção disse: “A caixa que virá com uma assistente da Associação Unida de Magiaa é essencial para nosso próximo ataque!”

— … — Ora essa, já ouvi esse tom de voz em algum lugar…

— Hm, então eu teria sido encurralada no porto?

— Se eu não tivesse ido te salvar. — Mina levantou os ombros como se dissesse que eu era um incômodo para ela.

Minha irmãzinha conseguia ser tão atrevida!

— Então o que devo fazer agora…?

— Por enquanto, fique com a caixa. Ainda tenho algumas coisas para investigar. Se eu conseguir uma lista com todos os membros da organização, conseguiremos prender todos.

— Então devo esperar na cidade até que isso ocorra…?

— Exatamente — disse Mina. — Inclusive, você tem um lugar para ficar? Se quiser, pode viver comigo nessa casa.

— Ah, irei ficar em uma pousada, então está tudo bem. Não se preocupe comigo!

Não quero ficar no caminho da minha irmã enquanto ela trabalha. Além disso, aqui está empoeirado e meio quente. Também não geraria problemas se eu ficasse na casa de alguém que está no meio de uma infiltração?

— … — Algo pareceu ter a magoado, porque Mina franziu sua testa. — Entendi… — disse ela enquanto soltava um longo suspiro.

A Mina sempre foi uma pessoa de poucas palavras, então nunca entendi bem o que ela pensava. Mesmo assim, ela sempre foi mais madura do que eu e uma garota confiável, então, no passado – especialmente antes de conhecer a Elaina – sempre fiquei grudada nela.

Mas agora nós duas tínhamos trabalhos, e praticamente não nos víamos, então senti como se tivéssemos ficados distantes.

— …

— …

Nós ficamos em silêncio, e eu fiquei mexendo em meu bolso enquanto escolhia minhas próximas palavras.

Lembrei que recebi uma bala mais cedo. Pensei que poderia chupá-la e molhar um pouco a minha garganta. Retirei a embalagem e joguei a bala para minha boca…

E, então, algo dentro de mim queimou.

 

 

 

…? O que está acontecendo? Sinto minha cabeça leve.

— De qualquer forma, não faça nada até que eu tenha impedido a revolta da Facção dos Antiquários, Irmãzona.

Irmãzona…? Quem? Não tenho nenhum irmão.

Parando para pensar, essa é minha primeira vez vendo a garota na minha frente.

Quem é você?

Por que estou aqui…?

Dessa vez, o plano deles parece ser um ataque simultâneo a todas lojas da cidade… da joalheria até o vendedor de armas, o mercado, até mesmo restaurantes e pousadas. Se eu não os impedir, o dano será catastrófico.

A garota sentada próxima de mim estava falando sério, mas eu estava totalmente ocupada tentando entender o que estava acontecendo.

Dei tapas leves em minha pele. Tentei me beliscar. Não parecia ser um sonho. Dentro de minha boca, uma bala estava rolando.

Hã? Pensei que isso tinha se dissolvido há um tempo…

Hmm…?

Uma vez que eu impedir os ataques, levaremos a caixa para a Associação Unida de Magia no porto. Então podem a entregar para a nação da ilha. Essa é a rota mais segura.

…? Ainda não fazia ideia do que se tratava.

Tudo parecia nublado, como se fosse um sonho.

Perto de mim havia o objeto que ela continuava chamando de aquela caixa. Estava casualmente dentro de uma bolsa.

— Irmã, tenho uma pergunta, você percebeu algo estranho desde que entrou na cidade…?

— Éé, foi mal, mas quem é você? Eu sou…

— Me poupe das piadas.

Mas eu não estou fazendo piada.

Retirei a caixa de dentro da bolsa.

Era mais ou menos do tamanho certo para segurar com as duas mãos. Não era muito larga. Para explicar o que se passava na minha mente naquele momento, eu somente focava na curiosidade do que poderia estar lá dentro.

Havia muitas outras coisas me atormentando, tantas que eu não sabia por onde começar. Então foquei apenas na caixa.

— Entendeu? Não sei o que a Facção dos Antiquários pode fazer com você, irmã. Não abaixe sua guarda…

Deixando as palavras dessa pessoa que eu nunca vi passarem por minhas orelhas, coloquei minha mão na caixa.

E então, a abri.

— …! Irmã! O que está…

Somente após revelar o conteúdo da caixa que percebi que provavelmente não deveria ter o feito.

No entanto, não conseguia ver nada dentro da caixa, já que o que havia lá dentro não era algo, mas apenas fumaça – fumaça que se expandiu, deixando tudo ao redor branco.

Naquele momento, eu não sabia o que era que estava dentro da caixa.

E ainda não sabia o que havia acontecido comigo.

De dentro da nuvem branca, ouvi uma tosse.

A fumaça que havia saído da caixa gradualmente se dispersou, e então pude ver novamente. Se me lembro bem, foi nesse momento que minha habilidade de pensar voltou ao normal.

Meu nome era Elaina. Estava no meio de um passeio turístico pela cidade. Recebi uma bala de uma tenda do canto da estrada.

Agora eu era outra pessoa. Parecia estar em uma conversa com a irmã mais nova de alguém, enquanto chupava uma bala.

Interessante. Não estou entendendo nada…

Irmã… zona…

A primeira coisa que encontrou meus olhos quando a poeira abaixou completamente foi a irmã mais nova que eu encontrei pela primeira vez. Alguns momentos antes, ela estava falando sobre algo importante com uma expressão séria em seu rosto.

Ela estava encolhida no chão, olhando para mim, respirando de forma irregular.

— Você está bem…?

Ela não parecia bem. Seu rosto estava vermelho até as orelhas e ela estava arfando com respirações profundas, como se estivesse com febre.

Ah não. Será que a fumaça era um gás venenoso ou algo do tipo…? Mas eu estou bem… Aaah, não tenho ideia do que está acontecendo!

De toda forma, parecia que a prioridade era ajudar a garota que estava sofrendo.

— Qual o problema? É o seu estômago? Está com febre? Acha que vai vomitar? — Fui para o lado dela, coloquei minha mão em sua testa e esfreguei suas costas para ela.

— Não me toque! — A irmã mais nova cujo nome eu não sabia me empurrou. Eu me desequilibrei e caí no chão, então ela também caiu, por cima de mim.

— É… — Tão pesada.

Hah, hah… — A irmã mais nova de alguém colocou suas mãos no chão, uma em cada lado do meu rosto, e se levantou lentamente.

— Hmm… — Nessa posição, parecia que era ela quem me pressionava contra o chão.

— Irmã… zona… — A garota parecia extremamente mal, e seus olhos… Após olhar novamente, ela não parecia mal. Parecia embriagada.

— Éééé… — Estou com um mal pressentimento quanto a isso.

— Irmã… Irmã… — A garota estava murmurando delirosamente: — Você é linda…

— … — De alguma forma, pude sentir que havia algo bem errado acontecendo.

— Aaaaaah… Eu te amo.

— Aaaa…!

Ela aproximou seu rosto do meu.

— Irmã… Eu… Por muito tempo, eu… Bom, tenho certeza de que é estranho por sermos irmãs, mas, bem, eu sempre te amei. Estranho, né? Você é a única coisa em que consigo pensar. É minha irmã mais velha, mas sempre me seguiu como um cachorrinho e dependeu de mim. Mas que irmãzona mais incapaz que você era. Você é tão, tão fofa e fofa e fofa e fofa e fofa… Não consigo aguentar! Ah, eu não preciso de nada além de você na minha vida. Ainda assim, sempre te tratei tão friamente! Desculpa. Eu sempre te amei, de verdade, mas não conseguia ser sincera sobre meus sentimentos. De verdade, eu só quero te comer todinha. Eu te amo, amo, amo, amo, amo, amo, amo, amo, amo, então, por favor…

— Não.

Ponto final. Eu a atordoei com a varinha que segurava, então ela grunhiu antes de cair em cima de mim novamente.

Dessa vez, seus olhos estavam avermelhados e ela não tentou se levantar.

Parecia ter desmaiado.

Uff... — Tirei ela de cima de mim e me sentei.

Mas o que…?

Após arrumar minhas roupas desordenadas, coloquei um chapéu pontudo e saí de lá – somente após isso que entendi o que estava acontecendo.

 

 

 

 

Se tivesse que resumir o estado da cidade em uma palavra, seria caos. Essa parecia descrever perfeitamente a situação.

— Aah! Eu te amo! Por favor, saia comigoooooo!

— He-he-he-he… Me espere…

— Eu sempre te adoreeeeeei!

— Eu te amo! Sempre te amei!

— Ah! Espere! Não vá!

— Ha-ha-ha-ha! Meu corpo pertence a você

— Pare! Já tenho uma garota em meu coração!

— Não! Não chegue mais perto!

— Ha-ha-ha-ha-ha-ha!

— Eca! Nojento! Morra!

No momento que desviei meus olhos, a população inteira aparentemente começou a brincar de pega-pega. Foi a única coisa que consegui imaginar, já que todas as pessoas da cidade estavam correndo por aí, perseguindo alguém.

Alguém fugiria, enquanto outra pessoa a perseguiria, e essa peça teatral toda iria parar e se repetir. Ninguém ficava parado.

— Mas que…?”

Mas o que está acontecendo?

A cidade inteira ficou maluca.

Após isso, minha capacidade mental de processamento havia chegado ao limite. Era muito coisa de uma vez. Senti como se quisesse chorar.

O grande mistério era que, mesmo que todos na cidade estivessem malucos, eu ainda me mantinha sã, do meu próprio jeito. Era estranhamente solitário – não que eu quisesse enlouquecer ou algo assim.

De alguma forma senti que, já que era a única sóbria em todo o local, cabia a mim resolver essa situação.

Hm, isso é irritante.

Como meu primeiro passo, andei pela cidade enquanto desviava de todas as pessoas que corriam perto de mim.

Entre os gritos confusos e os flertes descarados, me devotei a solenemente observar a situação.

Parando para pensar, deveria haver uma filial da Associação Unida de Magia no porto. Talvez eu deva me dirigir para lá.

Isso deve estar acontecendo porque abri aquela caixa, mas… Não consigo nem mesmo entender o que está acontecendo com meu próprio corpo.

Depois de caminhar um pouco, algo aconteceu. Eu já tinha chegado no porto, sem nenhum problema. Já até estava na filial da Associação Unida de Magia.

— Aaah! Ah, aaaah… Essa é…? Aaah. Não pode ser!

Mas, claro, havia uma pessoa estranha ali também. Era uma garota estranha, olhando para o vidro de uma cafeteria que ficava próxima da filial e balbuciando. Ela era suspeita, independentemente de como se olhasse.

A cidade inteira tinha ficado louca, então não fiquei surpresa de ver alguém olhando para o vidro de uma cafeteria enquanto murmurava:

— Uau… eu te amo…

De alguma forma, tive a impressão de que não valeria a pena falar com ela.

— … — Assisti a figura da garota me mantendo escondida. De um certo ponto de vista eu também parecia suspeita.

— Você é muito linda… e super adorável de todo ângulo…

— … — Estranho, mas eu já tinha visto essa garota antes.

Suas roupas eram bem comuns, apenas uma camisa e uma saia longa. Seu cabelo era cinzento. Era longo e suave, preso em um estilo metade para cima, metade para baixo. Seus olhos cor lápis-lazúli estavam olhando amorosamente para seu próprio reflexo no vidro, a ponto de ambos parecerem estar com formato de coração. Sua boca estava aberta, solta e babada, enquanto sussurrava, “Eu te amu… ” Era praticamente possível ver corações flutuando com suas palavras.

Aquela garota, se contorcendo e abraçando seu quadril e ombros, parecia ser uma bruxa e uma viajante.

Quem você acha que era?

Era eu…

— … — Hã? Por que tem duas de mim?

Quando me aproximei da garota com minha cabeça inclinada, confusa, percebi que minha própria aparência havia mudado. Meu corpo, refletido no vidro, era o de uma bruxa da Associação Unida de Magia, vestindo um chapéu preto e pontudo e uma capa preta. Meu cabelo, preto como carvão, estava solto e ia até meus ombros, e meus olhos eram pretos também. Parecia até que era do Leste.

Ou seja…

— Saya…?

Eu era Saya. Seu cabelo estava um pouco maior desde a nossa última interação, mas eu estava definitivamente olhando para Saya.

— Elaina…?

Ao ressoar da minha voz, a pessoa que estava em meu corpo se virou. Naquele momento, tive certeza de quem era.

— …

— …

Olhamos uma para outra, em frente à cafeteria. Era como olhar no espelho, e ambos os nossos rostos estavam surpresos. Nos levou um tempo para que percebêssemos precisamente o que havia acontecido.

Resumindo, uma situação inconcebível havia acontecido conosco.

Será que… trocamos… de corpos?

 

 

Vamos esperar um pouco para nos recompor.

Com esse objetivo, escapamos para a cafeteria, ignorando a garçonete, que gritou: “Bem-vindas… Ah! Chefe, eu te amo!” e correu para algum lugar. Nos sentamos em uma mesa próxima da janela.

— Hã? O que é isso? O que está acontecendo? Não estou entendendo. Explique para mim, por favor. — Presa no corpo de Saya, segurei e chacoalhei firmemente os ombros dela, a qual estava sentada na minha frente, no meu corpo.

— Eu também não sei! Só chupei uma bala e, então, me tornei você, Elaina… Mas não faço ideia de por que a cidade está assim.

Ah, não.

Esqueça isso. Entendi, mais ou menos, a razão.

Hã?

De qualquer forma, indo para a razão pela qual trocamos de corpo…

Então foi culpa das balas. Claro, eu a chupei, e estava na boca da Saya também, mas…

Não, espera. Então você sabe o motivo para a cidade estar assim?

Éé, vamos deixar isso de lado por enquanto… Balancei minhas mãos casualmente para os lados.

— Ah, parando para pensar, deveria ter uma caixa junto comigo, mas… o que aconteceu com ela? Aparentemente é um objeto perigoso que definitivamente não deve ser aberto.

— … — Dessa vez, eu desviei meu olhar.

— Hm? Qual é a dessa reação?

— …

— Não me diga, você a abriu…?! — gritou ela levantando de seu lugar.

— … — Eu sabia que não conseguiria escapar dessa vez. — Bem, talvez um pouco…

— Um pouco! O que estava pensando?! Sério! — Saya me bateu gentilmente. Vendo-a em meu corpo, eu estava tomando mais dano mental do que físico. — Não era óbvio que nada de bom aconteceria se a abrisse?!

— Não, porque ninguém me disse nada sobre ser errado abrir ela!

— Minha irmã mais nova não te parou?

— Irmã?

— Se você e eu trocamos de lugar, então você deveria estar no local em que eu estava, onde minha irmã estava. Ela não estava lá? Ela tem cabelo preto e é terrivelmente sensual.

— …

Aaaaaaah… Eu te amo.

Irmãzona… Eu… Por muito tempo, eu…

— É… Sim… Ela…

— Você está pálida.

— Então vocês são irmãs…? Vocês… se parecem…

— Hã? Sério? — Não parecendo nem um pouco desapontada, ela riu. — E-he-he-he…

— Poderia parar de fazer essa expressão com meu rosto? — Irritada, olhei pelo vidro.

A cidade ainda estava em caos. Pessoas continuavam se perseguindo por aí.

— Elaina, o que está olhando… Ah! Te amo!

Por sua vez, imediatamente após Saya seguir minha visão para a janela da cafeteria, se grudou em sua própria figura refletida no vidro. Nunca fiquei tão confusa.

O que ela está fazendo? Perdeu a cabeça?

— Se afaste da janela, por favor.

— Jamais! Nunca vou me separar da Elaina, pelo resto da minha vida!

Eu suspirei.

— Por enquanto, nossa prioridade deve ser voltar a cidade ao normal, não…? Quero dizer, não bem nossa, acho. É o que eu devo fazer.

Porque fui eu que causei isso.

Tudo bem, já que agora eu sou a Elaina, também deveria fazer algo, né?

Era uma maneira confusa de falar em uma situação já confusa, mas Saya parecia dizer que iria me ajudar.

Fico grata, mas saia dessa janela, por favor.

Imagino, o que poderia ter estado dentro daquela caixa…? Fumaça cobriu a cidade, e então todo mundo passou a agir de um jeito engraçado, mas… Saya estava gemendo enquanto inclinava sua cabeça, se questionando.

Se afaste desse vidro!

— …

Eu tinha uma certa ideia, já que a irmãzinha dela disse que ela iria entregar a caixa para a nação da ilha e todo mundo ficou louco no momento em que a abri.

Não era um feitiço. Era uma maldição.

Pelo que pude deduzir após assistir Saya recuperando a sanidade ao me ver no vidro da cafeteria, o que quer que estivesse afetando a cidade, não era nada como uma magia de amor, mas… não tinha nada que pudéssemos fazer com essa informação.

Basicamente, nossa situação era o pior cenário possível.

Só porque sei que não é, não significa que vou conseguir lidar com isso aqui e agora.

— A Facção dos Antiquários provavelmente sabe de algo. — Apoiei minha cabeça em minhas mãos.

Saya colocou uma mão em meu ombro e disse:

— Ouvi isso da minha irmãzinha, mas aparentemente esse grupo sabia sobre a caixa… Devem saber como lidar com ela.

E, então, Saya me contou cada informação que ouviu de sua irmã, desde o começo.

Blá-blá-blá. Concluindo

— Acho que provavelmente conseguiremos resolver essa situação se caçarmos a Facção dos Antiquários, os capturarmos e fazê-los falar tudo que sabem…

Ela acenou determinadamente para mim.

— Tenho um pressentimento, não tenho certeza do porquê, de que a Facção dos Antiquários provavelmente está envolvida na causa da nossa troca de corpos.

— Bom, seria coincidência demais se tivesse acontecido por causa de alguma bala…

Falando de outra forma, fomos enganadas para chuparmos as balas como parte de algum esquema e terminamos assim. Pelo menos, era essa a minha suspeita.

Faz sentido, assumindo que conseguiriam me colocar em uma posição para abrir a caixa.

— De toda forma, devemos achar um dos membros da tal facção, não?

Se alguém do lado oposto somente aparecer convenientemente aqui, iria nos poupar muito tempo e esforço, mas…

Eu suspirei e, nesse momento, aconteceu.

— Ninguém se meeeeeeeexe!

A porta da cafeteria foi aberta com força, e um grupo de aparência verdadeiramente suspeita com pedaços de pano cobrindo seus rostos invadiu.

Cada um deles tinha uma espada ou arma extremamente velhas, um arco ou uma lança, ou até mesmo uma caneta ou frigideiras normais. Todos tinham algo, desde armas de verdade até objetos do dia a dia. Pela aparência deles, pareciam ser catadores de lixo segurando seus lixos.

— Não percam tempo! Os efeitos da fumaça não vão durar um dia todo! Temos que roubar tudo que pudermos e escaparmos antes que acabe! Não se segurem! Vão logo e terminem!

Com gritos estridentes de “Hya-ha!”, o grupo avançou pela cafeteria, pegando dinheiro das carteiras dos clientes, fugindo com as moedas do caixa e, se aproveitando da situação, destruindo mesas e outros móveis.

Bem.

Que bando de vagabundos. Quem poderiam ser?

Olhamos uma para a outra.

— …

— …

— Parando para pensar, minha irmã disse que a Facção dos Antiquários iria roubar todas as lojas pela cidade.

— Ah-ha, perfeito.

E, então, me levantei.

 

 

— É, foi mal por me deixar levar…

— Está tudo bem, de verdade. Desde que me fale onde seu líder está.

Havia uma bruxa horrível lá, rindo sozinha – “oh-ho-ho!” – conforme maltratava o homem que estava amarrado com cordas. O cabelo elegante dela se estendia até seus ombros, ela vestia uma capa preta e um chapéu pontudo. Chutava, chutava e chutava o homem.

Ela devia ser algum tipo de demônio

E quem era aquela bruxa?

Exato. Era a Saya.

— Pare de mentir, Elaina.

— …

Diretamente atrás de mim, uma garota com cabelo cinza estava olhando para mim. Era eu, mas com Saya dentro. Mas se parecia comigo do lado de fora, não podíamos dizer que era eu?

Comecei a agir de forma imprudente com essa nova mentalidade.

— Por favor, não aja tão fora de controle com o meu corpo — implorou Saya. — Depois desse incidente ser resolvido, todo tipo de pessoa vai ficar brava comigo. — Ela estava com as bochechas estufadas, irritada.

Já que eu estava no corpo de Saya, tudo que fizesse podia ser jogado para ela depois.

Entendo.

Sentei em frente de um dos ladrões vendados.

— Se apresse e fale. Se não, vou quebrar seus dedos, um por um. Créck! Créck!

Descrevi com detalhes brutais como usaria um feitiço para sadisticamente torcer seus dedos para trás até quebrarem.

— H-Hunf…! Eu sou um membro da Facção dos Antiquários, sabia? Nunca vou ceder para tal ameaça…

— Tá. — Créck!

— Aaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaahhhh! — Chorou ele, em agonia. — E-Espera, espera! Espera um…

— Ops. — Créck!

— Aaaaaaaaaaaaaahhh! — Outro pranto agonizado. — Desculpa! Desculpa! Vou falar! Eu vou…

— Hm? — Créck!

— Aaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaahhhh!

Para alguém pertencente a uma organização que incomodava a sociedade como a Facção dos Antiquários, o ladrão parecia bem cavalheiro, verdadeiramente motivado por um forte senso de justiça, e respondeu todas as minhas perguntas.

— Por favor, não minta, Elaina.

— …

Ali havia uma garota com cabelo acinzentado que me olhou desapontada.

Após isso, nos dirigimos para a localização do líder, a qual convenci (forcei) o ladrão a nos dizer. Aparentemente, a pessoa que chamavam de líder estava se escondendo no porão abaixo de uma taverna da cidade…

— Aaah… e pensar que minha Elaina é uma sádica que ri enquanto quebra os dedos das pessoas… Não aguento…

Conforme caminhávamos para nosso destino, a garota atrás de mim chorou abertamente.

Olhei para ela por um momento.

— Não me diga que realmente pensou que quebrei os dedos daquele homem. Além disso, não sou “sua Elaina”.

— Hã? Mas, Elaina, você está usando o pingente que te dei, não está? Olha.

— Ah, estava pensando em vender ele.

— Malvada…

— … — Suspirei profundamente. — Meu Deus, é claro que estou brincando, e também não quebrei os dedos do fulano.

— Não, mas, Elaina, tenho certeza de que assisti atrás de você enquanto os dedos dele viravam para uma direção estranha.

— Assim? — Com um grunhido de esforço, apliquei o mesmo feitiço no meu próprio dedo e ele se torceu para trás.

— Aaaaaaaaaaaaaaaaaaaahhhh! — O choro horrível pertencia a Saya. — O-O-O-O-O-O-O que está fazendo?! Meu dedooooooo!

— Calma. — Você tem que parar de fazer essas feições enquanto está no meu corpo.

— Hyaaaaaaaaaaaaaaaaaaaahhhh!

— Te falei para se acalmar! — Parei o feitiço que havia colocado em meu dedo. Imediatamente, ele voltou ao normal. Eu era capaz de virar e fechar ele como se nada tivesse ocorrido.

— Aaaaah… Hã? — Piscando, surpresa, Saya inclinou sua cabeça. — Mas o que…?

— Simplesmente usei um feitiço para virar o dedo um pouco mais do que o limite do alcance normal. Só isso.

Um dedo humano pode se virar para trás em, aproximadamente, noventa graus. Se forçar o dedo a se mover um pouquinho mais desse alcance, é terrivelmente doloroso. E se acontece rápido, pode fazer você pensar que seu dedo quebrou.

Na verdade, eu brinquei com a sensação de dor do homem, mas não senti nenhuma necessidade de falar sobre isso, então decidi ficar quieta.

— Mas, se você não quebrou nada mesmo, o que era aquele barulho estranho…?

— Torci alguns aipos.

— Aipos.

O homem estava amarrado com cordas, então ele confundiu o som e a dor com seus dedos terem quebrado, o que foi o suficiente para o convencer.

Quando colocado em palavras, foi apenas isso que aconteceu.

— Bem, imagino que eles odeiam magos porque fazemos esse tipo de coisas com eles…

Despreocupadas com os eventos, conversamos sobre isso e outras coisas conforme caminhávamos pela cidade que estava tomada por tumultos.

Chegamos na taverna um pouco depois.

 

 

O porão da taverna era escuro e sombrio. O ar estava estagnado e, no meio da sala, uma lâmpada pendurada no teto gerava uma luz laranja, fazendo com que a toda a poeira que dançava pela sala brilhasse.

Ao fundo havia, claro, a figura da pessoa no comando da Facção dos Antiquários.

— Ho-ho-ho… ha-ha-ha… He-he-he-he…!

A mulher que estava de pé e soltando uma risada sinistra tinha um cabelo vermelho, longo e elegante. Não conseguia dizer quantos anos ela tinha, mas já havia escutado aquela risada antes.

— Ho-ho… Mais ou menos agora, meus homens devem estar tirando vantagem da confusão da cidade para sair roubando dinheiro… he-he-he…

Visto que ela estava de costas para nós e lendo um livro, a mulher não parecia ter percebido nossa chegada. Mas que idiota.

— Assim que a pessoa da Associação Unida de Magia chegou na cidade, a fiz trocar de corpo com uma moradora qualquer e a fiz abrir a caixa que ela estava carregando… Um plano perfeito, se posso dizer… He-he-he-he… Agora essa cidade é minha!

Conforme escutávamos a mulher falar alto consigo mesma, ficava mais óbvio o que tinha acontecido.

Eu em minhas roupas comuns e Saya com sua capa.

A mulher e seu grupo estavam de olho na bagagem que Saya pretendia enviar para a nação da ilha por meio dessa cidade. Então quando ela veio para a cidade, provavelmente fizeram um plano para que ela abrisse a caixa.

Achei que poderiam ter usado hipnose ou algo assim, ou até mesmo ter roubado com força bruta, mas o método que usaram aparentemente foi a troca de corpo.

— Quando chuparam aquela bala, trocaram as mentes… uma vez que isso aconteceu, ela abriu a caixa! Um verdadeiro método inovador! Ha-ha-ha-ha-ha-ha! Dessa vez, com certeza conseguiremos uma vitória total!

Sinto como se esse plano estivesse cheio de buracos… no entanto, doido do jeito que era, funcionou… Então acho que nós somos as verdadeiras burras.

Inclusive, por que trocou um mago e uma cidadã qualquer?

Não seria um plano mais garantido trocar o mago que viesse com um membro da Facção dos Antiquários?

Por que? Mas é óbvio do porquê! Rindo alto, ela disse: Quer dizer, trocar de corpo significa que vai ter que ficar dentro do corpo de um mago, né? Não seria um inferno?

Aha.

Realmente, seria revoltante ser forçado a passar um dia inteiro como uma pessoa que odeia – o suficiente para fazer você ficar enojado.

— Não considerou a possibilidade de essa pessoa qualquer e o mago pudessem acabar sendo conhecidos?

Quando coloquei uma mão em seu ombro, a mulher se virou.

— Hã? Até parece que isso… — A expressão dela endureceu.

O tempo parecia parado enquanto ela nos olhava com sua boca aberta, trocando seu olhar levemente da direita para a esquerda, suor escorrendo de sua testa.

— Hã…? — E então, finalmente, ela falou: — O que estão fazendo aqui embaixo…?

Respondi uma voz baixa.

— Apenas vim comprar algo — falei categoricamente. — Você tem bala, não tem?

 

 

— Haaaaaah…

Então a realidade era sombria, pelo que parecia.

Não havia mais balas.

Precisávamos esperar pacientemente por um dia inteiro para que voltássemos ao normal. A mulher não tinha produzido mais balas, então quando a perguntamos pessoalmente, essa foi a resposta que nos deu.

Que irritante.

— Então voltaremos ao normal após um dia, certo? Não tem como isso estar errado? — A questionei, e ela concordou e fungou com lágrimas em seus olhos.

Aparentemente, a própria existência dos magos era um insulto para essa facção de ladrões. Por causa disso, eles planejaram soltar a fumaça pela cidade. Ficaram sabendo sobre o que havia dentro da caixa de alguma maneira ilegal e executaram nossa troca de corpos para a adquirir.

Parecia ser essa a situação.

— Enfim, o que vai fazer? É sua culpa que a cidade está um caos, não é?

De acordo com os capangas que invadiram a cafeteria, tudo voltaria ao normal em um dia, mas eu sabia que nunca seríamos capazes de parar todos os roubos. As pessoas já estavam se revoltando. Um retorno ao normal não mudaria o fato de que a cidade já estava em caos. Esse era o pior cenário possível.

— H-Hunf! Parece que você veio ao lugar errado! A cidade não vai voltar ao normal, mesmo com você vindo ao nosso esconderijo. Meus homens são excelentes no que fazem! Os ordenei a roubar o que conseguirem e saírem da cidade imediatamente! Ha-ha-ha! A vitória é nossa!

— …

— …

Não pedimos para nos envolver nessa situação estúpida. Como você consegue ficar com essa expressão triunfante, como se tivesse nos derrotado ou algo assim?

Você entende a sua situação aqui? Eu a forcei contra a parede e bati minha mão na parede ao lado dela. Nesse momento, você está em nossas mãos. Podemos te pegar como refém e atrair sua trupe para todos serem presos de uma vez.

H-Hunf… É uma ameaça? Meus companheiros não parariam de se esconder por isso.

Tudo bem. Então, até aparecerem, que tal eu quebrar seus dedos, um por um? Se, mesmo assim, não aparecerem, então irei arrancar suas unhas. Se mesmo isso não der, vou quebrar seus braços. Se não for o suficiente, acho que vou cortar seus dedos inúteis, um a um. Irei usar toda e qualquer técnica ao meu dispor e, definitivamente, não vou parar, mesmo que sua garganta fique rouca de tanto gritar… Me pergunto, em que estado você vai estar quando seus companheiros finalmente aparecerem?

Meu tom de voz foi um pouco ameaçador, mas só comecei a falar daquele jeito porque ela não mostrou nenhum remorso.

— Waah… — A mulher começou a chorar.

Saya se encolheu com desgosto.

— Elaina, não consigo mais dizer qual das duas é a pessoa má!

Eu não era um demônio, então gostaria de evitar tal comportamento violento, se pudesse. Se possível, preferiria proceder pacificamente. No entanto, mesmo se começássemos a caçar os lacaios dessa mulher, nunca conseguiríamos pegar todos eles…

Eu estava perdida, muito perdida, mas determinada a não deixar transparecer em meu rosto.

— Não, não tem necessidade de procurá-los… — disse alguém.

Uma voz ecoou pelo porão após a Lady Presas e eu ficarmos nos encarando pelo que pareceu uma eternidade.

Era uma voz que eu conhecia.

— …

Quando virei, vi as figuras de duas bruxas de pé no local. Havia, em adição, uma montanha de tralhas, de armas como espadas, lanças, arcos e machadinhos, até artigos de papelaria, móveis ordinários e utensílios de cozinha. Parecia uma pilha de variados tipos de entulho.

Eram duas bruxas que eu conhecia.

Uma delas tinha cabelo loiro e macio, como pó estrelar, preso em um único coque atrás de sua cabeça. Vestia uma capa com dois broches presos na região de seu peito, um com formato de estrela e outro parecido com a lua.

— Há quanto tempo…

A outra tinha cabelo suave, longo e preto como a meia-noite e um ar despreocupado ao seu redor. Vestia uma capa preta e chapéu pontudo, e sobre seu peito havia um único broche com formato de estrela.

— Não se preocupe sobre a Facção dos Antiquários que estava louca lá fora. Lidamos com todos eles — declarou a bruxa loira, enquanto exalava uma fumaça roxa de seu longo cachimbo.

— Mas como raios isso aconteceu? Ainda estão aterrorizando a cidade, mesmo com o que aconteceu no passado? — A bruxa de cabelo preto perguntou, curiosa, conforme inclinava sua cabeça.

Quem pensaria que nos reuniríamos aqui?

Quem pensaria que ela viria para um lugar assim?

Se tivesse pelo menos algum aviso, eu teria tentado parecer mais apresentável. Realmente não gostava da ideia de alguém me ver assim.

Para começo de conversa, nem mesmo sou eu mesma.

— M-Mestra… — disse Saya, vestindo meu corpo e pingando de suor. Ela olhou para a bruxa loira… para Sheila.

— S-Senhorita…? — Já eu, vestindo o corpo da Saya, olhei com uma expressão de pânico para a bruxa de cabelo escuro… para a Senhorita Fran.

Seus rostos despertaram muitas memórias.

Espera, a Saya acabou de falar “mestra” para a Sheila…?

 

 

Retornar a cidade ao normal foi surpreendentemente simples. Pelo visto, tudo que tínhamos que fazer era abrir a caixa de novo. Uma vez que foi levada para a Associação Unida de Magia por nós quatro, a Lady Presas nos contou a verdade sobre isso.

Após a garota, que acabou por ser a irmã mais nova da Saya, agir de forma bizarra, tive que fugir rapidamente e acabei deixando a caixa para trás, então o retorno das coisas ao normal acabou sendo atrasado até conseguirmos o objeto de volta.

Que impensado da minha parte. Não foi minha culpa, no entanto. Afinal, eu estava sem entender nada lá, certo? Então não conseguia pensar bem. Não fiz nada de errado.

De toda forma, voltamos para o quarto da irmã mais nova de Saya – o quarto de Mina – abrimos a caixa e retornamos tudo ao normal.

Ela ainda está dormindo…

Mina ainda estava perdida em um sonho. Estava dormindo como uma pedra, respirando profundamente no chão.

Hã? Por que ela está dormindo? O que você fez? Saya estava me espiando com suspeitas.

Não fiz nada de errado. Na verdade, ela que fez coisas comigo.

Não que eu possa te dizer. Não consigo.

Para confirmar que a cidade estava normal – e fazermos um passeio turístico ao mesmo tempo – nós quatro nos aventuramos pela cidade.

— Eh… O que raios… eu…? — Um homem, por algum motivo, deitado e seminu em frente a um espelho, se sentou, segurando sua cabeça.

— Ah, não. Nós…? — Uma garçonete de algum restaurante de algum lugar se levantou da coxa esbelta de um homem.

— E-Ei…! Mas que diabos?! Ficando atrevido para cima de mim…

— E-Eu que o diga! Pare! Não estou interessado…

Um drama agridoce estava sendo reproduzido em uma esquina de rua próxima.

Todos pareciam ter voltado ao normal.

— Ainda bem… — Suspirou Saya, aliviada.

— Nem me diga. — Acenei quietamente.

Tirando que nós ainda não voltamos ao normal!

Fiquei muito surpresa em achar vocês duas aqui. Sabia que a pupila de Sheila viria para essa cidade, mas em pensar que Elaina também estava aqui… Andando ao nosso lado, Senhorita Fran olhou gentilmente para Saya.

Já que eu havia trocado de corpo com a Saya, e já que não achamos o melhor momento para revelarmos esse fato, continuamos a conversa, mesmo que minha mente estivesse ficando doida de frustração e desconforto.

Bem, eu ouvi todos os detalhes dos ataques dos membros da Facção dos Antiquários quando os encontramos lá fora. Parece que vocês passaram por maus bocados. Foram forçadas a abrir a caixa contra suas vontades, certo?

Ela não parece ter escutado sobre a troca de corpos… e pensa que tudo isso aconteceu porque a Facção dos Antiquários me forçou a abrir a caixa. Ela não considerou que eu pudesse ter aberto sozinha.

Sheila disse:

— Bem, isso foi uma bela calamidade. — A mão dela encostou em meu ombro e ela soprou fumaça em meu rosto. Fedia.

— O que trouxe vocês duas para um lugar como esse? — Inclinei minha cabeça, curiosa, conforme afastava a fumaça com minha mão.

Dado que eu estava no corpo da Saya, o gesto pareceu um pouco inadequado.

— …? Hm? Me conhece de algum lugar? — Senhorita Fran inclinou sua cabeça para mim.

Sheila também fez uma feição confusa.

— O que aconteceu? Alguém está calma hoje.

Para tornar as coisas piores, Sheila ficou me encarando intensamente, se aproximando cada vez mais, olhando cada vez mais fundo nos meus olhos, como se estivesse procurando por algo.

— Hmm…?

Não sabia se sua intuição era afiada, ou se ela tinha um olhar aguçado para coisas assim, mas Sheila me encarou um pouco mais, e então disse confiantemente:

— Realmente tem algo de estranho em você…

Será que é melhor ir em frente e falar…? Mas parece que a situação só vai ficar mais complicada, uma vez que dissermos para elas que trocamos… Morro de medo do que vão pensar quando souberem que nós causamos essa situação sozinhas.

Tenho a impressão de que vão se irritar conosco.

— Ah, será que você…? — Sheila me cutucou enquanto eu ficava quieta, sem respondê-la. — É isso? Está agindo toda inocente na frente de sua amada Elaina?

O que ela está dizendo? Sério, do que ela está falando?

— Ah, espera…! Mestra! Por favor, não diga…! — Saya estava agitada, em pânico, em meu corpo.

Aaaah, que desconfortável…

Parecendo não ver a Saya com o rosto vermelho, balançando suas mãos e agindo de forma suspeita atrás dela, Sheila sorriu de forma travessa e passou seu braço pelos meus ombros.

Ha. O que é isso? Está toda inocente agora? Como se não ficasse sempre dizendo “Na próxima vez que ver Elaina, vou XXXXX a XXXXXX dela, e XXXXXXXXXXXXXXXXXXX…”

Aaaaaaaaaaaaaaaaaaaaahhhh!

Ops, desculpa. Ela está logo ali.

Ela era tão maldosa.

Meu Deus, Saya… Era isso? Você está bem? Seu rosto está vermelho.

Quem não ficaria vermelha após revelarem em frente da própria Elaina que ela quer XXXXXXXX a Elaina…

— Aaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaahhh!

— Fique quieta, Elaina. Você está bem? — Senhorita Fran encarou Saya intensamente, a qual estava em meu corpo.

Realmente, essa situação era mais do que complicada.

Eu só podia suspirar e torcer para que o amanhã chegasse logo.

 

 

No final das contas, ficamos em silêncio sobre nossa troca de corpos para Sheila e a Senhorita Fran, mas é óbvio que foram colocados sérios limites em nosso relacionamento.

— Éé, esquece o que ela disse, Elaina… Éé, sabe, é que…

Após nós quatro andarmos um pouco pela cidade e comermos uma refeição juntas, Saya e eu nos separamos das nossas mestras. Adoraria ter ficado um pouco mais com elas, já que foi um encontro raro e tínhamos tantas histórias para contar, mas como já disse várias vezes, eu não era eu mesma, e sentimos que poderíamos morrer se ficássemos um pouco com as duas.

Especialmente Saya.

Nós duas decidimos ficar na mesma pousada devido à troca de corpos. Fui eu quem alugou o quarto – no momento, significava que Saya o fez.

Já que havíamos feito isso, trouxemos a irmã mais nova de Saya, ainda inconsciente, para nosso quarto. Os olhos do dono da pousada se escancararam de surpresa quando viu duas garotas carregando outra em seus ombros, mas fizemos ele ficar quieto com um suborno considerável. Ouro nos tornava certas.

— Aaaaarrgh… Não é verdade… — Saya estava encolhida no chão e eu, a olhando indiferentemente.

— Eu não ligo de verdade, sabe…?

Não me incomodou quando ouvi que você quer me XXXXXX, XXXXX e XXXXXX, ou XXXXX minha XXXXXX. Eu só fiquei meio “Ah é? Sim? Entendi.” De verdade!

— Você está mentindo… Agora me acha nojenta, não acha?!

— Lógico que não.

— Mas seus olhos parecem mortos, Elaina!

— Esses são seus olhos. Sempre pareceram mortos.

— Maldade.

— Bem, sendo honesta, eu realmente me assustei um pouco.

— Viu?! Sabia! Minha vida acabou! Vou acabar com ela!

Com lágrimas saindo de seus olhos, Saya tinha começado a bater sua cabeça repetidamente no chão. Estranhamente, lembrou a postura que ela fez no passado, quando se prostou para implorar que eu a ensinasse magia.

Inclusive, você percebeu que o que está machucando é o meu corpo? O que vai fazer se me machucar? Pare com isso agora mesmo!

— Éé, olha, Saya. Eu realmente me assustei um pouquinho, mas não ligo de verdade, sabe? — Desci da cama e coloquei minha mão em seu ombro.

— Eh…? — Seu rosto estava muito fofo quando levantou seu olhar para mim. Claro, era meu próprio rosto.

Jogando uma piada ruim para o canto de minha mente, sorri para ela do melhor jeito que pude.

— Sempre soube que você pensava essas coisas, Saya. Desde o começo. Então isso realmente não me incomoda.

— Ah nãaãããão! Vou acabar com tudo!

Oh-ow. Parece que joguei sal na ferida.

— Por favor, não. Ou pelo menos espere até amanhã.

— Aaaaaaaaaaaaaaaaaaahhh!

Pow, pow, pow, pow, pow! Ela bateu minha cabeça no chão violentamente.

O que está fazendo? Pare. Você com certeza está incomodando as pessoas que ficam no quarto abaixo do nosso. Desse ponto em diante, finalmente fiquei séria em tentar parar ela.

— É, Saya, sabe, todos temos fantasias selvagens assim, especialmente na sua idade. Então não tem motivo para ficar para baixo só porque as suas foram expostas…

— Para, por favor! Não seja tão gentil comigo!

— Desculpa…

— Posso acabar ficando grávida!

— Não importa o que aconteça, você não aprende né?

Você precisa refletir seriamente.

— Não aguento mais!

— Sério…? Ei, tenho que pedir de verdade para que pare de ferir o meu corpo.

Após isso, senti como se tivéssemos gritado uma com a outra por um tempo. Não sei quanto tempo ou o quão escandalosas ficamos durante isso.

Mas acho que estávamos bem barulhentas.

— Nngh…

Porque a irmã mais nova de Saya acordou.

Ela se levantou e sentou na cama. Depois de encarar, confusa, o teto desconhecido, olhou ao redor do quarto e finalmente olhou para nós.

— …

Mina olhou para mim – no corpo de Saya – segurando os braços da irmã dela para parar Saya – em meu corpo – de se machucar tanto.

— Irmã…zona…? Quem é essa pessoa?

Por que você tinha que acordar logo agora…?

 

— Entendi… Então minha irmã resolveu tudo, hein? Bem, ela é a minha irmã, afinal… Claro que ela seria capaz de lidar com isso.

Nós contamos toda a história para Mina após ela acordar. Desde abrir a caixa depois de trocarmos de corpo, até a insanidade que ocorreu na cidade, até o fato de que tudo já foi resolvido. Dissemos tudo para ela.

Estaria tudo bem para mim ficarmos quietas sobre a troca de corpo, mas não deixar ela saber poderia gerar diversos problemas, então com a graça de uma deusa, contamos a verdade.

— A troca de corpo é um pouco… bem, difícil de acreditar. Mas isso significa que não foi minha irmã quem abriu a caixa. É isso que está dizendo, é? — Mina acenou, concordando.

— É, sim, isso também — respondeu Saya, acenando bastante com a cabeça.

— … — Mina estava com seus olhos fixados em mim. Ela adicionou: — Bom, que seja… Não estou incomodada, de qualquer forma. — Fiquei chocada.

Mina balançou seu cabelo sem se importar. Pensei em revelar sua conduta imoral do dia anterior para Saya, isso estava preso em minha garganta, mas me segurei por pouco.

— O que será que era aquela fumaça? A população começou a agir de forma estranha. — perguntou Saya, inclinando sua cabeça. — Hmm?

— Ah… sobre isso. — Lembrei de algo naquele momento e juntei minhas palmas das mãos. — Pedi para a Senhorita Fran e Sheila perguntarem à Lady Presas, e ela disse que aquilo é um afrodisíaco mágico potente. Aumenta o desejo em 100 vezes, então você não seria capaz de se controlar se visse alguém que gosta um pouco. E é forte a ponto de fazer você ficar totalmente louca se ver alguém que realmente gosta. Parece que a fumaça é amaldiçoada.

Por isso o povo dessa cidade ficou caçando um ao outro ou fugindo.

Aparentemente, era isso.

— Tanto faz… — Mina jogou seu cabelo de novo.

Aha. Então é assim? Essa é a atitude que você vai tomar?

— Bem, você sabe, a razão do porque as pessoas começaram a agir de forma estranha ontem foi totalmente culpa de suas inibições sobre romance pararem de funcionar. Não vou dizer quem é, mas… — Dei uma olhada para Mina. — Vou dizer para ela sobre seu comportamento imoral de ontem. Está bem? — Tenho certeza de que foi isso que eu disse, mas…

— Aaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaahhh!

Estranhamente, foi Saya quem começou a urrar, horrorizada, não Mina.

Não estou falando sobre você. Quer dizer, se aplica a você, também. Se aplica para as duas irmãs. Qual é o problema de vocês?

— Eu realmente não ligo…

Do outro lado, Mina estava olhando rapidamente para mim e para Saya, conforme seu rosto foi quietamente ficando vermelho. Senti que essa garota discreta e eu tínhamos algo em comum.

Senti como se agora eu entendesse, mais ou menos, uma das razões do porque Saya me escolheu para ser quem lhe ensinaria mágica.

 

 

Assim que tudo acabou, a caixa que era para ter sido mandada para o país da ilha, o objeto que estava por trás de todo o incidente, seguiu para seu destino, junto com vários outros objetos que possuíam poderes estranhos.

Como o país da ilha tinha uma política de omissão nacional, o que fazia chegar até lá muito difícil, e já que somente era possível pegar um navio por ano para a ilha, propriamente falando, o protocolo era de depositar parcelas para assegurar o produto em Qunorts até que o navio estivesse pronto para partir. Mas, desta vez, era um objeto do país da ilha que causou o incidente terrível, então a Associação Unida de Magia forçou o envio imediato. Estava acompanhada de uma carta que dizia brutamente: Nós recuperamos isso para vocês, então que tal enviarem de volta uma bela recompensa?

No dia seguinte, uma carta de resposta chegou e dizia, com escrita elegante: Claro. Obrigado por isso. (A partir de agora, quando encontrar algo, vá em frente e destrua na hora. Não se dê o trabalho de enviar de volta. É um incômodo ter vocês demandando dinheiro em todas as vezes!)

No momento em que recebemos a carta, Saya e eu estávamos de volta em nossos corpos originais.

O incidente estranho finalmente se concluiu.

Saya e Mina tinham trabalhos para fazer, e eu era uma viajante. Sheila e Senhorita Fran só tinham visitado a cidade para as férias. Nossa esperada reunião foi necessariamente curta.

Se ficássemos juntas por mais tempo, as despedidas com certeza seriam mais dolorosas para todo mundo.

De toda forma, na mesa da cafeteria onde nós cinco nos sentamos antes de cada uma seguir seu caminho, parecia que nenhuma de nós queria realmente ir. Eu não podia ser a única que queria que ficássemos juntas.

Enquanto estávamos lá, Senhorita Fran e Sheila nos contaram todo tipo de coisa.

A irmã mais nova de Saya trabalhava na Associação Unida de Magia, assim como Saya. Sheila era a mestra de Saya. Sheila e a Senhorita Fran foram instruídas pela mesma pessoa no passado. Resumindo, foram aprendizes.

Elas nos disseram que haviam lutado contra a Facção dos Antiquários neste país no passado. Desde o primeiro incidente com o grupo, as duas passaram a ser amigas próximas. Todo ano, em comemoração, viajavam juntas…

Ouvimos todo tipo de história, e também compartilhamos todos os tipos de coisas sobre nossas vidas. Especialmente que eu estava escrevendo um livro.

— Sim, estou te dizendo, Sheila é assim há um bom tempo… Ela se recusa a parar de fumar. Ela não pensa se incomoda as pessoas ao redor, claro. O que acha? Ela é uma tonta, não é? — Senhorita Fran riu baixinho com Saya.

Quando percebi, estávamos perdidas em conversas.

— Oho. — Saya riu. —  Estou sempre dizendo para, por favor, parar de fumar, sabia? Mas ela não escuta nada que digo.

— Ela só está convencida de que inalar veneno faz ela parecer legal.

Senti como se estivesse assistindo um raro acontecimento.

— … — Do meu lado da mesa, Mina estava me encarando fixamente. — Então você é a Elaina, hein…?

— Eu mesma.

— Ouvi várias coisas da minha irmãzona; que você ensinou magia para ela depois de eu a deixar e que vocês se reencontraram em algum outro país.

— …

— Ela parecia muito feliz quando estava me contando sobre isso…

Então por que você parece estar com um pouco de ciúmes? Por que está rangendo seus dentes? Por favor pare. Está começando a me assustar.

— Por que deixou Saya para trás no País dos Magos? — perguntei. — Aquilo realmente a magoou, sabia? — falei, sussurrando para que minhas palavras não chegassem ao ouvido de Saya.

— Ah, sobre isso. — Quem me respondeu não foi Mina, mas Sheila. — Eu queria que ela se apressasse para passar pelo treinamento para se tornar uma bruxa, então a pressionei para retornar para sua cidade natal. Saya tem o costume de depender das pessoas, certo? Se ela nunca deixasse sua irmã, não seria bom para nenhuma das duas. Foi por isso.

Entendi, entendi.

— Tinha certeza de que Mina tinha perdido a paciência com Saya e apenas partiu…

Sheila bufou para minhas palavras.

— Não, na verdade, Mina estava um tanto quanto furiosa! Gritando comigo, coisas como “Por que me separou da minha irmã?” ou “Nunca vou te perdoar!” ou “Vou te amaldiçoar até o dia em que eu morrer”, e por aí vai.

— Ha! — Isso foi inesperado. Bem, depois do que ocorreu ontem, eu provavelmente não deveria estar tão surpresa.

— Desse jeito, não tenho certeza de qual das duas era mais dependente da outra.

— Por favor, só mudem de assunto… — Mina estava fazendo força em sua boca conforme seu rosto brilhava de tão vermelho.

A conversa continuou após isso. Não havia um assunto específico, nem um foco coerente, ainda assim a conversa interessante, divertida e sem rumo era como uma jornada.

 

 

Mas esse momento não durou para sempre.

A hora de partir havia chegado.

— Waaaaaahhh! Não! Não quero! Não quero voltar! Quero ficar mais um pouco com a Elaina!

Havia uma única garota bagunçando e chorando na frente dos portões da Cidade Livre de Qunorts. Se está se perguntando quem essa criança vergonhosa poderia ser, era Saya.

Sheila havia a segurado pela nuca, a arrastando brutalmente. Ela parecia com uma criança fazendo escândalo, ou talvez com uma gata rebelde.

Irritada com sua carga, Sheila soltou um grande suspiro.

— Por que está fazendo esse escândalo? Temos trabalho para fazer, então estamos voltando para casa.

— Tudo bem, me demito.

— Hã? Como vai comer?

— Vou fazer a Elaina me tomar como esposa dela.

— É, vai ter que se contentar com um não. — Passo.

— Viu? — Sheila bufou.

— Irmãzona, desiste. — Mina também resmungou, olhando intensamente na minha direção.

Acho que ela me odeia… E muito…

— Nuncaaaaaaaaaaaaa! Waaaaaaaaaaaahhh!

O choro horrível de Saya ecoou pela cidade até ela deixar a cidade completamente para trás.

As garotas, todas da Associação Unida de Magia, tiveram que partir da cidade. Até porque tinham trabalho para fazer. Consequentemente, Senhorita Fran e eu fomos para nos despedir, mas…

— Você é mesmo amada. — Senhorita Fran riu secamente do meu lado.

— Bem, acho que… eu seja…

Na verdade, eu não fazia ideia de como responder, então acabei deixando minha frase sair dos trilhos.

— …

— …

Nos despedimos de Saya e das outras, então era hora da nossa própria partida.

Mesmo que estivéssemos apenas de pé no local – ainda que a única diferença fosse que não conseguíamos mais ouvir os gritos de Saya – por algum motivo, o silêncio estava sufocante e quase impossível de aguentar.

— Já te falei sobre minha própria mestra, não falei, Elaina? — Aparentemente, eu não era a única que achou o silêncio difícil de suportar. — Te contei sobre a viajante livre que era muito forte, sábia e mesquinha, não contei?

— Contou, e eu escutei.

— Bem, não acha que ela parece com alguém que você conhece? — Senhorita Fran inclinou sua cabeça.

Sua expressão normal não podia ser vista em nenhum lugar.

— Quem sabe…? Tem muitas pessoas assim, não tem?

— Ela parece você — disse Senhorita Fran, sem pausa. — Muito forte e sábia, mas mesquinha. Não é exatamente como você?

— Será que está tirando com a minha cara…?

— Um pouco, se ainda não percebeu.

— …

Uma viajante livre, a qual parecia comigo.

Não é como se ela fosse igual a mim. É mais certo dizer que eu lembro ela.

E eu chuto que essa pessoa tinha cabelos cinzentos, olhos com cor lápis-lazúli, e costumava usar uma capa preta e um chapéu pontudo.

Aposto que ela transborda autoconfiança.

E, talvez, tenha escrito um livro enquanto viajava. Se nós formos iguais, claro.

— Você parece já ter percebido. — Como se pudesse ler minha mente, Senhorita Fran continuou indiferentemente: — Quem foi a pessoa que me ensinou magia? Quem é a bruxa que você sempre almejou ser? Você já deve ter descoberto há um bom tempo.

— … — Definitivamente não faço ideia do que está falando. — Bem, quem é ela?

Meu Deus, não se faça de desentendida. Senhorita Fran riu, quieta. Vejo que ainda não melhorou da sua incapacidade de ser honesta quando se trata de coisas importantes.

— Não mudar isso não me causa nenhum problema.

Acho que arrumar isso também não causaria problemas.

Imagino há quanto tempo nos conhecemos, hein?

Eu diria que há vários anos. Não acho que foi tanto tempo assim.

Acho que passamos mais tempo separadas do que juntas.

Imagino que esteja certa, mas acho que consigo meio que te entender. Digo, está claro para mim. É óbvio que você vagamente percebeu quem ensinou para mim e Sheila, e quem escreveu esse livro que você tanto adora.

— Eu também consigo ver que, mesmo sabendo, está fingindo que não.

Ela não parecia ter a intenção de me repreender. Ao invés disso, Senhorita Fran estava lá, sorrindo gentilmente, com seus olhos melancólicos apenas um pouco abertos, como sempre.

Aquilo era de alguma forma bem nostálgico, mas eu não conseguia olhar diretamente para ela.

Então desviei meu olhar e falei aos trancos e barrancos:

— A autora daquele livro…

As Aventuras de Nique. O título do meu amado livro.

— A autora escreveu cinco livros sobre suas viagens e então sumiu da face da Terra… Deixando apenas seus livros para trás, ela desapareceu. Desde então, não houve mais novas publicações e, no final das contas, nunca se tornou público quem era a autora ou de onde ela veio.

— Sim, eu sei…

— Um dia, quando descobrirei isso, tenho certeza de que minhas viagens indulgentes vão chegar a um fim.

O estímulo para eu começar minha jornada estava, falando de forma suave, relacionado com As Aventuras de Nique. Decidi seguir o mesmo caminho que a autora e seguir os rastros da autora conforme viajava.

Foi isso o que estive fazendo.

Me pergunto o que aconteceria se soubesse quem era a autora.

Provavelmente concluiria que perdi minha razão para continuar viajando.

Creio que seria mais fácil, nesse caso, fingir não saber.

— Ainda quero seguir viajando, quero continuar me movendo de lugar para lugar. Quero levar o meu tempo e fazer conforme desejar.

Quero fazer uma história que não vai acabar em cinco volumes.

Então, já que minha jornada ainda não pode acabar, não acho que isso seja algo que eu possa me permitir perceber agora. Quero ser eu mesma, a Bruxa Cinzenta. Quero ser uma viajante normal.

O que eu disse para ela foi clara e resumidamente apenas isso.

— … — Senhorita Fran não me criticou por meus objetivos ambíguos. Nem parecia particularmente desapontada. Ela simplesmente fixou seus olhos em mim. — Mesmo que descubra quem realmente era sua heroína, não acho que mudaria nada sobre o que fez até agora…

— Será…?

— É verdade. Sabia? Minha mestra sempre pareceu ser calculista, mas ela tinha uma personalidade bem descuidada.

— … — Sério?

E você também é um pouco descuidada.

Sério?

Por isso não acho que você precisa se preocupar com coisas pequenas. Senhorita Fran sorriu. Mas, cedo ou tarde, você vai precisar voltar para sua cidade natal. Sua mãe está preocupada com você.

Creio que esteja… Cedo ou tarde.

No entanto, não sei quando vai ser esse dia…

Definitivamente não há dúvidas de que, até agora e a partir de agora, você é uma viajante qualquer disse a Senhorita Fran. Mas, por favor, não esqueça que nós estamos sempre pensando em você, ou que iremos sempre te amar.

Como ela consegue ser tão sentimental com um rosto sério? Bruxa manhosa.

Eu simplesmente continuei desviando o olhar dela, fingindo estar perdida em meus pensamentos, conforme refletia sobre o que ela havia dito. De alguma forma, em momentos assim, minha habilidade de formar palavras ou agir falhavam, então eu simplesmente ficava parada em transe.

Creio que eu ainda era, como sempre fui, uma garota que tinha problemas para ser honesta.

Não, não. Mesmo eu tenho que ter alguns momentos de sinceridade.

Então reuni minha coragem e falei:

— Eu também te amo. Eu te amo, Senhorita Fran…, e todo mundo.

Aquilo deve ter chegado aos ouvidos da Senhorita Fran.

Eu conseguia sentir seu sorriso normal em seu rosto, ainda que não conseguisse olhar diretamente para ela, mesmo que estivesse na minha frente.

— Tchau, Senhorita Fran.

— Até logo, Elaina.

Dessa forma, nossa última despedida – quem sabe quantas vezes já fizemos isso – foi um pouco amorosa.

Após todo o entusiasmo morrer, e Senhoria Fran e Sheila saírem da cidade juntas, dei meu primeiro passo adiante.

As cortinas estavam se abrindo para uma nova jornada.

 

 


 

Tradução: Jeagles

Revisão: Gifara (Sonny Nascimento)

 

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