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Bruxa Errante, a Jornada de Elaina – Vol. 5 – Cap. 04 – Duas Professoras

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Ao final da tarde, uma velha conhecida minha veio para uma visita.

Até onde eu conseguia me lembrar, fazia muito, muito tempo que eu não recebia visitantes neste lugar que servia tanto como escritório, quanto como sala de estar. Na verdade, acho que meu último convidado pode ter sido minha pupila favorita, que me visitou há algum tempo.

— E aí.

Do outro lado da porta frágil estava minha velha amiga, aparecendo inesperadamente e me chamando com uma voz carinhosa. Arrastando seu cabelo longo e bonito que brilhava suavemente como poeira estelar, ela entrou na sala exalando nuvens de fumaça e fechou a porta atrás dela.

— Já faz algum tempo.

Balancei minha cabeça em saudação do meu lado da mesa e ela suspirou.

— Trabalhando em um lugar apertado como sempre hein — observou ela e se sentou no sofá. Então exalou mais fumaça.

A Bruxa da Meia-Noite, Sheila, ainda era uma fumante inveterada e cheirava a tabaco.

— Então você ainda não desistiu dos cigarros?

Que tal largar?

— Não é um cigarro, é um cachimbo.

— Você não fumava cigarros? — Inclinei a cabeça e Sheila coçou a bochecha, parecendo um pouco envergonhada.

— Sim, minha pupila me deu isso.

Que coisa, ela deve querer que você morra jovem. Você é tão amada.

— Você arranjou uma pupila? — perguntei.

— Sim.

— É a primeira vez que ouço falar disso.

— Nunca encontrei a hora certa para te contar. — Sheila fez um barulho que ficava entre um bufo e um riso, então inalou pelo cachimbo. — Falando na minha pupila, ela aparentemente é uma conhecida sua, o nome dela é Saya.

— Saya… — pensei no nome por um momento. — Ah!

Elaina falou dela quando visitou este país há um tempo, essa é a garota a quem ela estava dando aulas para que pudesse se tornar uma aprendiz de bruxa, certo? E agora ela é aluna de Sheila.

— O mundo é um lugar pequeno, não é?

— Nem me fale. A propósito, também conheci a sua.

— Minha nossa.

— Quando eu disse para Saya, ela pareceu incrivelmente ciumenta.

— Por favor, diga a ela para continuar se dando bem com a Elaina…

— Ela está tão apaixonada pela Elaina que pensa que não pode viver sem ela, então não imagino que isso seja um problema.

— Por favor, diga a ela para se dar bem com… moderação.

— Acho que nada do que eu disser fará diferença. — Sheila olhou para o teto.

Toda a fumaça se acumulou como uma espécie de névoa perto do teto, lentamente se enrolando como nuvens agitadas por uma brisa suave. Enquanto ela olhava para a fumaça flutuando, voltou a colocar o cachimbo na boca e soltou um suspiro branco.

— A propósito, sabe que dia é hoje?

As nuvens no teto foram perturbadas por uma nova pluma.

— Claro.

Todos os anos, neste dia, minha velha amiga e ex-colega de quarto vinha me visitar e, depois de nos atualizarmos com todos os novos detalhes de nossas vidas separadas, tirávamos férias juntas.

Essa era nossa tradição anual.

Sempre que Sheila aparecia para me visitar, eu de repente percebia que havia se passado um ano. Já que nos encontrávamos assim todos os anos – e como sabia que nos encontraríamos novamente no próximo ano da mesma forma – nunca senti nostalgia ou qualquer emoção intensa, mesmo quando passava um tempo longe dela.

— Está pronta? — perguntou Sheila. — Se precisar, posso te ajudar com as malas, suponho que você ainda nem começou a arrumar, como em todos os anos.

— Posso te dizer uma coisa primeiro? — respondi enquanto olhava fixamente para fora da janela.

— Hm? O quê?

— Este é um quarto para não fumantes.

Sheila pareceu chocada por um momento, mas então revelou um pequeno sorriso.

— Meio tarde para isso…!

— Simplesmente não consegui encontrar o momento certo para te contar.

Esta é a história de algo que aconteceu quando ainda estava viajando com minha professora.

— Fran? Acho que quero ter uma pupila.

Enquanto caminhávamos por alguma estrada de um país em algum lugar, minha professora disse: “Oh, vamos pensar nisso”, como se não tivesse importância, e então começou esta conversa.

Uma pupila?

— Hum, não sou sua pupila…?

Do que essa mulher está falando?

— Sim, você é, é claro! Você é minha pupila, mas estive pensando que poderia ter outra.

Isso poderia significar o que acho que significa? Que sua primogênita está crescida e bem cuidada, então quer ter outra filha? Parece um daqueles pais loucos por bebês. Não que eu saiba algo sobre isso.

— Bem, eu realmente não me importo muito… Eu sou sua pupila, nada mais e nada menos, e acho que você deve ser capaz de decidir essas coisas por conta própria.

— Ora, mas você não ficaria com raiva se eu não contasse?

— Você diz isso, mas já encontrou uma nova pupila, não é?

Esse é o tipo de pessoa que minha professora era.

Ela só pedia minha aprovação de já ter feito tudo. Em outras palavras, no momento em que se aproximou de mim para consultar sobre o assunto, era certo que já havia arranjado a segunda pupila.

— Acho que sim.

Eu sabia.

Minha professora disse:

— Está tudo bem, Fran. Ela é uma garota muito legal, tenho certeza de que você também gostará dela.

— …

Isso poderia significar o que acho que significa? Deve ser como quando um pai se casa de novo, mas seu novo cônjuge tem seu próprio filho, então de repente você começa a viver sob o mesmo teto com outro filho que você não conhece, mas os pais tentam consolar os filhos e dizem que vai ficar tudo bem.

Bem, pensei que provavelmente estaria tudo bem.

Quando a família fica maior, não é necessariamente ruim, certo?

— Então, onde está essa nova pupila?

— Eu estava prestes a ir encontrá-la. — Minha professora voltou a andar, comigo a reboque.

— …

Lembro que não demorou muito para chegarmos lá. Minha professora parou em frente a um certo prédio, apontou para ele e disse que sua nova aluna estava esperando lá.

Franzi minhas sobrancelhas.

— Hum, senhorita…?

— O que é?

O prédio estava em ruínas.

— Você está planejando assumir uma fantasma como pupila?

— Claro que não, ela é uma garota legal e completamente normal.

Se ela mora em um lugar como este, não acho que possa ser particularmente normal.

 

A luz caiu através do teto em ruínas. Do alto de uma montanha de escombros, uma única garota olhou para nós.

Seus cabelos dourados brilhavam suavemente como poeira estelar. Ela fixou seus olhos azuis em nós.

Parecia muito com uma maga, vestindo uma túnica branca despretensiosa e um chapéu pontudo, mas não havia nada em seu peito. Aparentemente não era uma aprendiz nem nada, apenas uma noviça regular.

A propósito, estava segurando um cigarro na boca. Uma delinquente, hein?

— Ei, você está atrasada, senhorita.

Esta garota parecia não saber nada de boas maneiras, ela exibia um sorriso ousado enquanto olhava para a nossa professora.

— Você tem coragem de me deixar esperando — disse ela enquanto descia de sua montanha de escombros.

— Desculpe, levei um pouco de tempo para persuadir minha pupila.

— Você poderia, por favor, parar de mentir tão descaradamente? — pedi. Quero dizer, ela basicamente só falou comigo durante a nossa caminhada até o local.

— Huh?! Então esta é sua outra pupila, hmm…? Ela parece tão fraca.

— … — Então essa garota é minha novata? Ela é tão rude, e logo no nosso primeiro encontro, onde esse mundo vai parar?

— Eh? Qual é o seu problema? Não faça careta para mim. Quer tentar a sorte?

Além disso, ela parecia ter uma atitude pós-apocalíptica, pronta para saltar para a batalha no momento em que fizéssemos contato visual.

É para isso que este mundo está caminhando?

— Senhorita. Onde está a boa garota de quem você estava falando? Essa cuspiu veneno desde o momento em que nos vimos.

— Fran, essa coisa se chama tabaco.

— Não, não isso.

Eu sei que o tabaco é realmente desagradável. Causa todos os tipos de danos e não tem absolutamente nenhum benefício, além dela estar poluindo o ar ao seu redor. Além disso, ela tem uma tendência ruim e ainda assim você acha aceitável, mesmo que ela esteja cuspindo dois tipos de venenos?

— Bem, de qualquer maneira, decidi aceitar essa garota como sua novata, então vocês duas vão se dar bem, certo? Oh-hoh-hoh! — Minha professora riu.

— Prazer em conhecê-la… Hum, seu nome é? — Estendi minha mão, achei que fosse sacudir a dela como uma demonstração de amizade.

— Sem nomes para você. — Ela deu um tapa na minha mão.

Então esse é um aperto de mão comum nesta região, bom saber.

— Esta é a Fran. — Minha professora passou o braço em volta do meu ombro. — E esta é Sheila. — Ela colocou a mão na novata. — Vocês duas se darão bem a partir de agora, viu?

— Morra, megera. — Sheila cuspiu no chão, aquilo parecia ter um cheiro ruim.

— Senhorita, isso é impossível… — reclamei.

Minha professora apenas riu como de costume.

E foi assim que a cortina se ergueu em nossa jornada, para nós três.

A relação entre Sheila e eu, falando francamente, era tão ruim que poderia ser expressa de forma sucinta em uma única palavra: horrível.

Simplesmente não éramos compatíveis, em todos os aspectos, éramos opostos absolutos.

— Modificar sua vassoura para se ajustar ao seu próprio estilo é simplesmente o melhor, claro. O que você acha desse bebê? Faz sua mente dar cambalhotas, certo?

Sheila aplicou todos os tipos de modificações em sua vassoura, como prender uma alça e um encosto de cadeira. Também acrescentou algumas buzinas musicais e luzes piscantes – será que estava tentando pescar algumas lulas vaga-lumes? – além de todos os tipos de coisas para torná-la mais rápida. Deve ser o que as pessoas querem dizer quando falam sobre remodelações mágicas.

— Digo, acho que você pode usar sua vassoura do jeito que ela é. Você é estúpida? Quer dizer, ela nem se parece mais com a vassoura original, não é? Você é uma idiota?

— Huh? Você está caçando briga?

— Isso é tudo que você sabe dizer? Você é estúpida? Idiota?

— É você quem fica repetindo as mesmas coisas, seu vocabulário é bem pobre, hein?

— Estou apenas me rebaixando ao seu nível de QI limitado.

Começamos a nos encarar e, pouco antes de a situação se transformar em uma briga de socos, nossa professora nos forçou a parar. Mas não é aí que nossa baixa compatibilidade terminou.

Por exemplo, quando saímos para comer…

— Peixe ou carne?

Quando nossa professora perguntou se preferíamos comer carne ou frutos do mar, eu imediatamente respondi:

— Eu gostaria de peixe.

E Sheila disse:

— Carne, dã.

Nós nos encaramos.

— Se você quer frutos do mar mesmo, coma sozinha. Nossa professora e eu comeremos carne.

— Huh? Então você que coma sozinha, vou comer peixe com nossa professora.

— Ehh?

— Huhh?

No final das contas, nós três comemos separadamente naquele dia. A propósito, nossa professora comeu pão. Ela era o tipo de pessoa louvável que preferia pão ao invés de carne ou peixe.

Sheila e eu brigávamos a cada passo.

— Feitiços de fogo ou feitiços de gelo, o que devo ensinar a vocês hoje?

Quando respondi que gostaria de aprender feitiços de gelo, Sheila levantou a voz e disse:

— Huh? Fogo, claro! Tá brincando comigo?

— Tudo bem, que tal nem um e nem outro e tirar o dia de folga?

Por fim, relaxamos durante o dia todo. Acho que nossa professora provavelmente só não queria fazer nada..

— Se uma maga está sem sua varinha, ela não pode fazer nada. Portanto vocês precisam de algumas técnicas caso seus movimentos fiquem restritos ou para momentos em que uma arma for apontada contra vocês.

Era extremamente raro ela nos ensinar algo que não fosse magia, e estava nos perguntando que tipo de habilidades queríamos aprender.

— Certo, ensine-nos algumas artes marciais.

— Bem, então, por favor, mostre-nos como manusear um arco e flecha.

— Ehh?

— Huhh?

No final, ela chegou a um acordo incompreensível:

— Tudo bem, nem uma, nem outra, vou lhes ensinar como usar facas. Em primeiro lugar, esconda a faca sob a saia. Esta é uma faca de arremesso, certo? Então, quando for puxá-la para fora, levante sua perna de um jeito sexy e…

Ela nos deu uma lição sobre manuseio de facas.

Para dar outro exemplo, brigamos mesmo depois de terminar uma missão.

— Estimadas bruxas! Com que rapidez vocês resolveram esse incidente para nós. Como recompensa, gostaria de apresentar a vocês uma escolha entre essas duas caixas. — Na frente de nossos olhos estavam uma caixa grande e uma pequena.

Bem, pensei, devo discordar da sua atitude arrogante, quero dizer, é para ser uma recompensa e aqui está você nos fazendo escolher uma em vez da outra, mas suponho que…

— A menor é melhor — respondi.

— É a grande, claro! Use o bom senso! — rosnou Sheila.

— Huh? Todo mundo sabe que, em situações como esta, você deve escolher a menor.

— O que está dizendo? Claro que a grande é melhor.

— Huhh?

— Ehh?

Depois disso, nós nos encaramos por um tempo.

No final, nossa professora abordou o cliente:

— É uma recompensa, então é natural dar as duas coisas, não é? Você está tentando nos insultar quando diz que temos que escolher?

O episódio terminou sem problemas.

Nós duas éramos como água e óleo, definitivamente não nos misturávamos. Colidíamos, nos separávamos e era impensável que nos daríamos bem.

O abismo entre nós ficou cada vez maior.

— Acho que você é a única pessoa com quem nunca vou me dar bem.

— Nossa, que coincidência. Também sinto que nunca poderia me dar bem com você, e apenas com você.

Esse era o único ponto em que concordamos.

O relacionamento entre nós era horrível, mas continuamos nossas viagens juntas. Estranhamente, embora tenhamos entrado em conflito toda hora, nunca chegamos a um consenso. E quando se tratava de habilidade mágica, éramos iguais.

Nossa professora apenas sorria e observava enquanto ficávamos o tempo todo brigando.

— Senhorita, por quê você escolheu Sheila como pupila…?

Um dia, fiz essa pergunta a ela quando Sheila não estava por perto.

— Curiosa?

Achei que devia haver algum motivo mais profundo. Pela primeira vez, nossa professora não sorriu com seu sorriso ambíguo, e sim olhou para mim em silêncio. Já fazia muito tempo que eu não a via tão séria.

Balancei a cabeça e esperei que ela falasse. Por que diabos minha professora poderia ter escolhido Sheila como pupila? Poderia ser porque ela tinha um talento mágico? Ou talvez porque estava sendo chantageada…?

Eu tinha todos os tipos de especulações rodando em minha mente. Minha professora colocou a mão no meu ombro e disse apenas uma coisa:

— É porque ela é uma boa cozinheira.

— …

Pelo visto, Sheila havia explorado o apetite da minha professora.

Nosso relacionamento era sempre horrível.

Ficou tão ruim que não poderíamos nem ter uma conversa adequada se nossa professora não se interpusesse entre nós, mas estávamos presas juntas nesta jornada.

Então, um dia…

— Bem-vindas. Esta é a cidade de Qunorts, a Cidade Livre.

Chegamos a uma pequena cidade portuária situada no litoral. O leve cheiro de água do mar flutuava sobre a cidade, onde casas com telhados laranja e paredes brancas despretensiosas foram construídas com seus beirais todos em fileiras organizadas.

Na verdade, era uma cidade pequena e bonita, mas não estávamos de bom humor. Ao longo da estrada, passamos por um grande número de placas e outdoors em exibição com frases discriminatórias como: DESPREZEM AS MAGAS! ou MAGAS NÃO DEVEM SER TEMIDAS! e MAGAS SÃO CRIAS DO DIABO! e assim por diante.

Poderia dizer que foi enervante.

— Qual é o problema desse lugar? Estão tentando arranjar uma briga com a gente?

Normalmente, eu estaria pronta para discordar de qualquer coisa que Sheila dissesse apenas por ser ela quem disse, mas, neste caso, não pude deixar de concordar.

— Parece que não somos bem-vindas neste país… — falei.

— Imagino… — Em contraste com nós duas, que não fazíamos nenhum esforço para esconder nosso descontentamento, nossa professora permaneceu bastante composta. — Embora possa haver indícios disso, não devemos julgar a cidade inteira. Se essa é a posição de vocês, então não são diferentes do grupo que pendurou todos aqueles cartazes e placas.

— …

— …

Olhamos uma para a outra, em silêncio, e ela continuou:

— Há um lugar onde eu gostaria de passar, se estiver tudo bem.

Paramos de andar.

ASSOCIAÇÃO DE MAGIA, RAMO DE QUNORTS.

Diante de nossos olhos estava um prédio com uma placa em uma escrita que parecia quase tímida.

— Minhas desculpas por mantê-las esperando, veneradas bruxas…

Nossa professora podia ser uma viajante, mas também era uma bruxa habilidosa e, por isso, era frequentemente chamada pela organização confidencial conhecida como Associação de Magia.

De reprimir insurreições ao transporte de bagagens, os trabalhos que lhe foram confiados tinham um alcance incrível, mas nossa professora basicamente não recusava nenhum deles.

— Poupe-me das sutilezas, quanto é que o trabalho paga?

— Bem, em primeiro lugar, gostaria de lhe dar uma descrição da comissão…

— Quanto paga?

— …

O motivo era simples, ela era obcecada por dinheiro.

— Dez moedas de ouro…

— Humph. — Ela estava assentindo apaticamente para o membro da equipe da associação, mas, por dentro, seu coração estava pulando de alegria. — Tudo bem, e a descrição?

Seu motivo oculto a fazia parecer um tanto rude e sem modos, mas este país aparentemente estava enfrentando uma situação a qual não poderiam resolver sem depender dela no momento.

— Na nossa cidade existe atualmente uma organização criminosa que usa uma loja de antiguidades como disfarce para suas atividades ilegais… Vocês todas já devem ter visto o trabalho deles na cidade, não? Os cartazes e placas que caluniam as magas.

De acordo com o representante da associação, a equipe do Antiquário era uma turma comum de bandidos que trabalhavam como ladrões e batedores de carteira na cidade. Não havia nenhum entre eles que pudesse usar magia e, por essa razão, eram mais hostis a magas, que tinham poderes especiais, do que a multidão normal. Aparentemente, perseguiram e caluniaram a Associação de Magia em inúmeras ocasiões.

Entendo, suponho que ladrões comuns considerariam as magas uma ameaça.

Contudo…

— Se você está sendo assediado, pode simplesmente retaliar, não é? Quero dizer, eles nem conseguem usar magia, certo?

Ao meu lado, Sheila fez a pergunta que estava em minha mente em voz alta.

Era uma preocupação razoável. Que motivo poderia haver para sair do caminho e pagar para um grupo de estranhos resolver a situação?

— Já os confrontamos muitas vezes. É muito difícil dizer isso, mas… por mais embaraçoso que seja, nunca fomos capazes de enfrentá-los. Nenhuma vez, muito menos de prendê-los.

— Há algum motivo para isso…?

O membro da equipe acenou com a cabeça para minha professora.

— Eles têm alguns tipos de ferramentas estranhas. Por exemplo, capas de invisibilidade, espadas que podem cortar qualquer coisa, armas que nunca ficam sem munição, fósforos que induzem alucinações…

Por causa da capacidade dos membros do Antiquário de manipular habilmente esses objetos misteriosos e usá-los para brincar com as magas, disse ele, o público tinha praticamente perdido toda a confiança na associação.

Estavam fazendo as mesmas coisas que a magia – talvez até mais – sem usar magia, contando, em vez disso, com esses objetos enigmáticos que podiam conjurar energias especiais, ele nos disse.

Já que estavam colando cartazes e placas hostis onde quer que quisessem, parecia certo que as pessoas nesta cidade não tinham mais fé nos usuários de magia.

Quando o balconista terminou sua história, intimidado e com um olhar de cansaço, voltou seu olhar para a nossa professora.

— Você não pode fazer algo sobre isso…?

— … — Ela estava se mantendo em silêncio e seus olhos não estavam focados em nós, mas em algum lugar distante, como se estivesse olhando para o oceano, era como se de repente tivesse percebido alguma coisa.

Depois de uma breve pausa, ela bufou.

— Entendido, prometo que este assunto será completamente resolvido.

— Muito obrigado! Se uma bruxa habilidosa como você promete resolver o problema, então até mesmo isso…

— Ah, não, não por mim. — Ela interrompeu o funcionário entusiasmado. — Essas duas vão resolver o problema, certo?

Ela colocou as mãos em nossos ombros.

Como é?

Imediatamente após o check-in em nosso hotel, nossa professora bateu palmas alegremente.

— Tudo bem. Deixe-me explicar as regras!

Era como se ela estivesse dando início a algum tipo de jogo.

— A partir de hoje, vocês duas devem preparar uma armadilha e prender os membros do Antiquário. Podem estar em posse de certas ferramentas incômodas que causariam problemas para uma maga comum, mas não serão nenhum problema para duas alunas minhas, certo? Afinal, vocês não são magas comuns.

Ela tinha um jeito de falar muito indiferente, mas suas palavras pareciam dizer: “O fracasso não é uma opção para nenhuma aluna minha.” Para reformular a frase de maneira cruel, ela parecia estar nos dizendo: “Quem não passar leva um chute“.

— Hmm… em outras palavras, você não precisa daquela que não puder resolver o assunto e quer que ela pare de ser sua pupila? Eu gosto do jeito que você pensa. — Ao meu lado, Sheila sorriu e disse essas palavras desagradáveis.

— …

Aparentemente, por mais horrível que fosse nosso relacionamento, estávamos ambas pensando a mesma coisa.

— Interpretem como quiserem. O prazo é de três dias. Mostrem-me o que vocês podem fazer antes que esse tempo acabe.

Nossa professora não confirmou nem negou suas intenções. Com isso, saiu do cômodo.

E assim a cortina subiu para nossos três dias.

— Eeek! Espera! Espera! Eu sinto muito! Foi tudo minha culpa! Por favor, poupe minha vida…

O homem que persegui até um beco ergueu as duas mãos no ar. Seus dentes batiam e seus olhos se encheram de lágrimas.

É isso que devem chamar de gato encurralado.

— Não vou tirar a sua vida. Estou atrás dessa sua arma.

Eu estava com minha varinha apontada para a espada na mão do homem. Ele era um membro do Antiquário e dono de uma espada que poderia cortar qualquer coisa.

Depois de coletar alguns depoimentos de testemunhas oculares na cidade, fui diretamente à cena do crime e acabei atropelando-o.

— Ei, espere um segundo! — Uma voz soou por trás de mim. — Fui eu quem pôs os olhos naquele cara primeiro, e vou pegar a arma dele.

Quando me virei, Sheila estava apontando sua varinha para mim.

— Fui eu quem o perseguiu, o que significa que tenho o direito de reclamar os despojos.

— Não, eu usei você para persegui-lo, o que significa que tenho prioridade. Entendeu?

— Eu não entendi e não o entregaria mesmo se entendesse.

— Ehh?

— Huh?

Olhamos uma para a outra por um tempo, mas, como sempre, estávamos em um impasse.

— …

— …

Não nos importamos em terminar a discussão, uma vez que percebemos que o homem encurralado havia escapado enquanto estávamos absortas em nossa briga.

Os três dias da nossa disputa decorreram no mesmo ritmo.

Sempre que uma de nós perseguia um membro do Antiquário, a outra atrapalhava.

Quando Sheila perseguiu um dos proprietários de uma arma que nunca ficava sem balas, por exemplo, eu fui e interferi. Outra vez, quando peguei um dos homens que tinha uma capa de invisibilidade, Sheila apareceu para usurpar a minha conquista.

— O que há com você? Está tentando ficar no meu caminho? Ou você só quer a aprovação da nossa professora?

Trombávamos toda hora.

— Cale a boca! Isso não tem nada a ver com você. — Sheila soprou uma fumaça tóxica roxa na minha cara.

— …

— …

Nós nos encaramos.

— Humph… — Eu me afastei.

E, uma vez que continuamos atrapalhando uma à outra, não conseguimos coletar qualquer das armas especiais extremamente importantes.

Se as coisas continuarem assim, não vou conseguir colocar minhas mãos em nenhum deles e nossa professora vai ficar sem paciência. Fui alimentada por essas preocupações.

 

Então, um dia…

— Você aí, que tem tentado derrubar o Antiquário.

Eu estava tomando um café quente e lendo o jornal sozinha em um café, em busca de mais informações, quando uma voz veio da mesa logo atrás de mim.

Dentro do café, que podia ver por cima do meu jornal, estavam uma garçonete trabalhando arduamente, um casal afetuoso que parecia alheio ao que estava à sua volta, um homem de terno que claramente tinha muito tempo livre e muitos outros.

Eu certamente não estava sozinha, então a princípio pensei que a voz poderia estar chamando outra pessoa em alguma outra mesa.

— Ei, estou falando com você. Fran? Ou qualquer que seja o seu nome.

Oh, eu? Me virei quando meu nome foi chamado.

Vi longos cabelos ruivos. A outra pessoa estava de costas para mim, em direção a uma mesa vazia. Estava olhando para baixo e o chapéu que usava obscureceu sua expressão. Lentamente, a pessoa se virou para mim, até que quase metade do rosto de uma mulher ficou visível e ela rapidamente voltou a se virar.

A única coisa que vi foram seus caninos longos e afiados.

— Onde você descobriu meu nome?

— Bem, os detalhes não são importantes, são? — A anônima Lady Presas riu alto. — Mais importante, como está indo? Sua tarefa está indo bem?

— Parece que está indo bem?

Levantei o jornal para que ela pudesse ver, na página havia a manchete: LÍDER DO ANTIQUÁRIO ANUNCIA: “TOMAREMOS AS CABEÇAS DAS MAGAS QUE CONTINUAM A ATACAR NOSSOS MEMBROS.” Para surpresa de ninguém, Sheila e eu fracassamos completamente em nos manter discretas. Esse líder desconhecido – não sabíamos seu nome nem seu rosto – estava aparentemente muito zangado conosco.

— Huh, parece que você se meteu em uma situação bastante perigosa. Caçou uma briga com aquela gangue?

 — Não, mas isso funciona a nosso favor.

— Hmm? Por que? Sua vida está em jogo, não é? — Mesmo que eu não pudesse ver seus olhos, eu poderia de alguma forma dizer que a Lady Presas estava franzindo a testa.

— Isso significa que estarão vindo até mim. Isso vai me poupar o tempo e esforço de procurá-los — continuei, segurando o jornal na frente do meu rosto. — O problema é que há uma chance da minha novata chegar primeiro. Ela é uma garota ousada e desagradável, mas é bastante capaz, então pode derrubar o Antiquário antes de mim.

— Huh… Alguém confiante… — murmurou a Lady Presas para si mesma. — A propósito, sabe todos os detalhes sobre o Antiquário?

— Detalhes?

— Quem são os membros, o objetivo da organização, a localização de sua base, como adquirem suas ferramentas.

— Não estou interessada em nada disso, só preciso esmagá-los, certo?

— Uh-huh. — Ela parecia estar balançando a cabeça. — Autoconfiança total e imprudência…

Parecia que alguém estava estalando os dedos.

Eu não sabia quem tinha estalado ou porquê, mas me senti um pouco desconfortável no instante em que ouvi o barulho e levantei meu rosto de trás do jornal de novo. Então eu soube que estava tudo acabado.

— …

Ao redor da minha mesa estavam a garçonete e todos os clientes apontando armas para mim. Estavam armados com espadas e revólveres, e até facas e garfos.

— Deixe-me dar uma boa notícia — diretamente atrás de mim, a mulher com as presas parecia estar sorrindo —, você não precisa se preocupar com sua amiguinha derrubando o Antiquário antes de você ter a chance, pois nós já a capturamos.

— …

— Ah, e nem pense em resistir, faça um movimento suspeito e vamos arrancar sua cabeça aqui mesmo.

— …

Foi a primeira vez que percebi minha própria estupidez.

Talvez eu tenha ficado cega para isso por causa do limite de três dias ou por causa da minha crescente frustração com minha novata, ou por causa do meu ego inflado. Neste ponto, eu não sabia qual dos motivos poderia ser a causa. Provavelmente trabalharam juntos para me levar a este fim horrível.

— Leve-a embora e lide com ela.

A única coisa que posso dizer com certeza é que, naquela época, eu era uma idiota sem esperança.

— Você deve estar brincando comigo, eles te pegaram assim…?! Você é uma veterana inapta.

— Te pegaram antes de mim, que novata totalmente inútil que você é…

— …

— …

Nossas palavras não tinham o vigor usual. Nada surpreendente, considerando que fomos feitas prisioneiras na base de operações do Antiquário.

Estávamos em uma sala escura. O ar estava um pouco úmido e uma luz laranja escorria de uma lâmpada do teto, fazendo com que as partículas de poeira que dançavam pela sala brilhassem.

No meio da sala, estávamos cercadas.

A corda estava enrolada em nossos braços, restringindo o movimento até mesmo de nossos pulsos. Não acho que eu poderia fazer muito nessa situação. A metade inferior do meu corpo não estava amarrada, então eu provavelmente poderia ter fugido, mas acabei ouvindo que me matariam se eu me mexesse e suas armas estavam apontadas diretamente para nós. A frase não poderia fazer nada parecia totalmente apropriada.

— Vocês magas são sempre assim, sempre atrapalhando nosso trabalho com seus estranhos poderes. Não tenho paciência para isso, realmente não tenho. — A mulher com presas estava presente. — No entanto, vocês realmente são lamentáveis. Como se pudéssemos perder para duas pequenas aprendizes!

Lady Presas soltou um enorme suspiro. Esta mulher, que parecia ser a líder do Antiquário, olhou para seus companheiros enquanto eles nos cercavam, segurando armas em punho, com olhos frios.

E então, também olhou para nós.

— Parece que vocês duas falam demais. Nós ouvimos tudo, sabe? Vocês estavam tendo algum tipo de competição para caçar nossos membros, como assim? Acham que mexer com nosso método de vida é algum tipo de jogo? Huh?

Lady Presas colocou o dedo sob o queixo de Sheila e inclinou o rosto dela para cima, olhando para ela com uma expressão fria.

Sheila olhou para trás, parecendo zangada como sempre. Depois de olhar para mim por apenas um segundo, disse:

— Nunca foi um jogo, queríamos acabar com vocês…

E então ela cuspiu um grande chumaço de catarro bem no rosto da Lady Presas.

Parecia cheirar a nicotina e veneno. Sua saliva parecia tão tóxica que eu meio que esperava que a Lady Presas tivesse câncer de pulmão na mesma hora. Tenho certeza de que isso aumentou o risco de um ataque cardíaco ou derrame.

Sheila foi rude como sempre, mesmo diante de um perigo mortal.

— Huh? Você acha que pode me desrespeitar? — Lady Presas franziu as sobrancelhas.

Pfft — Sheila cuspiu nela de novo, totalmente impiedosa. Isso parecia mesmo horrível.

— Não brinque comigo! Não entende a posição que você está…

— Pfft.

— Ei, já basta…

— Pfft.

— …

— Pfft.

— Ewww…

Antes que eu percebesse, os cantos dos olhos da Lady Presas estavam gradualmente se enchendo de lágrimas. Mais provável que fosse apenas cuspe. Não importa o que fosse, parecia cheirar bem mal.

Os ataques persistentes de Sheila podiam ter sido bem-sucedidos. Lady Presas murmurou:

— Ugh… nojento. — Depois desapareceu da sala… ou assim pensei, mas ela apenas enxugou o rosto e voltou de novo.

— Humph…! Que piada! Você aí! Lide com essas duas! Imediatamente!

Naquele momento, enquanto ela gritava ordens, todos os olhos na sala se voltaram para a Lady Presas.

Esse momento era a melhor chance que iríamos ter.

Baque. A corda que prendia nossos braços caiu no chão, foi por sorte que nos lembramos das habilidades furtivas com a faca que nossa professora nos ensinou uma vez como um meio-termo.

— Ah-hah! — Sheila agarrou sua varinha e explodiu as armas das mãos dos capangas da Srta. Presas.

— Certo! — Eu fiz o mesmo, incapacitando-os.

Eles não escondiam seu ódio por magas, mas assim como as magas, se não tivessem suas armas especiais, não seriam nada além de pessoas comuns.

Poderia ser o ódio nascido da semelhança?

— O q…! — Nosso ataque surpresa parecia ter funcionado. A expressão no rosto da Lady Presas me disse muito. — O-O que vocês estão fazendo? Acabem com essas bruxinhas agora mesmo!

Ignorando sua comoção de pânico, nós lutamos.

Nas mãos dos capangas estavam espadas e armas, escudos e lanças, e todos os tipos de outras coisas. Não havia necessidade de sair do nosso caminho para matá-los; assim que os despojamos de suas armas, perderam qualquer tipo de vontade de resistir.

Uma após a outra, confiscamos suas armas, coletamos cada uma que podíamos ver.

As armas se amontoaram no chão. Talvez porque nos deparamos com um perigo real, nos esquecemos completamente da nossa disputa. Tínhamos arrancado as armas deles, uma por uma, enquanto protegíamos as que já havíamos coletado entre nós, às nossas costas.

— Parece que subestimamos a situação.

Provavelmente teria sido fácil derrubar cada um dos criminosos por conta própria. Poderíamos até ter transformado isso em uma competição, mas não tínhamos tempo sobrando.

Em vez de pensar que Sheila era irritante ou ficar ressentida com sua audácia apesar de ser minha novata, ou qualquer coisa nesse sentido, eu estava pensando apenas em sobreviver.

Tenho certeza de que ela devia estar pensando no mesmo.

— …

Com certeza foi uma sensação estranha.

Mesmo agora, lembro bem.

A garota que eu odiava havia se tornado muito confiável – embora estivéssemos sempre em desacordo. Mesmo que estivéssemos sempre brigando, mesmo que ela sempre tenha sido meu oposto exato.

Nós duas éramos como um par espelhado.

Levamos muito tempo para perceber esse simples fato.

Antes que eu percebesse, havíamos conseguido empilhar muitas armas e ferramentas ao nosso lado.

Quando tudo acabou, estávamos completamente exaustas e Sheila e eu caímos no chão, costas com costas. Tínhamos drenado quase todas as nossas reservas mágicas, nossa respiração estava irregular e estávamos pingando suor, mas não tínhamos energia para enxugá-lo.

Tínhamos amarrado os membros do Antiquário com uma corda, mas não tínhamos energia restante para transportá-los para a filial da Associação de Magia.

— Vamos carregá-los depois de descansarmos um pouco…

Pude sentir Sheila acenar em resposta.

— Concordo.

— …

— …

— Ei, você — murmurou Sheila, em voz baixa, como se estivesse falando sozinha, falou pelas minhas costas. — Por que você está aprendendo magia com aquela professora?

— Por que não deveria…?

— Só estou perguntando. Não precisa franzir as sobrancelhas para mim.

— Oh, você pode ver o meu rosto?

— Acho que posso dizer, mesmo sem olhar.

— …

Eu a questionei de volta:

— Por quê você decidiu aprender magia com nossa professora?

— Eu realmente não tenho nenhum motivo em particular…

A história que ela me contou então era o tipo de coisa que se escuta o tempo todo.

No país onde ela e eu nos conhecemos, Sheila era órfã, mas morava sozinha, cheia de força de vontade.

Ela havia estudado magia por conta própria e a usava para furtos, extorsão e outras atividades bastante questionáveis. Ela conheceu minha professora em um desses dias.

Como de costume, estava usando magia para roubar carteiras, mas para seu azar, seu alvo do dia era minha professora. Sheila sabia usar magia, mas não tinha formação, então não poderia saber o quão poderosa uma bruxa poderia ser.

Ela foi pega em flagrante pela minha professora.

— Foi então que ela me contou que existem pessoas neste mundo chamadas de bruxas, que são magas fortes, e quando você se torna uma bruxa, consegue um bom emprego na mesma hora. Ela me disse que eu poderia parar de viver como uma gatuna, então decidi que queria me tornar uma bruxa — explicou. — Viu? Não é um motivo tão bom, é? — Cuspindo as palavras como se as achasse idiotas, Sheila bufou: — E você?

— Meu nome é Fran — respondi. — Também não tenho um grande motivo…

Se eu fosse escrever, minha história ocuparia apenas algumas linhas.

— Não há bruxas na minha cidade. Então se eu me tornar uma, serei a única da cidade. Ficarei tranquila para o resto da vida. É por isso.

— …

— A razão pela qual decidi estudar com nossa professora particular é ainda mais simples. Quando continuei sendo reprovada no exame de promoção para me tornar uma bruxa noviça, pedi a ela para me ensinar a lançar feitiços e eu passei. Então, quando estava pensando em me tornar a pupila de alguém, me tornei aprendiz dela.

— Então você se tornou sua pupila por motivos egoístas…

Bem, suponho que se for resumir, é esse o caso.

Pelas minhas costas, Sheila soltou uma risada silenciosa.

— Que droga, você e eu somos iguais, não somos…?

— …

Sempre estivemos de costas uma para a outra, voltadas para direções opostas.

Talvez sempre tenhamos sido mais próximas uma da outra do que de qualquer outra pessoa.

— Acho que sim.

Eu percebi que estava rindo. O corpo quente contra minhas costas também estava tremendo, eu me perguntei se quem começou primeiro fui eu ou ela. Ainda me pergunto quem foi.

De uma forma ou de outra, parecia que eu sabia, mesmo sem olhar.

Depois disso, foi tudo fácil.

Começando com Lady Presas, nós pessoalmente a trancamos com os membros do Antiquário na prisão, através da filial da Associação de Magia.

Ela e sua gangue não tinham feito nada particularmente ruim, como assassinato – apenas pequenos furtos – então seus crimes não eram tão graves.

— Pela estimativa mais pesada, serão condenados a vários anos de trabalhos forçados, hein? — Nossa professora encolheu os ombros.

Ela nos contou que as ferramentas misteriosas que o Antiquário havia usado foram trazidas de um país insular através de um dos portos da Cidade Livre Qunorts. Ela também disse que tinha visitado aquele país insular uma vez, antes de encontrar Sheila e eu – e é por isso que reconheceu as ferramentas.

De acordo com as leis, era proibido tirar as ferramentas do país insular.

— É por isso que precisávamos reuni-las e devolvê-las ao país insular. Bom trabalho recuperando-as, vocês duas.

Nossa professora devolveu o equipamento recuperado, acompanhados de uma carta que dizia: Recuperamos para vocês, então entreguem a recompensa, viu? Parecia que ela conhecia pessoas importantes por lá.

Sim, sim, obrigado pelo seu trabalho árduo. (De agora em diante, sempre que você encontrar algo, vá em frente e destrua no local, não se dê ao trabalho de devolver. É um incômodo ter que exigir dinheiro o tempo todo!)

Uma carta nesse sentido foi enviada em resposta, junto com uma quantia bastante considerável.

Em outras palavras, éramos pagas pelas duas partes – pela Associação de Magia e pelo país insular.

Que dissimulada. Que astuta.

— Viram? Viajantes podem ganhar dinheiro desta forma.

Nossa professora riu para si mesma.

Essa maneira dissimulada e desprezível de conseguir dinheiro não era algo que eu queria aprender com ela. Infelizmente, parecia ter sido herdado perfeitamente por suas filhas.

Era isso que chamavam de genética.

A partir daí, nossa jornada continuou.

Sheila sempre se sentia confortável nadando com as marés, então rapidamente se tornou uma bruxa noviça e tinha um broche preso ao peito, assim como eu.

Nós duas, juntas, sob a orientação de nossa professora, com o tempo aprendemos todas as maneiras sujas dos adultos ganharem dinheiro, junto com alguns feitiços muito respeitáveis, ​​adequados para magas respeitáveis.

Viajamos assim por cerca de meio ano.

No final, quando nossa professora estava voltando para sua cidade natal, nós duas recebemos nossos nomes de bruxas.

— Fran, seu cabelo é preto, certo? Então você é a Bruxa do Pó Estelar. — Ela prendeu um broche em forma de estrela no meu peito.

— Sheila, seu cabelo é brilhante, certo? Então você é a Bruxa da Meia-Noite. — Ela também fixou um no de Sheila.

Inclinamos nossas cabeças, imaginando como diabos nossa professora tinha inventado esses nomes.

— Meu cabelo é preto, então sou a Bruxa do Pó Estelar? Como assim?

Se meu cabelo é preto, não devia ser a Bruxa da Meia-Noite?

Sheila não deveria ser a Bruxa do Pó Estelar, com seu cabelo loiro?

Nossos nomes não estão invertidos?

Nossa professora sorriu, parecendo que estava esperando que eu perguntasse exatamente isso.

— Meia-Noite e Pó Estelar colocam um ao outro em vantagem quando estão juntos.

— Hã?! Não entendi direito o que você quis dizer.

— … — Nossa professora ficou em silêncio.

Olhando de soslaio para nossa professora, Sheila disse:

— Em outras palavras, nós duas ficaremos juntas, mesmo se estivermos separadas, ou, pelo menos, essa é a mensagem que ela colocou nos nomes… Isso é o que ela está tentando dizer. — Ela me olhou exasperada.

— … — As bochechas da nossa professora ficaram bastante vermelhas, então o palpite de Sheila provavelmente estava correto.

Ah, que simples.

— Mas por que você derivou nossos nomes de nossa cor de cabelo?

Inclinei minha cabeça novamente e nossa professora revelou outro sorriso antes de me responder.

— Porque é legal.

Depois que nossa jornada com nossa professora acabou, voltei para minha cidade natal e me tornei professora. Surpreendentemente, Sheila começou a trabalhar na Associação de Magia.

Ela conseguiu um emprego tão respeitável que ninguém nunca imaginaria que uma vez ganhou seu pão de cada dia por meio de furtos de carteiras e chantagem.

Imagino se algum dia deveria expô-la, uma vez que ela alcançar uma posição elevada. Brincadeirinha.

— Você mudou, não mudou…? — perguntou Sheila.

— Ambas envelhecemos — respondi. Era uma frase mais adequada para uma velha.

Como se estivesse surpresa com o que eu disse, Sheila soltou um suspiro branco enquanto caminhava ao meu lado sob o céu de outono.

— Agora somos mesmo bruxas velhas?

Ah, é claro que ela teria um contra-ataque.

— De qualquer forma — continuou Sheila —, até onde vejo, é você quem parece ter mudado.

— Eu?

Sempre fui assim, não fui?

— Antes você sempre era rápida para discutir comigo — disse ela. — Mas agora parece uma senhora aproveitando a vida de aposentada.

— Como ousa…

— Meio que sinto falta do seu lado indisciplinado.

— Se sentindo solitária? — perguntei.

— Não é exatamente isso — respondeu Sheila. — Na verdade, gosto mais de nosso relacionamento de agora do que o de antes, quando não fazíamos nada além de brigar. É confortável.

— Você realmente mudou…

Sheila bufou.

— Suponho que ambas crescemos.

Cada uma de nós trilhou seu próprio caminho depois de terminar nossa jornada juntas.

Mas nunca nos distanciamos.

Uma vez por ano, nós duas nos encontrávamos. Não éramos realmente obrigadas a fazer esta viagem e, por outro lado, também não estávamos andando por aí agarradas com ternura uma à outra, 24 horas por dia, sete dias por semana.

De uma forma ou de outra, decidimos que esse era o nível certo de distância.

— Bem, então devemos ir este ano também?

Olhei para o céu. Todos os anos, quando nossas viagens juntas terminavam, eu ficava ansiosa para fazer outra viagem com Sheila.

Então nós duas subimos nas vassouras e saímos da cidade.

A grama verde profunda farfalhou. O vento soprava forte e frio, nos avisando que o inverno chegaria em breve.

— É lua nova, eu acho. — Voando em sua vassoura ao meu lado, Sheila olhou para o céu.

Segui seu exemplo e seu olhar. Fiquei cativada.

O pó estelar cintilando no céu da meia-noite era muito, muito bonito.

 


 

Tradução: Nero

 

Revisão: Gifara (Sonny Nascimento)

 


 

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