Se eu tivesse que dar uma cor ao meu humor enquanto calçava meus sapatos internos nos armários da escola primária, seria cinza. Principalmente por causa de todas as pessoas desagradáveis que encontrei naquela manhã. Em horas como essas, costuma-se dizer a cor azul por seu ar melancólico, mas eu gostava da cor azul.
— Oh, cara, a esquisita está aqui! — Uma voz que não reconheci chamou de dentro.
Eu dei um suspiro teatral.
— Vocês todos devem ser realmente estúpidos se não conseguem vencer uma esquisita como eu nas provas. Que fascinante.
Gratificada pelos olhares de raiva nos rostos de vários de meus colegas idiotas, recusei-me a conversar mais com eles. No fim, um deles disse algo como: “Por que você é um bebê?”
Eu queria elogiá-los por serem capazes até de falar de maneira inteligível, mas foram embora, então calcei meus sapatos internos e entrei no prédio.
Nessa hora…
— Bom dia, Koyanagi.
Uma única voz interrompeu meu embaralhamento cinza. Eu me virei para ver um dos meus colegas de turma e minha expressão ficou sombria.
— Ah! Bom dia, Ogiwara.
— Acabei de ler Tom Sawyer ontem. — disse ele. — Foi muito bom.
— É? Que ótimo. De quais cenas você gostou?
— A parte sobre a pintura, eu acho. Eu também achei o Tom muito legal.
— Tom é realmente atraente. E inteligente.
— Eu também gostei do Huck.
— Sem-teto Huck, certo? Oh, pensando bem, eu…
Parei. Não porque estava tentando manter minha conversa com a Vovó só para mim, mas porque um menino veio correndo atrás de Ogiwara e se chocou contra ele. Virei as costas para o assustado Ogiwara, mas duvido que ele tenha percebido. O menino que se colidiu era seu amigo íntimo e com certeza topou com Ogiwara em nome da brutalidade masculina infantil, não de intimidação. Ninguém intimidaria Ogiwara, nem ele intimidaria ninguém. Ele tinha muitos amigos.
Eu, por outro lado, não tinha amigos em nossa turma e decidi virar as costas para isso. Fora Ogiwara, todos os outros em nossa classe pensavam que eu era desajeitada ou me odiavam. Ainda assim, eu nunca tinha sido intimidada por eles. E por isso, decidi sair ao ver o amigo de Ogiwara. Uma amizade entre garotos não é algo que uma garota deva se intrometer.
Eu precisava parar na biblioteca antes de poder ir para a sala de aula. A biblioteca abria de manhã cedo, o que era maravilhoso para mim. Eu preferia muito mais pular o período barulhento antes da chegada da Professora Hitomi e passá-lo na biblioteca silenciosa.
Quando entrei, fui saudada pelo cheiro especial dos livros e pela gentil bibliotecária. Perguntei à bibliotecária se tinha As Aventuras de Huckleberry Finn, sobre o qual eu tinha ouvido falar da Vovó no dia anterior. Ela me guiou até uma estante de livros e deixou que eu mesma procurasse o livro.
— Se você é uma amante dos livros, vai querer desfrutar da sensação de ter o coração acelerado ao procurá-los. — disse ela.
E eu sentia a mesma coisa.
Eu rapidamente encontrei o livro em questão e o peguei, com a ponta dos meus dedos formigando de animação. Larguei minha mochila e sentei ali perto.
Tenho certeza de que Ogiwara e eu éramos os únicos em nossa turma que entendiam a sensação incomparável de abrir a primeira página de um livro. Ela seria desperdiçada com os outros.
Sozinha, dei o primeiro pequeno passo na história do Sem-teto Huck.
A biblioteca era um lugar maravilhoso, com seu silêncio, seu cheiro adorável e a bibliotecária gentil. Porém, mesmo aqui, havia uma linha que não se deve cruzar: perder-se profundamente no mundo dos livros.
Até a bibliotecária gritar, eu tinha esquecido completamente que ainda estava na escola. Pouco antes de o sinal da manhã tocar, a bibliotecária chamou meu nome e, depois do que pareceu uma eternidade, voltei ao meu próprio mundo. Peguei o livro emprestado, enfiei na mochila e me despedi por enquanto.
Passei pelos corredores, mais barulhentos agora do que quando cheguei, e subi as escadas degrau por degrau até a minha sala de aula no terceiro andar. Ignorando os meninos que corriam pelos corredores, entrei. Ninguém pareceu notar minha entrada na sala. Como sempre, marchei direto até o meu assento na última fila. Larguei minha mochila e me sentei.
Kiriyuu, que tinha sentado ao meu lado, me notou e fechou apressadamente o caderno em seu colo.
— Bom dia, Kiriyuu.
— B-Bom-bom dia, Koyanagi.
Ele estava falando rápido, como fazia quando ficava chateado por ser provocado. Ele empurrou o caderno fechado para baixo da mesa.
— O que você estava desenhando?
— Na-nada!
Ele estava mentindo. Eu sempre sabia quando Kiriyuu estava mentindo. Ele estava fazendo um desenho. Estava sempre rabiscando em seu caderno. Talvez achasse que estava fazendo um bom trabalho em esconder, mas eu era sua vizinha — vi tudo.
Ele era muito habilidoso em desenhar, algo que eu achava que ele deveria estar gritando para as pessoas ao seu redor, mas nunca o fez, e os meninos idiotas o ridicularizaram repetidamente por isso.
— Kiriyuu, a vida é como uma cavidade.
— O-O que você quer dizer com isso?
— Se você não gosta, deve se apressar e fazer algo a respeito. Se as pessoas estão tirando sarro de você por desenhar, então você deveria cuspir de volta na cara delas. — falei, colocando minha mochila na prateleira atrás de mim e me sentando mais uma vez.
— E-Eu não posso fazer isso. — Kiriyuu disse baixinho, sem olhar na minha direção.
— Não com essa atitude fraca. — eu disse, assim que o sinal tocou.
A Professora Hitomi entrou na sala de aula. Todos a amavam — a única vez que a atmosfera parecia clara e brilhante era quando estava lá.
— Bom dia!
— Booooom diaaaaa!
Sob a direção de Ogiwara, o representante da turma, começamos mais um dia chato de escola.
O primeiro período foi de matemática, o segundo foi de estudos sociais, e então no terceiro período tivemos a lição sobre felicidade que a Professora Hitomi mencionou para mim. Eu queria anunciar com orgulho que sabia sobre isso desde ontem, mas tinha jurado segredo. Não mencionei a lição nem o chocolate.
A aula de cinquenta minutos passou rapidamente, lendo a história em nosso livro e pensando sobre os sentimentos do personagem principal. Não havia tempo para pensar em felicidade. Então a Professora Hitomi anunciou que o quarto período seria uma extensão do terceiro. Eu aprovava muito essa ideia e achava que cinquenta minutos não eram o suficiente.
No quarto período, tivemos que pensar em várias noções de felicidade. Fomos divididos em pares e tivemos que discutir o que considerávamos nossa própria felicidade.
Fui colocada com meu vizinho, Kiriyuu, que raramente puxava assunto, então eu tinha que conduzir a conversa.
— Ontem eu estava comendo um biscoito com sorvete por cima. Eu me senti feliz na hora.
— Huh.
— Aconteceu algo assim com você?
— Bem, hm, os ohagi que minha avó fez eram realmente bons.
— Os doces que as vovós fazem são sempre super gostosos!
— Sim. Eu gosto dos que minha mãe faz também. Eles são diferentes dos da Vó.
— Sua mãe faz doces também? Que legal. Minha mãe não chega em casa até a noite.
Nós dois continuamos discutindo assim, anotando coisas em nossos cadernos. Estávamos trabalhando, e quando a Professora Hitomi fez as rondas para conferir, ela nos elogiou, mas havia uma coisa que ainda me incomodava. Por mais que discutamos o assunto, mesmo quando mencionei livros, Kiriyuu nunca disse nada sobre desenho. Achei isso estranho, então perguntei:
— Você não fica feliz quando está desenhando?
— Uh, t-talvez? Eu… gosto.
— Então isso é uma coisa que te faz feliz.
— M-mas sempre que eu desenho… as pessoas zombam de mim…
— Isso não importa!
Minha voz foi mais alta do que eu pretendia. Kiriyuu parecia chocado, todos na sala também ficaram. Eu também fiquei surpresa comigo mesma.
— Desculpe, fiquei empolgada! — Eu disse à Professora Hitomi, que estava olhando na minha direção.
— Tente não assustar a todos. — respondeu ela gentilmente, e embora todos estivessem resmungando, a calma voltou.
Voltei-me para Kiriyuu.
— Coisas assim não importam.
Anotei “fazer desenhos maravilhosos” na minha página. Kiriyuu baixou a cabeça, em silêncio.
Quando o quarto período terminou e o almoço subsequentemente encerrou, passei o resto do meu intervalo do meio-dia na biblioteca. Estava mais barulhento agora do que pela manhã, mas ainda estava mais silenciosa do que a sala de aula, e eu fui capaz de me enterrar nas aventuras do Sem-teto Huck.
Depois do intervalo era hora da limpeza, então quando o sinal tocou, voltei para a sala de aula e peguei uma vassoura. Kiriyuu, estando no mesmo grupo, também tinha retornado antes do tempo para iniciar a limpeza.
Enquanto limpávamos diligentemente a sala, aquele garoto idiota de antes voltou do ginásio, falando algumas bobagens estúpidas.
— Vocês dois são super assustadores, sempre fazendo desenhos e lendo todos aqueles livros.
— A única coisa assustadora aqui é o seu rosto. — respondi obedientemente. — Você sabia?
Eu olhei para Kiriyuu para ver se ele responderia também, mas naturalmente não respondeu.
O quinto e o sexto períodos terminaram. Como chegou a hora dos anúncios da tarde, deixei escapar um suspiro de alívio, liberando toda a ansiedade que estava me segurando. Nos despedimos da Professora Hitomi, e então acabou… ou assim pensei. Mas ainda havia um anúncio importante para nós.
— Na semana seguinte, teremos uma visita de turma. Todos os pais e mães já foram informados sobre isso, mas essa será uma chance importante para eles verem como vocês normalmente são na escola, então certifiquem-se de dar a eles o material que estou passando por aí, ok? Por favor, me prometam, pessoal.
— Sim, senhora. — dissemos em coro, devolvendo o material que foi passado da primeira fila.
Li o conteúdo da folha e alegremente coloquei-a na mochila. Eu adorava esses dias de observação. Era uma chance para minha mãe e meu pai verem o quão inteligente eu era.
Sem ser chamada para ficar até mais tarde hoje, fui para casa sozinha, como sempre fazia. Coloquei minha mochila no quarto como sempre e comecei a voltar quando me lembrei de algo importante. Retornei ao meu quarto e peguei a folha, colocando-a na mesa da sala antes de sair novamente.
Fora do prédio, como sempre, minha amiga de cauda curta estava esperando por mim.
— Miau! — gritou ela em saudação.
Nós duas partimos em direção ao grande rio ondulante. Enquanto subíamos a margem, uma brisa soprou agradavelmente pelo meu cabelo e ondulou em sua cauda curta. Sentindo-nos maravilhosas, nós duas começamos a cantar. Em pouco tempo, nossas vozes ainda reverberando, chegamos ao prédio de apartamentos de cor creme, onde paramos na porta de sempre e tocamos a campainha. Na primeira vez, não ouvimos nada. A porta também não abriu na segunda vez. A Senhorita Bobtail choramingou aos meus pés quando toquei pela terceira vez, mas nenhuma resposta veio.
— Eu acho que ela deve ter saído hoje.
— Miau.
A Senhorita Messalina era uma mulher ocupada, então estava frequentemente fora de casa. Deixando o vento levar nossa decepção, desistimos e decidimos voltar por um caminho diferente. Obviamente, ainda não estávamos indo para casa. Tínhamos um compromisso habitual depois da casa da Senhorita Messalina.
Caminhamos cantando, passando por grandes e pequenas casas. Logo passamos pelo prédio onde eu morava, antes de seguirmos pelo caminho usual até as colinas que se erguiam atrás dele. Cumprimentei os habitantes locais pelos quais passamos ao longo do caminho, mas minha amiga reservada apenas balançava a cauda para frente e para trás, desviando o olhar friamente.
— Não dê bola, são só humanos. — eu disse. — Você vai acabar sendo desprezada no mundo dos gatos dessa forma.
Ela continuou a andar na minha frente, como se não tivesse me ouvido, chegando ao sopé da colina e começando a subir entre as árvores. Finalmente chegamos à clareira de costume, com sua casa de madeira, e corremos para bater na porta.
Na primeira vez que batemos, não houve resposta.
Batemos várias vezes, tentamos a maçaneta e circulamos o perímetro da casa, mas parecia que a Vovó não estava em casa. Sentei-me na vegetação daquele espaço vazio e cruzei meus braços curtos.
— É estranho para que as duas, a Senhorita Messalina e a Vovó, estarem fora.
— Miau miau. — respondeu a Senhorita Bobtail, desamparada por ainda não ter recebido uma refeição.
— Agora você não pode simplesmente ficar de mau humor com isso. A vida é como uma merenda escolar.
— Miau.
— Você ainda tem que aproveitar o máximo que puder, mesmo quando eles não têm as coisas que você gosta. Entendeu?
Ela não pareceu entender, mas descemos a colina juntas mesmo assim. Talvez encontremos a Vovó quando ela voltar, pensei, mas chegamos ao parque no sopé da colina sem essa sorte. No parque, crianças menores do que eu corriam por aí, com as mães cuidando delas.
Então, o que poderia estar acontecendo? pensei. A Senhorita Bobtail rolou aos meus pés, talvez perturbada por todas as suas esperanças terem sido traídas.
Eu coloquei as engrenagens de minha mente afiada para girarem. Então me lembrei de algo.
— Há uma bifurcação no caminho para a casa da Vovó.
— Miau.
— Agora que penso sobre isso, ainda há um caminho que não seguimos. Vamos tentar ir por ele.
A Senhorita Bobtail ainda estava caída de lado no chão. Eu a cutuquei com meu dedo do pé. Ela se levantou com certa relutância, soltou um grande bocejo e começamos a subir a colina novamente.
Eu a segui, estava com o suor pontilhando minha testa. No fim, chegamos à bifurcação. Sempre saímos daqui para a direita, mas hoje, pela primeira vez, decidi tentar à esquerda. Este caminho se estendia até uma subida suave. Talvez animada pela chance de fazer um pouco de exercício, a Senhorita Bobtail saltou na minha frente. Os gatos são criaturas tão descontraídas.
Cinco minutos depois, com o cheiro das árvores ficando mais forte aos poucos, o portão de ferro quebrado apareceu. O portão, que apareceu como se fosse um passe de mágica, estava aberto apenas alguns centímetros.
Quando estendi a mão para tocá-lo, o portão se abriu lentamente, rangendo com um som estridente. Hesitei por um momento, mas observei a Senhorita Bobtail nos olhos, pensando o quão longe já tínhamos chegado, e decidi prosseguir. Eu já tinha muita prática em olhar para cima e mostrar minha língua por perdão, apenas no caso de alguém ficar com raiva de nós.
Além do portão, havia degraus de pedra bem definidos, ao contrário do caminho acidentado que tínhamos escalado. Subimos com cuidado, mas eventualmente as escadas acabaram e se abriram em algo como uma clareira, salpicada de cascalho.
Fiquei surpresa ao ver isso e tomei um fôlego desse novo ar. Não tenho ideia se a pequenina aos meus pés também ficou surpresa.
— Miau. — disse ela, como sempre fazia.
— Eu não tinha ideia que havia algo assim aqui.
No final do caminho oposto à casa da Vovó havia algo que era o completo oposto: um prédio que parecia uma caixa quadrada de pedra. Olhando para os buracos parecidos com janelas ao longo das paredes, pensei que o prédio tinha dois andares, mas não tinha a menor ideia do que realmente era. Não havia padrões ou letras em qualquer lugar. Parecia muito com uma caixa de pedra simples. Não tinha nada do calor da grande casa de madeira da Vovó.
Ao me aproximar, descobri que não havia nem mesmo uma porta no lugar onde deveria estar a entrada. Pensando nisso por um momento, deslizei timidamente por um dos buracos abertos. A Senhorita Bobtail engoliu os nervos e casualmente entrou no edifício. Entrei atrás dela. Não conte a ninguém, mas eu estava com um pouco de medo.
Primeiro, olhamos pelos arredores no térreo, mas não havia nada que se parecesse com quartos. O chão era plano e sólido, totalmente vazio. Não havia o menor indício de que alguém pudesse estar lá. A única coisa que evidenciava esta caixa como um edifício era a escada que ficava bem no meio. Sem nenhum outro lugar para ir, reunimos nossa coragem e lentamente subimos as escadas.
O segundo andar também estava vazio. Parecia que os buracos quadrados realmente tinham sido janelas uma vez, já que havia cacos de vidro pendurados aqui e ali. Obviamente, eu não toquei neles — isso seria perigoso.
Ah, não sobrou nada neste prédio, pensei, olhando ao redor do segundo andar.
Não conte a ninguém, mas foi realmente assustador. Eu não queria nada mais do que correr para fora. Mas então descobrimos outro conjunto de escadas levando para cima. Olhando para cima, eu poderia dizer que direcionava ao telhado, vendo o céu aberto acima. Troquei olhares com a pequenina aos meus pés e decidimos subir.
Passo a passo, subimos as escadas, deixando pegadas na poeira. Quando colocamos nossas cabeças no telhado, fui recebida por raios de sol e pelo vento soprando em meu rosto. E então olhei para uma jovem sentada encolhida no chão com um estilete pressionado em seu pulso.
Naquele dia, profundamente chocada, entendi pela primeira vez o que as pessoas queriam dizer quando falavam que o tempo parou. E então, um instante depois, o tempo estava correndo.
— Aaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaah!!
— Aaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaahh!!!
— Miau!
E foi assim que conheci a Minami.
Tradução: SoldSoul
Revisão: Guilherme
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