— ESTOU indo.
— Volte em segurança.
Não uso meu cavalo quando vou à aldeia. Não levo minha espada nem meu escudo. Todas essas coisas são inadequadas para um simples caçador. Usar uma adaga em meu cinto é o máximo que posso fazer para manter meu disfarce. Além disso, a aldeia não é tão longe para que eu precise viajar a cavalo. As coisas, agora, são completamente diferentes do primeiro dia, quando, com medo e cuidado, segui o caminho pela amaldiçoada floresta envolta em neblina. Estou mais do que acostumado a viajar por este caminho inexplorado agora. Também conheço alguns atalhos.
Quanto mais longe da Árvore Milenar, mais fraca ficava a barreira, e, no fim, a névoa entre as árvores diminuía. A fronteira não era bem marcada, mas definitivamente era ali. A bênção da Fada-Madrinha protegia a Princesa do mundo externo desta forma.
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ATTEGRUNE era uma aldeia situada ao sul da Floresta Negra. Cerca de quinhentas pessoas viviam lá. O número aumentava no Dia de Feira. À venda, os mais frequentes eram bens de lã, queijo, gado, cavalos e ovelhas; toda a magnanimidade dos pastos da abençoada floresta era cultivada em grande escala, sendo assim, os animais que pastavam lá eram grandes e gordos. Antes dos meses atuais, esta terra não era significante a não ser para mercadores, criadores de gado, pastores e fazendeiros, porém…
No último ano, o número de soldados aumentou drasticamente. Por isso, agora, homens usando armaduras eram vistos com frequência carregando espadas, lanças e outras armas mortais.
A razão da presença deles era óbvia — estavam procurando a Princesa.
Provavelmente, a notícia de que a última vez que a viram foi próximo à Floresta Negra foi espalhada. Entretanto, nos últimos dias, o número de soldados diminuiu. Rufiões e mercenários, todos contratados, vieram aos montes para substituí-los. Eram o tipo de escória que rapidamente passavam de soldado para ladrão quando não estavam sendo pagos.
Não os encare. Não se envolva. Não comece uma briga. Continuei com cuidado enquanto dizia a mim mesmo essas três regras. Os aldeões nesta área vivem com o mesmo mantra. Usando o mesmo manto emprestado com a autoridade de seu empregador, Lorde Ardiloso, esses assassinos roubavam tudo que queriam sem pagarem por isso. Soldado e fora da lei: aqueles que mantém a ordem pública e os que a destroem. É necessário ter cuidado quando lida com homens musculosos que facilmente trocam de papéis quando é mais conveniente.
Viu só, eles apareceram bem quando eu estava no meio de meus assuntos. Os vermes se espalhavam por toda a rua, exibindo armaduras e espadas, emitindo tinidos enquanto andavam. Baixei meu chapéu sobre o rosto e mantive-me em um lado da rua para deixá-los passar. O equipamento deles era extravagante demais. Parecia que o Lorde Ardiloso deixou suas maneiras mesquinhas de lado e estava dando pagamentos generosos agora. Por quanto tempo continuaremos seguros dentro da floresta?
Continuei seguindo a rua principal, indo em direção à estalagem. Era a maior da aldeia e possuía muitos tipos de serviços. O primeiro andar era uma taverna, como já era esperado. Os quartos eram limpos e a comida, tentadora. Mas, mais importante, eram bons quando se tratava de pagamentos.
Dei a volta, indo até os fundos, e chamei:
— Chefe, está aí?
Um homem de rosto vermelho cumprimentou:
— Oh, imaginei que logo apareceria.
Ouvi dizer que ele não é muito mais velho do que eu, mas nós dois somos completos opostos. Ele tem um grande sorriso sempre que nos encontramos. Na verdade, nunca o vi ficar bravo antes. Será que eu teria me tornado um velhote gentil assim caso tivesse tomado outro caminho na vida?
— Aqui estão os despojos desta semana.
Esta estalagem comprou a minha primeira caça, desde então estive lhes vendendo tudo que pego. Até hoje decoram o local sobre a lareira com a cabeça de um javali selvagem.
Entreguei as galinhas, faisões e perdizes. O estalajadeiro os pesou, calculou o valor e me deu o equivalente em ouro. Peguei o dinheiro e o guardei na bolsa em minha cintura. Nossos negócios de sempre ocorreram sem problemas.
— Estou ansioso pela próxima visita, Caçador.
— Muito obrigado pela sua compra.
— Não quer almoçar antes de partir, hein? A sopa acabou de ferver.
— Muito obrigado.
Dei a volta, indo até a taverna, e me sentei em uma mesa de canto. Logo em seguida, a esposa do estalajadeiro trouxe uma bandeja com uma tigela quente e uma caneca. A tigela tinha uma calorosa sopa de feijões, nabos e cordeiro, tudo cozido com leite. Também havia pão de centeio na bandeja.
— Desculpe pela demora. Vá em frente e não se acanhe, vamos!
— Obrigado.
Ao contrário de seu marido, ela movia-se rapidamente pela estalagem com grande energia. Seu raciocínio também era rápido e tinha uma incrível capacidade para conversar com os clientes. Sem contar que era terrivelmente carinhosa.
Sabia que eu estava criando minha sobrinha — em outras palavras, a Princesa —, por isso sempre me dava alguma coisinha para que eu levasse como presente. Normalmente era algo pequeno que não pesaria em minha viagem de volta.
O presente de hoje foi um laço verde-claro.
— Obrigado…
— É só uma lembrancinha, nada mais! Comprei os laços porque minha filha estava me incomodando para tê-los, mas, então, percebi que comprei muitos.
Ela não tentava forçar sua vontade sobre nós para fazer com que nos sentíssemos em débito, fazia isso porque gostava, nada mais. E sabia quando insistir e quando recuar. Era uma boa mulher, no exato sentido da palavra.
— Este lugar está bem cheio hoje.
— Ah… Sim, pode-se dizer que sim — murmurou ela, o que era incomum. Segui seu olhar até alguns homens de aparência perigosa, posicionados entre os clientes comuns. Bebiam cerveja, mesmo que ainda estivéssemos no meio-dia. Muitas canecas vazias cobriam a mesa deles.
Ela continuou:
— O dinheiro é bom. Apenas o dinheiro…
— Aposto que sim.
— Não posso ser exigente com nossos clientes. Recentemente, as taxas aumentaram como nunca também… — Então parou. — Ah, meu bem, me desculpe. Acabei falando demais e estragando o humor com uma conversa dessas.
— Tudo bem. Não se sente melhor por tirar isso de seu peito?
— Pode ter certeza.
Alguém a chamou de uma mesa do outro lado.
— Tudo bem! Já estou indo! — Virou-se para mim uma última vez — Tudo bem, pode ir devagar e aproveitar a sopa. — Seus peitos balançavam um pouco enquanto ela andava.
“O tamanho do peito de uma mulher é proporcional ao tamanho de seu coração?”
— Hora de comer. — Cortei um pedaço de pão e o molhei na sopa quente. Assoprei antes de colocá-lo em minha boca. Era um pão duro com um gosto amargo. Encharcado no caldo saboroso, derretia lentamente. — Muito bom.
Poder comer algo que outra pessoa fizera, ainda mais quando é comida boa, é, sem sombra de dúvidas, um tipo de alegria.
O cordeiro tinha um cheiro forte e distinto. No mínimo, era o que eu pensava até agora. Comparado ao coelho e veado que estive comendo ultimamente, é muito mais adocicado. Em outras palavras, não tem muito daquele cheiro mordaz e não é tão abundante. Mostrava que, quanto mais perto de um assentamento humano, melhor seria a comida.
Em seguida, usei a colher na sopa. Manjericão, sálvia e alecrim davam o sabor base, coberta com uma grande quantidade de gengibre para dar aquele gosto. Então, o leite abraçava todos os sabores, criando um gosto que só poderia vir mesmo ao ferver um bocado de ingredientes em uma panela grande.
Sopa quente desceu pela minha garganta, fluindo até meu estômago vazio. Meu rosto mostrou um sorriso satisfeito. A tensão em meus músculos rígidos e duros foi aliviada de dentro para fora. Mastiguei, saboreei o gosto e engoli, então, peguei a caneca de cerveja para molhar a garganta. Virei toda a bebida espumante da caneca de bronze. A cerveja desta taverna tinha uma amargura formigante que era uma paulada. Felizmente, não sou um daqueles que fica zonzo depois de uma ou duas canecas cheias, mas me certifico de comer enquanto bebo apenas por segurança. É por conta da taverna e, sejamos sinceros, um homem adulto e solteiro comendo em uma taverna só ter uma bebida é muito suspeito.
Ouvi com cuidado o que acontecia enquanto eu comia e bebia. Agora era a hora do almoço, então a taverna estava movimentada com o número normal de clientes. Quanto mais houvesse, mais barulhento e vívido seria o ambiente, e mais as pessoas entravam em um estado de falsa segurança. Eles deixavam pequenas verdades escaparem, as quais jamais diriam em um local silencioso. E os rumores tinham uma forma de chegar às aldeias rurais.
— A Ponte de Atbridge foi destruída de novo.
— De novo? Deve ser por causa das chuvas que estão caindo sem parar.
— As chances de ser consertada logo são muito baixas.
— Então ficaremos sem ponte agora?
A ajuda, assistência e permissão de um governante são necessidades indispensáveis quando se trata do conserto de grandes pontes. Nenhuma delas foi garantida, então a mesma permaneceria sem conserto, não importa quanto tempo passe.
— Não posso rir disso.
— Devo concordar com isso.
Devo concordar com eles.
Quando comi aqui pela primeira vez, a maioria dos clientes não tinha medo do Lorde Ardiloso. Alguns deles até mesmo lhe receberam de bom grado, já que havia subido ao poder ao ignorar completamente os sistemas e instituições que nosso Rei tinha posto em prática. Ele deixou aqueles que o obedeciam em paz e puniu o resto. Ofendeu os nobres, oficiais governamentais, cavaleiros e soldados em um ritmo louco, mas não colocou as suas mãos diretamente sobre os civis. Pelo menos ainda não…
Todos que eram leais ao Rei foram massacrados de forma indiscriminada, ou fugiram e estavam espalhados pelo Reino neste exato momento. Não era garantido que alguém sobreviveu.
As coisas ficaram mais suspeitas após não um nem dois, mas três meses depois da troca de governantes. A primeira grande ação do Lorde Ardiloso como novo governante foi uma renovação em massa do castelo. Então, veio um aumento de soldados no seu exército pessoal. Afinal de contas, ele não poderia confiar nos soldados do Rei ou em nenhum dos cavaleiros que eram leais ao Rei. Rapidamente livrando o castelo deles, ele preencheu os buracos com homens que contratara com dinheiro.
Mesmo assim, as economias do castelo eram finitas. Lorde Siegfried estava jogando o fraco aos lobos para balancear suas contas. Chamas consumiam cidades, secas acabavam com poços, rios subiam e arrastavam pontes, doenças infecciosas varriam grandes populações. Mas isso não importava para ele — o Lorde Ardiloso optou por ignorar as angústias do povo.
De todos que ouvi, ele dava a mesma resposta, sem falha, para qualquer súplica que não lhe agradava:
“Lidaremos com isso de forma apropriada em um futuro próximo.”
Este futuro próximo jamais virá. O mais assustador era que muitas mãos apoiaram sua política. Principalmente as mãos dos fortes, dos jovens e dos ricos. Bem típico.
— Yahooo! Agora os destroços da sociedade estarão fora de cena!
— Cidadãos de segunda classe são melhores mortos.
— Se tivermos dinheiro para manipulá-los, podemos conseguir lucrar um pouco mais também.
Comece a interromper e moldar o fundo da pirâmide e você acabará lá em seguida. Pode não ser hoje nem amanhã, mas, algum dia, sua vez chegará. Antes de você perceber, cairá em desgraça, acabando no fundo do poço. Na hora que perceber que sua cabeça é a próxima na tábua de cortes, será tarde demais.
“Não era para ter acabado desta forma!”
Você estará correndo por aí como galinhas sem cabeça até que levem o golpe final e, boom, acabou para você. Mas ninguém acredita que isso acontecerá algum dia.
Para piorar a situação, o Lorde Siegfried está mostrando às pessoas como tomar vantagem umas das outras. Quer algo? Saqueie, mesmo que seja necessário matar. Ele tornou-se um modelo, fazer publicidade de forma errada é o caminho certo de se fazer as coisas. Ele está, oficialmente, dando permissão para que a escória fique solta com sua política de tomar “a ação apropriada no futuro”.
Mas essa é a maneira típica de um usurpador. O pior de tudo vem depois.
Depois de deixar o inferno correr a solto, o Lorde Ardiloso simplesmente virou as costas para o caos. Nem sequer tentou demonstrar seu poder para manter as coisas sob controle, pois só se importava com sua própria ganância. Continuou em frente sem olhar para trás. Sendo sincero, estava fazendo algo diferente dos outros que usaram o mesmo manto que ele.
“Farei da Princesa Lala Lilia minha esposa!”
Agora ele fica gritando isso pela cidade sem dar a mínima para o que as outras pessoas pensam. Um homem de quarenta anos, o qual já possui uma filha, está anunciando abertamente seu desejo de se casar com uma jovem garotinha de sete. Para ele, isto é uma obrigação! Bem, se estes rumores sobre seus desejos chegaram a cidades rurais no meio do nada como essa, então todo o Reino já deve saber.
Mesmo assim, o Lorde Ardiloso Siegfried é o atual governante do Reino. Ele está no topo e comanda todo o dinheiro e poder. Portanto, ninguém o desafia ou o critica. Ninguém pode pará-lo.
“Farei da Princesa Lala Lilia minha esposa!”
O caos caiu sobre o Reino como resultado. Criminosos corriam desenfreados por todo o lado, pilhando e saqueando em plena luz do dia. Destruindo paredes e entrando em lares, indo às ruas para cercar qualquer transeunte aleatório e espancando-o até ficar inconsciente. E o controle sobre a ordem pública seguiu em mão única à leniência. Além disso, o exército pessoal do Lorde Siegfried tomou o livre arbítrio e pegava qualquer coisa que quisesse. Muitos homens ficavam felizes em se juntarem à pilhagem.
Este reino já estava em trapos e cheio de buracos de vermes. As paredes que o último Rei deixou estavam à beira da destruição. Quando um desastre de alta escala aparecesse… As bases de seu Reino instável cederiam, como uma casa construída sobre a areia ou cinzas.
Ouça, sou um homem ignorante quando se trata de governar, mas até mesmo eu entendo o que está acontecendo.
O Lorde Ardiloso Siegfried quer apenas o título de Rei. Ele não se importa com governar o Reino, de forma alguma. Acabará por devorar esta nação até que a mesma caia em ruínas ao seu redor. E, então, se moverá em direção à sua próxima presa, como o parasita que é.
Da mesma forma que usou esposas para subir a escada do status social.
“Chega desses pensamentos ruins… Isso está estragando o sabor de minha comida. Nossa última esperança é proteger a Princesa até o fim.”
— Obrigado pela refeição, estava deliciosa.
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PEGAR os caminhos secundários era a rota mais curta até o ferreiro. Embora nos referíssemos a eles como caminhos secundários, se considerasse quando foram criados, veríamos que eram as ruas principais antigamente. Como a população da aldeia aumentou, construíram ruas mais largas. Por este motivo, esta rua seguia para onde as pessoas viviam. Água parada, solo erodido, grama embolorada, árvores secas, metal enferrujado, roupas meio úmidas. Seja um castelo ou uma cidade, ou uma aldeia; onde quer que as pessoas vivam, este tipo de cheiro está presente. Há uma diferença no quão perceptível é, mas o cheiro de habitação nunca vai embora, nunca mesmo.
O som é outra coisa que pode ser percebida. Você vai ouvir muito mais vozes nas ruas secundárias do que na rua principal.
— Oficial, por favor, poupe-me com esta quantia.
A voz me assustou — era uma brincadeira de criança. Fora a garotada que brincava atrás da loja do ferreiro, havia dois garotos que chamaram minha atenção. Um deles segurava uma bolsa encardida, enquanto o outro pegava um pote na varanda, o qual usou para colocar certa medida de areia no saco.
— Não, não, ainda não é o suficiente. Isso não chega nem na metade do que me deves.
— Perdoe-me, mas você está cobrando o dobro do mês passado, meu lorde.
— Este é o valor do mês inicial. Foi o que os homens no comando decidiram. Continue, então, encha. Coloque tudo. Caso contrário, vou te colocar uma corda no pescoço e te deixar pendurado!
Os dois começaram a rir. Deixaram a bolsa, o pote e a areia de lado e começaram a correr um atrás do outro no quintal. Brincadeiras de crianças são como um espelho mágico: refletem a realidade cruel deste mundo.
Esperei que passassem correndo por mim antes de entrar na loja do ferreiro.
Posso fazer o eixo de uma flecha. Posso confeccioná-la. Porém, a ponta da flecha é algo que não consigo fazer sozinho. E não há nada de suspeito em um caçador comprando flechas.
Comprei apenas o que precisava e agradeci ao ferreiro quando parti. Ele estava lucrando. Isso mostrava o quão grande era o aumento no número de pessoas querendo uma arma.
Uma mulher passou ao lado da loja quando saí. Ela ainda era jovem. Usava o capuz de seu manto para tapar o rosto, mas não escondia suas curvas sedutoras. Seus peitos perfeitamente flexíveis e volumosos estavam bem apertados pelo seu espartilho, mas, mesmo assim, balançavam. Era um banquete para os olhos. Sua intenção de cobrir-se teve o efeito oposto, fazendo com que se destacasse ainda mais por causa do pano.
E ficou claro que ela não estava acostumada com as ruas por ali. Seus olhos encaravam os arredores de forma inquieta, mas logo que passou por mim, virou-se. Será que não sabia para onde ir?
“Ela está pedindo por problemas desta forma.”
— Ah!
Justo quando este pensamento passou pela minha mente, ela chocou-se com um homem que andava arrogantemente no meio da rua estreita como se fosse o dono do lugar. Embora lhes faltassem uniformidade nas roupas que usavam, cada um desses picaretas possuía armaduras e armas caras. Ele era do exército pessoal do Lorde Ardiloso.
— EI!!
Tinidos. Metal chocou-se com metal. Os sons agudos atravessaram o ar opressivo e atingiram meus ouvidos. Soou diferente das batidas regulares do ferreiro batendo metal contra metal.
— O que tá fazendo, tá andando por aí com a cabeça nas nuvens, senhorita?!
Ah, qual é, há um limite para até onde você pode usar falsas acusações. Não importa como olhe, era óbvio que foi ele quem trombou nela!
— Sinto muito mesmo. Foi um descuido meu.
— Descuido? Acha que vou perdoar isso, hein? Se vai se desculpar, mostre sinceridade!
Nenhum de seus amigos soldados o parou. Pior ainda, formaram um círculo ao redor da moça. As coisas estavam começando a ficar complicadas.
“Problema atrai mais problema. Não se envolva. Não meta a colher. Não aja. Esqueça sua coragem cavalheiresca e sentimentos nobres, Gideon!”
Sei o que preciso fazer, mas meus pés não se movem. Não me virei e continuei meu caminho.
— Qual é, gente, não foi nada. — Um dos homens de barba, o qual parecia ser mais velho, resmungou de trás do grupo, mas foi ignorado. — Vamos deixar isso assim e ir beber! — tentou mais uma vez, mas um olhar do líder o silenciou.
O homem que começou a briga virou-se novamente para a mulher.
— Deixa eu te ensinar uma saída simples e fácil. Deixe tudo o que tem e siga teu rumo.
Eu nunca tinha visto um roubo tão corajoso e direto assim antes!
— Dinheiro… Está tudo bem se eu apenas pagá-lo com dinheiro?
— Tudo bem, mocinha. Obedeça e mostre tudo o que pode ser mostrado! — O homem, com grosseria, tentou agarrá-la.
— O que está fazendo?! — A mulher recuou, com medo. O impulso fez seu capuz cair.
— Opa, o que temos aqui? É uma mulher bem boa!
Ela era mesmo bonita. Cílios curvados sobre belos olhos em forma de amêndoa, cercados por um rosto muito atrativo. Um nariz reto destacava seus olhos âmbar e longo cabelo prateado. Sua pele morena e brilhante mostrava que devia ser de outro país. Um muito ao sul. Tudo isso era somado à beleza rara e extremamente exótica daquela moça.
— Quer saber, não preciso mais do dinheiro.
— Pois é. Não precisamos de dinheiro se tivermos isso. Moça, venha conosco um pouquinho.
— Me recuso — declarou ela, corajosamente.
— Temos dinheiro.
A mulher de cabelos prateados franziu o cenho, juntou as sobrancelhas e ergueu o queixo de forma desafiadora. Olhou para o homem com os olhos semicerrados e fechou firmemente seus lábios vermelhos. Sorrindo, disse:
— Infelizmente para vocês, não sou esse tipo de mulher.
A presa que, supostamente, haviam capturado, revidou com coragem.
— Sua puta!
Este era o momento em que qualquer pessoa com um senso decente de vergonha iria embora para que não se envergonhasse mais. Porém, estes homens ganharam armas e poder, além disso, não tinham esse tipo de mentalidade. Pelo contrário, tinham alguns parafusos soltos.
— Não se atreva a me fazer de bobo!
Um dos homens grunhiu. Seu rosto se contorceu e, com violência, ele agarrou-a pelo colarinho.
— Pare! O que está fazendo?! — Ela se contorceu com dor quando foi agarrada.
O manto dela escorregou. Ainda assim, o homem não ficou satisfeito. Ele rasgou à força o que mantinha seu vestido preso. Os fios romperam-se, expondo seu peito. Redondos e pesados, peitos negros e volumosos, maiores que a mão de um homem adulto, balançaram para fora de seu espartilho. Ela era uma mulher atraente, de beleza exótica e com um corpo incrível.
— NÃO! Me largue! — Seus gritos me atingiram. Ela estava aterrorizada.
Meu corpo moveu-se mais rápido que meu cérebro.
— Venha aqui. Vou te ensinar a ser mais respeitosa. Te ensinarei que mulheres existem só para obedecerem ao que os homens pedem!
— Isso aí, mostre a ela! Faça… AHH!
Passei uma rasteira em um dos homens que a cercavam. Quando caiu no chão, pisei sobre ele para chegar até o homem ao seu lado. Eram fracos. Deviam ter baixado a guarda, assumindo que ninguém ousaria cruzar seu caminho.
Agarrei o pulso do marginal, bem na articulação, e apertei com força o osso sob a pele.
— Deixe a dama em paz. Ela não está interessada — gritei. Tudo o que fiz foi afastá-lo, pelo menos por enquanto.
— Humph! Não se meta! Você não é um cavaleiro.
— Verdade, não passo de um caçador. Mas eu, pelo menos, sei a diferença entre o que você deve ou não fazer.
— Ou! Ou! Ou!
Cravei meus dedos e apertei. Sua pele dobrou-se e o osso estalou. O rosto do homem distorceu-se e seus olhos giraram para trás. Apertei ainda mais.
— AHH! Está me machucando! Isso dói!
— Solte a dama. Ou prefere dizer adeus ao seu pulso?
— Não! Qualquer coisa menos a minha mão boa!
Eu conseguia sentir o osso deslocando-se sob meus dedos. A dor devia ter o atingido agora, porque ele soltou a mão da moça. Sem demora, dobrei seu braço para trás das costas.
— URGH!
Não precisei de muito esforço. Dei um soco na parte de trás do joelho dele e pressionei o corpo caído no meio de onde seus companheiros estavam, estupefatos.
— Agora, cavalheiros — curvei-me como se fosse uma peça —, me dariam a honra desta dança?
— Desgraçado!
Irritei vocês, não é? Eu já imaginava.
Vários marginais estavam caídos naquela rua. Adicione o fato de que era o Dia de Feira, diante da loja do ferreiro, e você conseguiria contar todos os tipos de objetos jogados no chão. Não sei se este prático pedaço de madeira a meus pés é uma lasca que caiu de uma carruagem ou de um machado antes de ser entalhado, mas, de qualquer forma, meus olhos já estavam fixos nele antes de eu dar um passo à frente. Chutei aquilo para cima com a ponta de minha bota, agarrei e imediatamente o acertei nas costas da mão de um dos assassinos vestidos de soldado, o qual estava prestes a puxar sua espada, presa contra o corpo. Torci com força a ponta do pedaço de madeira sem aliviar a pressão.
— Espere um pouco. Será fim de jogo se você desembainhar essa coisa bonita que tem aí. — Enfiando a madeira ainda mais fundo, me aproximei dele. — Dê uma olhada. Você tem olhos, não tem? É um funcionário do governo. O que vai fazer? Desembainhar isso aqui e agora? Hein?
— Seu! Seu…
Oficiais, corruptos como são, não podiam ignorar uma disputa se uma arma fosse exposta diante deles no meio de uma aldeia que enfrentava altas taxas de impostos. Você só pode olhar para o outro lado por um tempo, e falhar em bater a meta de impostos é uma sentença de morte para um oficial. Não vamos esquecer que estamos em uma região afastada aqui. A corrupção não era tão profunda quanto no centro do reino.
— O oficial nesta aldeia é um tapado — continuei — Subornos dos seus belos lordes ainda não funcionam tão bem com ele… Entende onde quero chegar, né? Significa que é melhor você fazer as malas, porque eles vão te perseguir até fora da aldeia. Quer saber se há uma pilha de pedras agradável e confortável para você acampar longe daqui?
Seus aliados cambalearam até ficarem de pé. O homem que tentou usar a espada evitou seus olhos e recuou lentamente. Manejei minha espada — outrora conhecida como pedaço de madeira. O vitorioso foi decidido.
— É melhor você não esquecer disso.
— Tudo bem, mas só se eu tiver tempo livre.
Que frase clichê. Eles se viraram ao mesmo tempo e correram. Observei-os antes de abaixar a ponta do pedaço de madeira.
— Você está bem, senhorita?
— Obrigada. — A dama de cabelo prateado já havia colocado o manto. Parecia que eu não precisaria ser educado e desviar o olhar dela. — Você me salvou, moço.
— Não sou jovem o bastante para ser um moço.
— Tudo bem então, como posso chamá-lo nesse caso?
“É, hmm.”
— V.E.L.H.O.T.E.
A pele macia e quente apertou contra meu braço, pressionando contra o peito dela.
— Não quer se juntar a mim em uma bebida como agradecimento? É por minha conta. — Ela olhou para mim sob seu capuz com um sorriso muito encantador. Sua voz doce fez cócegas em meus ouvidos. Se eu fosse dez anos mais jovem, não teria aguentado. Talvez eu tivesse esperanças de ser sortudo o bastante para ganhar algo mais além de uma bebida…, mas as coisas eram diferentes agora.
— Tentador, um convite muito tentador, senhorita. Mas este velho está ocupado agora.
— Trabalho?
— Nop, crianças.
— Awn, você tem filhos. — O calor de seus peitos macios e balançantes sumiu na mesma hora. — Que pena. — Ela deu de ombros.
— Minhas mais sinceras desculpas, senhorita. Deixe-me pelo menos levá-la até a rua principal.
— Obrigada.
— Por aqui…
Ela andou ao meu lado. Por sorte, não se agarrou ao meu braço desta vez.
— Os caminhos aqui são bem complicados mesmo. É como um labirinto — reclamou.
— São bem úteis quando você se acostuma. Pode pegar vários atalhos.
— Não planejo ficar andando por aí para me acostumar.
No caminho até a rua principal, uma música familiar me parou.
“Uma colherada de doce, doce leite todos os dias para os pequeninos se banquetearem~♪”
Seis meninas estavam em círculo, jogando bola. Elas jogavam uma que era maior que suas mãos ao ritmo da música.
“Redondinhos, redondinhos, fofos e rechonchudos Brownies~♪. Pequeninos, espíritos protetores de seu lar doce lar… ♪”
Parece que elas tinham um padrão para jogar a bola. Às vezes deixavam quicar uma vez no chão. Ou uma delas jogava para cima, aplaudia e pegava novamente. Eram regras não faladas que pareciam coordenar os movimentos. E, pelo fato de estarem acompanhando uma música, o momento certo e a velocidade também eram coordenados. Parecia muito difícil, mas divertido.
“Mas, mas, tenha cuidado. Se esquecer do leite…♪”
O que acontece se esquecer do leite?
Esforcei-me para ouvir a próxima frase quando uma voz fraca gritou:
— Oh, não!
E a bola rolou até meus pés. Parece que a garota não conseguiu pegá-la. Curvei-me e ergui a bola. Era mais leve do que eu esperava. A parte externa parecia ser feita de pele de cordeiro ou cabra. As costuras eram minúsculas por toda a superfície e havia sinais de ter sido remendada.
— Aqui, pegue!
Joguei-a gentilmente de volta com uma mão.
— Obrigada, Senhor Caçador! — Uma garota, com seu cabelo preto amarrado em tranças, as quais eram presas por laços verdes, pegou a bola. Devia ser a filha do estalajadeiro. Ela rapidamente se curvou e voltou ao círculo.
“Uma colherada de doce, doce leite todos os dias para os pequeninos se banquetearem~♪”
Começaram a música mais uma vez. Devia ser algum tipo de regra. Eu não pretendia ouvir o resto.
“Redondinhos, redondinhos, fofos e rechonchudos Brownies~♪”
Seis vozes cantavam ao mesmo tempo. A Princesa cantava a mesma música sozinha.
— Talvez ela se sinta solitária.
— Sua filha?
— Não, minha sobrinha. Adotei-a porque minha irmã mais nova e seu marido faleceram devido a uma doença infecciosa.
— Ah, que droga. Deve ter sido difícil.
— Pois é. Ainda não me acostumei com crianças. — Dei de ombros e segui em frente.
— Está pensando em comprar uma bola de presente para ela?
Isso me chocou. A dama de cabelo prateado olhava para mim, os cantos de seus lábios carnudos e exuberantes se curvaram. Ela leu minha mente e conseguiu supor a ideia que tive há pouco.
— Eu não faria isso se fosse você. Este não é um jogo que você pode jogar sozinho.
E, então, ela rapidamente me advertiu. Eu era tão óbvio assim, hein?
— O máximo que ela vai poder fazer é jogar para cima e pegar quando cair.
— Sério? Acho que você tem razão. — Este tipo de jogo era impossível para um dragão e eu. Nossos físicos eram muito diferentes, especialmente o do dragão. — Talvez eu possa cantar com ela.
— Você sabe cantar?
Trocamos olhares por um bom tempo.
— Talvez?
Ela deu de ombros.
— Acho que seria bom se você conseguisse.
Ela bufou.
— Boa sorte.
A luz do sol brilhava na direção em que estávamos indo. Eu conseguia ouvir o clamor de pessoas e o estalar de rodas de carruagens indo e vindo de seus destinos. A rua principal estava próxima.
— Obrigada. Vejo você qualquer hora dessas, Velhote. — Um dedo esbelto e negro deslizou pela minha bochecha. Uma sensação quente e macia permaneceu em meu rosto quando ele se afastou.
— Hã? — Fiquei completamente congelado por um segundo. A dama colocou com suavidade o capuz sobre a cabeça e partiu.
Enquanto isso, fiquei parado no meio da rua, com uma mão na bochecha, parecendo um idiota. Só depois que ela partiu que eu percebi que minha bochecha havia sido acariciada.
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SUAS palavras não me deixaram, mesmo depois de eu ter voltado à floresta.
“Eu não faria isso se fosse você. Este não é um jogo que você pode jogar sozinho.”
Pois é, não dá.
A Princesa estava sozinha. Ela só tinha a mim e ao dragão. Ambos eram velhotes. Quanto aos outros com quem conversava, tinha uma cabra, um cavalo e galinhas. Além deles, tinha só os Pequeninos. Já que as outras crianças estavam cantando sobre eles, ficava claro que não vinham apenas da imaginação da Princesa. Isso pelo menos aliviou um pouco as minhas preocupações.
Por quanto tempo deveríamos manter este estilo de vida? Por quanto tempo deveríamos ficar escondidos nesta floresta? Quando será a hora certa que a Dama do Alvorecer falou? Hoje? Amanhã? Daqui a dez anos? A Princesa será forçada a cantar sozinha até lá? Isso é muito triste.
“Consigo cantar? Eu?”
O dragão até podia. Por mais incrível que pareça, ele tem uma voz boa… Para um lagarto. Mesmo sendo um lagarto que cospe fogo.
Algo roncava na direção em que eu me dirigia no matagal. Levantei a cabeça e vi aquilo.
— GI! DE! ON! — A Princesa veio correndo com toda a velocidade ao longo de um dos grandes galhos horizontais da Árvore Milenar.
Droga! Não estou bem posicionado! Ela está vindo nesta direção!
Apressei-me para largar as sacolas e firmei meus pés. Foi por pouco. A Princesa saltou do galho com seus pequenos pés em minha direção.
— Yahooo!
O cabelo ruivo flutuou, arrastando-se atrás dela com seu grito de alegria enquanto vinha voando. Abri bem meus braços e a segurei.
Minhas costas estalaram. O peso e o impulso da Princesa fizeram minha espinha aguentar todo o impacto. Mas não a soltei. Quem teria coragem de fazer isso? Jamais o faria. A Princesa riu alto em meus braços. Sardas se destacavam bem em suas bochechas cor de rosa.
— Bem-vindo de volta!
— Estou de volta, Princesa.
Neste meio tempo, minha principal preocupação era quanto tempo meu corpo aguentaria. Primeiro, quanto tempo minhas pernas aguentariam.
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— OBRIGADA pela comida! Minha nossa, que delícia!
— Fico feliz que tenha gostado.
Ela pulava sem parar, formava punhos com as mãos, se agachava e saltava. O laço verde-claro amarrado em seu cabelo flutuava atrás dela como uma borboleta.
As reações da Princesa quando comia eram honestas demais. E, como posso dizer? Ela tinha um apetite grande. Na primeira vez que viemos à floresta, havia devorado amoras silvestres em um dia frio e chuvoso. Felizmente, a refeição desta noite era uma sopa quente e pão torrado com queijo. O caldo da sopa era feito com carne de coelho, leite de cabra, nozes e nabos. Tentei recriar o sabor que experimentei na estalagem com os ingredientes que tínhamos em casa. Meu experimento foi um sucesso. A Princesa limpou a tigela, esfregando o pão ao longo da borda para terminar com o resto.
— Agora vai ficar mais fácil lavar essa tigela.
— A sua também, Gideon.
Tínhamos duas tigelas e colheres feitas de madeira polida. A Princesa ficou perplexa na primeira vez que teve que usá-las no ano passado. Não a culpo. Até então, havia comido em pratos de porcelana e talheres de prata. Mas agora já estava completamente acostumada.
— Eu gosto de colheres de madeira. Elas são macias dentro da boca.
— Entendo, entendo… É bom ouvir isso.
Ela tirou o prato que usou da mesa; já havia se acostumado a essa rotina.
— Limpe a mesa.
— Deixa comigo.
Ela molhou o pano de prato com água, torceu-o e passou sobre a mesa. Pelo que me disse, aprendeu tudo, de como tirar as coisas até como limpá-las, apenas ao me observar. Depois de ver mais algumas vezes, ofereceu-se para ajudar: “Também farei isso”, ela se voluntariou. Foi estranho no começo, mas as coisas ficavam melhores mesmo quando uma criança começava a ajudar.
— Ei, Princesa, quer um chá pós-refeição? Um de menta e camomila…
Não ouvi resposta alguma. Olhei sobre meu ombro. Cara, ela caiu no sono sobre a mesa. Sua mãozinha ainda segurava o pano.
— Crianças conseguem mesmo cair no sono em qualquer lugar…
Ela saltava e pulava de um lado para o outro, então era compreensível cair no sono desta forma. Peguei-a e subi as escadas até o segundo andar, levando-a até seu quarto.
Não eram boas maneiras, mas abri a porta com o pé e empurrei com o ombro. As coroas que teceu com bolotas, galhos, ervas, flores e heras farfalharam e sibilaram quando a porta foi aberta. Ela realmente sofreu para conseguir fazer uma pequenininha, mas suas habilidades aumentavam à medida que as fazia. Agora, fico maravilhado com as cores e tamanhos.
A maior surpresa de todas, no entanto, foi saber que o dragão lhe ensinou isso.
“Qual o tamanho do conhecimento daquele lagarto?”
Puxei as cobertas jogadas e coloquei-a deitada na cama. Removi seus sapatos e a cobri.
— Boa noite, Princesa.
Hora de trancar a porta. Melhor fechar a pocilga também.
O vento estava úmido e o ar, pesado. Não demoraria para chover esta noite.
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TROVÕES ribombavam. Os barulhos altos faziam as persianas tremerem. A Princesa Lala Lilia acordou repentinamente e se encolheu, abraçando o travesseiro na cama. Ela não conseguia se lembrar quando caíra no sono ou quando foi posta na cama.
As folhas e galhos da Árvore Milenar dobravam e emitiam sons com o vento, mas o tronco não dobrava nem um pouco. O lar que a protegia era forte.
“Está tudo bem. Sem problema. Aqui é seguro. Eu sei. Eu sei, mas…”
Luzes brancas piscavam pelas frestas da persiana.
— Ah! — Ela agarrou o travesseiro sobre a cabeça e enfiou o rosto na cama. — Um, dois, três, quat…
BANG!
Saltou da cama, balançando os pés no chão. Descalça, fugiu de seu quarto, abraçando o travesseiro e descendo as escadas com cuidado.
“Não faça barulho. Não faça barulho agora!”
Luzes piscaram do lado de fora da janela mais uma vez.
— Ahhhh! — Correu o mais rápido que suas perninhas conseguiam escada abaixo. — Senhor Dragão! Senhor Dragão!
Foi até o porão onde o dragão dormia.
— Olá, Princesa. — O dragão esperava por ela. Seus olhos cor de mel, sua voz agradavelmente profunda e ressoante, e sua respiração aconchegante a envolveram. — Qual seria o problema?
— Trovões… São assustadores. Posso dormir com você?
— Mas é claro. Venha aqui, pequena.
O dragão acenou para ela com sua perna dianteira, suas asas se abriram. A Princesa pulou nele, abraçou seu grande corpo e agarrou-se ao seu estômago.
— Tão quentinhoooo. — Enfiou-se debaixo de suas asas gentis e fechou os olhos. — Eu te amo.
— Também te amo.
— Eu te amo…
Ela repetiu “Eu te amo” várias vezes enquanto as palavras se transformavam em respirações pacíficas de sono profundo.
— Ela caiu no sono? — O Cavaleiro perguntou logo depois, escondido na sombra de um pilar de suporte.
— Sim. Ela não está com frio. Não precisa se preocupar mais.
— Tudo bem então. — Ele subiu as escadas. Sabia que este era o trabalho do dragão, afinal de contas.
— Boa noite, Princesa.
Tradução: Taiyo
Revisão: Taipan
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