Vários caixões de madeira estavam alinhados na câmara funerária. O teto tinha formato de arco estável, e padrões que lembravam um fluxo de água estavam desenhados nas paredes em vermelho vivo. A câmara se estendia um pouco para trás, mas não poderia realmente ser chamada de espaçosa.
— Não posso proteger nós dois — gritei para Al enquanto dava um passo à frente. — Corra o mais rápido que puder. — Estabilizei minha respiração, concentrei-me na circulação de mana…
— Opa. Calma aí, guerreiro da chama. Você também, anão.
Eu podia sentir seu sorriso de satisfação.
— Se você pretende lutar comigo, pode ter a vitória agora mesmo. Hoje não sou um Eco, como pode ver.
Assim que ele disse isso, notei que sua presença não estava tão concentrada quanto antes, nem tão avassaladora. A força era incomparável com a de um demônio ou besta comum, mas, inversamente, isso era tudo. Não era a aura daquele ser irracionalmente absoluto.
Apontei a lâmina luminescente de Lua Pálida para o fundo da câmara. Havia um altar onde ossos de animais haviam sido colocados. Provavelmente era um totem para espíritos ancestrais. Sentado sobre o altar estava um corvo de penas pretas brilhantes e olhos vermelhos que pareciam de alguma forma sinistros.
— Um Arauto.
Arautos comunicavam a vontade dos deuses e estavam um passo abaixo dos Ecos mais poderosos.
— Muito perspicaz.
A sensação de que ele estava sorrindo ficou ainda mais forte.
— Ah, e você pode ficar tranquilo. Não coloquei uma única mão nos mortos desta câmara funerária. Suas almas já retornaram ao grande ciclo, e uma tropa improvisada não teria chance contra você de qualquer forma.
Os olhos do corvo cerraram.
— Sim, graças à surra que você me deu, não poderei manifestar um Eco nesta terra por um tempo, não importa o que eu faça.
Al pareceu ter ficado atônito e silente.
Por um tempo, huh? Quanto tempo era “um tempo” em termos de deuses, essa era a questão. Seriam alguns anos? Algumas décadas?
— E assim, como pode ver, enviei um Arauto e…
— Decidiu ir pescar?
— Muito perspicaz mais uma vez. Minha nossa, você está mais afiado do que nunca.
Tive a sensação de que, por algum motivo, ele estava ficando mais alegre a cada vez que falava.
— Você é desagradável.
— Ah, tenho certeza de que pescar é sempre um negócio muito desagradável para os peixes. Essa é a natureza de um deus. Não podemos ser medidos pelos padrões humanos.
A aura profana que o caçador havia sentido aqui no Monte dos Pilares deve ter sido obra do corvo diante de mim, o Arauto do deus da morte. Ele sabia que, se estendesse um anzol nesta região com um avistamento de morto-vivo atrelado a ele, eu teria uma grande probabilidade de morder a isca. Se ele não me pegasse na primeira vez, poderia simplesmente mudar de localização e tentar novamente. Era uma abordagem muito paciente e divina. Só que…
— Não parece que você está atrás de vingança pela última vez.
— Sim. Em primeiro lugar, devo-lhe um pedido de desculpas.
O quê?
— Meu Eco anterior exibiu um comportamento vergonhoso em seus momentos finais. Sinto-me profundamente envergonhado. Não há desculpas para isso.
O corvo parecia completamente sério.
— Um Eco é uma tentativa de projetar o poder e a mente de nós, deuses, na natureza de uma pessoa ou fada. Alguma distorção é necessária. Ecos recém-nascidos tendem, em graus variados, a ser infantis, emocionais e precipitados. Claro, isso não o torna aceitável.
Fiquei de boca aberta. Nunca pensei que ouviria palavras de desculpas de uma divindade, de um deus verdadeiro, inconfundivelmente real.
A boca de Al estava se mexendo. A aura desse ser por si só era suficiente para fazer qualquer um sentir certeza de que ele era um Arauto dos deuses. Não era de admirar que Al estivesse tão confuso ao vê-lo falando comigo de uma maneira tão amigável.
— Ah, anão. Este ‘guerreiro da chama’ e eu já cruzamos as lâminas uma vez. Embora eu já estivesse bastante desgastado por seu mentor naquele ponto, devo dizer, ele era um adversário formidável. Quanto tempo passou desde que um Eco meu foi destruído por um humano puro? Sem mencionar que ele parece ter se tornado ainda mais forte desde então. Pode até mesmo estar no mesmo nível dos heróis da lenda se continuar a…
— Stagnate. — Eu o interrompi, usando um tom deliberadamente ameaçador. Não parecia que ele iria lutar ativamente contra mim, mas o que estava diante dos meus olhos ainda era um Arauto de um deus maligno com ideias perigosas. Não tinha ideia do que ele estava planejando. — Não tenho intenção de me envolver em uma conversa com você. O que você quer?
— Que antipático. O que há de errado em me dar a oportunidade de conversar um pouco? Nosso relacionamento ficou tão frio?
— Que tipo de relacionamento você acha que temos?
— Vamos lá, não me diga que se esqueceu daquela noite apaixonada que passamos juntos? Nós dois passamos um pouco de tempo recebendo carinho.
— Eu não sabia que os deuses gostavam de piadas.
O corvo estalou o bico em representação a uma risada.
— Então, hoje eu vim com um tópico de interesse para o grande e forte guerreiro que me fez morrer um pouco.
— Tenho permissão para quebrar seu pescoço?
— Por favor, não. Que pensamento horrível.
Enquanto trocava palavras casualmente com ele, tive uma sensação interna de desconforto. Agora que estava tentando ter uma conversa adequada com o deus da morte, pude entender ainda mais profundamente o quão formidável ele era. Em termos de simples força também, é claro, mas ainda mais em termos de seus outros aspectos.
Esse deus realmente sabia falar. Você poderia trocar piadas e sarcasmos com ele. Se você lhe contasse seus problemas, ele certamente ouviria atentamente. Até poderia simpatizar. Tentaria trabalhar junto com você para encontrar uma solução ou orientá-lo na direção certa com seus poderes divinos. E seria sincero o tempo todo.
Sim, por mais assustador que fosse, era sincero. Isso era o que fazia de Stagnate um deus extremamente perigoso. Muito provavelmente, aqueles que acabassem sendo levados por seus encantos se tornariam voluntariamente mortos-vivos, de forma espontânea se reuniriam sob sua bandeira e por escolha própria permaneceriam leais a ele. Gracefeel, que era o deus que eu adorava, tocou sinos de alarme dentro da minha mente desde o início da conversa, pedindo desesperadamente que não baixasse a minha guarda perto dele.
— Sua conversa superficial não funcionará comigo. O que você quer?
— Ah, sim.
O corvo bateu as asas uma vez, como se estivesse arrumando sua aparência, e me encarou formalmente.
— Campeão que me derrotou, paladino da chama…
Sua voz e gestos oraculares eram apropriados para alguém que se proclamava um deus.
— Aceite minha revelação.
No momento em que disse isso, uma imagem poderosa foi introduzida em minha mente.
Quando dei por mim, estava no escuro, nas entranhas da Terra. A escuridão terrivelmente espessa corrompeu até mesmo meu senso de distância. Havia apenas uma coisa que eu podia ver em suas profundezas: um único olho dourado. Uma pupila longa e fina se estendia verticalmente pelo olho, como se tivesse sido ligeiramente rasgado. O corpo enorme se mexeu, e o som de suas escamas raspando ecoava em meus ouvidos. Estava olhando para ele. Não conseguia me mover. Sabia que tinha de lutar, mas meu corpo não se mexia. Por quê? Por quê?
Pensei sobre isso e percebi. Não era de se admirar que eu não conseguisse me mover. Como poderia me mover quando meus braços e pernas haviam sido arrancados?
Os rostos de Maria, Sanguinário e Gus passaram pela minha mente. Pensei em um pedido de desculpas a eles. Eles haviam me criado para nada.
Foi então que ele estalou suas presas em mim repetidamente, como se estivesse ridicularizando seu desafiante imprudente e idiota. Então houve luz. O hálito tóxico e ardente armazenado em seu ventre, uma massa de calor incandescente, viajou do ventre até a garganta e, no instante em que iluminou o terrível rosto do dragão de um olho só, minha consciência se extinguiu.
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Eu comecei. Minha mente retornou à realidade das imagens que haviam sido gravadas nela.
Minha respiração estava irregular. Eu só havia perdido a consciência por um instante, mas a experiência tinha sido poderosa. O que vi, tinha certeza, era minha própria morte, como um futuro possível.
— William, você desafiará o dragão e morrerá derrotado, pois seu propósito não foi cumprido.
Suas palavras proféticas tinham um toque de verdade nelas. Stagnate governava a imortalidade, e provavelmente era possível para ele ler esse futuro também.
— Se quiser se poupar de uma morte sem sentido, não lute contra a Foice dos Deuses, o dragão repugnante, Valacirca.
Seus olhos vermelhos me prenderam no lugar.
— Se não pode confiar em mim, sugiro que peça a opinião de Gracefeel. Pergunte se, com seu poder e a proteção dela, você pode vencer o dragão como está agora. Você receberá a mesma resposta.
A visão de um corvo negro falando uma língua humana era estranha e só tornava suas palavras ainda mais poderosas.
— Porque você está me contando isso?
— Porque você demonstrou que tem o que é preciso para ser um herói.
A resposta do corvo foi sem hesitação.
— Eu adoro humanos. Heróis em particular, como seus professores. Um herói superando o impossível e acabando com a injustiça com o brilho de sua alma é uma visão que considero bela do fundo do meu coração. Eu até acredito que eles sejam a personificação física das possibilidades dos seres humanos, não, de todos os seres.
Eu o deixei continuar.
— É por isso que quero preservar essa visão em uma forma eterna. É insuportável ver almas assim sendo arrastadas de seu potencial por tolos comuns e reduzidas a nada, seu brilho entorpecido pelo sofrimento e arrependimento. É a mesma coisa imaginar você morto por um tolo mundano como Valacirca. A ideia me dá nojo
— Mundano?
— Hm. Então sua pesquisa ainda não revelou isso. Sim, mundano. Valacirca é um dragão repugnante e materialista.
Stagnate cuspiu essas palavras e então começou a falar mais eloquentemente sobre ele.
— O nome de Valacirca como a ‘Foice dos Deuses’ se origina do tempo das grandes guerras entre os deuses do bem e do mal. Na época, eu estava no que você poderia chamar de lado do bem. E Valacirca também estava lá – um dragão com um corpo enorme, escamas vermelho-escuras e hálito ardente e nocivo. Ele era um dos dragões mais fortes e ferozes a serviço dos Seis Grandes.
Ele me disse que Valacirca era um dragão poderoso e cruel que declarou abertamente que as únicas razões pelas quais servia às forças do bem eram que os dragões e gigantes que se opunham a ele eram poderosos e receberia uma boa recompensa.
— Estou surpreso que os deuses do bem tenham sentido vontade de empregá-lo.
— Se tivessem feito o contrário, ele teria se tornado inimigo deles. Até mesmo aquele grupo de boa índole é capaz de calcular o que é de seu próprio interesse.
Ele tinha razão. Era tempo de guerra. Não recusariam a ajuda de combatentes contratados por causa de um pouco de falta de educação.
— Ele estava obcecado por três coisas: batalha, vitória e tesouro. Ele ganhava, roubava e ficava muito satisfeito consigo mesmo. Uma natureza simples e animalesca, você não concorda? E, por causa disso, os Seis Grandes foram muito mais cautelosos ao lidar com ele.
Ele era inserido nos pontos mais críticos e vencia. O dragão sem nome começou a ser chamado de Valacirca, a Foice dos Deuses.
— Em um determinado momento durante essas guerras, dei as costas às forças do bem. Evitarei entrar em detalhes sobre o que ocorreu depois disso, mas, no final, houve uma batalha final em que os lados do bem e do mal se enfrentaram igualmente e quase se destruíram. Os deuses e os dragões foram todos gravemente feridos, e muitos partiram para um mundo distante. Daquele momento em diante, os deuses ficaram limitados em sua capacidade de interferir diretamente no mundo.
Essa era uma parte da mitologia que foi transmitida neste mundo. Como os deuses interferiam no mundo de maneira prática, a menos que algum deus espalhasse deliberadamente uma história falsa, o esboço geral seria transmitido com precisão.
— Valacirca sobreviveu com sucesso e inteligência a essa última guerra total e foi dormir.
Para se preparar para a próxima guerra e pilhagem.
— O dragão sempre dormia por muito tempo. Toda vez que acordava, participava de uma guerra. Se não houvesse guerra, ele mesmo atiçava as chamas. Ele não tomava partido, mas emprestava sua força a todos os envolvidos. E toda vez que fazia isso, os planos dos deuses eram interrompidos. Até onde sei, a última guerra da qual participou foi o pandemônio iniciado por aqueles demônios do inferno.
Está se referindo ao Grande Colapso e o fim da Era da União.
— Ele encontrou o Rei Supremo e lhe emprestou seu poder. Sua habitual astúcia e materialismo, tenho certeza. Espadas à parte, o Rei Supremo não era muito apegado a tesouros, como você pode imaginar. E Valacirca devastou o País do Ferro, sofreu um grave ferimento de batalha e dormiu para permitir que se curasse. Removido da maré de batalha, mais uma vez ele habilmente se retirou…
— E-Espere! — Al, que estava rígido de medo até agora, de repente levantou a voz assustado.
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— Ferimento de batalha? Você disse que ele sofreu um grave ferimento de batalha? Meus ancestrais…
— Hmm, o que é isso? Você é descendente dos anões da montanha?
— S-sim.
Depois de ouvir essa resposta, o corvo riu. Era uma risada alegre.
— Minha nossa, a mão do Destino em ação! Muito bem, então. Anão conectado às Montanhas Ferrugem! Eu, Stagnate, deus da morte, revelarei a você a verdade: o Lorde das Montanhas Ferrugem, Aurvangr, foi um verdadeiro herói!
Era uma voz inocente, como a de uma criança mostrando um tesouro a um amigo.
— Ouça isso! E tenha orgulho! Calldawn, aquela espada lendária de muitas gerações, roubou um olho do dragão imundo que viveu desde a época dos deuses!
Enquanto o deus falava dos ancestrais de Al com o maior orgulho, a mão trêmula de Al se fechou em um punho.
— E-Essa é a verdade?
— Certamente é. Eu reconheço aqui: seu heroísmo foi espetacular e extremamente satisfatório!
A voz de Al se engasgou de emoção.
— O-Obrigado… Obrigado…
O corvo, o arauto do deus da morte, olhou para Al com carinho. Só por essa cena, teria sido difícil pensar nele como um deus maligno, mas também era fato que se tratava de um deus cuja simpatia o levava a produzir um grande número de mortos-vivos, corrompendo as leis da vida e da morte e, a cada vez, provocando um desastre.
— William, guerreiro da chama, um dia você poderá superar até mesmo as gloriosas realizações de Aurvangr e cortar a cabeça de Valacirca. Mas agora não é a hora. Evite a batalha. Aguarde seu tempo e treine.
Suas palavras pareciam ser de genuína preocupação comigo.
— Mesmo que haja vítimas, por mais difícil que seja para você aceitar.
Eu hesitei em como responder. No momento seguinte, senti uma sensação de rastejamento subir pela minha espinha.
— Ouça, o dragão está dormindo levemente agora.
Um estrondo subterrâneo ecoou pela câmara funerária.
rrrrrRRRRR…
O chão tremeu. Eu podia ouvir um rugido que parecia ecoar das profundezas da terra.
rrrrrrrrRRRRRR…
Era um som aterrorizante que parecia estar segurando minha alma com força. Minhas mãos estavam tremendo. Quando foi a última vez que senti medo do rugido de uma criatura viva?
rrrrrrrrrrrRRRRRRRRRRR…
Depois desse último rugido, significativamente mais longo que os outros, o barulho e o tremor pararam abruptamente.
— O dragão demonstrou seu poder. Para ele, provavelmente não foi nada mais do que rolar em seu sono à beira do despertar. Mesmo assim, sugiro que retorne ao seu território rapidamente, ou as coisas ficarão fora de controle.
O corvo do deus da morte parecia descontente.
— O fogo do desastre sombrio pegará nas montanhas ferrugem. Esse fogo se espalhará e esta terra poderá ser consumida.
— O dragão está chegando! O dragão está chegando! Valacirca! A foice da calamidade desce sobre você!
Essas palavras sinistras mais uma vez passaram pela minha cabeça.
***
Al soltou um grito selvagem. Seu pesado machado de batalha balançou horizontalmente direto no rosto do lagarto gigante enlouquecido, quebrando ossos e espalhando pele e carne.
— Hmm, mais quatro estão se aproximando a noroeste. E agora?
O corvo arauto de Stagnate grasnou alto no ar.
Sem me preocupar em responder, me virei com minha funda quando um dos lagartos saltou de um arbusto para o noroeste e acertei sua cabeça em cheio. Uma flor vermelha desabrochou. Mal olhei para ela. Girei a próxima pedra. Mais dois lagartos saltaram um após o outro. Escolhi um dos dois e enterrei a pedra entre seus olhos.
O outro se aproximou. Al bloqueou com um escudo enquanto tentava mordê-lo e, convocando um instante de coragem, enfrentou-o de frente e esmagou sua cabeça com o machado.
Sua primeira batalha não foi como eu esperava. Ainda assim, ele estava se movendo muito bem.
O último dos quatro também avançou contra ele, que defendeu-se com os movimentos que haviam sido enraizados nele pelo treinamento, dando gritos de pânico o tempo todo, e finalmente o esmagou com o machado. O lagarto gigante continuou lutando descontroladamente até estar completamente morto.
— Entendeu agora? Isso é um rugido de dragão.
Era o tipo de terror que apenas um governante poderia exercer, e tinha o poder de causar pânico nos corações de todas as criaturas, grandes e pequenas. Gus uma vez me disse que essa era a razão pela qual heróis excepcionais eram necessários para matar um dragão. Fazia sentido. Se um dragão pudesse inspirar esse tipo de pânico apenas rugindo, não importaria quantos soldados médios você reunisse; só serviriam para acelerar o caos.
Depois daquele rugido de dragão, escapamos da câmara funerária com a terra caindo em pedaços do teto para sermos imediatamente confrontados por bestas que haviam enlouquecido com o uivo do dragão.
O Corvo Arauto do deus da morte ainda não havia saído e parecia estar se divertindo enquanto voava ao meu lado. Na verdade, chegou ao ponto de estar me dando informações úteis sobre as bestas que estavam chegando. Fiquei grato, mas a sensação de que isso poderia ser um movimento calculado me impedia de sentir felicidade. Como eu deveria chamar essa emoção?
— Ah, olá. Noroeste. Mais problemas estão vindo daquela direção.
Eu podia ouvir o chão tremendo em intervalos regulares e o som de árvores se partindo. Esses não eram os sons que uma criatura de quatro patas fazia ao se mover…
— É um gigante da floresta. Isso vai ser um pouco difícil até para você.
Acompanhado pelo som terrível de árvores vivas sendo despedaçadas, um gigante apareceu com mais de três metros de altura e vestindo peles. Ele tinha uma clava na mão e espumava pela boca. Estava claramente perturbado pelo pânico. Assim que Al o viu, recuou com um grito de horror e surpresa.
— Parece que não estava preparado para os uivos de Valacirca. E agora, herói?
O Corvo Arauto olhou para mim do céu, com um prazer genuíno e irritante em seus olhos vermelhos.
Gigantes da floresta viviam nas profundezas da floresta e eram geralmente tranquilos, embora dependesse da personalidade do indivíduo e do clã. Eles também eram relativamente pequenos como gigantes.
— Você vai matá-lo?
— Claro que não.
— Então vai impedi-lo? Como?
— Você não sabe?
Sanguinário gritou dentro da minha cabeça.
— Seja destemido, e você pode resolver praticamente tudo pela força!
Joguei minha funda de lado e corri em direção ao gigante.
***
Rugindo com raiva e espumando pela boca, o gigante da floresta balançou sua clava em um arco horizontal na minha direção. Era uma clava muito volumosa, como se um pedaço tivesse acabado de ser cortado de um tronco de árvore. Parei de repente, cruzei meus braços compactamente, segurei meu escudo em posição com as duas mãos e meu ombro esquerdo, e recebi o golpe de frente. Houve um impacto poderoso. Pressionei meus pés com força, e eles cavaram um rastro no chão enquanto eu era empurrado para trás um pouco.
— Isto não é… nada! — Empurrei de volta.
Apesar de sua perda de controle, o gigante da floresta parecia assustado com a sensação inesperada de resistência. Apressadamente puxando sua clava para trás, ele então soltou uma enxurrada de golpes com movimentos surpreendentemente ágeis de seu braço. Recebi todos em meu escudo. Um escudo normal já teria se quebrado em pedaços com o impacto, mas eu havia esculpido camada após camada de Sinais neste nos últimos dois anos. Não quebraria facilmente. Enquanto suportava todos os golpes ferozes do gigante, gradualmente diminuí a distância entre nós.
Com um rugido alto, o gigante finalmente mudou para uma postura de duas mãos e desceu a clava como se quisesse quebrar minha cabeça ao meio. Um ataque frontal que se aproveitava de sua altura e peso corporal superior. Quando a clava desceu, pensei em como era impressionante que ele tivesse tido o julgamento de usar esse movimento em particular enquanto estava em um frenesi.
Entretanto, eu já esperava esse ataque. Segurando meu escudo em um ângulo inclinado, desviei seu golpe para a esquerda. A sensação do golpe sendo forçado em uma direção diferente quando todos os seus ataques anteriores haviam sido apenas parados pelo escudo surpreendeu o gigante, e sua postura vacilou. Estava esperando por esse momento. Torcendo meu corpo enquanto dava um grande passo à frente, agarrei o grosso braço do gigante, o puxei com força em minha direção e girei meu corpo inteiro no estilo de um arremesso de sacrifício. O centro de gravidade do gigante se inclinou para frente. Ele não conseguiu lutar contra isso. Senti a sensação interessante de um peso enorme flutuando no ar e, no instante seguinte, um tremendo estrondo sacudiu a terra.
— E-ele jogou o gigante? — Al disse, atordoado.
— Sim, ele jogou.
Não podia me dar ao luxo de prestar atenção neles. Ignorei-os, segurei o gigante no chão e imediatamente orei ao deus da chama. A oração que eu estava usando era Sanidade, um milagre de ressuscitação que fazia com que o alvo se recuperasse da confusão. Senti o poder do meu deus sendo canalizado através de mim, e então o gigante da floresta enlouquecido fez alguns ruídos sonolentos e confusos e a luz da sanidade voltou aos seus olhos.
— Como sempre, suas ações me deixam sem palavras.
— O que você esperava que eu fizesse?
A menos que você realizasse a oração enquanto tocava diretamente o alvo, a Sanidade só tinha um efeito leve, então um plano era necessário se eu quisesse lançá-la em um gigante que tivesse perdido a mente. Era preciso poder para realizar esse plano, e ocorre que eu tinha. Isso era tudo.
Seja destemido e você pode resolver praticamente tudo pela força. E se você tiver técnicas e magia também, é ainda melhor.
Como regra, os ensinamentos de Sanguinário estavam corretos.
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— Eu realmente fiz algo lamentável.
— Não se preocupe. Você consegue voltar sem ajuda?
— Acho que consigo voltar de alguma forma.
— Oh, uh,‘Linguagem gigante, um pouco, entender.’
— Ahh! ‘Que surpresa! Isso ajuda muito!‘
Era uma conversa incrivelmente confusa.
— H,m… o dragão… ‘Dragão, uivo, perigoso, é’…
— Sim, é terrível, eu sei. ‘Preciso voltar para minha tribo. Depois disso, acho que vou me mudar para algum lugar um pouco mais seguro.’
— Ah, nesse caso, por favor, mencione o nome de William, o paladino. ‘Se, pessoas, encontrar, meu nome, William.
— William. Paladino, William, entendi. ‘Tudo bem. Você tem minha gratidão, Sir William.’
Depois que joguei o gigante da floresta, toquei-o com a mão e realizei o milagre da Sanidade, ele recuperou o autocontrole.
No entanto, um problema sério surgiu quando tentamos nos comunicar: nenhum de nós era muito proficiente na língua do outro. Embora a maioria das línguas de uso diário neste mundo estivesse distantemente relacionada, todas derivadas das Palavras da Criação originais, a linguagem dos gigantes era um pouco esotérica demais. Até mesmo Gus, que me ensinou, estava trabalhando com uma memória muito fragmentada dela. Era por isso que estávamos tendo essa tentativa hesitante de comunicação usando ambas as nossas línguas.
— ‘Eu sou Gangr da raça de Jotunn’,eu, Gangr de Yotun, William. ’William, campeão dos homens. — Gangr colocou uma palma grande e robusta contra a minha. Era uma saudação gigante. Parecíamos um adulto e uma criança comparando o tamanho das palmas das mãos. — Não esquecerei dessa dívida. Se você tiver problemas na floresta, me chame.
— Como posso chamá-lo?
— Grite: ‘Gangr dos Jotunn, William está aqui. As árvores passarão a mensagem.
O título de “gigante da floresta” era aparentemente merecido. Ele parecia estar em termos amigáveis com os feéricos e as fadas.
Depois disso, Gangr se curvou muitas vezes para nós e voltou para a floresta mais uma vez.
— Essa é a primeira vez que vejo um gigante.
— Eu também. Ele realmente me pegou de surpresa.
— Mesmo que você possa falar a língua deles?!
— Meu professor de magia era uma enciclopédia ambulante.
Enquanto Al e eu conversávamos, o Corvo Arauto desceu do céu. Ele tentou pousar despreocupadamente no meu braço, me esquivei dele, e ele resmungou astutamente enquanto pousava no chão.
— Você viu isso. Essa é a influência de um dragão antigo temido até mesmo pelos demônios do Inferno.
O Arauto de olhos vermelhos do deus da morte falou. Ele estava continuando a conversa que estávamos tendo pouco antes do rugido da Foice da Calamidade.
— Não há nenhum herói nesta era ou região maior do que você. Se ele acordar e buscar a guerra mais uma vez, não haverá outra maneira de derrotá-lo além de você. Mas mesmo você não é suficiente.
— E por causa disso você está me dizendo para aceitar que haverá algumas vítimas? Uh, podemos ser inimigos, mas isso não parece com você.
O Corvo Arauto fez uma expressão de nojo.
— Por mais irritante que seja, mil vidas não podem substituir dez mil. Como mais vidas podem ser salvas se você permanecer vivo, sou forçado a recomendar isso. Se fosse possível, eu mesmo colocaria um Eco de bom grado e o mataria. Contudo, infelizmente, graças a uma certa pessoa, fiquei impotente. Graças a uma certa pessoa.
Ele não fez nenhuma tentativa de esconder sua amargura.
— N-Nenhum dos outros deuses vai se mexer?
— Eles têm seus próprios planos, em uma escala muito maior e abrangente. Deuses como Gracefeel e eu, que se alegram e choram com as alegrias e tristezas das pessoas comuns, somos excêntricos.
Eu não disse nada.
— Este plano também não me agrada, mas acredito que seja o melhor plano na situação atual. Pense muito, muito cuidadosamente nisso, portador da chama, cavaleiro de terras distantes.
Com um forte bater de asas, o Corvo Arauto abriu suas asas.
— Adeus. Nos encontraremos novamente em breve.
Ele voou para a névoa. Al e eu o vimos ir em silêncio, minha expressão amarga e Al um pouco desconcertado.
— Ele está cuidando de você. — Al disse.
— Não, ele está de olho em mim. — Eu não tinha esquecido a ameaça de morte que ele me fez quando destruí seu Eco antes, mesmo que agora tivesse se desculpado por isso.
— Dizem que os deuses desejam heróis, pessoas que espalharão sua mensagem divina e realizarão sua vontade na terra.
— Sim.
— E você é um herói que representa o deus da chama, então…
— O deus da morte quer me colocar em dívida com ele, aposto.
Em vez de ser hostil comigo, ele estava tentando se tornar alguém benéfico para mim. Ao fazer isso, pretendia acalmar lentamente minha hostilidade em relação a ele e explorar esses favores passados para gradualmente, muito gradualmente, me derrubar. Por um instante, me imaginei reduzido a um cavaleiro morto-vivo. Balancei a cabeça para me livrar daquela imagem sinistra. Stagnate era muito bem versado em manipulação sutil.
— O que você planeja fazer daqui em diante? — Al perguntou, preocupado. — O deus da morte disse que mesmo você… hum… não poderia vencer o dragão.
— Boa pergunta, — eu disse. — Eu me pergunto o que devo fazer.
Eu não tinha uma boa resposta para ele.
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As criaturas da floresta foram levadas ao pânico pelo uivo do dragão. Voltei com pressa e fui imediatamente inundado com pedidos para cuidar dos danos que estavam causando. Relatórios vinham de todas as partes. Despachei aventureiros e sacerdotes para muitos lugares diferentes e troquei cartas com Veleiro Branco.
Agora, um tempo depois, tudo finalmente se acalmou um pouco. Eu estava em Porto da Tocha. Os rugidos do dragão ainda continuavam intermitentemente. Ao mesmo tempo, os conflitos estavam ocorrendo por causa de todas as criaturas mudando seus habitats, embora não estivessem tão loucos quanto na primeira vez em que aconteceu. Naturalmente, também estávamos começando a ver vítimas. Menos pessoas e cavalos estavam viajando nas estradas, e tive a impressão de que os navios que iam e vinham pareciam um pouco solitários no rio.
Todo mundo estava com medo do dragão – e os rumores de que aqueles eram os rugidos de um dragão se espalharam incrivelmente rápido – que vivia nas Montanhas Ferrugem. Os dragões eram uma grande ameaça. Só teria que acordar e subir ao céu por capricho, e não importa o Porto da Tocha, até Veleiro Branco poderia ser destruído. É um fato que todos morrem mais cedo ou mais tarde, mas quantas pessoas poderiam permanecer calmas depois de ouvir o rugido de sua própria morte?
No momento, eu estava na escuridão do meu escritório com todas as persianas fechadas, passando os olhos por uma carta do templo sob luz mágica.
Uma resposta à minha carta havia chegado do Bispo Bagley.
A informação que ele encontrou sobre o dragão imundo corrobora com o que o deus da morte nos revelou. Valacirca, a Foice da Calamidade, era um Dragão Ancião que estava vivo desde a época dos deuses. Suas garras perfuravam o aço e suas escamas quebravam as espadas dos heróis, e como se refletisse sua própria natureza, tinha um sopro de toxicidade e loucura
Toxicidade e loucura. Nunca poderia esquecer essas propriedades. Eles eram os mesmos que do wyvern e da quimera anormais que eu havia encontrado há dois anos. Dizia-se que essas criaturas se originaram a partir de pesquisas malignas realizadas pelos demônios do inferno. Provavelmente estavam experimentando usar o sopro que escapava da boca do dragão imundo enquanto dormia, misturando esse sopro com bestas e tentando domá-las.
Em sua carta, o bispo Bagley me avisou que havia inequivocamente um demônio de alto nível lá, além do dragão imundo. Por fim, ele tentou me dissuadir de lutar, dizendo que eu não era experiente o suficiente, que ele não conseguia me imaginar vencendo e que não haveria vergonha em fugir.
— Não há vergonha em fugir, hein?
Ele estava dizendo isso porque pensou que eu iria. O que o fez pensar isso? Como exatamente ele me via? Ainda estava agonizando com essa decisão…
O dragão provavelmente acordaria em breve. Se o deus da morte e as palavras do Lorde de Azevinho significassem alguma coisa, também haveria baixas. A primeira coisa que provavelmente aconteceria era que o dragão, uma vez acordado, atacaria um assentamento próximo por capricho e as pessoas morreriam.
Não terminaria aí. Não há como existir uma circulação animada e suave de dinheiro e bens em um lugar que um dragão possa sobrevoar a qualquer momento. O fluxo das coisas estagnaria, o vai-e-vem de cavalos e navios cessaria, e as bestas mais uma vez perseguiriam os assentamentos humanos como se fossem donos do lugar. Comerciantes e fabricantes que dependiam dessa circulação de dinheiro e mercadorias iriam à falência um após o outro, e as pessoas começariam a ficar desempregadas. Os desamparados se voltariam para o crime, a ordem pública pioraria, o governo se tornaria impotente e sua autoridade atingiria o fundo do poço. Muito mais pessoas provavelmente se afogariam nas ondas criadas pelo capricho do dragão do que já sucumbiram às suas garras.
Uma região completa, uma sociedade inteira, seria arruinada por um único dragão. Essa era uma situação que não podia permitir. Precisava tomar medidas para impedir, e depois que o dragão começasse seria tarde demais. Uma vez que houvesse vítimas diretas, seria impossível impedir que o efeito se espalhasse. Eu tinha que resolver esse problema antes que as presas de dragão se transformassem em carne humana.
No entanto, mesmo agora, não pude tomar a decisão de agir. A notícia pela cidade era que algumas pessoas estavam dizendo que o paladino tinha ficado com medo. Eu não podia chamar isso de completa e total bobagem também.
— Desafiarás o dragão com a proteção do deus da chama e morrerás derrotado, pois teu propósito não foi cumprido.
Eu não tinha sido capaz de sentir erro algum nas palavras do deus da morte. Sua revelação era verdadeira. Não podia vencer, não agora, com o poder que tinha atualmente. Desde que tomei conhecimento disso, não consegui seguir em frente.
Antes que percebesse, minhas mãos estavam juntas em oração.
Tradução: Erudhir
Revisão: NERO_SL
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