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O Paladino Viajante – Vol. 03 – Cap. 01

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As glicínias penduradas na pérgula balançaram com a brisa. Estávamos no pátio da mansão do lorde, no centro de Veleiro Branco, a cidade que era a porta de entrada para o continente Southmark. Flores de cores brilhantes desabrochavam vividamente sob as janelas da mansão, rodeadas pelo branco brilhante de suas paredes.

— Muito obrigado pelo seu trabalho. — Sob um caramanchão no pátio, Sua Excelência Ethelbald, duque de Southmark e lorde feudal de Veleiro Branco, falou conosco solenemente. A fraca luz do sol do início da manhã nos banhou. — Imagino que vocês estejam cansados de ouvir isso de mim, — ele acrescentou, um sorriso cruzando seu rosto enquanto sua expressão relaxava.

Eu não era muito bom em pensar em respostas espirituosas, então, enquanto ainda pensava no que dizer, Menel respondeu casualmente:

— Imagina. Mandando a gente pro trabalho sempre que aparece algo…

— É porque o paladino é meu vassalo, de certa maneira.

 

 

— E eu, não sou seu vassalo? Você me faz correr pra lá e pra cá trabalhando feito um escravo.

— Se eu mobilizar Sir William, consigo um segundo herói o acompanhando de graça.

— Eu não sou um brinde que você conseguiu em alguma barraca de rua.

— Mas você é o querido amigo do paladino. — Respondeu de volta. — Assim como um amigo luta pelo amigo, o cavaleiro luta pelo povo e pelo seu soberano. Estou errado?

— Serviço, devoção, fidelidade… Claro, parecem atraentes, mas como é a realidade? Se você colocar muita pressão em alguém, ele ficará infeliz. E quando você começar a suspeitar que ele se ressente, será difícil contar com ele quando realmente for necessário. Não é assim que as coisas funcionam? Eu me pergunto o que vai acontecer quando você tiver que enfrentar algo assustador sem esse herói para ajudá-lo. — Menel apontou para mim com um movimento exagerado.

Menel não tinha lealdade direta a Ethel, tinha coragem e nenhuma restrição. Ele seria sincero com qualquer pessoa, até mesmo um membro da família real.

Não conseguia me lembrar com clareza o que havia feito Ethel e Menel conversarem, mas a conversa entre os dois havia se tornado mais frequente de algum jeito durante os últimos dois anos, e agora eles conversavam bastante.

— Heheh. De fato, de fato, a ideia de meu paladino fugindo é certamente assustadora. Nesse caso, é melhor eu mantê-lo bem recompensado para ter certeza de mantê-lo, não é?

— Sim, isso, exatamente. Esse tipo de atitude é importante. Então, esse cara pode se sentir bem em mostrar lealdade a você.

Ethel riu graciosamente. Parecia que ele estava gostando muito de sua conversa com Menel. Deixando isso de lado, estava chegando à assustadora conclusão de que algumas discussões sobre como eu deveria ser compensado aparentemente estavam ocorrendo logo abaixo da superfície da discussão. Quando me dei conta disso, o fluxo da conversa já havia mudado para eu receber uma recompensa.

— Vou providenciar para que o dinheiro e os itens de seu pedido sejam enviados a você mais tarde. Agora, deixando isso de lado, Sir William…

— S-sim, pois não?

— Tenho algo que quero conversar com você. Eu gostaria que você me desse Meneldor.

— Huh?

Só pelo rosto de Ethel, era claro que ele estava falando sério, e seu tom solene eliminou todas as dúvidas.

— Ele é um elementalista habilidoso e um caçador espetacular. E não apenas isso, ele é um meio-elfo, envelhece lentamente e fala o que pensa. Quero ele. Eu o quero muito! — O duque parecia estar se divertindo muito.

Dei uma meia risada, meio suspiro enquanto pensava no que dizer.

— Excelência, Menel não é um objeto. Por mais que você diga que o quer, ele não é meu para dar. — Parei. — Se ele dissesse que gostaria de servir a Vossa Excelência, então seria outros quinhentos, mas…

— Eu não sirvo a ninguém, — Menel disse, interrompendo. — Como caralhos, vou ser trocado como um cachorro ou gato.

Mesmo que Ethel tivesse sido rebaixado ao status de plebeu, ele era membro da família real. Mas isso não fez diferença para Menel, que rejeitou a oferta, fechando os olhos de jade e acenando com a mão na frente do rosto para mostrar que não estava nem um pouco interessado.

Ethel suspirou ao ver a reação de Menel.

— Querido. Que pena. Nunca poderei ter gente talentosa o suficiente, sabe.

O duque de Southmark era do continente do norte do Prado. Irmão do Rei do Reino Fértil, ele estava encarregado de expandir o reino em Southmark. Ele provavelmente tinha muitas coisas difíceis para lidar e sempre tinha falta de pessoas e recursos.

— Só preciso de mais um navio, só preciso de mais um oficial confiável e competente… Tenho certeza de que você também deve ter pensamentos como esses.

— Sim. Especialmente recentemente… comecei a entender como é isso.

Depois de ser empurrado para a posição de senhor da região da Floresta das Bestas e fazer todos os tipos de trabalho para desenvolver a área, desenvolvi uma familiaridade próxima com esse tipo de dificuldade.

— Entendo. Como está o porto fluvial? — Ethel perguntou.

— Felizmente, está indo bem com a ajuda de todos, mas ainda tem alguns problemas…

— Hmm. Vamos ouvi-los. Talvez eu possa te dar alguns conselhos.

— Não é muito generoso da sua parte, — Menel disse. — Apenas conselho?

— Suporte de material também. Ou seja, se você estiver disposto a substituí-lo pela recompensa que mencionei antes…

— Tch.

Os dois sorriram um para o outro. Então, da entrada do pátio, ouvi cascalho sendo pisado e o som de uma respiração pesada.

Caminhando em nossa direção enquanto enxugava grandes quantidades de suor de seu rosto, estava o bispo Bart Bagley, o homem encarregado do templo principal de Veleiro Branco. Ele tinha um corpo grande e usava túnicas de sacerdote folgadas com fios de ouro e prata entrelaçados. Seus movimentos exalavam impaciência, e ele tinha uma severidade em sua expressão que vinha de sua personalidade rápida de raiva e do estresse de suas responsabilidades diárias.

Como de costume, ele era uma pessoa que, para colocar de forma educada, não passava uma impressão tão positiva, mas mesmo assim, eu o respeitava.

Ele parou em frente ao caramanchão, fez uma reverência para Ethel e depois voltou o olhar para Menel e para mim e nos lançou um olhar longo e profundo.

— Hmph. Retornou vitorioso, suponho. Eu esperava toda a bajulação de pessoas que o chamam de herói e um guerreiro valente e incomparável que subiu à sua cabeça e lhe rendeu uma ou duas derrotas esmagadoras até agora.

Eu me curvei para ele. Foi porque ele era alguém que falaria assim comigo que continuei a respeitá-lo tanto. Devolvi um sorriso completo para ele. Ele soprou o ar pelo nariz e virou para o outro lado.

Enquanto Ethel nos observava, ele soltou uma risada e disse:

— Obrigado por ter vindo, Bagley. — Então ele se recompôs, e seu rosto sério estava de volta. — Bem, então, vamos ouvir seu relatório sobre o incidente.

 

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— O fogo do desastre sombrio pegará nas montanhas de ferrugem. Esse fogo se espalhará e esta terra poderá ser consumida.

Depois que terminamos de relatar o incidente e a morte do demônio responsável, começamos a falar sobre a profecia. O silêncio desceu imediatamente sobre a mesa sob o caramanchão. Não relatar não era uma opção.

— Essas foram as palavras que o Lorde de Azevinho usou.

— O Lorde da Floresta disse que… — Sua Excelência resmungou para si mesmo e massageou as têmporas. — Bestas, depois demônios, e assim que comecei a pensar que as coisas haviam se acalmado, enfrentamos as ameaças não identificadas de um “fogo do desastre” e “senhor do miasma e da chama perversa”. A história que ouvi de você no passado, do Rei Supremo dos demônios selado em uma cidade dos mortos, também me preocupa. O problema nunca cessa, ao que parece. Céus, este continente nunca é entediante.

Eu podia sentir um cansaço considerável nele. Desde que me tornei um paladino, o vi forçado a fazer um monte de trabalho respondendo a tramas demoníacas, danos causados por bestas grandes e pequenas, e todos os tipos de outras coisas. Ele forneceu ajuda aos assentamentos que tinham sofrido danos reais com os ataques. Ele negociou com o continente para ganhar ajuda deles. Ele tinha cavaleiros patrulhando áreas para evitar danos antes que acontecessem. Empregou aventureiros temporariamente para caçar e matar as causas desses problemas. Cuidou dos documentos necessários para fazer tudo isso. Ele realmente viajou para as áreas afetadas e forneceu consolo e instruções no local. E, claro, também não podia negligenciar a governança normal da cidade. Eu nunca tinha visto Ethel relaxando e aproveitando um descanso.

Em consideração ao duque, o bispo perguntou em seu lugar.

— Caçador, que nível de poder este Lorde da Floresta tem? A sua chamada profecia pode ser confiável?

— Eu tenho um nome, meu velho.

— Eu também, garoto.

Os dois se encararam e resmungaram. Esses dois não se davam muito bem.

— H-hmm, vocês dois, tentem se dar bem…

— Hmph. Me dar bem com esse idiota? Você deve estar brincando.

— Tá bom. Eu odeio caras presunçosos como ele. — Menel bufou.

Os dois demonstraram abertamente seu descontentamento, o bispo Bagley cruzando os braços e olhando para Menel, e Menel apoiando o queixo na mão e juntando as sobrancelhas. Era muito desconfortável que meu amigo e a pessoa que eu respeitava se odiassem tanto.

Enquanto eu torcia minhas mãos, Ethel sorriu brilhantemente para a dupla.

— Mas tenho certeza de que vocês dois concordam que, como parceiro de negócios, o outro é mais do que adequado, certo?

— Bem, de fato. Eu não ignoro seus talentos.

— Nem estaria na mesma sala que ele de outra forma.

Nenhum dos dois parecia feliz com isso. Sua Excelência olhou em minha direção e piscou.

— Tudo bem, tanto faz, — Menel disse. — Isto é um negócio. Vou responder. Olhem isso. — Ele tirou um mapa da bolsa de couro que estava carregando e o espalhou sobre a mesa. Tínhamos obtido este mapa de Tonio, um comerciante com quem temos relações amigáveis. Era um mapa detalhado e cuidadosamente elaborado dessa área, como era durante a Era da União. Com duzentos anos, o mapa mudara bastante e estava coberto de ponta a ponta nas correções de Menel.

Ele traçou um dedo sobre o mapa enquanto nós olhávamos.

— Então, em primeiro lugar, quando digo “Lorde da Floresta”, existem linhas por aí que são como canais para a mana na terra. — Ele desenhou várias linhas invisíveis com o dedo, provavelmente representando as linhas de ley, e então apontou para o local onde muitas delas se cruzavam. — Onde eles se encontram, você tem um Domínio, e “Lorde da Floresta” se refere ao seu lorde. Quanto ao que um lorde realmente é, isso varia. Pode ser um alto feérico morando em uma árvore ou pedra, um velho animal selvagem que esteve em sua toca no Domínio por um longo tempo e ganhou inteligência, ou um monte de outras coisas.

Parando para respirar, Menel colocou o cabelo prateado para trás da orelha.

— Eles não apenas vivem muito mais do que cem ou duzentos anos, mas também estão diretamente conectados às linhas de ley. Eles armazenam muitas memórias e conhecimento, e estão constantemente atraindo mana para seus corpos de todas as áreas às quais as linhas de ley os conectam. O lorde é o coração da floresta, seu cérebro.

Este mundo foi feito de Palavras. Quando as árvores farfalharam ou a luz do sol se filtrava através das árvores deixando manchas de luz e sombra, um feiticeiro habilidoso poderia pegar Palavras fracas da flutuação de mana e interpretá-las.

Claro, havia um limite para a quantidade de informações que um feiticeiro poderia ler de algo assim. Mesmo usuários de magia tão bons quanto Gus, que me criou com Sanguinário e Maria e era conhecido como o Sábio Errante, não conseguiam aprender tudo o que havia para aprender apenas ouvindo o farfalhar das árvores. Mas Gus também me disse que isso acontecia porque nós, humanos, lemos as Palavras dentro da estrutura do pensamento humano. Se fosse um ser muito mais próximo da Natureza, então…

— O Lorde da Floresta não é tão poderoso quanto os deuses, que podem até ler o futuro não escrito até certo ponto, mas… se isso está vindo dele, você pode apostar que há uma base muito sólida por trás disso. — O tom de Menel foi firme. — É menos uma profecia e mais, uh, uma previsão educada.

O bispo Bagley murmurou baixinho.

— Parece necessário priorizar este assunto, Excelência.

— Sim. As Montanhas Ferrugem… Capital caída dos anões e um covil de demônios…

Todos sob a sombra do caramanchão tinham uma expressão séria. Não era algo surpreendente. Não houve nada além de problemas recentemente, incluindo muitos incidentes que não merecem uma menção explícita, e agora, no topo de tudo, tínhamos que lutar contra um “fogo do desastre” que viria de uma cova de demônios. Isso deprimiria qualquer um.

Então decidi rir.

— Isso parece ótimo!

Os três se viraram para olhar para mim. Fiz o meu melhor para abrir um sorriso enorme.

— Posso ficar tão selvagem quanto eu quiser!

Se você fosse bombado, poderia resolver quase tudo pela força. Sanguinário deu um conselho muito bom.

— Conhecemos a localização do problema e, melhor ainda, está em território inimigo, desolado a ponto de não correr o risco de machucar os transeuntes! Esse problema foi feito para mim!

Cerrei o punho ao dizer isso, e Ethel não pôde deixar de rir.

— Parando para pensar sobre isso, você está certo. Posso confiar em você, então, paladino?

— É claro!

O bispo Bagley e Menel suspiraram ao mesmo tempo e automaticamente se entreolharam, então bufaram e desviaram o olhar novamente.

— Dê a ordem, e eu reunirei alguns homens e partirei imediatamente…

Ethel riu da minha ansiedade.

— Não, duvido que haja uma necessidade de se apressar tanto.

Concordei. Sugeri energicamente de propósito para ajudar a limpar a melancolia, mas na verdade eu era da mesma opinião.

Todos aqui pensavam rápido, então eu tinha certeza que todos perceberam também: em relação ao “fogo do desastre”, o Lorde de Azevinho disse que “não demorará muito para chegar”, mas ele também nos prometeu “uma colheita abundante” para o outono. Isso significava que, a menos que acontecesse algo que o Lorde da Floresta não previu, poderíamos supor com segurança que nada aconteceria até o outono, pelo menos.

— Receio que também não saibamos muito sobre as Montanhas Ferrugem, — Ethel disse. — Também posso pedir-lhe para colher informações?

— Sim, — respondi. — Vou tentar perguntar ao meu amigo quem é o trovador e os anões que moram no porto. Quanto à profecia do Lorde da Floresta, devemos mantê-la em segredo entre todos nós aqui por enquanto.

Todos acenaram com a cabeça, como se dissessem que já estavam planejando isso. O período do verão ao outono era a época mais movimentada do ano para os agricultores, que constituíam a maioria da população. A colheita do trigo de verão ainda não havia acabado e eles tinham muito pela frente quando o outono chegasse: plantar trigo de inverno, engordar o gado com nozes e bagas da floresta, colher frutas e fazer álcool. Agora que as ameaças de bestas e demônios finalmente foram aliviadas, a vida começou a se acalmar e todos estavam ansiosos pela colheita. Em uma época como essa, nenhum de nós queria causar medo nas pessoas espalhando boatos inquietantes.

— Não se preocupe. Tenho certeza de que isso vai funcionar de alguma forma. — Eu forcei um sorriso.

O duque riu.

— Eu começo a acreditar quando ouço de você.

— Hmph. Não deixe que o tratamento de herói suba à sua cabeça, ou sua complacência será o seu fim, — o bispo Bagley disse, mostrando sua preocupação em sua maneira usual.

Menel e eu nos entreolhamos e trocamos sorrisos irônicos.

 

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Houve mais uma discussão sobre uma série de pequenos detalhes, e então deixamos a mansão. Sua Excelência e o bispo pareciam ter ainda mais o que falar. Eles tinham uma vida difícil.

— Então, o que estamos fazendo? — Menel perguntou. — Agora, quero dizer.

— Vamos ver Abelha primeiro para obter informações sobre as Montanhas Ferrugem. Ela deve estar na praça agora.

Menel deu um pequeno grunhido e puxou o capuz de sua capa sobre os olhos. Havia uma razão pela qual ele preferia evitar atenção.

— Fff. — Menel franziu o rosto como se dissesse que sabia que isso aconteceria. A praça foi preenchida com o som de um instrumento de três cordas conhecido como rebec.

— Perto e longe, bestas cruéis se rebelavam. Pessoas e cavalos iam e vinham. O vento norte abafou lamentos e gritos. Ao redor da floresta, os uivos das bestas ecoaram.

A história que está sendo recitada é uma que eu já tinha ouvido antes, de pessoas sofrendo nas mãos de demônios e das bestas que controlavam.

Um único jovem guerreiro sagrado com a bênção do deus da chama apareceu de lugares desconhecidos. O jovem guerreiro mudou o jeito de pensar de um belo caçador meio-elfo que estava se voltando para o crime na época de angústia, e os dois se tornaram amigos. O guerreiro o salvou de sua situação difícil e eles rumaram para a cidade juntos.

O que eles encontraram lá foi um wyvern determinado a destruir a cidade. O guerreiro quebrou o pescoço do wyvern com as próprias mãos e ganhou fama. Ele levou a situação do povo para o lorde, que o consagrou paladino por sua decisão louvável. Seu nome atraiu bravos aventureiros para sua causa.

Por fim, o paladino e seu grupo finalmente rumaram para o vale árido que era a base dos demônios e suas bestas. Mas eles foram pegos em uma armadilha desprezível e forçados a fugir. O paladino lutou para sair da batalha com o poder sombrio de sua espada demoníaca selada. Mas quando seu amigo foi gravemente ferido, a escuridão da espada demoníaca quase o engolfou.

Como o guerreiro estava quase reduzido a um berserk, seu amigo meio-elfo o trouxe de volta com palavras e punho. Lágrimas quentes foram derramadas; um abraço foi compartilhado. Os dois reconquistaram sua solidariedade e lutaram contra as bestas.

— Assim, os heróis marcharam no vale, onde uma grande besta com garras estava em seu caminho. A cabeça de um leão, com presas de navalha. A cabeça de uma cabra, com magia do mal. A cabeça de um dragão, com fogo carmesim. E sua cauda se contorcendo, uma cobra venenosa. Seus rugidos furiosos cortaram o vento, e seus pés sacudiram a terra enquanto ele andava.

Liderando as outras bestas estava uma besta gigantesca com três cabeças chamada de quimera. Os guerreiros montaram uma parede de escudos, ergueram suas espadas bem alto e bravamente enfrentaram a matilha. Entre esses guerreiros estava um espadachim também conhecido como Penetrador, que usava uma espada mais rápida e afiada do que a de qualquer outro.

— William, o Paladino Viajante, e Meneldor das Asas Velozes avançaram para a batalha juntos.

Por aqui, o estilo de fala do contador de histórias começou a esquentar.

— Ó grande deus perdido para a história, ó guia reticente das almas! Deus da chama, governante do ciclo eterno, Gracefeel! Você guiará nossos heróis para a escuridão que assola a fronteira e mostrará seu brilho para o mundo mais uma vez?!

A batalha contra a quimera foi tremenda. Ouvi Sir William, com sua força incomparável, lutar com a quimera e socá-la com as próprias mãos. Ohh, ele apenas deu um soco na quimera e a fez voar. Ela atingiu uma pedra e a quebrou ao meio. Soltei um “uau” apesar de tudo. Que herói.

Menel, ao meu lado, tinha uma carranca enorme no rosto.

Quando se tratava do caçador meio-elfo, abundavam as descrições de sua beleza. Cada vez que ele fazia algo, gritos animados vinham da plateia, principalmente das garotas.

— Ahaha…

Rapazes com cabelos castanhos e olhos azuis podiam ser encontrados em todos os lugares, então não me destaquei muito. Menel, por outro lado, era um meio elfo com cabelos prateados e olhos de jade. Ele não podia não ser perceptível. Essas histórias significavam que ele se tornaria o centro de todos os tipos de atenção, então provavelmente estava se sentindo um pouco desconfortável.

Mas à medida que a recontagem apaixonada de nossa matança continuava além da multidão na voz orgulhosa e feliz do contador de histórias, a expressão de Menel se suavizou, um sorriso relutante cruzou seus lábios e ele soltou um suspiro, como se a vontade de resistir tivesse murchado dele.

Ao mesmo tempo, uma grande ovação irrompeu da plateia. Sir William acabara de apunhalar a cabeça de leão da quimera com sua lança favorita.

 

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A história terminou e dicas foram dadas. Esperei que a plateia se dispersasse e, quando o trovador estava arrumando suas coisas, acenei com a mão e chamei-a baixinho.

— Abelha.

Suas orelhas pontudas se ergueram. Parecia que era tudo de que ela precisava. Ela se virou surpresa e seu rosto se iluminou com um sorriso radiante. Ela veio correndo e se catapultou para mim, gritando:

— Você estava ouvindo!

— De um jeito, sim! — Disse enquanto a pegava e girava em círculos na calçada de pedra. Ela deu uma risadinha de brincadeira. Essa garota, uma trovadora halfling com expressões faciais encantadoras, cabelo ruivo bagunçado e o físico de uma criança, era nossa amiga Robina Goodfellow. Ela estava tão brilhante como sempre hoje.

— Parece que ainda é popular.

— Você não tem ideia. É o meu principal agradecimento a você! Dá uma olhada! — Abelha nos mostrou uma cesta cheia de moedas de cobre e prata. — Fiz um monte de dinheiro mais uma vez! Yeeeah!

— É bom ver que nosso trabalho árduo está gerando pilhas de dinheiro para alguém, — Menel disse em tom de brincadeira.

— Awww. Okay, então é quase hora do almoço mesmo, acho que devo retribuir um pouco a vocês! — Abelha riu, colocou as mãos na cintura e olhou para nós. — O que vocês querem comer, vocês dois?

— Carne, — Menel disse sem pensar duas vezes.

— Você sabe que se seus fãs ouvissem ficariam muito desapontados.

— Calada!

— Você não tem algo um pouco mais, sei lá, algo? Como um elfo, elegante, sabe.

— Tá bom. Legumes. Enfeitar a carne.

Isso me fez rir.

Nos poemas e histórias, os elfos eram uma tribo elegante que vivia nas profundezas da floresta em harmonia com a natureza, e não tinham muita imagem de comedores de carne. Mas, na verdade, viver na floresta, viver em harmonia com a floresta, também significava comer carne animal como um predador. Tive uma lembrança de aprender com Gus há muito tempo que a razão pela qual os elfos eram famosos como arqueiros era porque eles eram excelentes caçadores. E isso foi confirmado na realidade; Menel era um comedor de carne e tanto.

— E você, Will?

— Carne para mim também, eu acho… Não é sempre que passeamos pela cidade.

— Vocês, guerreiros, são verdadeiros amantes de carne, hein…

Como observação, não havia muitas oportunidades de comer carne de gado no campo. Eu diria que havia apenas dois momentos principais: quando o gado velho morria e durante o outono, quando chegava a hora de abater o gado que não sobreviveria ao inverno. Afinal de contas, vacas e cavalos eram trabalhadores valiosos, e era preciso muito esforço para abater um único animal. Não apenas isso, mas aqueles animais podiam ser levados para a cidade e vendidos por dinheiro em vez de comidos.

Por todos esses motivos, as refeições do dia a dia no campo seriam normalmente pão, mingau de trigo e feijão, ou ocasionalmente carne de pássaros e outros animais silvestres com que um caçador voltaria.

Porém, na cidade o gado e outros animais trazidos vivos do campo eram abatidos todos os dias, e se enfileiravam na frente do açougue. Por causa da grande população, sempre haveria pessoas que queriam carne, e lojas e negócios dedicados poderiam sobreviver aqui atendendo a essa demanda. E com as lojas especializadas, aumentou o número de restaurantes que dependiam deles para servir carne. Tudo isso significava que você poderia colocar as mãos em um prato de carne com muito mais facilidade na cidade do que em qualquer outro lugar. Passar por cima não era uma opção.

— Nossa, vocês dois não têm graça nenhuma, — Abelha disse, abrindo os braços em fingida decepção.

— Ah, sim, e você? — Menel perguntou. — O que você quer?

— Eu? Hmm… — A trovadora ruiva pareceu estar pensando por um momento, e então ela riu. — Carne, eu acho!

 

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Um pouco antes do meio-dia, nós três carnívoros fomos atraídos para uma taberna pelo cheiro delicioso de carne, e entramos direto antes que ficasse muito cheio. Enquanto Abelha nos assegurava uma mesa para quatro pessoas, ela chamou o taberneiro de pele morena fervendo algo em uma panela grande.

— Com licença! O que você está cozinhando hoje?

— Carneiro cozido, minha querida! — ele respondeu com uma voz animada.

— Woo! Para três, por favor, e porções grandes!

— Já vai sair!

O que tinha em cada um de nossos pratos era um pedaço de carneiro com osso bem fervido e bem quente. Ao lado, também havia vegetais cozidos e uma espécie de pão feito amassando a farinha de trigo na massa, fermentando-a e depois cozinhando-a no vapor. Era semelhante aos pães cozidos no vapor que eu conhecia em minha vida passada. Como a cidade de Veleiro Branco era uma cidade portuária voltada para o mar interior, dava para ver a cultura gastronômica de muitas regiões aqui, o que era realmente interessante.

— Ah, isso é culinária de clima árido, não é? — Abelha disse, identificando sua origem só olhando.

— Claro que sim, — foi a resposta do cozinheiro. — Esse é o sabor da minha terra natal.

Clima árido… Já tinha ouvido falar disso. Se minha memória não me falha, era uma terra de nômades, estepes extensas. Fiel ao seu nome, ventos secos sopravam pela terra e, climaticamente, era fresco. Eu tinha ouvido falar que mesmo que caravanas de mercadores cruzassem aquela terra rumo a países do Extremo Oriente, era um lugar bastante perigoso que estava espalhado por planaltos controlados por tribos de goblins. E, finalmente, o que mais me impressionou quando soube do lugar foi…

— É verdade que há uma raça de centauros por lá? Meio-homem, meio-cavalo?

O taberneiro riu e acenou com a cabeça.

— Certamente existem. Assustadoramente bom com arco, todos. Tudo bem, vou deixar vocês comerem. — E ele voltou para a cozinha.

Menel, ainda com o capuz, olhava fixamente para o carneiro.

— Parece que o corte foi de baixo do pescoço até as costelas, — ele disse, identificando o corte.

Parecia delicioso. Minha expectativa aumentou. Mas em vez de atacar imediatamente a comida, primeiro parei por um momento.

— Mater nossa Mãe Terra, deuses de boas virtudes, abençoe este alimento, que por teu amor misericordioso estamos prestes a receber, e deixe-nos sustentar em corpo e mente. — Orei com minhas mãos juntas.  — Pela graça dos deuses, estamos verdadeiramente gratos.

Quando terminei de fazer a oração, Menel e Abelha se juntaram.

— Estamos verdadeiramente gratos.

— Vamos comeeeer!

Pegamos nossas facas e as limpamos, depois as inserimos nos pedaços de carneiro cozido à nossa frente e começamos a cortá-los. Nenhum falava nada, mesmo não sendo de propósito; simplesmente aconteceu enquanto nos focávamos atentamente em cortar a carne. Eu tinha ouvido dizer que as pessoas não conversavam muito enquanto comem caranguejo e, aparentemente, a mesma coisa acontecia com o carneiro.

Enfiei a faca, cortei um único osso e toda a carne que o rodeava e enterrei meus dentes. Minha boca se encheu com o sabor umami da carne e um salgado que era um pouco mais forte do que eu esperava. O carneiro tinha um cheiro e uma textura bem distintos, e cada vez que o mordia, o sabor parecia escorrer para fora e realmente me dava a sensação de que estava comendo carne. Os pães cozidos no vapor, leves e fofos, tinham um sabor suave e funcionavam bem para quebrar a refeição, como o arroz branco.

— A comida está ótima!

— Sim, se fosse uma competição, ganharia muito fácil!

— Eu disse! Ah, é bom com pães também.

— Hm, eu não tinha pensado nisso. — Rasguei um dos pães cozidos no vapor e coloquei os vegetais cozidos e um pouco da carne que havia cortado dentro dele. Estava uma delícia.

Mas achei que esse era um bom momento para fazer uma pausa e decidi abordar o assunto principal.

— A propósito, tem uma coisa que quero te perguntar, Abelha.

― Hmm? O que é?

— Aconteceu algumas coisas e… quero saber o máximo possível sobre as Montanhas Ferrurem.

— Sobre as Montanhas Ferrugem? — Abelha ergueu os olhos da carne cozida e da faca à sua frente e olhou para mim. — Os poemas de um poeta não são de graça, rapaz. Vai me pagar pela informação? — Ela sorriu maliciosamente para mim.

— P-pagar você? Hmm…

Menel falou antes que eu pudesse.

— Se acabarmos indo para as Montanhas Ferrugem, você será a primeira a saber o que estamos fazendo. Material para uma nova história de aventura. O que acha?

— Okaaaay, fechado! — Abelha acenou com a cabeça.

Eu tinha o péssimo hábito de pensar demais em comentários que não deveriam significar nada. Precisava aprender a pensar menos nesse tipo de assunto.

— Muito bem, vamos lá, eu realmente não sei muito bem. — Por enquanto, Abelha colocou a faca ao lado do carneiro cozido no prato e começou a falar. — Duzentos anos atrás, as Montanhas Ferrugem eram aparentemente chamadas de Montanhas de Ferro. E costumava existir um país chamado País do Ferro. Era o reino subterrâneo dos anões, os habitantes das montanhas que são os asseclas de Blaze, deus do fogo e da arte. Era um país poderoso que fez seu nome durante a Era da União.

Abelha continuou.

— Mas isso foi apenas mais uma coisa perdida no caos de duzentos anos atrás. O lorde anão em seus salões de pedra, junto com muitos guerreiros poderosos, morreu lutando nas montanhas tentando conter a invasão de demônios. Muito sangue foi derramado, muitas armas espalhadas pelo chão… e uma vez que as Montanhas de Ferro se tornaram um covil de demônios, em algum ponto elas começaram a ser chamadas de Montanhas Ferrugem. Isso é o que eu ouvi.

Representava a ruína do que o ferro já foi, os destroços lamentáveis da antiga glória, cheios de armas corroídas e o cheiro metálico enferrujado de sangue derramado.

— Não sei os detalhes do que aconteceu naquela batalha, — ela disse. — Não existe realmente nenhuma informação.

— Por quê?

— Porque os guerreiros anões e as pessoas daquelas montanhas que lutaram para defendê-los foram completamente exterminados. E também… — Abelha respirou fundo antes de continuar. — Porque o destino dos anões que escaparam de seu país foi tão cruel. Você deve saber, Will, você abrigou alguns anões refugiados há um ano, não é?

Lembrei-me daquelas pessoas com olhos exaustos. Eles estavam cobertos de lama, cheiravam mal e tinham barbas enormes cobrindo as bochechas encovadas.

— É óbvio o que aconteceria a um povo expulso de sua terra natal pela guerra, certo? É por isso que eles não me dizem nada sobre as montanhas que já foram seu lar, ou a última batalha que aconteceu lá. É uma memória difícil e dolorosa para eles, uma memória de tragédia e humilhação, mas ao mesmo tempo, suas memórias de glória compartilhadas são o único vínculo que os mantém juntos e permite que eles mantenham seu orgulho.

Mesmo que Abelha não tivesse nenhum instrumento e estivesse apenas falando de improviso, havia uma espécie de poder na maneira como ela falava. Ela tinha uma voz suave, cantante e agradável aos ouvidos e sabia exatamente como fazer uma pausa para atrair o ouvinte.

— Portanto, é um segredo que eles mantêm escondido dentro de si. Ninguém que não seja do País do Ferro caído sabe. Então é tudo o que posso dizer. Desculpe… — Abelha deu um sorriso de desculpas. — Se quiser saber mais alguma coisa… acho que tinha anões que migraram para o seu porto fluvial, certo?

— Yep.

— Eles se abririam se você perguntasse, acho. Não, tenho certeza disso. Se você mantiver o que eu disse em mente.

Eu balancei a cabeça e sorri para ela.

— Obrigado.

Fiquei pensando o quanto disso eles me contariam. Enquanto imaginava os rostos ásperos dos anões, pensei na prosperidade e na queda daquele reino de pessoas da montanha.

 

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Depois disso, Abelha disse que iria vagar cantando suas histórias por mais algum tempo, e Menel e eu a deixamos sozinha. Saímos da cidade de Veleiro Branco e rumamos para o sul.

Depois de alguns dias, voltamos para Floresta das Bestas e pisamos na trilha das fadas.

Mais uma vez, aquele cenário estranho nos cercou, de dia e noite trocando de lugar na velocidade de um redemoinho, a floresta se contorcendo, fadas sussurrando entre si e uma escuridão horrivelmente densa. O formigamento que senti na minha espinha não foi diferente do que da primeira vez que fiz isso. Andei com cautela por aquele lugar por mais ou menos meio dia, a sensação de admiração e medo nunca me deixando.

Passamos por um estranho anel de luz que era a saída da trilha das fadas e nosso campo de visão se abriu. Senti o vento soprando em minha direção. Levei alguns segundos para me orientar e percebi que já estava anoitecendo e eu estava no topo de uma colina.

Um número infinito de árvores se erguia e, além delas, um sol laranja se punha em um céu vermelho. O céu ao meu redor tinha começado a mudar para a cor da noite, e eu podia apenas distinguir o brilho das estrelas. Havia uma floresta, tanto quanto meus olhos podiam ver, e um vasto rio serpenteando por ela.

Eu mudei meu olhar e vi que abrangendo aquele grande rio era uma cidade em ruínas de duas cores: um cinza opaco e o verde das plantas aderentes. E aninhado bem próximo a ele estava uma extensão de telhados de tijolo vermelho macio e gesso branco. Era uma cidade viva, com pessoas entrando e saindo dela.

Há muito tempo, depois que tive aquela batalha com o deus da morte e disse adeus aos meus pais, segui este rio da cidade dos mortos abaixo para o norte. Foi lá, antes de conhecer Menel, que vi uma cidade semi-submersa e, neste exato momento, mãos humanas estavam trabalhando arduamente para reconstruí-la.

— Olhando assim, ficou muito grande, — Menel disse em um murmúrio.

— Sim. Cresceu bastante em apenas dois anos.

Nós conversamos sobre isso enquanto descíamos a colina e dizíamos olá para as pessoas por quem passávamos enquanto caminhávamos pelas ruas do pôr do sol.

Encontramos Tonio perto do porto, conversando sobre algo com um proprietário de um armazém. Ao nos notar, ele interrompeu sua discussão, deu-nos um breve aceno e se aproximou.

— Bem-vindos de volta, vocês dois.

— Obrigado!

— Vocês voltaram consideravelmente mais cedo do que eu esperava. É o anormal…

— Resolvido com segurança. Nosso relatório para o duque também terminou.

Tonio nos olhou espantado.

Menel e eu nos olhamos e rimos conspirando.

— Meu deus, vocês realmente são assustadores. Que truque vocês usaram desta vez?

— Um truque elemental secreto, — Menel disse. — Pode não ser muito útil para os negócios. Não é adequado para transportar coisas.

— Mas parece útil para coletar informações. Eu gostaria muito de ouvir os detalhes de vocês mais tarde, se vocês estiverem dispostos a compartilhar.

— Eu disse que é um segredo de figo e você ainda está tentando arrancar de mim? Uau. Táticas agressivas.

Sou um vendedor, — Tonio disse rindo.

Quando conheci Tonio, tive nele uma boa impressão de cansaço, mas ultimamente estava sentindo que um pouco do seu espírito havia voltado. Talvez o fato de os negócios estarem crescendo tenha causado autoconfiança, uma sensação de realização e todo esse tipo de coisa em seu rosto.

A reconstrução desta cidade foi algo que Tonio aproveitou para propor enquanto os aventureiros ainda estavam no mesmo lugar depois de se livrarem daquela quimera. Tínhamos mandado muitos grupos de aventureiros endurecidos pela batalha em uma varredura em grande escala para remover todos os perigos que ainda pairavam nas ruínas. Com o apoio de Ethel, realizamos manutenção no porto fluvial, destruímos os prédios em ruínas para a obtenção de materiais e reconstruímos casas.

Então, usando este lugar como sua base de operações, Tonio começou uma madeireira nas profundezas da Floresta das Bestas, derrubando árvores, construindo jangadas e enviando-as rio abaixo. Foi um enorme sucesso. O desenvolvimento da área de Veleiro Branco a deixou com necessidade de lenha para combustível e madeira para construção. Enquanto isso, Floresta das Bestas, que ficava rio acima, tinha uma cidade portuária em ruínas que poderia ser reconstruída, bem como uma abundância de recursos de madeira. Onde houver demanda por algo, você terá um grande lucro se puder encontrar um método de supri-lo.

Pode parecer óbvio, mas foi a maneira como Tonio identificou com segurança essas oportunidades óbvias e realmente tirou proveito delas que definiu sua maneira de fazer negócios.

Quanto a mim, depois que matei a quimera, as áreas ao redor chegaram a um consenso fácil em me tornar um senhor feudal, mas parecia que tudo o que esperavam de mim era o poderio militar para garantir a segurança da região e para eu usar meu título de paladino para ficar na frente de Sua Excelência e representar a área. Não era como se houvesse uma montanha de coisas sobre as quais eu pudesse tomar decisões também. Na verdade, apesar de ser um lorde, eu nem tinha uma casa.

Vou repetir: eu nem tinha casa.

Pensei em persuadir alguma aldeia a me deixar morar com eles, mas minha entrada na aldeia significaria que eu estaria forçando meu caminho ao topo de sua hierarquia social. Haveria pessoas que não ficariam muito felizes com isso e outras que tentariam me usar. Além disso, pensei que era perfeitamente previsível que algumas pessoas da aldeia tivessem a ideia de usar a minha existência para se darem vantagem diplomática nas relações com outras aldeias. Portanto, devido a todo o atrito que provavelmente causaria, hesitei em pedir para morar em uma aldeia sem pensar com cuidado.

Havia a opção de não se estabelecer em lugar nenhum e governar viajando pelo meu território, eu conhecia exemplos disso em minha vida passada, mas esse método tinha todos os tipos de problemas, então queria evitá-lo, se possível.

E então decidi entrar no negócio de Tonio. Investi, ajudei a fornecer segurança e enquanto fazia isso, me estabeleci aqui nesta cidade recém-formada.

Junto com Menel e alguns aventureiros, incluindo Reystov, liderei caças de bestas e demônios para a segurança da cidade e forneço tratamento médico. Às vezes, eu ia a vários lugares na Floresta das Bestas a pedido e lidava com uma variedade de questões menores em coordenação com Sua Excelência e os padres que pedi emprestado ao Bispo Bagley, incluindo Anna. E foi assim que passei meus dias.

Foi mais ou menos nessa época que aconteceu. Um bando de pessoas da montanha, isto é, anões, veio, ouvindo que a floresta havia se tornado bastante segura. Fui o primeiro a conhecê-los, na floresta. Eles estavam cobertos de sujeira e lama e pareciam ter lutado contra a fome e os animais selvagens para chegar aqui e mal conseguiram. Eles pareciam estar realmente lutando, então providenciei comida e alojamento temporário e tentei ajudá-los a encontrar empregos.

Os anões eram uma raça de artesãos que eram bons com as mãos, mas eram errantes, e eu não esperava deles um alto nível de conhecimento especializado. Mas, assim que começamos a conversar, descobri que muitos deles tinham um conhecimento surpreendente em coisas como forja, manufatura de couro, marcenaria, cerâmica, tecelagem e carpintaria. Perguntei a eles por que diabos eles haviam passado por tanta coisa só para vir até as profundezas da Floresta das Bestas, mas eles não falaram sobre isso.

De qualquer forma, como eles tinham habilidades assim, eu não iria deixar seus talentos irem para o lixo. Decidi investir a maior parte do dinheiro que tinha em mãos, que consegui com a exploração de ruínas e assim por diante, em sua embarcação. Ofereci-me para emprestar-lhes os fundos para construir todos os tipos de instalações: uma marcenaria para processar as toras depois de cortadas, uma instalação de processamento de couro para fazer produtos com as peles dos animais que caçávamos, uma ferraria, fornos para cerâmica, carvão e muito mais.

Eu pretendia que a proposta fosse aceita, mas eles me olharam com os olhos arregalados de surpresa e vieram para a mesa de negociações com muito medo e cautela quanto ao tipo de terrível interesse e termos que eu imporia a eles. E quando apresentei a eles o interesse e os termos, eles me olharam novamente com os olhos arregalados.

Mas para mim na época, foi uma decisão necessária. Há um número inacreditável de coisas necessárias para manter e expandir um assentamento recém-criado: tecelões, marceneiros, pedreiros, carpinteiros, ferreiros, couro, carvoeiros e muito mais. No início, você pode sobreviver até certo ponto com compras improvisadas e trabalho amador, mas em pouco tempo, você precisa de profissionais qualificados.

Não havia muitos artesãos curiosos o suficiente para vir até a parte de trás da Floresta das Bestas quando eles já tinham habilidades comercializáveis. Portanto, agora que as pessoas que tinham as habilidades de que tanto precisávamos haviam feito seu próprio caminho até nós, não havia como desperdiçar seu potencial em mão de obra não especializada, como carregar e descarregar madeira. Valia enfaticamente a pena gastar meu dinheiro com eles.

No entanto, simplesmente emprestar dinheiro a uma pessoa apenas a faria suspeitar que eu tinha algum motivo subjacente. Isso era particularmente verdadeiro para esses anões, muitos dos quais estavam agindo com muita cautela. Eu só podia imaginar o que tinha acontecido com eles enquanto perambulavam pela terra. Vários deles insistiram que criar dívidas era uma má ideia. Visitei-os várias vezes, cada vez explicando novamente minhas circunstâncias na esperança de ganhar confiança.

Quando inclinei minha cabeça para eles pela enésima vez e disse que precisávamos deles, seu líder, um homem chamado Agnarr, falou.

— Eu acho, — ele disse, — se este homem nos trai… nenhum de nós pode ser culpado por ter acreditado nele. O que vocês acham, pessoal?

Lembrei-me de ter ficado muito feliz com essas palavras.

Não muito depois, foram construídas oficinas de todos os tipos; o ar se encheu de sons de martelos, serras e teares; e fogueiras queimadas em fornos.

Depois que as oficinas foram criadas, as pessoas abriram lojas voltadas para as pessoas que lá trabalhavam. À medida que a lista de itens embarcados para Veleiro Branco ficava mais longa, também aumentava o número de navios que iam e vinham pelo grande rio. Claro, era um desperdício os navios voltarem rio acima sem carga, então eles começaram a voltar carregados com coisas que achavam que poderiam vender aqui, e depois de vendê-los, eles voltaram rio abaixo carregados com produtos desta cidade.

Bens e dinheiro mudaram de mãos repetidamente, e isso foi acompanhado por um influxo de pessoas. A essa altura, este lugar que antes era uma cidade semi-submersa estava rapidamente se tornando um centro de comércio fluvial. Navios transportando madeira e artigos de couro navegavam rio abaixo com as toras, e navios carregados de produtos vinham rio abaixo, com as velas balançando com o vento.

Mais e mais casas apareciam a cada dia, e os sons dos martelos e serras dos artesãos nunca pararam até o sol se pôr. Fiquei muito feliz com tudo isso.

— Bem, então, vamos voltar?

— Tá!

As pessoas agora chamam esta cidade de “Porto da Tocha”.


 

Tradução: Erudhir

Revisão: Merciless

 

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