Dark?

O Começo Depois do Fim – Cap. 458 – A Criança de Lady Dawn

Todos os capítulos em O Começo Depois do Fim
A+ A-

 

POV CECÍLIA

 

Enquanto observava a fênix cair, com o núcleo sobrecarregado, a reação o arrancando da consciência, uma lembrança que não era a minha ficou embaçada em minha mente: um menino correndo e rindo, seus olhos heterocromáticos, um laranja ardente, o outro azul gelado, brilhando de alegria e admiração. Agora, aqueles mesmos olhos vazios voltaram para dentro de sua cabeça enquanto ele caía em queda livre.

Estava olhando para o filho de Lady Dawn, não havia dúvida. O sabor de sua mana permaneceu em meus sentidos, criando uma espécie de ressonância com a dele. Eu podia sentir a conexão deles, agora fazia parte dela, como se houvesse dois ímãs nos ligando.

Junto com a conexão, vieram emoções que também não eram minhas: proteção, desespero e uma fúria brilhante e intensa.

Não eram emoções minhas. Pensei com amargura em todos os pensamentos, memórias e ideias que haviam sido enfiados em minha cabeça desde que reencarnei. Não se trata de alguém com quem me importo.

Controlando firmemente os instintos maternais que estavam surgindo, eu os reprimi, enterrando-os.

Khoriax se abaixou e agarrou a fênix inconsciente pela parte de trás de suas roupas. Ele me lançou um olhar questionador para onde eu estava escondida, entre os galhos fumegantes de uma árvore de folhas largas. Abri a boca para falar, mas antes que as palavras saíssem de mim, o mundo explodiu em um inferno de fogo.

As chamas iniciadas pela batalha rugiram para o céu, pintando o mundo em um vermelho que queimava como um sol poente. O ar queimou meus pulmões, transformando-se em fumaça e fogo. Minhas roupas fumegavam e pequenas chamas saíam da barreira protetora de mana que envolvia meu corpo. Até mesmo meus sentidos pareciam queimar sob a mana crescente, como se estivesse olhando para o sol.

Estendendo a mão, agarrei a mana e tentei reprimi-la… mas a vontade que a controlava resistiu, fazendo-me recuar.

— Mas… como? Quem? — ofeguei alto, espantada.

Um homem desceu até o inferno. O vento que rugia repentinamente parecia mal agitar seus cabelos, assim como a fumaça não conseguia cegar seus olhos amarelos.

As quatro Assombrações sobreviventes enfrentaram o homem, mas estavam tendo ainda mais dificuldade para resistir aos efeitos do feitiço. Eles trocaram olhares incertos e lançaram olhares de busca para as árvores em minha direção.

— Servos de Agrona. — A reverberação da voz do homem de repente me disse quem ele era, sua identidade estava contida nas memórias compartilhadas por Lady Dawn. — Sua hostilidade em meu próprio domínio não será tolerada. Este lugar e todos que estão nele estão sob minha proteção — disse Mordain, do clã Asclepius, com firmeza. — Vocês testam minha neutralidade juramentada ao atacar aqui. Devolvam-me esse membro do meu clã e vão embora.

A foice de Khoriax se reformou em suas mãos e ele pressionou a lâmina contra a garganta de Chul.

— Parece que hoje está chovendo fênix sobre nós. Que conveniente. Pare de canalizar esse feitiço maldito e se entregue, ou abrirei a garganta desse garoto e…

Enormes garras de fogo se manifestaram a partir do calor que queimava a atmosfera, envolvendo Khoriax. As garras queimaram sua mana e sua carne, transformando-o em carne carbonizada antes mesmo que pudesse gritar. O fênix mestiço caiu sobre a garra, ileso.

Eu ainda estava escondida, meu controle de mana garantindo que não pudesse ter a presença sentida até mesmo para alguém tão poderoso como esse homem. Estava preocupada que as Assombrações pudessem me denunciar, mas os três restantes mantiveram o foco em Mordain, com suas defesas levantadas, mas sem fazer nenhum movimento para atacar.

De repente, a árvore na qual me escondia foi engolfada por um fogo que eu não podia controlar nem sustentar. Reagindo instintivamente, saltei no ar e voei para longe das chamas, com a pele vermelha e dolorida mesmo sob minha mana protetora.

— O Legado… — disse Mordain. Seus olhos amarelos brilhantes estavam fixos em mim, suas vestes ondulando ao seu redor e se fundindo com a fumaça. — Nem mesmo você pode se esconder de mim dentro de meu próprio feitiço de domínio. Não teste seus limites contra minha paciência.

Minha mente estava confusa. Eu não sabia o que fazer. Essa fênix era poderosa, seu domínio sobre o mana era de ferro. Os dragões ainda se aglomeravam na Clareira das Bestas, portanto, mesmo que eu o derrotasse, conseguiria fazer isso rápido o suficiente para voltar à minha tarefa sem chamar a atenção deles?

Não vale a pena o risco, disse a mim mesma, esperando estar agindo logicamente, como Agrona faria, e não por medo.

— Assombrações, venham com…

De repente, meu corpo ficou rígido, pois uma força dentro de mim se impôs contra meu controle. Minha mão se ergueu por vontade própria, estalando para a frente e soltando um cipó em forma de chicote que havia se enrolado em meu pulso.

O chicote esculpiu o espaço entre Mordain e eu, um crescente verde que parecia estar se movendo em câmera lenta. A ponta da videira explodiu em chamas, que correram ao longo de sua superfície, escurecendo o verde-esmeralda de sua carne.

O chicote se transformou em cinzas bem perto da garganta de Mordain.

Sua expressão se contraiu levemente, mas ele não se moveu para contra-atacar, a hesitação transparecendo em seu rosto por uma fração de segundo.

Cerrando os dentes até rangerem, forcei meu corpo a se submeter novamente, quebrando a perda momentânea de controle, depois girei e voei a toda velocidade, saindo do limite do feitiço de domínio e voltando para o céu azul e o vento frio.

O que, em nome de Vritra, você estava tentando fazer? — rosnei para dentro de minha própria cabeça.

Tessia não respondeu imediatamente, então me apressei em colocar distância entre mim e Mordain. As três Assombrações tinham ficado para trás, esforçando-se ao máximo para me acompanhar.

Olhando por cima do ombro, percebi que o feitiço de domínio de Mordain era uma esfera que envolvia tudo dentro dela em puro mana de atributo de fogo. Dentro dessa esfera, sua própria mana empurrou toda a mana atmosférica, ampliando seus feitiços e seu controle e diminuindo o de seus inimigos.

Você achou que ele poderia nos derrotar ou nos matar, não é? Dentro desse terreno infernal que ele criou. Decida-se, por favor? Afinal, você quer viver ou morrer? Você ao menos sabe?

Não, eu não quero morrer — disse Tessia suavemente, suas primeiras palavras para mim desde que entramos em Dicathen. — Mas não posso deixar de me perguntar se sou covarde por não me esforçar mais para que isso aconteça. Para ferir Agrona e manter Arthur e todos a salvo, você precisa morrer.

Parei de repente, com um calafrio percorrendo minha espinha.

O feitiço de domínio de Mordain caiu. Por um momento, a presença de ambos os asuras foi cristalina, então a mana atmosférica pareceu engolir suas assinaturas enquanto Mordain encobria Chul e a si mesmo de mim.

E mesmo assim… algo ainda estava lá. Não havia sentido suas assinaturas de mana, mas… a ressonância que sentia agora com Chul não podia ser tão facilmente disfarçada.

Reunindo minha própria mana, empurrei uma esfera condensada e a lancei para frente na mesma velocidade em que eu estava voando.

— Sigam enquanto o feitiço durar, depois voltem para os outros e retomem sua caçada.

As três Assombrações me lançaram olhares semelhantes de confusão. Quando acenei para que seguissem em frente, não hesitaram e se afastaram rapidamente, seguindo o sol em miniatura que agora caía sobre a copa das árvores da floresta.

Deslocando-me sob a cobertura das árvores, comecei a voltar lentamente na direção em que as Assombrações haviam lutado contra Chul. O vento carregava o cheiro de fumaça, e havia um fluxo consistente de mana atmosférica de volta ao vazio deixado pelo feitiço de domínio.

A raiva brotou dentro de mim: raiva de mim mesma por ter que fugir de Mordain e por permitir que Tessia assumisse o controle.

Se seu objetivo era matar nós duas, deveria ter me deixado morrer durante minha integração — gritei para a elfa enquanto procurava a ressonância.

Foi fácil para você? Quando você se matou na espada de Grey? — Ela respondeu, com a voz carregada de amargura e arrependimento.

Mastiguei a parte interna da bochecha, tomando cuidado para manter minha mana sob controle, com medo de que Mordain a percebesse.

Mesmo assim, consegui, não consegui?

Sim, você conseguiu. Mas você fez isso para escapar, para fugir do que não podia suportar. — Um pouco de silêncio se prolongou antes que ela falasse novamente, com seus pensamentos cada vez mais confiantes. — Não queria morrer naquela época e não quero morrer agora, mas estou tentando fazer o que posso para ajudar, para lutar, diferente de você.

— Só porque você conhece minhas lembranças, não significa que saiba o que eu passei — disse, interrompendo minha busca. — Você não faz ideia do que tive de suportar… ou do que estou disposta a fazer para garantir que Nico e eu tenhamos a vida que merecemos.

Com a determinação renovada, parei por um momento para alinhar minha assinatura de mana com a mana ambiente ao meu redor e voltei a rastrear Chul, deixando que a leve atração de seu núcleo me guiasse. Avancei com cuidado, voando silenciosamente pela rede inferior de galhos, com toda a minha atenção voltada para aquele pequeno puxão à distância.

De repente, a conexão com a mana de Chul foi completamente cortada. Senti um pico de medo quando a adrenalina me invadiu e aumentei minha velocidade, visando o último lugar onde a havia sentido. Meus pensamentos começaram a se misturar, mas tentei deixar minha mente em branco novamente, lembrando-me apenas da sensação de onde aquele puxão havia estado antes de ser bloqueado.

Diminuí a velocidade mais uma vez quando me aproximei do ponto em que pensei ter perdido a conexão e me acomodei nas raízes de um carvalho gigante com casca prateada.

Deve ser aqui perto, pensei, quase esperando uma confirmação relutante de Tessia.

A Clareira das Bestas inteira estava ressoando com o eco de toda a mana derramada entre Epheotus e Dicathen, mas também havia várias fontes de magia de encobrimento em ação na floresta. Agora, tão perto, podia sentir as bordas de tal feitiço, ou melhor, muitas camadas do feitiço. Era sutil, intencionalmente quase indetectável, mas eu podia ver a mana, sentir a forma como o feitiço de envoltório pressionava as partículas atmosféricas, sentir o gosto da complexa compressão, sentir o cheiro daquele atributo único que tornava a mana das fênix diferente.

O feitiço de Mordain era poderoso; tinha que ser. Ele estava escondendo seu povo de Agrona Vritra e Kezess Indrath há séculos. Contudo, o que importava mais do que o poder era o controle, e o meu era maior do que o de qualquer um deles.

Fechei os olhos e estabilizei minha respiração. Minha própria mana estava em perfeito equilíbrio com a atmosfera, escondendo-me de qualquer pessoa que pudesse, por sua vez, estar procurando por mim. A madeira queimada era áspera e fria contra minhas costas. O aroma rico e esfumaçado de suas folhas me fez lembrar a preparação de um chá. O vento carregado de mana enviou ondulações através de suas folhas, que se esfregavam umas nas outras com ecos sobrepostos de arranhões suaves.

A árvore estava respirando. Eu podia sentir sua vida, sua energia. Os membros se erguiam muito alto no ar, espalhando-se e buscando o sol e a mana, enquanto as raízes se enterravam profundamente no solo. Era quase lindo como a árvore absorvia o sol, a água e a mana atmosférica e, mesmo sem um núcleo, purificava essa mana em outra coisa, algo novo, uma forma desviante de atributo planta exclusivamente sua.

Essa mana se espalhava por todo o local, infiltrando-se no solo, misturando-se com a mana do atributo terra e dando-lhe vida e energia. Conseguia sentir isso em cada galho, folha e raiz. As raízes dessa árvore, assim como de todas as outras nessa parte da Clareira das Bestas, pareciam crescer em um ângulo como se estivessem sendo atraídas por algo. Não se espalhavam uniformemente, mas eram puxadas em uma direção, mergulhando mais fundo do que qualquer outra árvore próxima.

Deixei meus sentidos se infiltrarem, seguindo a mana desviante até as raízes, que se espalhavam e se entrelaçavam, então senti os feitiços de cobertura passando por mim como um véu que se abre enquanto eu a seguia, cega para tudo, exceto a mana de atributo planta. Quando minha consciência ultrapassou as camadas de proteção, de repente senti novamente as assinaturas de mana específicas de Mordain e Chul… além de muitos outros.

Meus lábios se puxaram para formar um sorriso enquanto eu limpava a gota de suor que ameaçava rolar em meus olhos.

 — Está vendo agora? Isso era inevitável desde o início. O seu propósito, seu destino era ser o receptáculo para minha reencarnação pensei presunçosamente.

— Se for esse o caso, estou ansiosa para ver o destino que a aguarda, uma covarde com medo demais para enxergar a verdade: que você não passa de uma arma, uma ferramenta de destruição — respondeu Tessia, com uma voz insuportavelmente piedosa. — Se o que você espera se tornar realidade, posso te garantir que não será conquistado por meio da vitória. Será por misericórdia.

Meus punhos se cerraram, pois cada fibra do meu ser não queria nada mais do que apagar sua presença da minha mente como uma vela, mas o controle que eu tinha sobre a mana além do escudo de Mordain ameaçava se soltar.

Voltei meu foco para a tarefa em questão, deixando minha mana permear as raízes dentro das paredes esculpidas do santuário das fênix, avançando cuidadosamente como se estivesse andando em uma corda bamba até que…

— …precisa agitar seu núcleo, incentivá-lo a absorver a mana. Acenda as tochas e traga-me cristais de mana e elixires. Tudo o que tivermos!

Era a voz de Mordain. Apertada com uma ponta de pânico, não mais a tempestade controlada de poder que havia me mostrado antes. Uma dúzia de outras conversas vibrou no solo e nas raízes das árvores, mas as bloqueei, concentrando-me apenas em Mordain.

Estamos perdendo ele disse outra voz, ligeiramente rouca e hesitante. Seu núcleo mal está extraindo mana, e os membros que perdeu…

Obrigado, Avier disse Mordain com firmeza, cortando a segunda voz.

POV MORDAIN ASCLEPIUS

Avier se acomodou novamente em seu poleiro para observar em silêncio, com as penas levemente eriçadas, mas não podia me dar ao luxo de dar mais atenção a ele. Haveria tempo para gentilezas e pedidos de desculpas mais tarde. Depois…

Mana jorrou de minhas mãos, o calor se espalhando pelo ar entre mim e Chul. Soleil e Aurora, dois membros do meu clã, fazendo o mesmo que eu, suas manas se juntaram à minha enquanto tentávamos agitar o núcleo de Chul, mas, embora sua pele tenha se avermelhado sob o calor, seu núcleo permanecia opaco e dormente.

Ele não estava mais processando mana. Mesmo dormindo ou inconsciente, seu núcleo deveria ter continuado a absorver e purificar a mana para sustentar seu corpo físico, mas ele se colocou profundamente em reação enquanto seu corpo estava em um estado de quase morte. Grande parte de sua mana foi usada para apoiar e curar a si mesmo, e não sobrou nada para curar a tensão resultante em seu núcleo. Como um coração que parou de bater, tivemos que encontrar uma maneira de fazer sua mana fluir novamente, caso contrário…

Olhando ao redor da sala, tentei me lembrar das lições de minha juventude. Fazia muito tempo que não precisava curar feridas de batalha.

Uma única cama foi colocada no meio de uma pequena câmara no ninho central do Santuário Devido aos nossos esforços e ao fogo aceso na lareira, estava muito quente. Fiquei de um lado da cama de Chul, enquanto meus dois membros do clã ficaram aos pés e à cabeça de Chul, respectivamente. Avier se empoleirou em uma prateleira fixada na parede em sua forma de coruja verde, com seus grandes olhos acompanhando cada movimento nosso.

Chul estava inconsciente na cama entre nós. A última gota de sua mana havia sido usada para queimar suas próprias feridas, de modo que havia pouco sangue, mas a visão dele tão rasgado e dilacerado, sem a perna e o braço, foi suficiente para fazer meu velho coração se apertar dolorosamente. Quando o deixei ir para essa batalha com Arthur, nunca imaginei que voltaria para nós dessa forma.

Eu deveria ter sido mais cauteloso, pensei cansado. Havia mais em jogo do que a vida de um membro do clã. Eu precisava de Chul, precisava entender o que ele tinha visto e experimentado desde que deixou o Santuário. Ele era meus olhos no mundo para ver sua forma atual, a bússola com a qual encontraria a verdade dos eventos que se desenrolavam em ambos os continentes.

Fechei os olhos e soltei o suspiro sincero de um velho.

Olá novamente, Arthur disse Avier, e meus olhos se abriram.

Arthur Leywin estava na entrada, olhando atônito para o corpo de Chul. Eu não o senti entrar no Santuário. Escondendo minha surpresa, o recebi.

Que truque do destino o traz aqui neste momento? perguntei, observando-o atentamente em busca de algum sinal de suas intenções.

O que aconteceu? perguntou ele, aparentemente desnorteado.

Eu… As palavras me faltaram, e minha compostura se desfez, minha intenção de esconder a profunda dor que senti com meu próprio fracasso se esvaiu à medida que minhas feições tremiam. Tive que chamar Chul de volta ao Santuário, mas não sabia da presença do Legado na Clareira das Bestas. Ela o atacou com um grupo de basiliscos mestiços, acho que se chamam Assombrações. Você… chegou bem a tempo de se despedir de Chul. Não posso salvá-lo. — Mesmo quando disse as palavras, entendi que eram verdadeiras. Não havia mais nada que pudesse fazer pelo filho de Dawn.

Por que você… espere… Arthur pareceu se esforçar por um momento para entender o que eu havia dito. Como assim, você não pode salvá-lo? Esses ferimentos parecem ruins, com certeza, mas ele é um asura… ou pelo menos metade. Ele é… Então ficou quieto, com o olhar fixo em Chul.

Eu sabia o que ele estava vendo.

Seu corpo está muito fraco e ferido para se sustentar. Com tão pouca mana, ele não apenas está horrivelmente ferido, mas seu corpo está faminto enquanto tenta se curar. Não conseguimos alterar o estado de seu núcleo, e nenhum elixir que usamos foi absorvido adequadamente.

O desequilíbrio entre a força de seu físico e seu núcleo disse Arthur suavemente. Suas sobrancelhas se franziram e ele me lançou um olhar feroz. Você disse que o Legado… fez isso?

Apoiei minha mão na testa ardente de Chul, lembrando-me da sensação de sua vontade batendo contra a minha. Sabendo que não era o momento de contar toda a história, apenas assenti com a cabeça.

Arthur se aproximou da mesa. Suas mãos estavam fechadas em punhos brancos ao lado do corpo.

Ele não deveria estar sozinho. Deveria estar em Vildorial com minha irmã… Seus olhos se iluminaram quando ele teve um pensamento repentino e desesperado.  Ellie! Ela pode manipular a mana, empurrando-a diretamente para o núcleo. Talvez ela possa…

Assenti com a cabeça, já sabendo o que ele pretendia sugerir.

Embora seja improvável estimular um núcleo tão enfraquecido e sem reação, eu tentaria com prazer, tentaria qualquer coisa, mas… simplesmente não há tempo, Arthur. Quando conseguirmos trazê-la de Vildorial, Chul já estará…

Vocês têm que ter alguma maneira de… vocês são fênix, droga disse Arthur, com o olhar afiado de raiva genuína. Por que caralhos você o mandou sozinho para lá, Mordain? O que estava pensando?

Eu sabia que ele estava falando por medo e frustração por seu amigo, então não levei suas palavras a sério, aceitando seu peso e não sentindo nenhuma amargura em relação a ele. Quando falei, tomei cuidado com cada palavra, não querendo causar-lhe mais dor naquele momento.

Achei que a necessidade era grande, Arthur, mas você tem razão em ficar chateado comigo. Foi minha própria impaciência que trouxe Chul ao seu estado atual. E sinto que sua frustração só aumentará à medida que você souber de tudo.

Os outros asuras disse Arthur de repente, mudando a conversa. Certamente os dragões, ou Kezess, teriam uma magia capaz de curar até mesmo essas feridas, certo?

Não pude evitar a expressão de tristeza que se instalou em minhas feições.

Talvez. As artes vivum dos dragões podem ser bem potentes, mas quando um asura não consegue mais absorver mana, há pouca coisa que mesmo os mais poderosos feitiços de cura ou elixires possam fazer. A reação adversa em um asura é rara, Arthur. Temos mana suficiente em nossos núcleos para evitar isso em todas as situações, exceto nas mais terríveis.

Tem que haver alguma coisa disse Arthur, passando a mão pelos cabelos, com os olhos arregalados. Talvez… Ele fez alguma coisa, alguma magia com seu éter que não conseguia sentir, então começou a jogar itens na cama ao lado de Chul. Tenho elixires e todo o tipo de coisas que peguei em minhas viagens, só para garantir. Aqui, dê uma olhada em tudo. Que tal isso? Ele segurou um pequeno frasco de um líquido rico em cor de ameixa. Ou talvez estas? Espalhadas no colchão estavam três escamas verdes desbotadas, cada uma do tamanho de uma concha de molusco.

Soleil se inclinou para frente, olhando com os olhos arregalados da pilha de tesouros para Arthur e depois para mim. Arthur lhe lançou um olhar esperançoso.

Movendo-me ao redor da mesa para ficar ao seu lado, peguei os artefatos e os afastei.

Simplesmente não é suficiente. Nem perto, mas você já sabe disso.

Ele pareceu se esvaziar, pegando os objetos e fazendo-os desaparecer novamente em algum tipo de armazenamento dimensional. Ele procurou meus olhos, mas não pude ter certeza do motivo. Talvez haja algum significado na morte de Chul? Ou na verdade… e pensando nisso, percebi algo.

O que você está fazendo aqui? perguntei, esperando que minha voz soasse gentil. Você não poderia saber sobre Chul, então por que veio?

Ele ignorou a pergunta.

Isso realmente importa neste momento? Era… importante, mas primeiro precisamos… precisamos… Seus olhos se arregalaram mais uma vez e, novamente, ativou seu armazenamento dimensional. Elixires! Quase me esqueci de que ele os chamou de elixires poderosos.

Senti minhas sobrancelhas se erguerem.

Ele? Quais elixires? Arthur, eu…

Um suspiro saiu de mim antes que pudesse evitar, enquanto olhava para os três objetos que ele segurava frouxamente na mão. Movendo-me rapidamente, mas com cuidado, envolvi as mãos dele com as minhas e pressionei gentilmente seus dedos para que se fechassem firmemente em torno das três pérolas azuis brilhantes.

Cuidado, Arthur, cuidado! Sua expressão era pensativa ao observar minha reação, como se estivesse avaliando-a em sua mente. Você sabe o valor do que está carregando?

Arthur retornou meu olhar incerto com uma clareza e um propósito que me surpreenderam, mesmo vindo de alguém como ele.

Quando tentei dá-las antes, um senhor asurano se recusou a aceitá-las porque eram valiosas demais para serem aceitas. Não sou idiota, Mordain, sei como essas pérolas devem ser preciosas, mas tudo o que me importa agora é se elas o ajudarão ou não.

O que são elas? Avier perguntou com curiosidade, virando a cabeça para o lado.

Soleil e Aurora também estavam olhando para mim sem entender. Jovens, tão jovens, todos eles, pensei, triste por aqueles que estavam em meu lugar não conhecerem mais as Lágrimas da Mãe… e ainda assim hesitante em contar a história a qualquer um deles.

Olhando para Chul, pude ver o pouco de mana que ainda restava em seu corpo queimando rapidamente. Seria correto contar tudo a Arthur antes de aceitar uma em nome de Chul. O peso de seu sacrifício não deveria ser feito por ignorância, mas… Engoli pesadamente, procurando nos olhos de Arthur a verdade de sua intenção.

Por fim, assenti e peguei uma única pérola entre dois dedos, tirando-a levemente da palma da mão de Arthur.

Acredito que sim, embora não tenha visto uma sendo usada em muitos e muitos anos. Meu foco mudou para Soleil. Vá, encontre-me a faca de prata mais afiada. Rápido!

Arthur deu um passo à frente e se inclinou sobre Chul, então uma lâmina de poder ametista vibrante se condensou em sua mão na forma de uma adaga.

Eu faço isso. Apenas me diga o que precisa ser feito.

Arrastei meu dedo ao longo da pele ardente do peito de Chul, acima de seu esterno.

Precisamos cortar o núcleo dele. Abra o núcleo o suficiente para inserir a pérola.

Não houve surpresa ou hesitação em seus gestos. Em vez disso, ele apoiou uma mão no peito de Chul enquanto a outra guiava sua lâmina conjurada graciosamente ao longo da dobra acima do esterno de Chul. A lâmina ametista separou a carne, o osso e até mesmo o exterior resistente do núcleo tão fácil como se estivesse cortando pão. Era necessária apenas uma única passagem.

Movimentando-me tão lentamente que parecia quase doloroso, desci a esfera azul brilhante por baixo da pele de Chul até o próprio núcleo e me afastei rapidamente; Soleil e Aurora fizeram o mesmo.

Arthur nos copiou tardiamente, seu olhar se movendo para frente e para trás entre mim e o ferimento no esterno de Chul.

Está funcionando?

Saberemos em um instante. Até lá, tudo o que podemos fazer é esperar.

O silêncio permaneceu enquanto todos nós observávamos, igualmente incertos quanto ao resultado. A paz e a calma se instalaram na tensão profundamente arraigada, ajudando a rompê-la. Tudo o que poderia ser feito já foi feito, agora tudo o que podíamos fazer era esperar.

Você disse que… Cecília fez isso? Arthur perguntou depois de um minuto ou mais.

Seus soldados o fizeram expliquei, sentindo uma ponta de raiva invadir a paz do momento. Ela ficou escondida. Acredito que seu objetivo era que ninguém descobrisse sua presença em Dicathen hesitei. Havia algo… estranho neste encontro. Ela… me atacou, mas foi um esforço fraco, e pareceu ter sido pega de surpresa por sua própria tentativa. Então fugiu.

Arthur estava em silêncio e contemplativo, mas não respondeu.

Considerei tudo o que havia acontecido, a improbabilidade de tudo, desde a presença do Legado até a chegada de Arthur com as pérolas.

Diga-me, Arthur… Preciso saber como você conseguiu essas pérolas. Você as roubou? Tomou à força? Alguém as ofereceu a você em troca de algo? Se…

Ele pareceu surpreso e afrontado, olhando para as outras fênix e para Avier.

Não! Veruhn… O senhor Eccleiah as deu para mim. Presumi que fossem um presente a ser dado ao clã Matali, mas eles recusaram.

Entendo disse sem querer interrompê-lo. Lorde Eccleiah… Não vou fingir que entendo o que ele estava pensando. Ter presenteado você não com uma, mas três dessas coisas, e sem nem mesmo explicar o que eram… Balancei a cabeça, mal acreditando naquilo. Veruhn está jogando um jogo perigoso. Estou surpreso que Kezess tenha permitido que você deixasse Epheotus com isso. Estão acontecendo coisas que não entendo.

Meu senhor Mordain chamou Aurora em sua voz baixa. Quando olhei em sua direção, ela continuou. O que essas pérolas… fazem? O que as torna tão valiosas?

Lágrimas da Mãe… um ritual leviatã. Fiz um gesto para Arthur, e ele levantou as outras duas. Criadas a cada mil anos, talvez menos. É extremamente raro que um asura morra na infância, antes mesmo de nascer. Uma tragédia inacreditável. Minha garganta ficou áspera, minha voz rouca. Os leviatãs… há muito tempo descobriram um processo pelo qual… decompõem o corpo do bebê, mas mantêm seu núcleo.

“Contida em um núcleo leviatã imaturo, toda a mana que deveria formar e construir uma nova vida, sustentando um bebê enquanto ele aprende a manipular a mana por si mesmo. Uma vida. Isso é o que cada pérola contém. Uma nova vida.”

Não entendo o que isso significa disse Arthur, com a voz suave.

As pérolas de luto são o maior presente que o senhor da raça leviatã pode oferecer. Ele as concede apenas raramente, e somente para aliviar o grande sofrimento de uma vida que deve ser vivida, entende? Senti minha boca se curvar em uma carranca cada vez mais profunda a cada palavra. A história de Epheotus é rica em contos de príncipes, reis, profetas e grandes heróis que foram salvos da morte certa por uma dessas pérolas, mas cada uma delas é comprada com uma vida não vivida, um bebê que não pôde ser salvo. Nunca é uma troca feita levianamente.

Três mil anos de pérolas… murmurou Arthur. Ele as rolou gentilmente e depois as fez desaparecer de volta em seu armazenamento dimensional, pensei que talvez estivesse começando a entender o peso de sua decisão. Ele se sacudiu um pouco. Não importa. Ainda não sei o que o Senhor Eccleiah quer para ter me dado isso, mas, independente de seu valor, se puder salvar esse simplório faminto por batalhas de…

Ele se afastou enquanto a luz azul se refletia em seus olhos dourados. A mana estava começando a fluir da pérola. No início, era apenas um gotejamento, depois, um riacho. Em poucos instantes, um rio de mana jorrou.

Uma luz azul-branca, tão brilhante que tive de desviar o olhar, brilhou do corte no peito de Chul. Derramando-se para fora dele, fervendo sobre sua carne antes de ser absorvida novamente por suas muitas feridas, envolvendo-o em uma luz líquida de mana pura. Suas feridas se fecharam, foram limpas como se não passassem de manchas de sangue em sua pele, então, lentamente, o braço e a perna que faltavam começaram a se regenerar.

Eu mal podia acreditar. O mana de um nascimento, uma vida, um… renascimento. Sabia que Chul mudaria, mas não tinha certeza de como. Rejuvenescido não apenas por essas feridas, mas por uma vida inteira de crescimento e desgaste.

Não senti isso… Arthur sussurrou. Como pode haver tanto mana escondido nisso?

Na cama entre nós, o peito de Chul se expandiu lentamente enquanto ele respirava fundo. A tensão diminuiu em seu rosto e o manto de mana começou a escurecer à medida que voltava para sua carne, preenchendo-o mais uma vez.

Seu núcleo está… consertado disse Arthur, com a voz tensa.

Meu olhar se voltou para o rosto dele, que estava cheio de emoções conflitantes. Seus dedos se cravaram em seu próprio esterno, pressionando com força suficiente para embranquecer os nós dos dedos, eu podia entender.

Ele limpou a garganta e deu um tapinha suave no braço de Chul.

Fiz o que pude, meu irmão em vingança. O resto agora é com você.

 


 

Tradução: NERO_SL

Revisão: Crytteck

 

💖 Agradecimentos 💖

Agradecemos a todos que leram diretamente aqui no site da Tsun e em especial nossos apoiadores:

 

  • decio
  • Mygirl
  • S_Eaker
  • Abemilton Filho
  • Alan Forma Perfeita
  • Alerrandro Adrian
  • Blscat
  • Caio Kapps
  • Carlitoos
  • crytteck
  • Darkïnn
  • dieguim
  • dlvzin64
  • dogju_
  • dylanoliveira
  • experiencelain
  • feijoada36
  • Hashura
  • igor.ftadeu
  • jaokz_
  • Jean Marcos
  • juba87
  • karaboznolm
  • kevinof
  • kicksl
  • Krocks
  • Lessandro
  • Luca Neves
  • MackTron
  • MaltataxD
  • marceloaugusto
  • matheusunicornio
  • miguelx1122
  • mota_1303
  • nesovershennyy
  • nicholasjorge_br
  • Nivalís
  • nskn
  • pedroernestoa_68175
  • ph182
  • rian rrg
  • Roque
  • ruan_angelo
  • Silas
  • Teixeira
  • terasu
  • Wylla
  • xandellicia
  • XeeRoX
  • ZaionXD
  • zDoctorH
  • ! Rafaelpla
  • “L”
  • alexsander_309
  • augustokkjk
  • Enrig
  • fb2272
  • Mucego1991
  • SrYuke
  • vapor.train
  • zedopessego

 

📃 Outras Informações 📃

Apoie a scan para que ela continue lançando conteúdo, comente, divulgue, acesse e leia as obras diretamente em nosso site.

Acessem nosso Discord, receberemos vocês de braços abertos.

Que tal conhecer um pouco mais da staff da Tsun? Clique aqui e tenha acesso às informações da equipe!

 

 

Tags: read novel O Começo Depois do Fim – Cap. 458 – A Criança de Lady Dawn, novel O Começo Depois do Fim – Cap. 458 – A Criança de Lady Dawn, read O Começo Depois do Fim – Cap. 458 – A Criança de Lady Dawn online, O Começo Depois do Fim – Cap. 458 – A Criança de Lady Dawn chapter, O Começo Depois do Fim – Cap. 458 – A Criança de Lady Dawn high quality, O Começo Depois do Fim – Cap. 458 – A Criança de Lady Dawn light novel, ,

Comentários

Cap. 458