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O Começo Depois do Fim – Cap. 358 – Relíquia de Sangue III

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POV CAERA DENOIR

Meu olhar estava fixo nas costas de Grey enquanto andávamos pelo labirinto, em silêncio, exceto pela bajulação constante de Kage. Apesar de que agora Grey parecia perfeitamente bem, era difícil ignorar a memória dele deitado imóvel, com a sua garganta cortada…

Fechei meus olhos com força, piscando para esquecer essa imagem, me concentrei na tagarelice constante vindo de Kage enquanto nos guiava em direção ao portal de saída que tinham escondido.

— … não é realmente minha culpa, entende? Quando o Rato viu como as pessoas apenas iriam embora depois de um tempo, depois de decidirem que a relíquia não poderia ser reivindicada, apareceu com a ideia de fechar o portal e forçar as pessoas a ficar. Simplesmente concordei… o que mais eu poderia ter feito?

— E você também foi forçado a fazer as ascendentes mulheres que entraram nessa zona de brinquedinhos?

A forma grande e bruta de Kage se encolheu sob o meu olhar apesar do fato de que nós não tínhamos nos incomodado em restringi-lo com algemas de contenção de mana. Mesmo assim, ainda estava com espírito de luta, eu podia sentir sua mana queimando em fúria.

— Continue andando, resmungão

Regis disparou seguindo de perto por trás do ascendente com cicatrizes.

Meus olhos se fixaram novamente nas costas de Grey enquanto se movia quietamente atrás de Regis, deixando o lobo das sombras conduzir Kage até o nosso destino.

Uma frustração desconfortável e revoltante estava fazendo minhas entranhas se embrulharem enquanto considerava de novo o que Grey tinha me pedido para fazer.

Sabia que Kage não era uma ameaça pra mim, mas a verdade era que Grey ainda tinha silenciosamente pedido sua completa confiança. Fui deixada pra trás como garantia, como uma donzela em perigo, um estereótipo de fraqueza e fragilidade contra o qual eu estive lutando minha vida inteira, e Grey esperava que me colocasse em um estado de vulnerabilidade sem mesmo a oportunidade de questionar ou entender o que estava fazendo.

Precisei de toda fibra de autocontrole para me impedir de matar Kage quando tinha sacado um par de algemas de supressão de mana e anunciado que nós estaríamos seguindo atrás de Rato e Grey juntos.

Esfreguei os leves hematomas em meu pulso, as dores incômodas eram um lembrete físico do perigo de confiar demais, algo que nunca tinha me permitido antes. Escolhi esconder minhas habilidades, confiando em Grey que nada de ruim aconteceria comigo.

Nada de muito ruim, admiti enquanto pressionava os curativos contra o corte sangrento na minha palma.

Preocupada com esses pensamentos, quase esbarrei nele, não percebendo que Kage havia parado.

— É bem aqui, certo.

Murmurou, dando a Regis um sorriso banguela, como um servo espancado procurando pela aprovação de seu mestre arrogante.

— Você quer um petisco ou algo assim?

A juba flamejante de Regis tremeluziu com irritação.

— Abra.

Kage ficou pálido antes de levar as mãos para a parede de pedra. A terra tremeu e ruiu para os dois lados, escorregando como lama em um deslize de terra repentino, revelando um túnel escondido. Regis guiou nosso prisioneiro relutante para a passagem, que levava a um beco sem saída. Kage repetiu o feitiço, abrindo uma segunda passagem secreta, que levava a uma terceira, a uma quarta até finalmente chegar numa caverna redonda.

Veias de rocha vermelha brilhante cresciam em um padrão circular no teto, iluminando a caverna com um brilho estranho e banhando o portal com uma luz enferrujada. O portal em si, que ficava bem no centro da sala, parecia uma cortina escarlate caindo através da pedra vermelho-tijolo da moldura.

Nós todos caminhamos ao redor de Kage, que tinha parado completamente no início do túnel, observando-nos com nervosismo. Assim que nossa atenção saiu dele, girou e saiu correndo na direção que havíamos vindo.

Regis o observou ir com uma expressão de leve diversão em sua face de lobo.

Sem nem mesmo olhar pra trás, Grey disse.

— Livre-se dele.

Regis saiu em uma disparada.

Grey parecia já ter tirado Kage de sua mente e sua atenção estava inteiramente no portal. Deu duas voltas em torno dele, encarando a profundeza opaca como se pudesse ver o que estava esperando do outro lado.

Suas roupas estavam rasgadas onde havia sido apunhalado, e manchadas com sangue. Não entendia ainda completamente o que havia acontecido. Grey não tinha explicado como havia desativado o escudo, apenas como havia pego a relíquia e ordenado Kage a nos liderar até o portal. Esteve calado quase o caminho inteiro.

Parou repentinamente e seu olhar se fixou em minha palma machucada.

— Me desculpe por isso.

Flexionei minha mão cortada, que estava enrolada em um pedaço da camisa rasgada de Grey. O machucado queimou, mas não era particularmente profundo e se curaria rapidamente.

— Vou te perdoar se você explicar exatamente o que aconteceu lá atrás.

— Justo.

Ficou pensativo por um momento.

— O comportamento de Rato era incomum para alguém que estava sendo mantido prisioneiro. Pequenas coisas. Mas tudo realmente se encaixou quando vi os glifos e percebi que eles não tinham ideia alguma de como realmente abrir.

— O que você quer dizer?

Grey se curvou e usou poeira do chão para limpar um pouco do sangue manchando suas mãos. Quando olhou pra mim, seus olhos estavam frios e calculistas.

— Pensei sobre o que faria se estivesse na posição deles. Como eu motivaria os ascendentes fortes, por vezes inteligentes, que chegavam nessa zona…

— Mas se você entendeu os glifos imediatamente, por que se deixar ser derrotado completamente?

Os dedos de Grey inconscientemente brincaram com os buracos na sua túnica onde a lâmina de Rato havia machucado ele.

— Porque precisava que ele fizesse isso. Eles estavam certos quanto à necessidade de um sacrifício de sangue, mas tinha que ser de alguém que havia machucado o sangue dos djinn.

Então você o deixou te apunhalar? Quase perguntei, mas já estava reunindo as peças na minha mente. Vilões eram frequentemente previsíveis, afinal. Tudo que Grey tinha que fazer era dar a Rato uma razão para derramar seu sangue, fazendo o próprio Rato a chave para desbloquear a relíquia. Mas então, isso significava…

— Então, você tem o sangue dos magos antigos, dos djinn?

Grey encolheu os ombros indiferentemente.

— Imagino que um bocado de pessoas tenha. Mas as Relictombs me chamaram de “descendente” antes, o que me confirmou que eu tinha um ancestral djinn… Imagino que isso foi suficiente.

Abri minha boca para perguntar sobre essa ancestralidade de magos antigos, mas a fechei lentamente. Embora quisesse saber mais, a julgar pelo jeito que Grey estava ficando cada vez mais impassível e sucinto dava pra dizer que não conseguiria as respostas que almejava. Era muito frustrante o fato que ele continuava a viver atrás desse véu de mistério, mesmo depois que eu tinha mostrado tamanha confiança nele, mas… sabia com o que eu havia concordado quando fizemos nosso acordo.

Um breve momento de silêncio passou antes que eu soltasse uma respiração profunda.

— O que te faz ir tão longe?

As sobrancelhas de Grey se levantaram em surpresa. Ele pigarreou e ficou de pé repentinamente. Ficou quieto tanto tempo que eu não pensava que ia responder, mas então um sorriso triste apareceu nas suas feições, uma expressão que continha tão pouca, mas ainda assim muita emoção.

— Devo isso a todos que deixei para trás: voltar forte o suficiente pra cuidar deles.

Tentei encaixar a resposta dele no mosaico quebrado que era meu panorama da vida de Grey, cheio de lacunas que representavam tudo que eu não sabia sobre ele, mas isso não ajudou muito a resolver o mistério do que o levou a tais extremos.

Antes que pudesse decidir se queria xeretar mais, um grito, seguido de uma voz profunda e retumbante ressoou pelo túnel.

— Só eu posso chama-lo de princesa!

Os túneis tremeram e um pouco de poeira caiu sobre nós. Encontrei os olhos dourados de Grey, bem abertos, e nós dois caímos em uma gargalhada silenciosa.

Balançando minha cabeça, perguntei:

— Então? Você vai dar uma olhada na relíquia ou trapos esfarrapados são uma parte de sua nova imagem agora?

Ele revirou os olhos, mas ativou sua runa dimensional e pegou a relíquia.

Reprimi uma risada enquanto estendia o conjunto de mantos de batalha pesados e antigos. A cor era um marrom cinzento, e já que eram compridos demais para ele, iam ficar se arrastando atrás dele como um véu de casamento.

— Dê uma chance, Grey.

Disse, incapaz de me conter.

— Talvez um lindo vestido para a linda princesa vai te ajudar a esconder sua identidade…

Ele me ignorou enquanto investigava os mantos, seus dedos vasculhando pelas fileiras de runas bordadas. O toque era gentil, um cuidado curioso, podia ver seus lábios se movendo embora não falasse alto. Sabia que devia ser capaz de sentir algo a partir dos robes, embora eu apenas pudesse sentir uma pequena carga de mana dentro deles, pouco mais que o anel que ele usava em seu dedo.

Grey deixou os mantos caírem sobre um braço e pressionou sua mão no tecido.

— Eu acho…

A roupa de batalha desapareceu, deixando para trás uma nuvem vaga de luz roxa que sumiu um momento depois.

— O que aconteceu?

Perguntei, incerta se ele tinha simplesmente guardado a roupa de novo, ou ativado algum tipo de habilidade baseada em éter que eu não podia sentir.

Com os cantos de sua boca se contorcendo, Grey fez algo, um tipo de força mental que aumentou a pressão do ar ao nosso redor e deixou os cabelos da minha nuca em pé, então os mantos reapareceram, envolvendo seu corpo. Ele estendeu seus braços para os lados, examinando o efeito.

Estava ridículo. Abri minha boca para dizer isso a ele, mas congelei. Os mantos estavam se movendo, o tecido seco ondulando como água lamacenta, escolhendo-se para se adaptar ao corpo dele.

A coloração marrom-cinzenta escureceu para um preto brilhante, o tecido pesado que pendia para baixo e se arrastava no chão se separou e se reformou em pernas individuais. A relíquia, que já não se parecia com um manto mais, continuou a ficar mais apertada até que coube em Grey como uma segunda pele. O material se solidificou em escamas pequenas e pretas como piche, que se prenderam à sua pele, destacando seu corpo muscular, mas flexível. Ouro brilhava entre as escamas, correndo pelo seu corpo como tendões brilhantes.

Sabatões com escamas se moldaram ao redor de suas botas, as lâminas sobrepostas estavam unidas por uma malha dourada, levemente visível quando se movia, e ombreiras onduladas se formaram para cobrir seus ombros. Manoplas com garras cresceram sobre suas mãos e antebraços.

O capuz do manto se transformou nas mesmas escamas negras, mas se encolheu para cobrir a garganta, queixo e as laterais da cabeça de Grey, deixado seu cabelo brilhante pendurado sobre a armadura negra e mantendo sua face visível. Assim que eu pensei que a transformação estava completa, chifres de obsidiana se formaram sobre suas orelhas, crescendo para fora da armadura e se estendendo para frente e para baixo, enquadrando sua mandíbula.

Eu me engasguei, soluçando em uma respiração chocada quando percebi que eu tinha esquecido de respirar.

 

POV ARTHUR LEYWIN

Flexionei minhas mãos, que estavam inteiramente envolvidas pelas manoplas com garras, e conjurei uma lâmina etérica. A longa adaga estremeceu, sua forma instável por um momento, mas depois se estabilizou. Podia sentir a pressão dela contra minha palma, desinibida pelas manoplas. Desfazendo a lâmina, levantei meus braços e rotacionei meus ombros, então desferi golpes no ar com uma série de chutes e socos.

A armadura se moveu comigo perfeitamente, deixando meus movimentos desimpedidos.

Uma forma sombria no canto do meu olho capturou minha atenção, eu levantei minha mão para tocar o chifre crescendo do meio-elmo.

— Wow

A voz familiar de Regis disse enquanto galopava de volta para a pequena caverna.

— Que diabos aconteceu enquanto eu estava fora?

Sorrindo para meu companheiro, enviei um pulso de éter para a armadura, e ela desapareceu, se desfazendo em uma nuvem etérica.

Seus olhos se esbugalharam, então ficaram comicamente maiores quando reinvoquei a armadura com uma aplicação mínima de éter. Ela me envolveu como uma sombra, tão leve e bem vestida que eu mal podia senti-la.

— Ayy! Xarás de chifres!

Regis deu uma risada gutural.

— Nós podemos ser o trio de cornos.

Caera cuspiu surpreendida enquanto dava um carão para meu companheiro.

— Nós não vamos nos chamar assim.

Regis me circulou, farejando.

— Está aí, realmente e fisicamente, mas também…

— Uma manifestação de éter. — finalizei por ele.

— Como energia ligada à uma forma física. Curioso. — estendi meu braço.

— Regis, me morda.

Mostrando uma falta preocupante de hesitação, mordeu meu antebraço, seus dentes rangendo contra a armadura. Senti uma pressão, obviamente, mas sem dor. Inclinando minha cabeça para ele, provoquei:

— É o melhor que você consegue?

Rosnando, Regis mordeu ainda mais forte, e a pressão aumentou. Focando no meu antebraço, empurrei éter para fora de minha pele do mesmo jeito que me protegeria com uma barreira etérica. A armadura pareceu reagir a isso, sugando o éter para reforçar suas capacidades defensivas e reduzir a pressão esmagadora.

Regis soltou e deu patadas na sua língua.

— Urghh. É como passar minha língua numa bateria. Minha boca tá toda formigando agora.

Embora estivesse curioso para continuar testando as habilidades dessa nova relíquia, o zumbido baixo do portal de saída estava me atraindo, estava ansioso para ir para a próxima zona e testar a armadura apropriadamente.

— Nós deveríamos ir.

Caera franziu quando deu uma olhada no túnel que chegava nessa pequena caverna.

— E as outras pessoas nessa zona? Não deveríamos…?

— Eu não quero dar ainda mais motivos pra pensarem que fomos nós que pegamos a relíquia. — respondi.

— O túnel que leva até aqui é óbvio o suficiente agora, e eles vão inevitavelmente começar a procurar de novo, agora que Rato e Kage se foram. Vão encontrá-lo.

Caera pareceu incerta, mas se moveu para ficar de pé ao meu lado em frente ao portal.

— Faça sua coisa com a Bússola, então.

Estendi o braço e segurei sua mão, surpreendendo-a. Nós tínhamos simuladores sincronizados para nos manter juntos conforme nós navegávamos pelas Relictombs, mas dessa vez, senti que o destino do portal seria acessível apenas pra mim e queria ter certeza que não fôssemos separados.

— Esse portal já leva para onde precisamos ir.

Assim que Regis voltou pra dentro do meu corpo, nós entramos na cortina escarlate juntos.

Então, nós nos encontramos em uma paisagem dos sonhos bizarra que minha mente lutava para aceitar. Era como o corredor de branco estéril que Regis e eu tínhamos navegado para alcançar a primeira ruína djinn, só que…

Pedaços de paredes e pisos brancos brilhantes flutuavam sobre, ou abaixo, ou dentro, um vazio negro sem fim, esmagado e rasgado, cada parte individual flutuando livremente, algumas girando, outras de cabeça pra baixo ou viradas… mas nas lacunas, quando vistas do canto do meu olho, vi um espaço como uma biblioteca, exceto que, invés de livros nas estantes, havia fileiras e fileiras de cristais com uma coloração arco-íris, e nas facetas dos cristais, imagens se moviam como memórias…

— Grey…

A voz de Caera veio de muito longe, ecoando enquanto se dobrava sobre si mesma, repetindo-se várias vezes, mas não estava ao meu lado. Não tinha certeza de quando ela havia saído, ou mesmo de quando eu havia soltado sua mão.

Com cuidado, dei um passo para frente e minha perspectiva mudou. Caera estava lá, encostada contra uma seção incompleta de parede. O chão abaixo de nossos pés estava girando lentamente, trazendo à nossa visão outra parte do corredor desunido e, bem longe, um vórtex de cristais negros esmagados, que estava pulsando conforme as peças se recombinavam para formar um portão, depois se quebravam de novo, repetindo isso a cada alguns segundos de uma maneira que era difícil de olhar.

— Está tudo bem.

Disse, pegando o braço dela.

— Eu estou aqui.

A biblioteca, ou a visão imaterial dela que havia visto do canto do meu olho, tinha sumido, e em seu lugar havia uma ruína em pedaços, similar àquela na qual havia descoberto a primeira projeção djinn. Assim como a biblioteca, só podia vê-la quando não olhava diretamente. Não sabia como alcançá-la, porque parecia que já estávamos lá.

— O portão. — Regis sugeriu.

— Se conseguirmos chegar nele de alguma maneira.

Os olhos de Caera tremeram e se abriram, ela deslizou seu braço para fora do meu e se endireitou. Estava pálida e suando levemente, mas se segurou contra a desorientação nauseante da zona em colapso.

— Que lugar horrendo…

— Eu não acho que é pra ser—

Olhando para Caera, percebi com uma surpresa de pânico que os seus chifres estavam visíveis.

Temendo que a zona estivesse interferindo com a magia, maneira similar à zona congelada, verifiquei minha nova armadura, encarando as escamas e estendendo minha mão para tocar um chifre… mas a armadura estava intacta. Entretanto, algo na zona estava a afetando, fazendo com que emitisse um tipo de aura que parecia, de algum jeito, estabilizar a área ao meu redor.

Quando abaixei minha cabeça para olhar através da aura estreita, uma zona de um centímetro ao meu redor onde o espaço era forçado de volta ao formato correto, podia ver o corredor inteiro, não quebrado, se envolvendo ao nosso redor.

Com Caera ao meu lado, ela desembainhou sua espada para ajudá-la a manter o equilíbrio conforme caminhava por um corredor que não poderia ver totalmente. Nos guiei pela passagem, usando a imagem filtrada através da aura nebulosa que cercava minha armadura, navegando até que ficássemos de pé diante do portal de cristal negro.

Na minha mente, uma voz quebrada e distorcida disse:

— Entre-bem-vindo-descendente-por favor

Causando uma pontada de dor atrás da minha têmpora direita.

Os milhões de fragmentos do portal de cristal se dobraram para fora desenrolando-se como uma bandeira e dissolvendo-se em um ciclone cinzento. Esperei e me encontrei de repente na biblioteca que tinha visto com o canto do olho, mas nada aconteceu. Em seguida o portão estava se reformando, os fragmentos de cristal reaparecendo e voando juntos novamente.

— Entre-bem-vindo-descendente-por favor

Soou em minha cabeça uma segunda vez, levando a pontada de dor mais fundo.

A voz de Regis soou meio difusa quando disse:

— Nós precisamos fazer algo, chefe. Não acho que Caera vá durar muito aqui.

Caera cambaleava levemente, seus olhos fechados com força contra a dolorosa visão surreal do portão, que se quebrava e se refazia.

— O que está acontecendo, Grey? Eu não aguento abrir meus olhos…

Piscando fortemente e resistindo à agonia lancinante no meu crânio, assisti enquanto o portal de cristal se quebrava e começava a se refazer novamente. Algum instinto de sobrevivência enraizado no meu âmago me avisou pra não passar por aquele portão. Me imaginei capturado em seu loop eterno, separado e reconstruído de novo e de novo até que as Relictombs se degradassem e a zona colapsasse…

Novamente vi um cômodo circular de pedra arruinada no canto do meu olho. Estava tão perto, como se eu pudesse apenas…

Em um instante de percepção, desfoquei meus olhos e procurei pelos caminhos etéricos que eu poderia acessar com o Passo de Deus, mas eles estavam torcidos e amarrados entre si. Se eu estivesse certo, não importaria.

Agarrei o braço de Caera e ativei minha runa divina.

A zona se moldou em um clone da primeira ruína que eu havia visitado, feita de pedra cinza, quebrada e desmoronando em muitos lugares. No centro do espaço estava outro pedestal coberto por runas, ao redor do qual quatro halos de pedra estavam rotacionando. Ou, deveria haver quatro.

Apenas dois halos continuavam suas revoluções lentas. A julgar pela massa de pedra esmagada na base do pedestal, estava claro o que havia acontecido com os outros dois.

Como antes, um pequeno cristal passava bem por cima do pedestal, pulsando com uma luz inconsistente de lavanda. E como antes, algo dentro do cômodo, algo além do cristal, continha uma quantidade monstruosa de éter.

Uma mulher saiu de trás do pilar. Caera levantou sua lâmina defensivamente, mas pus minha mão em seu ombro, tranquilizando-a. Ela me deu um olhar questionador antes de abaixar a arma lentamente.

A mulher havia ignorado Caera completamente. Seus olhos roxos brilhantes estavam travados em mim, ou, mais especificamente, na minha armadura.

Ela mal tinha um metro e meio de altura e era tão fina que parecia frágil. Sua pele era de uma cor rosa-lavanda discreta, seu cabelo cortado curto era ametista, e usava apenas shorts brancos e um top, o que deixava à mostra os padrões entrelaçados de runas de feitiço que cobriam cada centímetro de seu corpo. Ao contrário da primeira projeção de djinn que conheci, que era serena tanto em movimento quanto em atitude, o olhar inabalável e a graça nobre dessa mulher carregavam uma intensidade furiosa que parecia irradiar dela como o calor de uma fogueira.

Ela me deu um sorriso fraco e triste.

— Então alguém recuperou minha criação afinal. Na verdade, esperava que seu templo ficasse imperturbável até o fim dos tempos.

— Sua criação?

Ela inclinou sua cabeça, gesticulando para a armadura que eu vestia.

— Quando ficou claro que o Clã Indrath preferiria destruir nosso povo do que aceitar que nós não daríamos a eles nosso conhecimento de éter, tentei formar uma resistência contra eles. Os muito poucos que estavam dispostos a revidar me ajudaram a forjar essa armadura, mas era pouco demais e tarde demais. Invés de vesti-la eu mesma e avançar sozinha em uma batalha perdida, designei a zona onde você a encontrou, na esperança de que ela algum dia poderia ser reivindicada por alguém disposto a lutar contra os Asuras.

Caera me deu um olhar incerto.

— Grey, o que está acontecendo? Essa é uma… uma maga antiga?

Gesticulei para o cristal, que tremeluzia como um artefato de luz prestes a acabar.

— Não, não exatamente. Ela é uma consciência, contida naquele cristal. Eles são como… algum tipo de guardiões ou algo assim.

Para a mulher djinn, eu disse:

— A última projeção que eu encontrei estava muito mais confusa em me ver. Por que você não está?

— Tenho algum eco da memória dele, sabia que você estava vindo. Tinha esperança que você chegasse antes que o artefato que abriga minha consciência falhasse completamente.

Com o pé, ela cutucou um pedaço dos halos de pedra quebrados.

— Meu senso de tempo é… inexato, mas sei que o tempo que eu tenho restante é limitado. Nós deveríamos começar o teste em breve.

— Teste?

Caera balançou sua cabeça.

— Não entendi.

Rapidamente expliquei o que aconteceu da última vez que eu encontrei uma dessas projeções djinn e como acreditava que cada um protegia uma parte do conhecimento, escondido em uma pedra angular, que poderia me ajudar a desbloquear novos poderes.

— Nós vamos lutar um contra o outro?

Perguntei à mulher djinn, que havia nos observado curiosamente enquanto eu explicava.

Ela sorriu ironicamente.

— A ironia de ter sido designada aqui é que minha tarefa é administrar um tipo diferente de teste. Uma punição por declarar que nossa ociosidade contra os dragões resultaria em loucura e fracasso, ao contrário de paz.

Ela estendeu uma mão para prevenir as perguntas já se formando nos meus lábios.

— Entretanto, o fato de que eles não me proibiram de passar adiante as artes marciais que desenvolvi em vida diz muito sobre a sua passividade, sua incapacidade de compreender o desejo de lutar, de se defender. Ao me dar uma tarefa com um teste mental invés de um físico, eles presumiram que eu simplesmente faria o instruído e nada mais.

Ela posicionou os braços ao lado do corpo, e uma lâmina etérica apareceu em sua mão esquerda. Era longa, fina, e levemente curvada, sua forma era surpreendentemente clara, sem a inconsistência na qual as minhas tentativas deficientes resultavam quando forçava o éter a se materializar. A quantidade de energia contida naquela única lâmina era suficiente para desencadear várias explosões etéricas.

— Como eu disse: mente pequena.

Então uma segunda lâmina apareceu em sua mão direita. Ela cruzou as duas na sua frente, suas pontas afiadas marcando linhas gêmeas na pedra em seus pés, e quando se tocaram, faíscas voaram sibilando e estourando no ar.

— Você mostrou que tem força para revidar, para atacar e derramar o sangue de nossos inimigos. Você é exatamente por quem eu estive esperando, vou treiná-lo para manipular o éter não apenas como uma ferramenta de criação, mas como uma verdadeira arma de destruição.

 


 

Tradução: Reapers Scans

Revisão: Reapers Scans

QC: Bravo

 

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