A visão de Ellie desaparecendo em uma onda de destruição passou pela minha mente, de novo e de novo. Minha irmã… vestida como um soldado alacryano… apanhada em um ataque Asurano na terra natal dos elfos… onde Nico e Tessia lutaram lado a lado, como velhos amigos…
Não parecia real quando eu pensava assim. Cada pedaço era mais absurdo do que o outro. Talvez fosse apenas uma visão, disse a mim mesmo, embora soubesse que não era verdade. Quer fosse algum aspecto da magia da relíquia ou minha própria intuição, eu sabia que o que tinha visto era real, que tinha acabado de acontecer.
Ellie está viva.
Tinha que estar. Eu não poderia aceitar um mundo onde ela não estivesse.
— Como está se sentindo? — Caera perguntou, suas sobrancelhas franzidas com preocupação.
Soltando um suspiro profundo, como se isso fosse de alguma forma aliviar o peso do que eu acabara de testemunhar em Dicathen, eu acenei para a nobre Alacryana.
— Vou ficar bem.
— O que aconteceu? A pedra em sua mão estava brilhando, e então, de repente, seus olhos estavam vidrados e você congelou como uma estátua. — Caera estava segurando meu braço, seu olhar voltado para cima em busca de respostas em meu rosto.
Regis esperou com expectativa, quase sem jeito, e eu podia sentir seu desejo por respostas também.
Respostas que eu não estava pronto para dar.
Embora eu tivesse decidido que Ellie tinha que estar bem, como se minha própria força de vontade pudesse fazer isso, se eu apenas acreditasse nisso com força suficiente, eu nem tinha começado a aceitar o que isso significava para Dicathen, pra guerra… pro mundo.
Era simplesmente demais.
Tirando os dedos quentes de Caera do meu braço, dei um passo à frente atordoado em direção ao portal de volta ao segundo nível das Relictombs. A ponta da minha bota atingiu a relíquia, que rolou pelos ladrilhos brancos até a borda da poça de água no centro da sala.
Resisti ao impulso de chutá-la para dentro da banheira e deixá-la lá, escolhendo pegar a pedra multifacetada e examiná-la. A superfície limpa e brilhante estava novamente opaca, sem brilho. Não exatamente a mesma textura de pedra lisa de quando ganhei, mas parecia morta e sem vida em minha mão.
Olhando mais de perto, notei uma leve rachadura ao longo de um lado, mas minha mente estava muito pesada para refletir sobre os mistérios da relíquia, então a guardei em minha runa de armazenamento dimensional.
Caera estava parada ansiosamente entre mim e o portão cintilante, seu corpo tenso e o olhar piscando para trás enquanto bloqueava meu caminho. Seus chifres haviam desaparecido novamente, escondidos pela relíquia que usava, que não estava mais sendo suprimida pelo deserto nevado da última zona.
— Grey, espere.
Estava com raiva, ansioso, cansado e com medo, e uma parte de mim só queria rastejar em um buraco e negar tudo que a relíquia havia me mostrado. Mas havia trabalho a ser feito. Precisava voltar e me encontrar com Alaric. Precisava de recursos, um plano e precisava voltar para as Relictombs.
Por causa do que vi na relíquia, agora tinha certeza de uma coisa. Os Vritras não eram o único clã de Asuras que era uma ameaça para Dicathen.
Podia ouvir os ecos maçantes de meus passos soando em meus ouvidos, abafando as palavras de Caera, enquanto cambaleava pelo portal.
Fui saudado por uma massa de soldados Alacryanos posicionados ao meu redor em uma formação de meia lua.
À minha esquerda, cavaleiros em armaduras de aço enegrecido seguravam suas armas para frente, prontos para a batalha, cada figura individual vibrando com magia. À minha direita, cavaleiros vestindo armaduras de prata branca cintilante formavam a outra borda da meia lua, mas, ao contrário de suas contrapartes mais escuras, sua postura não era agressiva.
Diretamente à minha frente, preenchendo o centro do semicírculo, estavam vários indivíduos vestidos com túnicas de cores variadas, tensos e quietos.
Caera saiu do portal ao meu lado.
— Droga, Grey, por que você não esperou—
Um som cortante de aço na pedra a interrompeu quando os cavaleiros em prata branca bateram suas lanças contra o chão e se ajoelharam em uníssono.
— Que baita comitê de boas-vindas. — Regis refletiu. — Acha que isso é tudo para a senhora demônio aqui, ou…
— Lady Caera! — Uma mulher com cabelo laranja brilhante amarrado no topo da cabeça em um coque solto correu através da fila de soldados vestidos de branco, praticamente deslizando até parar diante de minha companheira. — Você se machucou? Sofreu? Está com dor? — Ela divagou, seus olhos arregalados examinando cada centímetro do corpo de Caera.
Apesar de seu cansaço, Caera esboçou um sorriso.
— Estou bem, Nessa, de verdade.
A mulher de cabelo laranja franziu a testa ao dar um tapa no braço da nobre Alacryana.
— Como você pôde escapar em outra ascensão?! E sem seus guardiões! Você sabe quantos problemas eu tive com o Alto Lorde e a Alta Lady? Meu Deus, e, como se isso não bastasse, pensar que você se misturou com…
A mulher chamada Nessa soltou um grito assustado, como se só agora percebesse minha existência. Ela puxou Caera alguns passos para longe e se escondeu atrás dela.
— V-você! Você é o assassino! — Ela gaguejou, apontando um dedo trêmulo para mim.
— Você terminou, assessora?
A voz ressonante ecoou pelo terraço e todos os olhos se voltaram para a fonte. Encarei um Alacryano idoso que se adiantou do resto de seus colegas de túnica.
Foi quando notei a coroa estampada no peito de seu manto escuro. Na verdade, agora que eu estava prestando mais atenção, percebi que todos os soldados de armadura escura também tinham uma coroa dourada gravada em seus peitorais.
Memórias dos irmãos Granbehl vieram à tona em minha mente, suas mortes se repetindo tão claramente quanto no momento em que aconteceram.
Merda.
— Parece que Caera estava certa. — refletiu Regis. — Deveria ter apenas matado a garota.
Isso não é o que Haedrig, não o que Caera disse, e também não ajuda, Regis.
Estendendo uma mão pálida e ossuda em suas vestes, o ancião de cabelos dourados puxou e desenrolou um pergaminho antes de começar a lê-lo.
— Grey, sangue sem nome. Você é acusado pelo assassinato de Kalon e Ezra do Sangue Granbehl, e Riah do Sangue Faline.
Caera deu um passo à frente, o braço levantado na minha frente.
— Grey não foi o único que os matou.
O ancião olhou para cima, seus punhos cerrados traindo o respeito forçado em sua voz.
— Temos o depoimento de uma testemunha ocular importante que diz o contrário, Lady Denoir.
— Eu mesma sou uma testemunha ocular, assim como Lady Ada do Sangue Granbehl. — rebateu.
Os olhos do ancião de cabelos dourados se estreitaram.
— Seu testemunho e envolvimento neste assunto foram revogados, Lady Denoir. Por favor, se afaste.
A raiva escoou de Caera quando ela deu um passo ameaçador para frente.
— Por direito de quem?
— Pelo Alto Lorde Denoir, minha senhora. — o ancião respondeu imediatamente. — A seu pedido, com o reconhecimento do Sangue Faline e Sangue Granbehl, a Associação de Ascendentes sancionou isso para que você não seja questionada e enviada a julgamento também.
Caera continuou a discutir, mas estava claro que ela estava perdendo a batalha.
Minha mente cansada tentou examinar as opções disponíveis para mim. Era bastante óbvio que eu provavelmente não teria um julgamento justo, considerando que eles estavam dispostos a renunciar a Caera como testemunha, e eu não tinha nenhum desejo de me submeter a qualquer tipo de questionamento por parte dos oficiais Alacryanos que pudesse levá-los a perceber que eu não era quem eu dizia ser.
Apesar do número de magos prontos para a batalha ao nosso redor, eu sabia que não seria muito difícil escapar agora que estávamos de volta ao segundo andar das Relictombs. Mas lutar para escapar, me tornar um fugitivo procurado com minha aparência revelada, tornaria qualquer ascensão futura difícil e certamente chamaria a atenção. Talvez até mesmo atenção suficiente para envolver uma Foice.
— Você não está realmente pensando em seguir com toda essa merda, certo? — Regis perguntou, sua irritação crescendo. — Apenas me deixe sair e eu abrirei o caminho.
Por enquanto, seguir o roteiro parece ser a melhor opção. Um pensamento estranho me ocorreu. Quem sabe, talvez possamos até mesmo transformar isso em nosso benefício de alguma forma. No mínimo, sabemos que nenhum de seus artefatos de supressão de mana funcionará em mim, e podemos escapar mais tarde se for necessário.
Uma voz brilhante e prateada cortou meus pensamentos.
— Caera, chega. — A voz silenciou todos os outros nas proximidades, chamando minha atenção para uma mulher luxuosamente vestida com cabelos brancos brilhantes. — Estamos indo embora, querida. Deixe isso para os administradores.
— Mas, mãe—
— Agora, Caera. — A autoridade na voz da mulher era absoluta, e Caera desabou sob a pressão.
Eu não conseguia me lembrar de ter visto a maga Alacryana de sangue Vritra parecer tão miserável antes, mesmo quando estava prestes a matá-la quando ela revelou sua verdadeira identidade pela primeira vez.
Ela se virou, seus olhos escarlates encontrando os meus.
— Está tudo bem. — disse. — Apenas vá. Eu vou ficar bem.
— Grey, eu estou—
— Caera! — A mulher de cabelos brancos disse novamente, sua voz soando através do terraço como um sino.
Caera se encolheu e correu para seguir sua mãe adotiva, que conduziu os cavaleiros de armadura branca para longe do portal. Ela lançou um olhar furtivo para mim, e fiquei impressionado com o quanto ela parecia diferente e agia na presença de seu sangue.
— Famílias são estranhas. — disse Regis. — Quer dizer, olhe para toda essa merda maluca em que você me meteu.
Percebi que o ancião de cabelos dourados estava falando novamente.
— …e assim é que o suspeito, Grey, deve ser levado para a mansão Granbehl para interrogatório antes de um julgamento ser realizado. Este julgamento está atualmente definido para… —Verificou o pergaminho novamente — três semanas a partir de hoje.
Zombei.
— É procedimento padrão que o acusado seja preso pelos acusadores? Dificilmente parece justo e imparcial, não é?
O orador pigarreou e fez uma careta.
— Sangue Granbehl tem todo o direito de garantir que você seja julgado por seus crimes. Se você fosse membro de um Sangue Nomeado ou Alto Sangue, poderia ser liberado sob a custódia de seu sangue para aguardar o julgamento, mas—
Eu afastei suas explicações, sabendo que não passavam de palavras. A verdade é que os poderosos sempre obedecem a regras diferentes de todos os outros.
— Vamos apenas acabar com isso logo?
Continuei a encarar o homem até que ele se encolheu e desviou o olhar.
— Algemem este homem e coloque-o na carroça. — disse ele, com uma pitada de amargura e cautela em seu tom.
Três cavaleiros avançaram. Um puxou meus braços na minha frente, enquanto outro ajustou meus pulsos com um par de algemas de supressão de mana. O terceiro manteve sua lança pressionada contra minhas costas.
Terminados esses procedimentos, conduzido a uma pequena carroça puxada por uma besta que havia sido deixada na beira do alpendre e colocado dentro dela sem palavras. Era pequeno, com espaço apenas para mim e um outro soldado Granbehl que já estava sentado lá dentro.
As feições do guarda estavam escondidas atrás de um capacete fechado. Uma espada curta repousava em seu colo, cuidadosamente colocada na curva de seu braço para que, se necessário, um golpe curto perfurasse meu núcleo.
Um momento depois, a carroça balançou quando a besta que a puxava avançou ao comando de nosso motorista. Descansei minha cabeça contra a parte traseira do carrinho e fechei meus olhos. Meus pensamentos estavam confusos, uma mistura indecifrável de memórias, medos e planos para o que estava por vir.
Estava absorto o suficiente em minha própria mente para não notar o guarda tirar o capacete, e fiquei surpreso quando uma voz familiar interrompeu minha contemplação cansada.
— Bem, uma baita encrenca em que você se meteu hein, garoto bonito?
Tradução: Reapers Scans
Revisão: Reapers Scans
QC: Bravo
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