O Caçador Imortal de Classe SSS – Cap. 86 – O Coração do Leitor (2)

Era assustador. Sua Afeição por mim era 95. Agora eu sabia o que acontecia com alguém quando sua Afeição alcançava 95.

— Brilhante-Ja! Antes de te conhecer, eu não passava de um cego! — gritou o Bibliotecário Interno, acariciando meu pé. — Eu era praticamente surdo antes de ouvir suas falas!

Os olhos do Bibliotecário Interno brilhavam enquanto ele tentava cortar minha unha do pé com o cortador. 

— Você é minha luz! Você é minha música!

Seus olhos eram aterrorizantes.

— Já que seu nome é Gong-Ja, eu me converto alegremente ao Confucionismo¹Confúcio é chamado de Gongja na Coreia.! Serei seu erudito! Não é maravilhoso aprender e praticar? Não é um prazer ter amigos que visitam de longe? Mesmo quando os outros não reconhecem seus esforços, você é um homem nobre se não se irritar²O raw é유붕자원방래, 불역낙호(有朋自遠方來,不亦樂乎) As falas são de Analectos, também conhecidos como Ditados de Confúcio.! A partir de hoje, sou um erudito confucionista que te serve, senhor Gong-Ja!

— Ei. Pelo amor de Deus! Ei!

Que tipo de erudito louco iria atrás da unha de alguém? Queria fazer essa pergunta, mas havia algo em seus olhos que me fez parar. Seus olhos e sua respiração pesada me fizeram perceber que, não importava o que eu dissesse, entraria por um ouvido e sairia pelo outro.

— Se você continuar assim, não entrarei em outro livro apocalíptico — avisei.

O Bibliotecário Interno parou de falar. A parte assustadora era que, mesmo em silêncio, ele ainda acariciava meu pé. Ele estava louco?

— …Essa é uma ameaça sólida — murmurou, como um erudito enfrentando um grande enigma. — Vai funcionar comigo.

Fiquei aliviado ao ouvir que funcionou.

— Mas isso é impossível, considerando sua análise de personagem.

O quê? Análise de personagem?

— Você sabe que os outros livros apocalípticos têm aqueles que murcham por uma razão injusta, como a Demônio Celestial. Dada sua personalidade, você tem que ajudar essas pessoas. Por sua natureza, você não resiste ao impulso. — O Bibliotecário Interno sorriu. — Não subestime seu fã, senhor Gong-Ja. Eu te conheço melhor que você mesmo! Posso escrever duas páginas sobre qual mão você usou e como você parecia enquanto comia sua pílula de grãos no primeiro dia da Crônica do Demônio Celestial…

Ele estava definitivamente louco. Nada nele era são.

— Agora, senhor Gong-Ja, apenas me entregue! Você tem que me dar isso pelo menos! Sabe, estou sendo incrivelmente consciente por não usar o aroma do sono para te colocar para dormir, senhor Gong-Ja.

— Sua consciência também me surpreende — respondi azedamente.

— Você provavelmente não entende porque nunca foi fã de alguém. Ah, que tragédia! Como é miserável a vida se você nunca encontrou alguém para ser fã? O coração de tal pessoa deve ser frio como gelo. Ainda assim, devo te entender, Brilhante-Ja…

— Afaste-se antes que eu diga que te odeio.

O Bibliotecário Interno realmente congelou.

— Dê cinco passos para trás. Se não der, eu realmente vou dizer isso — coloquei minha mão entre mim e ele.

O Bibliotecário Interno recuou silenciosamente.

— Por favor, aja como você normalmente faz. Honestamente, está me dando nojo. E, por favor, me devolva meu cabelo e unhas.

— Não! Você não pode fazer isso comigo! — O tom do Bibliotecário Interno tornou-se autoritário novamente enquanto ele segurava as bolsas de seda contra o peito, melancolicamente. — Você deveria simplesmente cortar minha cabeça! Não, espere um minuto, Gong-Ja. Eu só estava sendo dramático. Por favor, não pense realmente se deve ou não fazer isso… Você parece estar realmente considerando, e isso genuinamente me machuca… 

Ele agora parecia um hamster desanimado.

No geral, consegui acalmar o Bibliotecário Interno. Após queimar as bolsas de seda assustadoras – o que o fez gritar terrivelmente – ele e eu finalmente começamos a ter uma conversa apropriada.

— Foi incrível — comentou o Bibliotecário Interno. — O que você fez pela Demônio Celestial é verdadeiramente admirável! Apenas se tornar o discípulo dela poderia ter sido seu final, mas você não parou por aí! A batalha final da Grande Guerra do Bem e do Mal… E a melhor partida da vida dela… Ah, foi como provar uma raspadinha com sorvete de chocolate por cima.

— Então, o mundo da Crônica do Demônio Celestial é agora o vigésimo segundo andar da Torre?

O Bibliotecário Interno sorriu brilhantemente. 

— Sim, é. Outros caçadores também podem entrar e sair livremente do vigésimo segundo andar. Eles também podem aprender Habilidades lendo os manuais de artes marciais no Salão das Artes Marciais Celestiais. Tudo isso graças aos seus feitos, Gong-Ja.

— Meu tempo no livro apocalíptico me trouxe uma dúvida. Espero que você possa responder… — apoiei o queixo na palma da mão.

— Pergunte qualquer coisa! Responderei quase tudo!

— Pare de tentar tirar meus sapatos como se não fosse nada. Por que a Crônica do Demônio Celestial é um livro apocalíptico?

O Bibliotecário Interno inclinou a cabeça, claramente confuso com minha pergunta. 

— Por quê? Você acredita que deve haver uma razão para a Crônica do Demônio Celestial ser um livro apocalíptico?

— Acredito que sim — coloquei meus sapatos de volta. — Você gosta de finais felizes, senhor? Ou prefere finais ruins?

— Essa é uma escolha que não posso fazer — respondeu o Bibliotecário Interno imediatamente. — Um final é o último porto que os personagens alcançam durante suas vidas. A vida pode ser tanto feliz quanto triste. É natural que os leitores desejem a felicidade dos personagens, mas também quero abraçar suas tristezas e falhas.

— Então você está dizendo que um final ruim também é um final apropriado.

— Bem, é claro.

— Isso me faz pensar ainda mais — disse.

Ele tentou contornar minhas costas com uma tesoura, então agarrei seu pulso e tirei a tesoura dele. Ele tentou pegar a tesoura de volta, mas não conseguia alcançá-la, não importava o quanto pulasse.

— Mesmo que eu não tivesse intervindo, a Crônica do Demônio Celestial encontrou um final apropriado, mesmo que fosse ruim. A Mestra se esforçou e deu o seu melhor com o líder da Aliança Murim até o fim. Mesmo que ele morresse primeiro e ela enlouquecesse… esse ainda é o final que ela alcançou — olhei nos olhos do Bibliotecário Interno. — Por que a Crônica do Demônio Celestial é considerada um livro apocalíptico? Não é considerado um final apropriado se o líder da Aliança Murim morreu e a Mestra se suicidou após enlouquecer?

Na verdade, a questão me incomodava desde que vi o conto de fadas chamado Nossa Vítima. Independentemente de eu aceitar os finais ou não, esses mundos pareciam ter encontrado seus fins naturais.

A biblioteca estava silenciosa, exceto pelo som da respiração dos Caçadores inconscientes. Enquanto os peitos deles subiam e desciam, o Bibliotecário Interno permaneceu sem expressão.

— Por alguma razão, eu queria ver um final feliz. Isso pode ser a razão?

— Se você não gostou do final, poderia ter reescrito você mesmo — respondi. — Você é forte. Para um Caçador como eu, você é onipotente, mas nos enviou em vez de reescrever o livro você mesmo.

Em outras palavras, essa Constelação era um “leitor”. Ele absolutamente odiava intervir na história, então simplesmente a aceitava. De forma alguma ele queria ser um autor – ele recusaria mesmo que pudesse, daí o “Bibliotecário Interno”.

— Devo fazer uma análise de personagem sobre você também? Não tem como você ter classificado eles como livros apocalípticos apenas porque seus finais eram estranhos, não quando você é tão meticuloso. Deve haver outra razão para a Crônica do Demônio Celestial e as histórias serem classificadas como livros apocalípticos.

— …Você é difícil, não é? — O Bibliotecário Interno sorriu amargamente. — Me siga.

Ele pegou minha mão e usou a outra para segurar a Crônica do Demônio Celestial.

— …Vou te contar a verdade por trás dos livros apocalípticos.

A Constelação abriu o livro, e fui cegado por sua luz.

Quando abri os olhos novamente, estávamos de volta ao mundo de neve. Não havia necessidade de caminhar pelo campo de neve – o Bibliotecário Interno ainda segurava minha mão, então voamos pelo céu de inverno, suas longas mangas batendo como asas de gaivota.

— Se… se o vírus zumbi tivesse sido criado na Crônica do Demônio Celestial… Crônica do Demônio Celestial…Se realmente fosse… Eu nunca teria classificado este mundo como um livro apocalíptico, como você disse.

Passamos sobre as montanhas nevadas.

— Isso significa… — deixei a frase no ar.

— Não foi. O vírus zumbi é uma praga que veio inteiramente do mundo exterior. É como o Novo Mundo sendo invadido por uma força externa. — O Bibliotecário Interno soltou uma baforada de respiração branca. — Lá. Podemos ver agora.

Ele apontava para um pico de montanha imponente, o pico sagrado deste mundo. Algo enorme estava sentado no topo.

[Brilhinho sentiu uma presença sinistra.]

A Espada Sagrada pendurada no meu cinto tremia.

— Oh, sua espada parece sentir também — notou o bibliotecário. — Não é estranho. Sua espada já foi uma Constelação completa também. As pessoas tendem a reconhecer rapidamente pessoas em situações semelhantes.

— Por uma situação semelhante, você quer dizer…

— Gong-Ja, você já viu a queda de uma Constelação?

Eu tinha a Preta, que havia caído de ser uma Constelação chamada Rei Demônio da Chuva de Outono.

— Sim, já vi.

— Então você também viu o corpo de uma Constelação morta?

— …

— …Eu sabia. — O Bibliotecário Interno sorriu tristemente. — É uma visão bastante rara, então aproveite bem enquanto tem a chance.

No pico da montanha jazia um dragão morto. Sua pele, outrora lisa como seda, estava queimada de preto, enquanto seus chifres desmoronavam como pó de carvão. Sua cintamani estava enterrada na neve em dois pedaços.

[Brilhinho detectou a presença de sua irmã.]

E uma espada estava cravada no centro de seu peito.

[Brilhinho diz que é Simpatia, sua segunda espada irmã!]

Uma energia negra e turva fluía da espada. Poderia ser considerada aura, mas não era normal. Era algo semelhante, e possivelmente até mais caótico, do que as águas residuais que o Rei Demônio da Chuva de Outono usou para se cobrir. A energia caótica envolvendo o dragão se espalhava por todo o pico. Quando flocos de neve caíam no pico da montanha, a energia imediatamente os infectava e os tornava negros.

— Dói… Eu odeio…

Os olhos do dragão negro não tinham luz, mas um gemido continuava a escapar de sua boca.

— Dói. Dói… Dói. Eu odeio. Dói. Arde…

Por um momento, fiquei sem palavras.

— …Você não disse que essa Constelação estava morta? — perguntei. — Ele ainda está vivo.

— Ele está morto. O que você vê e ouve é o rancor do morto. Quando você está na classe de uma Constelação, não pode morrer pacificamente.

Aterrissamos no pico onde o dragão negro gemia sem fim. O Bibliotecário Interno olhou para o fim de outra Constelação com piedade.

— A praga que você e os outros chamaram de vírus zumbi é, na verdade, uma maldição.

— Uma maldição…

— Sim, é a maldição que a Constelação deste mundo, o Dragão Amarelo do Grande Lago, deixou ao morrer. Seu rancor não pode desaparecer, e seu cadáver ainda permanece mesmo após sua morte, então ele deve suportar a dor. Quando as pessoas são infectadas pela maldição, elas se tornam jiangshi.

Olhei para o cadáver do dragão.

— Dói…

Ele era o hospedeiro da praga e a fonte da maldição. A doença que trouxe a ruína a este mundo começou daquele cadáver. A maldição daquele dragão era, basicamente, a razão pela qual a Mestra havia falecido.

— …Alguém o matou. A Constelação não se esfaqueou no peito.

— Logicamente, você provavelmente está certo.

— Quem é o culpado?

— Você já sabe quem é.

Rangi os dentes. 

— Lefanta Aegim.

— Isso mesmo. — O Bibliotecário Interno assentiu. — Seu título é Assassino de Constelações. Ele viaja de mundo em mundo e mata Constelações.

Brilhinho me disse que uma Constelação era o representante de um mundo.

— Um mundo que perdeu sua Constelação é como um castelo que perdeu suas muralhas. Ele se torna cada vez mais propenso a encontrar um fim abrupto e incomum.

Os livros apocalípticos na Grande Biblioteca de Toda a Vida eram os mundos onde seus representantes morreram e todos os residentes haviam desaparecido.

— Por que ele mata Constelações do nada? Se fundou o Império Aegim, poderia apenas ser o imperador de seu país. Por que sair por aí destruindo mundos? Não fizeram nada contra ele.

— Essa é uma pergunta que não posso responder. — O Bibliotecário Interno observou meu rosto cuidadosamente. — Sou apenas um leitor. Você disse que sou onipotente, mas isso não é verdade. Posso ser onisciente, mas sou impotente. Posso conhecer a verdade dos mundos, mas não intervenho em seus assuntos.

O Bibliotecário Interno de repente apontou para minha cintura, mudando abruptamente de seus comentários autodepreciativos.

— Mas você é diferente.

Seu dedo apontava para a espada pendurada na minha cintura.

— Você pode intervir e está intervindo. Quer queira ou não, você está consertando o que outra pessoa arruinou, um por um. Uma vez é coincidência. Duas vezes é destino. Três vezes é inevitabilidade. Você salvou o império que o Assassino de Constelações abandonou, acolheu a Constelação que ele dividiu, e agora está no mundo que foi destruído por causa dele.

“A medida que ele usou para matar o Dragão Amarelo do Grande Lago é cruel e viciosa. Pessoas comuns nem podem tocar aquela espada, mas você pode, Gong-Ja. Você transformou um encontro de coincidência e destino em uma inevitabilidade.”

Olhei para o cadáver do dragão negro novamente.

Brilhinho.

A Espada Sagrada tremia gentilmente.

[Brilhinho responde ao seu chamado.]

Como posso acolher sua irmã?

[Brilhinho diz que você deve sacá-la e tocar a espada irmã usando ela.]

Ótimo.

Saquei minha espada e golpeei a espada cravada no peito do dragão negro com ela, cortando o céu de inverno.

[A Deusa da Proteção está absorvendo uma parte de si mesma.]

Minha espada foi brevemente envolvida por luz.