Dark?

Mushoku Tensei: Reencarnação do Desempregado – Vol. 22 – Cap. 10.5 – Interlúdio: Nós nos casamos

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Envolto por um grupo de dez ou mais casas, havia um cercado rústico protegendo um jardim de vegetais, resguardado por um grupo de Plantas Piranhas dispostas em suas bordas. Estudantes adolescentes se aglomeravam em torno de uma panela gigante. Pareciam os mesmos de sempre, como numa pintura.

— Eu me pergunto se o papai está bem.

— É, eu não sei…

Na Vila Migurd, era como se o tempo não passasse.

Dois meses se passaram desde que convenci Atofe a se juntar a mim. Tinha usado esse tempo para entregar cartas a todos os reis demônios. Caminhei de uma ponta a outra do Continente Demônio levando cartas dela junto de oferendas recomendadas por Orsted, suando a camisa para forjar alianças… Ok, bem, usei os círculos de teletransporte, mas ainda assim.

Os reis demônios eram um grupo diverso. Havia o Rei Demônio Saqueador Baglahagla, um gourmet que parecia um porco, depois o Rei Demônio Face Lynebyne, que era literalmente só uma cabeça, como aquelas estátuas Moai. Depois disso, havia o Rei Demônio da Samedynomedy, cujo corpo inteiro brilhava constantemente, e depois o Rei Demônio Reluzente Patorsetor, cujo corpo translúcido estava escondido sob vestes puras. E só ficavam mais excêntricos daí em diante.

Todas as vezes, eu entrava pronto para lutar se precisasse. Eram reis demônios, sabe? Uma associação de idiotas com Atoferatofe e Badigadi no topo. Não tinha um fio de esperança de que fossem me ouvir. Pelo menos, era o que eu esperava, mas acabaram sendo inesperadamente sociáveis.

Eles aceitaram meus presentes sorrindo como crianças no Natal, e então, quando lhes dei a carta de Atofe, ficaram pálidos e sussurraram:

— Um campeão! — Abaixando a cabeça e desviando os olhos.

Um deles chegou a se molhar enquanto implorava por sua vida.

O Rei Demônio Vil Qeblaqabla fez o mesmo. Orsted me disse para ter um cuidado especial com este. Ele era uma esfera cheia de buracos que emitiam um constante cheiro de vômito. Vil como era, também procurava uma briga. Porém, até ele se curvou no momento em que eu disse o nome de Atofe.

Agora entendi o quão temida Atofe era, e como era única.

Os reis demônios, em geral, pareciam um bando de caras descontraídos fazendo suas próprias coisas. Cada um ouviu atenciosamente os meus pedidos e tomaram ciência sobre minha busca por Kishirika. Sobre o evento daqui a oitenta anos era outra história; a maioria disse que estava muito à frente para prometer qualquer coisa. Os reis demônios vivem muito tempo. Duvidava que pensassem muito no futuro.

Também paramos em Rikarisu ao longo do caminho; a localização do castelo de Kishirika, atualmente governado por Badigadi. Era uma cratera que já havia sido a fortaleza dela.

Badigadi não estava em casa. Entrei em contato com os soldados, e todos deram de ombros e informaram que não tinha voltado nem uma vez. Eles disseram que era provável que ela estivesse vagando sem rumo por aí.

Entreguei a carta de Atofe aos soldados que observavam o castelo em sua ausência, por precaução, e pedi que procurassem Kishirika e Badigadi. Restavam apenas alguns castelos de rei demônio para visitar. Aparentemente, iríamos passar por isso sem problemas.

Então Roxy veio e perguntou:

— Estaria tudo bem se eu parasse para cumprimentar minha cidade natal? Não se preocupe, não vai demorar muito. Vou sozinha e volto antes que você perceba.

De jeito nenhum eu a deixaria ir sozinha. Fui direto para casa, peguei Lara e o dote para Roxy, depois voltei para Rikarisu.

Já tinha uma leve ideia de que algo do gênero poderia acontecer. E eu estava pronto.

Três dias depois, nossa jornada chegou ao fim quando chegamos à aldeia  Migurd.

Eu, Roxy e Lara. Eris murmurou algo sobre não querer atrapalhar e deu para trás, embora tenha dito para agradecê-los pela espada em seu lugar. Pensando agora, ela tinha aprendido a ter tato. Poderia ter chorado de emoção.

 

Separador Mushoku

 

Quando a mãe de Roxy, Rokari, viu a filha, ela congelou.

Bem, não por causa de Roxy, especificamente. Foi porque Roxy estava com uma criança nos braços e comigo ao seu lado; a foto de um casal feliz.

Algumas pessoas na aldeia a estavam encarando intensamente. Me perguntei se estavam enviando mensagens telepáticas, mas não tinha a mesma dúvida acerca de Rokari. Seu cérebro obviamente havia parado, e ela junto com ele.

Ela ficou completamente parada por cerca de cinco segundos. Somente quando Roxy disse: “Estou em casa, mãe.” ela se recuperou

— R-Roxy, isso é… — disse enquanto gaguejava. — E essa criança…?

— São meu marido e minha filha — respondeu Roxy.

Por um momento, Rokari pareceu chocada, mas então sua expressão mudou para uma de prazer. Ela se virou para lá e acolá, olhando ao seu redor. Quase de uma vez, vi todos os Migurd próximos se virarem para nós, então ela deve ter gritado algo usando telepatia. Talvez estivesse chamando Rowin, pai de Roxy.

Pelos deuses, querido! Roxy trouxe um homem para casa!

Algo assim.

O silêncio caiu. Foi desconfortável ter todo mundo nos olhando sem falar nada. Mas eu era o marido da Roxy. Não podia deixar nenhum constrangimento transparecer. Cruzei os braços, separei os pés e estufei o peito. Então, canalizei minha Aura Assassina…

— Mãe, o papai está por perto? — Roxy perguntou.

— Hum, sim. Acabei de chamá-lo. Ele está na casa do ancião… — Rokari confirmou. — Tenho certeza de que ele estará aqui em breve.

— Poderíamos, por favor, esperar lá dentro, então? Tem gente demais olhando, e está mexendo com o Rudy. Olha a pose esquisita que ele está fazendo.

Como é?! Isso não é “estranho”! Esta é a pose de um ditador maligno de linhagem nobre, vou fazer com que entenda.

— Tudo bem, Rudy. Vamos entrar — comandou Roxy. Eu grunhi meu consentimento e a segui para dentro de casa.

Era a pressão de me apresentar aos meus sogros que estava me deixando tão afetado? Certamente prefiro culpar isso que os insultos da minha amada Roxy à pose que me esforcei tanto para fazer.

— Obrigado por me receber. — Eu disse enquanto seguia Roxy e sua mãe até a casa, longe dos olhares indiscretos. Pensando bem, não entramos nesta casa da última vez que viemos aqui. Talvez pudesse fazer com que Roxy me mostrasse seu antigo quarto e suas fotos de formatura do ensino médio.

Sim, sim, eu sei que eles não têm essas coisas nesta aldeia.

— Eu me pergunto se temos alguma provisão estocada — ponderou Rokari em voz alta.

— Não se preocupe — disse Roxy. — Não vamos ficar muito tempo.

— Mas Roxy, minha querida, você veio de tão longe até aqui. Não pode simplesmente sair sem mais nem menos. — Rokari soou desamparada.

Sentei-me ao lado da lareira. Roxy prontamente sentou-se ao lado, dizendo:

— Temo que estejamos muito ocupados, mamãe.

— Ah… — Rokari parecia decepcionada.

Provavelmente poderíamos ficar por três ou quatro dias, se ela quisesse… Mas eu sabia que Roxy não se importava muito com sua cidade natal, então uma estadia mais longa não estava nos planos.

— Enfim, Roxy, isso é tudo muito repentino! Você voltando… e com um homem tão bonito… — Rokari olhou para trás e me encarou e, sem mais reservas, me inspecionou dos pés à cabeça. Em seguida, quando se lembrou de um pequeno detalhe, ela deu um pequeno suspiro e se curvou:

— Que grosseria a minha! Eu sou Rokari, mãe de Roxy. É um prazer conhecê-lo.

Me… conhecer?

Ela não se lembrava da época em que nos conhecemos dez anos antes.

— Meu nome é Rudeus Greyrat. Creio que já nos encontramos uma vez antes — repliquei.

— Será mesmo…?

— Sim, há cerca de dez anos. Ruijerd me trouxe aqui — expliquei.

— Você é amigo de Ruijerd Superdia? Mas a última vez em que Ruijerd esteve aqui… — Rokari colocou a mão na boca enquanto pensava a respeito. Depois, tudo pareceu voltar à sua mente. — Ah! — exclamou. — Você é o pequeno humano que ele trouxe quando partiu em sua jornada?

— Sim, eu mesmo.

— Poxa vida…! Ah, isso é tão nostálgico! Você cresceu muito, não é? Mal se passaram dez anos, mas suponho que os humanos devem se tornar adultos de pleno direito quando ficam tão grandes quanto você.

— Sim, senhora. Estou fazendo o meu melhor para andar com os próprios pés, embora tenha um longo caminho a percorrer… — Aqui, coloquei as mãos no chão e abaixei a cabeça. — Lamento pelo anúncio ter chegado tão tarde. Eu me casei com sua filha.

— …Entendo. Ela está, hum, você está feliz com ela?

— Estou muito feliz com ela. — Olhei para Roxy e ela estava vermelha como um tomate.

— Roxy, ah, está se comportando corretamente como uma noiva humana? Há muita tensão entre humanos e demônios, não é mesmo? Ela não está te causando nenhum problema?

— Ela não só está indo muito bem, mas também vive constantemente me tirando de problemas. Ela é a pessoa mais confiável em toda a família.

— Bem, isso é… bom… — disse Rokari, embora soasse desconfiada.

Roxy me acertou nas costelas. Olhei para ela, questionando, e ela murmurou:

— Muito elogio.

Não estava exagerando em nada! Eu confiava nela.

— É só que, você parece um jovem tão bom… Tem certeza que você está feliz com a nossa Roxy?

A mesma pergunta novamente. Rokari também ficou afobada.

Roxy rebateu:

— Rudy tem outras duas esposas. Sou mais como a concubina dele. Então, mesmo que não esteja totalmente satisfeito, não é um problema.

Não havia nada insatisfatório sobre Roxy, e eu nunca, nem uma vez, a tratei como uma mera amante.

— Entendo… ainda assim…

— Mãe, você pode parar? Está me constrangendo.

— Ah… sim. Só estou preocupada, querida. Você sempre foi tão hostil e quieta, para não mencionar seus modos.

— Estou ciente dos meus pontos fracos, mãe, mas veja, estou cumprindo meus deveres como esposa. Até tive uma filha.

Deveres? Quanto profissionalismo. Eu ainda te amaria tanto quanto mesmo que você não pudesse ter filhos. Talvez eu devesse dizer alguma coisa.

— Rudeus, isso é verdade? — Rokari questionou.

— É. No mínimo, nunca deixarei de amar Roxy. Eu juro isso em nome de qualquer deus que você quiser.

Meu amor era divino; não conhecia limites.

— É mesmo…? — Rokari continuou, ainda perturbada. Talvez mostrar por meio de ações funcionasse melhor. Se eu colocasse o braço em volta de Roxy, assim… Opa, ela agarrou meu pulso. Não é isso, Roxy, eu não estou tentando tocar na sua bunda, pensei, mas aí percebi que ela estava apertando minha mão. Seus dedos estavam quentes.

Rokari parecia convencida.

— Suponho que sim — retomou ela. Neste momento, Lara, que estava sentada ao lado de Roxy, virou-se para olhar para fora.

— Ah! Rowin está de volta — anunciou Rokari. Meu sogro estava prestes a fazer sua entrada, o que significava que era hora de fazer minhas apresentações mais uma vez. Juntei minha coragem. Se precisasse, encostaria minha testa no chão, junto das mãos e joelhos.

 

Separador Mushoku

 

As apresentações com Rowin foram feitas sem problemas. Ele reagiu como Rokari e disse praticamente as mesmas coisas, então eu lhe dei as mesmas respostas. Foi uma operação simples. Não há necessidade de floreios.

— Bem, Roxy, parabéns — disse Rowin por fim, engasgando um pouco. — Enquanto você estiver feliz, isso é tudo o que importa. Ele apertou a mão dela.

— Obrigada, pai — respondeu Roxy. Os olhos dele e de Rokari estavam ficando marejados e, ao vê-los, senti minhas próprias emoções brotarem. Eu poderia fazer Roxy feliz? O que era felicidade, afinal? Eu não tinha uma resposta, mas faria o meu melhor para garantir que nosso amor nunca desaparecesse.

— Ah, querida. Minha Roxy, casada… — soluçou Rowin. — Você estava sempre tropeçando em seus próprios pés e explodindo em lágrimas desde pequena. E agora, olha como cresceu…

— Pai, por favor, não fale sobre isso na frente do Rudy.

Roxy quando era criança…! Aposto que ela era adorável. Quero dizer, provavelmente parecia mais ou menos a mesma que era agora, então obviamente era adorável. Assumi que ela falava mais como uma criança naquela época. Se tivéssemos nos conhecido naquele tempo e crescido juntos, as coisas poderiam ter sido bem diferentes… Mas não importa o tipo de relacionamento que desenvolvêssemos, tinha certeza de que sempre a respeitaria.

— E olha ela — continuou Rowin, emocionado. — Nunca pensei que conheceria minha neta. Mesmo depois que Roxy o censurou, ele pegou Lara em seus braços, parecendo encantado. Lara, como de costume, não protestou. Ela apenas o encarou com olhos arregalados. Ele sorriu para ela.

— Lara, não é? Que garotinha inteligente, já sabe dizer seu nome.

— Como é? — Roxy e eu exclamamos juntos. Não tínhamos dito o nome da Lara. E Lara não tinha falado nada.

Como é que ele… Pensei, mas então Roxy virou-se para Rowin com espanto.

— Nossa filha… Ela pode usar a telepatia? — questionou.

— Hã? Sim, ela ainda dá alguns tropeços, mas já pode dizer o que quer muito bem — confirmou Rowin.

Olhei para Roxy. Uma verdade chocante havia sido exposta. Nossa filha era uma telepata.

Ok, pensando bem, não era tão chocante. Roxy não podia usar telepatia, mas seus pais podiam. Provavelmente não era por causa da genética que Roxy não conseguia se comunicar desta maneira.

— Você não sabia? — Rowin indagou.

— Ninguém mais na família é telepata — respondeu Roxy.

Rowin franziu a testa.

— Tem certeza? A Lara aqui diz que a avó fala com ela o tempo todo.

A avó dela. A avó da Lara, então… Rokari? Isso não estava certo. Ela queria dizer Zenith.

— Ah…

Clicou para Roxy e para mim ao mesmo tempo. Era sobre isso que a Criança Abençoada havia falado. Zenith podia ler mentes. E em suas lembranças, Lara era uma tagarela. Lara era sempre quieta e solene, mas Zenith parecia estar conversando alegremente com ela. Então era por telepatia. Lara vinha conversando por telepatia o tempo todo.

Senti uma onda de alívio, mas Roxy não parecia estar lidando com isso da mesma forma. Ela estava de cabeça baixa. Podia imaginar o que se passava pela cabeça dela: Até minha filha é telepata. Por que sou a única que não é?

O ambiente na sala escureceu.

— É mesmo? Hum, tudo bem então… — Levantei e fui acariciar o cabelo de Lara, dizendo: — Laaara! É o papai!

Lara não sorriu. Ela apenas me encarou. O que ela estava dizendo?

— Ela disse “Eu não entendo” — traduziu Rowin.

Não entendia? … Ah, sim. Estava falando na língua demônio.

Tentei novamente, desta vez em língua humana.

— Laaara, é o papai.

Então olhei com expectativa para Rowin.

— Ela disse “Eu sei” — anunciou ele.

Ah, ela sabe, não é? Bem, suponho que não havia como não saber. Dizia isso para ela o tempo todo.

Ainda assim, sua resposta foi um pouco fria. Ela poderia pelo menos ter me presenteado com um “Eu te amo, papai!” ou algo assim. Lucie disse isso ontem mesmo.

Mas então, telepatia não era o mesmo que linguagem. Provavelmente foi algo diferente do que foi dito em voz alta. Sim, tinha que ser isso, ou ela dificilmente conseguiria falar com Zenith.

— Bem, isso é um alívio. — Eu comentei. — Estava preocupado que ela estivesse atrasada.

— Ainda é muito pequena para falar como vocês, exceto dentro de sua cabeça, mas ela começará a soltar a voz em breve. — Rowin me tranquilizou com um sorriso nostálgico. — Neste momento, aposto que vocês dois se sentem exatamente como nós quando Rokari teve Roxy.

— Como assim? — perguntei.

— Quando Roxy nasceu, pensamos que, como ela não conseguia falar, não devia estar se desenvolvendo adequadamente.

Assim como Roxy é a única de sua família que não podia usar a telepatia, Lara é a única de sua família que não conseguia falar. Eram parecidas nesse sentido. Tal mãe, tal filha.

Por enquanto, tudo o que sentia era alívio. Nossa filha estava crescendo muito bem. Se não houvesse ninguém em casa para ela conversar, isso poderia ter sido um problema,mas não era assim. Zenith certamente falava com ela, e eu tinha algumas suspeitas de que Leo podia usar alguma telepatia; algum poder que o permitia se comunicar com Lara também. Uma vez que ela começasse a usar palavras, poderia se comunicar com todos os outros também. Ela só precisava de um pouco mais de tempo.

— Lara se parece exatamente com a Roxy, não é? — comentei.

Rowin riu bem-humorado.

— Ela se parece, né? Parecidas como gotas d’água. Especialmente os olhos.

Rokari parecia estar se divertindo também. Talvez fosse só imaginação, mas achei que a Lara tinha a mesma aparência.

Depois disso, devolvemos o dinheiro que haviam me emprestado multiplicado por dez, lhes dei meu presente de noivado e, em seguida, nos sentamos para uma refeição de Tartaruga de Pedra Gigante. Era a primeira vez em tempos que comeria isso, e fiz questão de me entusiasmar com o quão delicioso era enquanto escondia minha vontade de vomitar. Nós tivemos um momento adorável. Estava pensando no quanto estava feliz quando notei algo: Roxy não parecia nada feliz. Ela não sorriu nem uma vez durante aquele tempo todo.

 

Separador Mushoku

 

Roxy e eu acabamos decidindo passar aquela noite na aldeia. Talvez em consideração ao fato de que éramos um casal, seus pais nos colocaram em uma casa vazia nas proximidades.

A casa ainda estava um pouco empoeirada, então fizemos uma breve limpeza e depois nos deitamos para dormir, nós três lado a lado. Parecia um pouco uma cena de um filme em que o casal aparece no hotel e há apenas uma cama com os travesseiros lado a lado, algo brega assim. Contudo, não podíamos fazer nada com a Lara aqui e, além disso, eu era Rudeus, o celibatário, agora. Eu conseguia passar uma noite sem tocar em Roxy, mesmo com ela dormindo bem ao meu lado.

Quando a vi deitada, de olhos fechados, não pude evitar. Esses sentimentos simplesmente se levantaram. Comecei a pensar, não vai ter problema se for só uma cutucadinha…

Pense nisso por um segundo. No fim das contas, tinha abraçado o caminho do celibato para garantir que nenhuma de minhas esposas engravidasse.

Ou seja, estaria tudo bem desde que ninguém engravidasse. Apenas liberar alguns impulsos reprimidos não afetaria o destino de ninguém. Roxy não corria perigo.

Ainda bem que esclarecemos isso. Agora, se você me desculpar, eu vou…

— Rudy.

Aaaah! Desculpa! Foi um pensamento passageiro! Eu não pensei que você se importaria com um pequeno toque… Mas não, você tem razão! Eu sou Rudeus, o celibatário!

Rudeus, o celibatário, jamais permitiria tal coisa!

— Você ainda está acordado? — Roxy perguntou.

— Hooonk… Shooo…

— Não finja estar dormindo. Nossos olhos acabaram de se encontrar.

Relutantemente, abri os olhos. Roxy estava lá, olhando para mim. Seus olhos eram sérios.

— É sobre a Lara.

A respiração de Lara indicava que ela já estava dormindo. Ela parecia um anjo quando dormia, muito longe de sua expressão habitual de desafio.

— A verdade é que eu já suspeitava que ela fosse telepata — explicou Roxy. Não precisei perguntar o porquê daquilo. Era sobre nossa mais nova descoberta. Lara possui a habilidade dos Migurd.

— Não falei nada até agora, mas… sempre que via Lara e Zenith olhando nos olhos uma da outra, considerava a possibilidade.

— A ideia nunca passou pela minha mente.

— Por que iria? Você tem estado tão ocupado nos últimos anos, correndo para lá e para cá.

Ela podia muito bem ter dito “Você não prestou atenção nos seus filhos.”

Quando você coloca assim, talvez ela tenha razão. Talvez eu só tenha prestado atenção no lado doce dos meus filhos. Não ajudei a cuidar deles ou criá-los. Honestamente, tinha me aproveitado de Sylphie e Roxy.

— Não faça essa cara — pediu Roxy. — Não estou te culpando nem nada.

Era doce da parte dela dizer isso. Não importava o quanto eu agonizava ou me arrependia. Naquele momento, minhas mãos estavam cheias lidando com o Deus-Homem. Não tinha como eu passar muito tempo com as crianças.

Roxy acariciou suavemente o rosto de Lara.

— Eu penso sobre isso. Nasci nesta aldeia, e não me lembro de um momento em que não pensei que era uma forasteira.

Quando eu não respondi, ela continuou:

— Olhando para trás agora, foi difícil. Quando saí de casa, fui para uma cidade onde as pessoas usavam palavras para se comunicar. Foi só quando conheci as pessoas de lá e comecei minha vida como aventureira que realmente senti que estava vivendo no meu mundo.

Ela não podia fazer o que todos ao seu redor podiam. A vida era simples para eles, mas não para ela. Quando lhe perguntaram por que ela não podia fazer essa coisa que deveria ser natural, Roxy não tinha resposta. Tudo o que ela podia fazer era continuar sendo vista como um fardo inútil pelas pessoas ao seu redor, até que a própria começou a acreditar nisso.

Só porque todos os outros podiam fazê-lo, no entanto, não significava que era algo natural. Acabou que ela poderia se virar sem aquilo. A sensação de liberdade que Roxy teve quando percebeu deve ter sido incrível.

— E se ao criar a Lara dessa forma, estamos fazendo ela passar pelo mesmo que eu passei? Eu estava bem quando saí de casa, mas isso não vai funcionar para ela. Os Migurd são os únicos com esse poder. — Roxy desviou o olhar.

Talvez estivesse certa. A Tribo Migurd raramente saía desta aldeia. Mesmo no Continente Demônio, quase nunca se via um. Eles não excluíam os outros, mas eram reclusos. Era muito possível que, um dia, Lara começasse a se sentir uma forasteira.

— Então essa é minha ideia… — Roxy franziu a testa como se não estivesse certa sobre o que estava prestes a dizer. Ela não olhou para mim. — E se a deixássemos sob os cuidados dos meus pais?

— …O quê?

— Pensei que poderia ser melhor para ela ficar entre os Migurd até crescer um pouco mais. Talvez até dez ou quinze anos. Depois disso, ela pode decidir por si mesma se vai partir ou permanecer aqui.

Eu não sabia o que dizer. Queria manter meu filho e filhas tão perto de mim quanto fosse possível. Essa era a obrigação que você assumia ao ter um filho; faz parte de ser um pai responsável. Mesmo com toda a situação do Deus-Homem, queria que Lara crescesse em algum lugar onde eu poderia vê-la.

Mas Roxy havia pensado bastante sobre isso antes de trazer o assunto à tona. Sua ideia não era fundamentada em um desejo de fugir de suas obrigações ou desistir de criar sua filha. Ela via como era difícil para Lara, e odiava a ideia de fazer a filha passar pelo mesmo que ela.

Não tinha como Lara, com seus cabelos azuis e sua capacidade de se comunicar de maneiras que os outros não conseguiam, viver a vida sem passar por nenhuma dificuldade. E os pais não podem proteger seus filhos de todas as coisas ruins.

— Eu não gosto — comecei. — Mas, se você acha que é a coisa certa, eu vou… — Parei, sem conseguir terminar. Não conseguia decidir.

Devo colocar meus sentimentos em primeiro lugar, ou a proposta da Roxy? Eu não sabia o que dizer, então eu simplesmente fechei a boca. O silêncio se estendeu até que Roxy disse:

— Sinto muito, Rudy. Vamos fingir que eu nunca disse nada. Por favor, esqueça.

Com isso, o dia chegou ao fim. Roxy e eu adormecemos de mãos dadas.

 

Separador Mushoku

 

A aldeia Migurd era tranquila. Você não ouvia uma voz. Todos os moradores se comunicavam por telepatia, então não havia necessidade de conversar. Algumas das crianças podem ter dito olá para Roxy, mas ela não conseguiu ouvir. Suponho que Lara poderia. Ela provavelmente podia ouvir as pessoas ali preparando a comida, e as brigas dos amantes de dentro das casas, e toda a agitação.

— Ver como pouco mudou aqui me faz perceber o quão cheios esses últimos dez anos foram — ponderou Roxy. — Ou, suponho, como as vidas humanas são apressadas. — Ela olhou para a filha em seus braços. Lara olhou para ela com seu habitual olhar mal-humorado. Dado mais dez anos, esta aldeia provavelmente permaneceria quase igual. Ou se mudasse, não seria de maneiras que pudéssemos ver.

Rowin e Rokari vieram até a entrada da aldeia para nos ver. Ficaram tristes ao nos ver partir.

— Se cuidem — disse Rowin.

— Eu gostaria que vocês ficassem um pouco mais… — acrescentou Rokari.

— Tudo bem se eu der outro abraço na Lara antes de partirem? — Rowin estendeu os braços. Provavelmente era verdade que os avós favoreciam seu primeiro neto em todos os mundos. Esses dois pareciam ter acabado de ter filhos.

— Claro que sim. Aqui. — Roxy deu Lara para ele, então fez um barulho de surpresa quando Lara agarrou a gola do manto de Roxy. Reconheci esse gesto.

— Vamos, Lara — pediu Roxy. — Diga adeus à sua vovó e vovô.

Lara não reagiu. Ela tinha todos os quatro membros enrolados em torno de Roxy como uma cigarra. Depois, sem se soltar, virou-se para me olhar. Sua expressão era a mesma de sempre, mal-humorada e desafiadora.

Sua boca se inclinou, sua sobrancelha franzida e ela parecia pronta para explodir em lágrimas. Era como se ela estivesse pedindo ajuda.

— Ah, querida… Hahaha, não se preocupe com isso — disse Rowin acenando com a mão com um sorriso desajeitado. — Ela disse que não quer deixar a mamãe.

Roxy olhou para Lara com espanto. Então, ao ver a filha à beira das lágrimas, sua expressão mudou para ansiedade.

Lara quebrou o silêncio.

— Naum. Quero a mamãe… — Seu esforço transparecia a cada palavra.

Nossa filha, que mal tinha dito duas palavras até agora, estava se impondo pela primeira vez. Talvez, pensei, Lara estivesse nos ouvindo ontem à noite. Ou talvez não estivesse ouvindo, mas escutar nossa conversa poderia tê-la feito sonhar sobre ser deixada para trás. Se sim, nós a deixamos preocupada à toa.

— Está tudo bem — disse Roxy, abraçando Lara. Sua boca estava apertada enquanto ela lutava para não chorar. — Eu nunca vou te deixar.

 

 

 

A preocupação deixou o rosto de Lara, e ela relaxou.

— Roxy, quando você acha que vai voltar? — Rokari perguntou.

— Boa pergunta. Acho que será quando a Lara crescer um pouco mais, então talvez… mais uns dez anos.

— Tudo bem, querida. Você se cuida, agora.

A resposta de Rokari foi certeira. Dez anos não era muito tempo para ela, imaginei.

Com isso, partimos da aldeia. Os pais de Roxy ficaram na entrada da aldeia até ficarmos fora de vista. Embora a visita tenha sido um pouco estranha em certos momentos, fiquei feliz por me apresentar a eles adequadamente.

Os pais de Eris e Sylphie estavam todos mortos. Roxy não era próxima dos dela, mas ainda assim, família era família. Eu esperava manter nossa relação por muitos anos.

— Bem, Rudy. Estamos prestes a ficar ocupados novamente — comentou Roxy.

— Sim — respondi.

Mas antes, pensei, tenho que cuidar da tarefa diante de mim.

Partimos de volta para Rikarisu.

 


 

Tradução: Black Lotus

Revisão: Pride

 

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