Uma fogueira crepitava na beira do rio, seu brilho quente mantendo a escuridão fria da noite à distância. Mia soltou um suspiro de alívio.
— Ok, não precisamos mais nos preocupar em pegar um resfriado.
O Reino de Remno não ficava no norte gélido, mas também não era tão ao sul a ponto de suas noites serem perpetuamente abafadas. Preocupados com os efeitos que uma noite fria poderia ter na saúde deles, eles prontamente acenderam uma fogueira. Bem, um deles acendeu. A outra apenas observou.
— Devo dizer, não pensei que você soubesse como acender uma fogueira — disse Mia.
— …Bem, eu já fui caçar antes. Aprendi algumas coisas nessas viagens — respondeu Sion, sem encará-la. Em vez disso, ele desviou o olhar, suas bochechas brilhando em vermelho à luz do fogo.
Era difícil culpá-lo. Tudo o que vestiam estava encharcado e precisou ser removido para secar, deixando ambos trajando nada além de suas roupas de baixo. Como resultado, Sion, sendo o cavalheiro que era, precisava se esforçar constantemente para manter o olhar longe dela. Mia, enquanto isso, apoiava o queixo nos joelhos e o observava.
Nossa! Que reação adorável!
A fresta de inocência em sua armadura de competência estampou um sorriso no rosto dela. Não que ela não estivesse envergonhada também, claro. Suas sensibilidades eram igualmente vulneráveis ao constrangimento de ser encarada por alguém do sexo oposto vestindo nada além de roupa íntima molhada. No entanto, no fim das contas, Sion era um garoto de doze ou treze anos, enquanto Mia tinha vinte anos por dentro — Vinte e um, na verdade, considerando que quase um ano se passara desde que ela viajara no tempo.
Ela era uma adulta! Uma dama de maturidade e compostura! Que estava admirando um garoto corado com um sorriso sinistro no rosto!
Ela era… o tipo de adulta de quem todos deveriam manter distância.
— Na verdade, sou eu quem está surpreso — disse Sion. — Quer dizer, sei que a chamam de a Grande Sábia do Império, mas eu nunca esperei que você soubesse sequer quais ervas selvagens são comestíveis.
— Oh, por favor. Dificilmente é o tipo de coisa para se surpreender — disse ela com a confiança presunçosa de quem tem um ás na manga.
Havia uma razão para sua atitude. Mia, veja bem, não era amadora. Ela tinha experiência anterior em passar a noite em uma floresta. Não foi durante o incidente na Floresta dos Mares Tranquilos; foi muito mais tempo atrás, lá na linha do tempo anterior. Em uma tentativa desesperada de escapar do exército revolucionário, ela correra para uma floresta para se esconder, acompanhada apenas por uma única criada de competência duvidosa.
Foram tempos difíceis…
Ela não conseguia encontrar água potável. Não tinha comida. Seus guardas há muito haviam se separado dela, e bestas selvagens pareciam espreitar em cada sombra. Além disso, seus captores estavam por perto, impedindo-a de procurar ajuda.
Não demorou muito para que sua criada fugisse para uma das aldeias vizinhas.
“É tudo culpa sua que fui arrastada para esta bagunça!”
Deixando para trás essas palavras e um olhar rancoroso como presente de despedida, a garota fugiu. Com sua partida, Mia ficou verdadeira e brutalmente sozinha. À medida que a noite ficava mais escura, seu coração ficava mais frágil. Sede e fome, amplificadas pela terrível solidão da penumbra da floresta, roíam dolorosamente sua mente e corpo. Eventualmente, sua vontade cedeu, e ela cambaleou para uma aldeia próxima, onde foi prontamente capturada pelo exército revolucionário.
Comparado a isso, isto é um passeio no parque.
A sede não seria um problema. Afinal, um rio — quando não estava tentando te afogar, de qualquer maneira — era uma fonte infinita de água potável. Quanto à fome, dependeria do que era comestível nas florestas do continente em questão. O que, é claro, Mia já havia pesquisado minuciosamente quando se enfurnou na biblioteca. O medo abrangente e sempre presente da guilhotina a transformara em uma verdadeira guru da selva. A essa altura, ela tinha conhecimento suficiente para dar trabalho a verdadeiros especialistas em sobrevivência.
Ela examinou seus arredores e anotou suas opções disponíveis, que iam de ervas comestíveis a frutas vermelhas e frutas, e decidiu que sua barriga não reclamaria por um bom tempo. Além disso, ela tinha o Príncipe Sion ao seu lado.
Lembro-me de ter morrido de medo de encontrar um urso ou um lobo naquela época, mas contanto que eu o tenha, pensou ela com um olhar de avaliação para Sion, estou segura.
Com o alívio veio o contentamento, e um sorriso complacente se espalhou lentamente por seus lábios. Um espectador razoável teria apontado que pedir a um garoto para lutar sozinho contra um urso ou um lobo era uma tarefa difícil, se não impossível, mas, infelizmente, nenhum espectador sensato estava disponível para fornecer qualquer comentário ponderado. A única outra pessoa presente era o próprio Sion, que no momento estava olhando contemplativamente para o nada e indisponível para comentar.
Agora que penso nisso, não acredito que agora ele esteja me protegendo. É tudo muito bizarro, pensou ela, estudando distraidamente seu perfil. Seus traços eram tão esculpidos que aquilo realmente a incomodava. Incomodava-a tanto, na verdade, que ela não conseguiu resistir ao impulso de se divertir um pouco às custas dele.
— Diga, Príncipe Sion, tudo bem se eu lhe fizesse uma pergunta?
Ele olhou rapidamente para ela antes de se virar novamente.
— Claro. Responderei o melhor que puder. Dentro dos limites, é claro…
Ela manteve os olhos nele e continuou em voz baixa.
— Se o senhor descobrisse que seu amigo e colega de escola, o Príncipe Abel, estava participando da supressão forçada de seu povo, o senhor o abateria?
— Eu…
— Ouvi muito sobre seu caráter, e acredito que o senhor seja uma pessoa de integridade, tão nobre de espírito quanto a Senhorita Rafina. E é precisamente por causa de seu caráter que desejo lhe perguntar. Se alguém que o senhor conhecesse pelo nome, alguém que é seu amigo, estivesse envolvido na prática de atos malignos, o senhor o julgaria com sua espada?
Era uma pergunta que estava em sua mente há muito tempo. O exército revolucionário, liderado pelo Príncipe Sion e por Tiona, tirara sua vida. Até certo ponto, ela passara a entender por que o fizeram. Podia ver como a fome de seu povo incitara sua raiva. Impulsionados por suas muitas queixas, eles provavelmente tinham amplas razões para desejar sua morte.
Mas isso foi no passado. Eles eram pessoas que ela não conhecia. O que ela estava realmente curiosa para saber… era como Sion se sentira. Que pensamentos e sentimentos estavam passando por sua cabeça quando ele observou aquela lâmina terrível descer sobre seu pescoço?
— Isso… certamente veio do nada, Princesa Mia. — Sion ficou em silêncio por um momento, seu rosto pensativo.
Eu não havia considerado essa possibilidade…
O menor indício de incerteza cintilou em seus olhos, durando apenas um segundo. Então, ele respondeu.
— Se o Príncipe Abel participasse da supressão forçada de seu povo e manchasse sua espada com o sangue deles… Então sim. Eu não teria escolha a não ser virar a minha contra ele.
Sua voz era inabalável, e ele falou com a convicção solene de alguém que, criado e treinado para ser o Príncipe Herdeiro de Sunkland desde bebê, fora ensinado por toda a vida a defender a justiça a todo custo. Simplesmente não estava nele fechar os olhos para o mal, especialmente se o malfeitor estivesse diante dele. No entanto, as próximas palavras de Mia o fariam vacilar.
— Então, dependendo das circunstâncias, o senhor está disposto a matar o Príncipe Abel? É isso que quer dizer, Príncipe Sion?
Ele não teve uma resposta imediata. Era verdade que Abel Remno não era um amigo do peito para ele. Mesmo assim, suas experiências compartilhadas como colegas de classe na Academia São Noel foram mais do que suficientes para forjar entre eles um vínculo próximo o suficiente para ser chamado de amizade. Se chegasse a hora, ele conseguiria erguer sua espada contra alguém que considerava um amigo? Ele conseguiria matar Abel? Seu coração permitiria? Ele respondeu, tentando arduamente ignorar a incerteza que vacilava dentro dele.
— Sim, é isso. O que a senhorita disse é possível.
Então, em um tom muito diferente de sua confiança habitual, ele qualificou sua declaração como se estivesse dando uma desculpa.
— Quer dizer, eu faria, mas não é como se eu tivesse alguma escolha, certo? É uma escolha que o Príncipe Abel teria feito. Não haveria nada que eu pudesse fazer a respeito.
Governar um reino era assumir a responsabilidade de defender a justiça. Como membro da família real, Sion sempre fora ensinado que tinha o dever de aplicar a punição apropriada àqueles que cometiam o mal, e esse princípio servia tanto como um padrão ao qual ele se esforçava para alcançar quanto como uma fonte de disciplina para si mesmo.
— O senhor não teria escolha… Não haveria nada que pudesse fazer… Isso é realmente verdade?
E, no entanto, a garota diante dele, conhecida como a Grande Sábia do Império, expressou dúvida.
— Está dizendo que estou errado?
Sua voz adquiriu um tom afiado. Um pensamento passou por sua mente. Mia estava vendo isso através das lentes da razão… ou do amor? Estaria ela talvez inserindo suas emoções pessoais e tomando o partido de Abel? Ele considerou a ideia, depois a descartou.
Não, não é isso.
Ele viu o brilho em seus olhos. Não era o fraco cintilar da tristeza, nem as brasas lamentáveis do apelo. Não… Era raiva. A Grande Sábia do Império estava furiosa com o que ele dissera.
— Essas palavras deveriam vir apenas dos lábios de quem já fez tudo ao seu alcance para evitar a violência, não deveriam, Príncipe Sion?
O jeito como ela o olhou — através dele — fez sua respiração ficar presa na garganta. Ele julgava porque não tinha escolha. Ele aplicava a punição porque o mal fora feito. Estes eram princípios centrais de sua visão de mundo. Ele os via como verdades fundamentais, tão claras quanto o sol no céu. E, no entanto, Mia os questionara. Ao fazer isso, ela parecia estar lhe perguntando: “E você, Príncipe Sion? Você alega não ter escolha… mas o que você fez para impedir esse mal? Para impedir que essa pessoa cometa o ato?”
Sion não era alheio às dificuldades enfrentadas pelo Reino de Remno. Seus espiões que trabalhavam lá secretamente lhe enviaram um fluxo constante de relatórios durante as férias de verão, e ele sabia que a agitação estava no ar. Ele até se preparara para a eventualidade de uma intervenção militar. Isso foi, no entanto, a extensão do que ele fizera. Não havia mais nada. Embora ele andasse por aí soltando platitudes morais sobre defender a justiça e punir aqueles que atormentam as massas, ele não fizera uma única coisa para impedir que esse tormento fosse infligido. Tinha ele, então, realmente o direito de julgar o Príncipe Abel? Uma massa nebulosa de incerteza começou a crescer em seu coração, juntamente com uma nova pergunta.
Por que a Princesa Mia partiu nesta jornada? Pensei que fosse porque ela só queria ver o Príncipe Abel… mas poderia haver outra razão? Poderia ela estar tentando impedi-lo de fazer algo errado?
Ele continuou seguindo a lógica de sua própria hipótese…
O que significa… que ela está tentando impedir que a revolução ecloda em Remno? Isso é sequer possível?
Ele olhou para ela, que fitava o fogo. Ela não disse nada. Seu silêncio, no entanto, e as palavras que eles deixaram por dizer ecoaram em sua mente, e ele descobriu dentro de si um crescente sentimento de admiração pela jovem princesa.
…Mal precisa ser dito neste ponto, mas, obviamente, Mia não tinha intenção de impedir a revolução. Para ser honesta, ela não dava a mínima para as crenças de Sion. Então, por que ela estava ficando tão zangada?
Você não teve escolha? Essa é a sua desculpa pelo que fez comigo?!
Aí residia a fonte de sua indignação. Claro, o Império Tearmoon estava desmoronando na época. Ela podia aceitar que as massas tinham boas razões para odiar os de alta estirpe. Podia até engolir as críticas de nações estrangeiras. Tudo isso era indiscutivelmente justificado. No entanto… havia uma coisa que ela achava absolutamente intolerável.
Eu morri porque você não se deu ao trabalho de nem mesmo me avisar que eu estava me metendo em encrenca? Apenas um rápido aviso teria sido suficiente! Você poderia, sabe, ter dito algo antes de começar uma revolução e deixar cair uma maldita lâmina na minha cabeça!
Certamente, todo aquele tempo que passaram juntos na academia deveria ter lhe rendido pelo menos uma palavra de cautela antes que medidas tão drásticas fossem tomadas. Se ele apenas a tivesse sentado um dia e lhe dito: “Ei, olha, estamos fartos da sua atitude”, as coisas poderiam ter melhorado. Em vez disso, ele esperou até que as coisas estivessem muito além do ponto de não retorno antes de entrar galantemente para salvar o dia e declarar a ela que “Eu não tive escolha a não ser levá-la à justiça!” e “Esta é a consequência de suas próprias ações!” Só de pensar nisso, ela fervia de raiva.
Retiro tudo de bom que já disse sobre ele! Ele é uma pessoa terrível e odeio suas entranhas!
Tão chateada que teve que se impedir de ranger os dentes, todos os tipos de pensamentos entraram em sua mente. Zangados, indignados, frustrados… A única coisa que nunca apareceu foi qualquer esboço de um plano para o que eles deveriam fazer a partir de amanhã.
Tradução: Gabriella
Revisão: Matface
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