Indo para fora das muralhas do castelo que cercava Parnam, o campo de refugiados ficava em um terreno a cerca de cem metros de distância. As tendas e choupanas estavam espalhadas ao acaso, e havia campos de vegetais rústicos em algumas áreas. Era onde viviam cerca de oitocentos refugiados.
Haviam várias raças ali. Humanos, elfos, homens-fera e anões também. Foi assim que muitos países foram destruídos pelo Domínio do Lorde Demônio e muitos povos foram forçados a fugir.
Eles haviam montado acampamento no local e viviam um estilo de vida quase primitivo, compartilhando os recursos e suprimentos que o reino lhes fornecia, depois caçando e colhendo para compensar o que não tinham.
Normalmente, a caça e a coleta exigiam permissão do país, mas o ex-rei, Albert, os havia deixado por conta própria. Continuei essa abordagem depois de assumir o trono sozinho. Tive uma montanha de problemas para lidar, além dos refugiados, então minha única escolha foi dar a eles um mínimo de apoio enquanto os deixava sozinhos.
Eu não poderia, de forma alguma, chamar o que eles tinham de condições de vida adequadas, mas estavam pelo menos recebendo algum apoio, que era melhor do que nada.
A situação dos refugiados neste continente era difícil. As únicas nações que podiam deixar os refugiados em paz eram países como o nosso ou o Império, que tinha algum poder nacional de sobra. Ouvi dizer que em países que fazem fronteira com o Domínio do Lorde Demônio eles eram recrutados à força e enviados para as linhas de frente, enquanto outros países os tratavam como escravos ou os usavam como mão de obra barata nas minas sob o pretexto de lhes dar abrigo.
O fato de os refugiados estarem indo para um país tão longe do Domínio do Lorde Demônio como o nosso só mostrava que não havia porto seguro para eles em nenhum outro lugar deste continente.
Caminhei por aquele campo de refugiados, seguindo o jovem que o ancião dos lobos místicos havia enviado como meu guia.
O cenário me lembrou das favelas de não muito tempo atrás. Uma olhada no estado em que as pessoas se encontravam foi suficiente para deixar claro o quão ruins eram as condições sanitárias. Suas roupas estavam esfarrapadas e seus corpos cobertos de sujeira e poeira.
E, ainda assim, nenhum deles tinha olhos que pareciam mortos por dentro. Cada um deles tinha os olhos cheios de vitalidade.
— É imundo, mas… todos eles têm uma força estranha no olhar — disse Hilde, que cobria o nariz e a boca com um pano desde que entramos na vila. Não era uma cena fácil de se ver para uma maníaca por limpeza.
Liscia e todas as outras tinham olhares de dor em seus rostos.
— Eles vieram para cá de muito longe ao norte, com apenas a vontade de viver — falei. — Tenho certeza de que as pessoas aqui são provavelmente muito mais resistentes do que imaginamos.
As pessoas que enfrentam dificuldades contra as quais nada podem fazer em tempos de guerra ou desastres naturais, mas ainda se recusam a ceder ao desespero, têm uma força única. Ainda assim, essa força… também pode ser um perigo. Enquanto isso fortalece sua vontade de se unir e superar a situação, a consciência de grupo pode se tornar muito forte e enfraquecer seu senso de individualidade.
Se aparecesse alguém suspeito e tomasse a liderança em momentos como este, o grupo como um todo poderia facilmente ser influenciado pelas opiniões dessa pessoa. Eu definitivamente não gostaria que alguém conectado ao Estado Papal Ortodoxo Lunar entrasse em contato com eles.
Enquanto eu pensava sobre isso, Liscia falou:
— A propósito… Kazuya. Você disse que deu apoio a eles, mas o que você fez?
Ela quase me chamou de Souma, mas sendo este o tipo de lugar que era, eu pedi que se abstivesse de usar meu nome (bem, era meu sobrenome, para ser mais preciso) tanto quanto possível.
— Não foi muito, mas fornecemos alimentos e lenha, entre outras necessidades básicas, e também contratamos a guilda dos aventureiros com uma missão para proteger este lugar — falei.
— Entendo o motivo para fornecer comida, mas por que contratar os aventureiros como guardas?
— Essas pessoas não são cidadãos deste país. Além do mais, perderam seus próprios países, que normalmente os apoiariam e os defenderiam. Por exemplo, se civis de nosso país fossem massacrados sem justa causa em uma terra estrangeira e os culpados ficassem impunes, eu apresentaria uma reclamação a esse país como rei e aplicaria sanções a eles, dependendo da situação. Também funciona ao contrário. Em outras palavras, isso criaria um incidente internacional. O potencial de algo causar um incidente internacional é uma força restritiva que impede nossos cidadãos de cometer crimes em outro país. Mas…
Fiz uma pausa e olhei para as pessoas no acampamento.
Continuei:
— Não existe essa força restritiva quando se trata de pessoas que não têm país próprio. Você terá pessoas que pensam erroneamente: “Se não causar um incidente internacional, então está tudo bem”. Só porque não causará um incidente internacional não significa que não serão julgadas sob as leis deste país, mas esse tipo de mentalidade ainda pode reduzir os obstáculos psicológicos o suficiente para que algumas pessoas o cometam. É exatamente por isso que quero que os refugiados se apressem e se naturalizem como cidadãos deste país.
Se eles fizessem isso, eu poderia oferecer-lhes abrigo e tratá-los como meu próprio povo. No entanto, eu estava bem ciente de que não seria tão simples quanto parecia. Nem tudo neste mundo pode ser abordado com razão.
— Quando o coração das pessoas está envolvido, as coisas ficam realmente difíceis — falei.
— Verdade… — Liscia concordou.
De repente, ouvimos gritos de dentro da vila. Ao mesmo tempo, havia o som de metal contra metal.
Liscia franziu a testa.
— Parece que alguém está lutando. Vários alguéns, aliás.
— Vamos lá — falei.
Todos correram em direção ao som da comoção.
Quando chegamos ao centro da comoção, havia um bando de homens e mulheres que parecia um grupo de aventureiros que, ao lado de um punhado de pessoas da aldeia, lutava contra mais de dez homens que pareciam ser mercenários. Os aventureiros incluíam um jovem espadachim, um lutador mal encarado, uma mulher empunhando uma espada curta que parecia uma ladra e uma bela maga.
Espere, ali estavam muitos rostos familiares…
Então, Juno e seu grupo assumiram essa missão, hein?
Dece o espadachim, Augus o lutador, Juno a ladra e Julia a maga. Eles eram os membros do grupo com quem eu costumava trabalhar quando mandava o Pequeno Musashibo para se aventurar.
— O que é toda essa comoção, poderia me dizer, por favor? — perguntou Owen a um homem que estava tremendo nas proximidades.
— Esses homens apareceram de repente e estavam tentando sequestrar as crianças! Eles até eliminaram os adultos que tentaram impedi-los! Depois disso, entraram em uma batalha com os aventureiros que ouviram o barulho e correram para cá!
Os adultos foram abatidos? Quando olhei para o canto, pude ver um homem sangrando sendo tratado pelo sacerdote, Febral.
Comecei a dar as ordens.
— Carla, Owen, ajudem os aventureiros.
— Entendido, mestre!
— Como desejar!
— Hilde, quero que você ajude aquele sacerdote ali — continuei. — Liscia, aguarde mais instruções.
— Tá, tá. Acho que também vou precisar ajudar — disse Hilde.
— Urgh… tudo bem — Liscia concordou.
Carla e Owen correram imediatamente para a frente, e Hilde foi até os feridos. Eu ia preparar um dos meus bonecos, caso fosse necessário, mas então percebi que não estava com nenhum deles. Certo… os deixei para trás porque imaginei que seriam bagagem demais para uma viagem fora das muralhas do castelo. Desembainhei a espada que usava como pouco mais do que uma decoração e assumi uma postura de combate.
— Você pode lutar se for necessário? — perguntou Liscia, seu florete em punho.
— Não sei — admiti. — Owen tem me colocado em dificuldades ultimamente, mas ele diz que ainda sou um pouco melhor do que um recruta.
— Isso não é muito reconfortante — disse ela. — Ainda assim, pelo que posso dizer, os números estão do lado deles, mas nenhum deles é particularmente forte. Duvido que alguém esteja abaixo do nível de um recruta. Se precisar, esconda-se atrás de mim.
— Por mais patético que seja, acho que terei de fazer isso — falei.
Eu não gostava de ser fraco, mas, se me intrometesse, provavelmente só causaria problemas para meu próprio povo. Eu estava em uma posição em que não podia me dispor a sofrer o mais leve dos danos. Isso era o que eu estava pensando, mas…
— Ah!
— Espera — gritou ela. — Para que você está avançando, logo depois que falamos sobre isso?!
Ouvi a voz de Liscia atrás de mim, mas não parei. Juno teve azar e tropeçou ao ter sua perna atingida por um pedaço de pau que foi arremessado contra ela. Foi quando um dos homens que tinha o cabelo estilo moicano tentou atacá-la. Enquanto corria em direção a eles, peguei um pedaço de tábua de madeira que havia caído no chão.
— Abaixe-se! Juno! — gritei e joguei a tábua no homem, igual um disco.
— Huh? Uwah! — Juno gritou e se abaixou.
O homem de moicano cortou a placa voadora. Como o ataque o pegou completamente de surpresa, ele não conseguiu cortar a tábua de forma limpa e acabou destruindo-a pela metade. Graças a isso, parecia que as lascas de madeira haviam entrado em seus olhos.
— Ai! Droga! — O Moicano pressionou seus olhos, agitando sua espada freneticamente enquanto recuava.
Aproveitei essa abertura para entrar no espaço entre os dois. Sua visão devia ter se recuperado, porque foi em minha direção.
Acalma-se! Uma troca de golpes! Eu só preciso resistir por uma troca, e então Juno terá recuperado o equilíbrio! Basta lembrar o básico que Owen me ensinou!
O Moicano ergueu a espada bem acima da cabeça. Ele ia tentar esmagar e abrir minha cabeça.
Levei meu pé esquerdo diagonalmente para a frente e assumi uma posição com minha espada acima da cabeça, horizontalmente, a ponta da espada um pouco inclinada em direção ao chão. No próximo instante…
Clang!
O som de metal batendo contra metal ecoou, então, com um som de raspagem, a espada do Moicano deslizou pela minha lâmina e foi desviada para o chão, à minha direita.
Eu consegui… eu consegui! Minhas mãos estavam dormentes, mas de alguma forma consegui bloquear!
— Não fique aí parado! — Liscia e Juno gritaram juntas.
Enquanto ele tentava recuperar o equilíbrio, Liscia e Juno cravaram suas espadas nele ao mesmo tempo. Ele desabou.
Assim que ela confirmou que seu oponente não estava mais se movendo, Liscia me agarrou pela frente da minha camisa. Ela me puxou para perto de seu rosto.
— O que você estava pensando, atacando daquele jeito?!
Ela parecia furiosa, mas, de perto, pude ver lágrimas em seus olhos.
— Oh, um… me desculpe…
— Não, nada de “me desculpe”! Você quase me causou um ataque cardíaco. Se algo acontecesse com você… o que eu… o que todos nós faríamos…?
Quando ouvi a voz de Liscia gradualmente sumindo com a emoção, pude sentir o quanto ela estava preocupada com a minha segurança. A mistura de felicidade e culpa fez meu peito doer.
— Não, sério, sinto muito! — falei. — Alguém que eu conheço estava sendo atacado, então me movi sem pensar…
— Ei, você!
De repente, fui agarrado pela nuca e arrastado na direção oposta. Quando me virei, Juno estava olhando para mim com um olhar super suspeito.
— Você me chamou de Juno, não foi? — retrucou ela. — Como você sabe meu nome?
— Não… Isso é, hm…
— Espere aí, So… Kazuya. — Liscia olhou para mim, parecendo chateada por um motivo diferente de antes. — Quem é essa garota?
Ela quase me chamou de Souma pela segunda vez, mas com Juno ao nosso lado, ela mudou para o meu nome secreto.
Sim, foi um bom pensamento rápido. Agora, eu só queria que ela não me encarasse de forma tão rígida.
Eu estava imprensado entre duas garotas bonitas, ambas olhando para mim. Algumas pessoas poderiam ter ciúmes dessa situação, mas, infelizmente, eu não estava preparado para esse tipo de fetiche para conseguir apreciar isso.
Essa situação… Como exatamente vou explicar isso? Imaginei.
Ou melhor, por onde eu deveria começar? Deveria começar me apresentando como a pessoa de dentro do Pequeno Musashibo (ou, mais precisamente, controlando-o remotamente)?
O olhar de Juno mudou para Liscia. Algo deve ter chamado sua atenção, porque ela a estava inspecionando de perto.
— Ei, eu sinto que também já te encontrei em algum lugar.
— Hein? — perguntou Liscia. — Ah!
Liscia puxou meu braço com força e sussurrou ao meu ouvido:
— Essa garota, ela estava naquele banquete, certo?
Huh? Oh! Agora que pensei nisso, Liscia conheceu Juno, não? Ela tinha reconhecido Juno, mas a julgar pela reação de Juno, ela não percebeu quem era Liscia. Provavelmente porque Liscia estava levemente disfarçada.
Juno colocou as mãos nos quadris, com a raiva estampada na cara.
— Sobre o que vocês dois estão cochichando? Parece suspeito.
— Não, não é nada suspeito, sério… — falei.
Quando Juno me encarou com seus olhos inflexíveis, fiquei um pouco incomodado. Foi quando Carla e Owen, que tinham acabado de exterminar os bandidos, voltaram.
— O que você estava fazendo, mestre?! — gritou Carla. — Indo para a frente desse jeito?!
— Gahaha! — Owen riu. — Eu vi aquilo. As técnicas de espada que ensinei a você foram úteis, não foram?
Vendo isso como minha chance de escapar da atmosfera atual, saí do meio do sanduíche Liscia-Juno e corri para os dois.
— Ah! Ei! Eu quero uma explicação adequada! — disse Juno atrás de mim.
Ignorando as reclamações dela, perguntei a Carla e Owen:
— Bom trabalho, vocês dois. Então, quem eram aqueles caras, afinal?
— Pelo que pude constatar, parece que era um comerciante de escravos e homens a seu serviço — disse Carla.
— Um comerciante de escravos? — repeti.
— O senhor nacionalizou o comércio de escravos recentemente, mestre, — explicou ela. — Ouvi dizer que você também tornou os exames de qualificação mais rigorosos. Isso levou os comerciante de escravos de outras nações para fora do país, e os escravistas de nosso próprio país que não conseguiram se qualificar também estão partindo para outros países. Era um grupo de escravistas reprovados no exame de qualificação.
Eu havia transformado comerciantes de escravos em servidores públicos recentemente. Ainda não poderia abolir o sistema de escravidão, mas para torná-lo algo que existisse apenas no nome, estava trabalhando para que os escravos deixassem de ser tratados como objetos para serem tratados como trabalhadores e pessoas. Para conseguir isso, fiz com que donos de escravos que tratassem seus escravos como objetos e abusassem deles fossem reprovados no exame de qualificação.
— Mas por que pessoas assim atacaram os refugiados? — perguntei.
— Para financiar a partida para o exterior, eles pretendiam sequestrar mulheres e crianças que pareciam render um bom preço, sem dúvida — disse Carla. — Como os refugiados não são pessoas deste país, devem ter pensado que as autoridades não agiriam de forma proativa para protegê-los.
— Como se não fôssemos! — gritei.
— N-Não é para mim que você precisa dizer isso — disse Carla com um olhar preocupado em seu rosto, me trazendo de volta aos meus sentidos. Verdade, isso não era algo para eu dizer a ela.
— Me desculpe — falei. — Sinto muito por perder minha compostura.
— Não…
— Carla, me desculpe, mas você poderia voar de volta para o castelo e relatar o que aconteceu aqui para o Hakuya? — perguntei. — Tenho certeza que ele enviará um aviso para aqueles que precisam saber e começar a pensar sobre as medidas necessárias imediatamente.
— Sim, senhor. Entendido.
Assim que disse isso, Carla abriu bem as asas e se ergueu no ar, voando em direção ao castelo em alta velocidade. Naquele instante, tive um vislumbre de sua cinta-liga, então rapidamente desviei o olhar.
Não, não vi nada muito importante. Então, por favor, Liscia, não me olhe assim.
Então, quase exatamente ao mesmo tempo que Carla decolou, Hilde voltou.
— Terminamos de tratar os feridos. Não foram ferimentos leves, mas provavelmente se deve ao trabalho rápido do sacerdote. Suas vidas não estão em perigo. As feridas já foram fechadas com magia.
— Entendo… Isso é bom…
— Mas o que você vai fazer? — perguntou Hilde. — Parece que uma multidão se reuniu aqui.
Quando olhei ao redor, vi refugiados que começaram a se reunir quando ouviram a comoção. Tínhamos conseguido ser discretos até o momento, então eu não queria me destacar a essa altura. Chamei Owen e Liscia.
— Vamos deixar os aventureiros entregarem esses caras às autoridades. Iremos nos encontrar com o chefe da vila, conforme planejado.
— Entendido, senhor — disse Owen.
— Você não vai fazer nada a respeito de Juno? — perguntou Liscia.
— Não vejo uma boa maneira de explicar esta situação. Além disso, provavelmente seria ruim se souberem que era o rei dentro do Pequeno Musashibo o tempo todo.
— É verdade, se as pessoas descobrissem que o rei estava brincando com bonecos, isso não seria exatamente digno. — Liscia acenou com a cabeça para si mesma, aparentemente satisfeita.
Então, saímos dali com pressa.
— Ah, ei! Espera! — Juno gritou atrás de mim quando percebeu, mas eu não queria esperar.
Até logo, pops!
Não, espera,a ladra ali era ela.
Deixando a limpeza para Juno e seu grupo, fomos para o centro do campo de refugiados para cumprir nosso objetivo original de nos encontrar com o chefe. Depois de seguir nosso guia por algum tempo, finalmente fomos conduzidos a uma grande tenda que parecia uma ger mongoliana ou uma yurt.
Quando entramos na tenda, havia um homem grande, sentado de pernas cruzadas com as duas mãos no chão, curvando a cabeça para nós. Era uma pose que eu costumava ver vassalos fazerem em relação a seus senhores em dramas de época.
O homem grande, que parecia ter cerca de trinta anos, usava, se eu fosse descrevê-lo de forma simples, uma vestimenta que parecia a roupa de um Nativo Americano ou algo semelhante. Ele tinha um físico bronzeado e musculoso e, embora já estivesse bastante frio, suas roupas de couro não tinham mangas. Ele usava uma pintura de aparência mágica no rosto.
Atrás dele havia uma garota vestindo roupas semelhantes que estava sentada na mesma pose. A idade dela provavelmente não era tão diferente da de Liscia ou de Roroa. Ela era uma linda garota com cabelo castanho escuro e uma simplicidade rústica. Havia uma semelhança em seus rostos, então esses dois podiam ser irmãos.
— Agradeço a sua presença, Grande Rei da Friedônia — disse o homem.
— Por favor, você poderia não me chamar de Grande Rei, nem nada parecido? — falei. — Eu realmente não gosto desse tipo de coisa.
Sentei-me na frente do homenzarrão. Não em uma cadeira, mas diretamente no tapete que havia sido estendido. Era algo familiar para um japonês.
Pela sensação, eu poderia dizer que provavelmente havia tábuas de madeira sob o tapete. Não parecia ter sido estendido diretamente na terra.
Liscia sentou-se ao meu lado, enquanto Owen, Hilde e Carla, que já havia retornado, sentaram atrás de nós, esperando.
O grandalhão disse:
— Entendo… — Um olhar pensativo em seu rosto. — Então, como devo chamá-lo?
— Rei Souma… Vossa Majestade… chame-me do que quiser.
— Entendido, Rei Souma. Eu sou Jirukoma. Sou o chefe desta vila de refugiados. Ouvi dizer que você acabou de ajudar algumas de nossas pessoas, e por isso agradeço do fundo do meu coração. — Jirukoma curvou a cabeça profundamente.
— Eu sou Souma Kazuya, aquele que age como o rei deste país — falei. — Quem os ajudou foram os aventureiros que despachamos para cá. Se quiser agradecer a alguém, agradeça a eles.
— Não, os aventureiros estão aqui por causa do seu apoio — disse Jirukoma. — Agradeço a você por isso e pelos suprimentos que você nos deu.
— Aceitarei seus agradecimentos. Mas, sabe, eu não vim aqui hoje para que você pudesse me agradecer, certo?
A expressão de Jirukoma endureceu. Ele tinha que saber o motivo da minha visita. Afinal, ele já havia falado muitas vezes com os emissários que enviei para discutir o assunto.
— Eu vim para pressioná-lo a tomar uma decisão — falei. — Você ouviu o conselho dos meus emissários, certo? Agora que vim pessoalmente, hoje é o dia em que você deve finalmente tomar sua decisão. O que você escolhe?
— Isso é…!
— Pare, Komain — disse Jirukoma.
— Mas, Irmão!
A garota tentou se levantar, mas Jirukoma fez sinal para que ela parasse.
O nome da garota era Komain, hein? Eles eram aparentemente irmãos, exatamente como eu pensava.
Jirukoma disse a ela:
— Nossas palavras decidirão o destino de todos nesta vila. Não podemos nos irritar rapidamente.
— Entendo… — Komain voltou a se sentar.
Por um momento, Owen e Carla, atrás de mim, ficaram tensos esperando uma luta, mas Komain abaixou os braços, por assim dizer, e eles também se acalmaram.
Uma atmosfera tensa caiu sobre nós.
Talvez preocupada com isso, Liscia falou:
— Souma, gostaria que você explicasse a situação…
— Certo… quero resolver todo esse problema de refugiados agora — falei. — Porque nada de bom virá, nem para o nosso país nem para as pessoas que aqui vivem, se deixar as coisas como estão. É por isso que forcei os refugiados a tomarem uma decisão.
— Uma decisão? — perguntou ela.
Dei um aceno de cabeça pesado, então disse claramente:
— Eles podem abandonar seu desejo de voltar para casa e se tornarem pessoas deste país, ou podem ir embora.
Para os refugiados que perderam suas casas com o surgimento do Domínio do Lorde Demônio, seu verdadeiro desejo era retornar à sua terra natal e retomar as vidas que um dia tiveram.
No entanto, na situação atual, não havia indicação de quando ou se isso seria possível.
A principal incursão que foi lançada contra o Domínio do Lorde Demônio terminou em fracasso, instilando o medo do Domínio do Lorde Demônio nas forças da humanidade.
Mesmo a maior nação do lado da humanidade, o Império Gran Caos, não estava entusiasmado com a ideia de outra invasão. As nações estavam focadas exclusivamente em impedir que o Domínio do Lorde Demônio se expandisse ainda mais.
Mesmo que, em algum momento no futuro, algo fosse mudar essa situação para melhor, não seria nos próximos dias. Não seria nos próximos meses também. Mesmo com o passar dos anos, ainda poderia ser difícil.
Sendo esse o caso, o que os refugiados deveriam fazer em resposta? Continuar a orar por seu retorno, não jurando lealdade a nenhum país enquanto permaneciam em uma terra estrangeira?
Isso não era bom… Esse tipo de arranjo distorcido certamente acabaria causando problemas.
— O antigo rei fez vista grossa à presença deles — falei. — Tive uma montanha de outros problemas para lidar, então continuei assim até hoje. Até dei algum apoio, embora pouco.
Jirukoma não disse nada.
— Mas, agora, com as soluções para todos os outros problemas resolvidas, tenho que resolver este. Não podemos simplesmente fornecer suporte para sempre, e você permanecer aqui ilegalmente é um problema. Fizemos vista grossa até agora, mas caçar e forragear sem licença é contra a lei. Se tolerarmos esses atos ilegais, com certeza despertaremos o ressentimento do povo deste país.
Porque eles não pertenciam a este país.
Por enquanto, ainda havia um ar de simpatia por eles, porque haviam perdido seus países quando o Domínio do Lorde Demônio apareceu. No entanto, ar era ar. Nunca se sabe quando os ventos poderiam mudar.
Eles não tinham perspectiva de voltar para casa. Se apoiássemos os não cidadãos indefinidamente e continuássemos a ignorar seu comportamento ilegal, não demoraria muito para que o ressentimento do povo transbordasse. Na pior das hipóteses, poderia haver confrontos entre as pessoas e os refugiados.
— É por isso que pressiono as pessoas aqui a tomarem uma decisão — falei. — Eles podem desistir de retornar às suas terras natais e se tornarem pessoas deste país, ou podem escolher não desistir de retornar e deixar este país. Estou aqui hoje para que eles façam essa escolha.
— Mas, Souma, isso é…
Liscia tinha uma expressão de dor no rosto, mas eu balancei minha cabeça silenciosamente.
— Você pode achar que é cruel, mas é necessário.
No mundo de onde eu vim, havia um livro que comparava uma nação a um monstro e seu povo a inúmeras escamas que o cobriam. Na capa desse livro, o monstro era retratado como uma pessoa maior que uma montanha.
— Um país é… fundamentalmente, algo como uma pessoa gigante — falei. — E as pessoas são espelhos que refletem umas às outras. Se alguém te ama, você pode amá-lo de volta e vai querer protegê-lo de qualquer maneira. Se eles são indiferentes, você será indiferente a eles. E a menos que você seja um santo, você não pode amar alguém que te odeia.
— Os países são iguais… é o que você quer dizer — disse Jirukoma gravemente.
Eu concordei.
Pude ver claramente que, se as coisas continuassem como estavam, as pessoas ficariam insatisfeitas. Era por isso que eu precisava me mover para assimilá-las enquanto o povo ainda estava simpático. Este era um estado multirracial. Comparado a um estado dominado por uma raça, o terreno para aceitá-los era relativamente fértil. No entanto, isso dependia de os refugiados serem capazes de aceitar tornar-se membros de um estado multirracial.
Falei sobre isso quando apontei a falha na Declaração da Humanidade, mas quando o nacionalismo étnico fica muito forte, pode ser a causa de uma guerra civil.
— Se você, Sir Jirukoma, e seu povo teimosamente se apegam à idéia de retornar à sua terra natal, e dizem que não podem se identificar com este país, então eu… serei forçado a exilá-los.
Jirukoma rangeu os dentes.
— Tudo o que queremos é voltar para a nossa terra natal.
— Eu entendo esse sentimento — falei. — Eu não me importo se você se apegar a esse sentimento em seu próprio coração. Se a situação mudar para melhor, permitindo que você volte, não me importarei se você fizer isso. No entanto, pelo menos enquanto você estiver neste país, preciso que se sinta como um membro deste país. Se não puder fazer isso, não vou deixar ficar aqui de jeito nenhum.
Jirukoma estava sem palavras.
Komain, que havia permanecido em silêncio até este ponto, levantou-se.
— O que… você saberia?
— Pare, Komain! — ordenou Jirukoma.
— Não, Irmão, vou falar o que penso! Você é o rei desta terra, não é?! Você tem seu próprio país! A dor de perder seu país é algo que você nunca poderia…
— Eu entendo! — interrompi.
Komain estava gritando de raiva, mas eu a olhei diretamente nos olhos e falei com calma.
— Você deve ter ouvido que fui invocado de outro mundo. Era uma passagem só de ida. Ao contrário de vocês, que têm pelo menos alguma esperança, não tenho como voltar. É por isso que posso entender a dor de perder sua pátria.
— Urgh… — Komain não conseguia encontrar palavras para dizer.
Liscia abaixou o rosto. Por ser o tipo sério que ela era, provavelmente estava se sentindo culpada por ter sido seu pai, mesmo que ele tivesse feito isso a pedido do Império, que me separou de minha terra natal.
— Essa saudade de casa… É difícil apagá-la, eu sei — falei. — A terra onde nascemos é especial para todas as pessoas. É quando perdemos algo que tínhamos como certo que somos forçados a ver o quão precioso aquilo era. É fácil dizer que esta é uma história que se repete indefinidamente, mas não é tão fácil aceitá-la logicamente dessa forma.
— Souma… — disse Liscia, seu coração claramente doendo.
Coloquei minha mão sobre a dela. Liscia arregalou os olhos de surpresa. Dei um leve sorriso a ela para tranquilizá-la.
— Mas… no meu caso, eu tinha Liscia e as outras. Tive pessoas que estiveram ao meu lado e me apoiaram. Tive pessoas que estavam pensando em mim. Trabalhei desesperadamente em nome deste país para responder aos seus sentimentos. Enquanto fazia isso, em algum momento, comecei a pensar neste país como meu. A ponto de ser capaz de pensar que, se eu perdesse este país, provavelmente ficaria tão triste quanto quando perdi minha terra natal.
Por fim, uma pátria era uma conexão. Era uma conexão entre a terra e as pessoas que viviam lá. Se algo pudesse preencher o buraco deixado ao perder isso, teria que ser outra conexão.
Komain se sentou, sem forças, e baixou a cabeça. Não era algo que ela seria capaz de aceitar de imediato. Mas não podiam seguir em frente ficando parados.
— É por isso que quero fazer por você o que Liscia e os outros fizeram por mim — falei suavemente. — Se estiver disposto a amar este país e tornar-se membro dele, este país irá aceitá-lo.
— Para ser mais específico… como vão nos aceitar? — Os olhos de Jirukoma ficaram mais severos, sondando-me para encontrar minha verdadeira intenção. — Eu sei que é incrivelmente rude perguntar isso quando você se ofereceu para nos aceitar. No entanto, vimos e ouvimos muitas realidades difíceis em nosso caminho para cá. Houve países que alegaram aceitar refugiados e, em seguida, colocá-los para trabalhar fazendo trabalhos forçados nas minas por um pequeno pagamento. Houve países que os enviaram para lutar como soldados na linha de frente na batalha contra o Domínio do Lorde Demônio. As formas como foram tratados foram muitas e variadas.
— Eu ouvi isso, sim… — falei. — Mas só posso ver esses planos como estúpidos.
— São planos estúpidos? — perguntou Jirukoma.
— Sim. Em primeiro lugar, mandá-los para a linha de frente é o plano mais estúpido de todos. A defesa nacional é a base de qualquer estado. Se eles estão confiando isso a estrangeiros, eventualmente vão acabar enfrentando uma grave crise nacional.
Existiam muitos exemplos disso na história da Terra. Por exemplo, o Império Romano Ocidental durante o Período de Migração tentou usar os povos germânicos que se estabeleceram pacificamente no império para lidar com os invasores germânicos, e eles centralizaram suas forças em torno dos mercenários alemães. Como resultado, seus exércitos se tornaram germanizados e foram destruídos pelo comandante mercenário germânico Odoacro.
Além disso, na dinastia chinesa Tang, dar poder a An Lushan, que era de origem Sogdian e Göktürk, levou a uma rebelião que encurtou a vida do país.
— Tratá-los como escravos é um plano igualmente estúpido — falei. — Isso só vai aumentar a animosidade dos refugiados. O que farão se os refugiados ressentidos planejarem uma rebelião ou ataques terroristas? Eles estão apenas cultivando as sementes de um desastre dentro de seu próprio país.
— Então… e quanto à política adotada pelo Império Gran Caos? — Jirukoma me perguntou, olhando-me diretamente nos olhos enquanto o fazia.
Cocei minha cabeça.
— É típico da Madame Maria adotar esse tipo de política.
O Império também recebeu um número considerável de refugiados. O Império havia fornecido a eles terras não cultivadas em seu país, seguindo uma política de reconhecer os refugiados como residentes temporários se trabalhassem para cultivá-las. Em outras palavras, criaram aldeias de refugiados, permitindo-lhes administrar a si mesmos. Se fossem capazes de se sustentar, isso não prejudicaria os cofres do Império, e se fossem capazes de retornar ao norte em alguma data posterior, deixariam para trás todas as terras que haviam cultivado. De qualquer forma, o Império não perderia nada.
Bem, provavelmente foi assim que Maria convenceu as pessoas ao seu redor. Era uma mulher tão gentil que fora chamada de santa. Em seu coração, provavelmente fez isso porque sentiu pena dos refugiados. Ao torná-los auto-suficientes, possibilitou que permanecessem dentro do Império, sem desistir de seu desejo de voltar para casa. Mesmo que não pudessem voltar para casa, porque seu território era dentro do Império, ela provavelmente pensou que eles se assimilariam naturalmente com o povo do Império.
Era a abordagem oposta ao que eu estava fazendo, obrigando os refugiados a desistirem de seu desejo de voltar para casa e forçando-os a se assimilar.
Mas…
— Desculpe, mas… essa é uma política que nosso reino não pode adotar.
— Por que não? — perguntou Jirukoma.
— Isso é perigoso.
Se lhes dessem terras não cultivadas e fizessem com que as desenvolvessem, claro, isso não prejudicaria os cofres do Império. Enquanto o poder do Império não diminuísse, os refugiados iriam obedecê-los e provavelmente se sentiriam em dívida com eles. Se isso durasse cem anos, era de se esperar que gradualmente se assimilassem com a população local.
No entanto, não havia como dizer quando os tempos mudariam.
Era da natureza do nosso mundo que o poder que detínhamos em um dia pudesse ser perdido no seguinte. Se o pior acontecesse e algo fizesse com que a autoridade do Império enfraquecesse, o que os refugiados fariam em resposta?
— É uma terra que eles cultivaram com o suor de seu próprio trabalho — falei. — Será que não sentem que é deles? Isso não é um problema para a geração que anseia por voltar para casa. Provavelmente sentiriam um apego mais forte à sua terra natal do que à terra que cultivaram. No entanto, e quanto à próxima geração? A geração que nasceu lá e nunca conheceu sua pátria? Seriam capazes de aceitar o fato de que a terra que seus pais suaram para abrir ao desenvolvimento foi apenas emprestada pelo Império? Não pensariam nisso como sua própria terra?
Na história da Terra, houve o caso dos sérvios. Quando o Reino da Sérvia foi destruído pelo Império Otomano, muitos sérvios fugiram para o Império Habsburgo (Império Austro-Húngaro). O Império Habsburgo deu boas-vindas aos sérvios. Eles fizeram com que desenvolvessem terras perto das linhas de frente com os otomanos, usando-os como soldados colonos para defender essas linhas de frente. Os sérvios desenvolveram a fronteira enquanto lutavam contra os otomanos. Esse ambiente hostil havia gerado um forte desejo de autogoverno nos sérvios, desenvolvendo um terreno fértil para o nacionalismo étnico.
Com o tempo, o conceito nacionalista da Grande Sérvia emergiu, causando o incidente em Sarajevo que desencadeou a Primeira Guerra Mundial e, por fim, destruiu o Império Habsburgo.
Além disso, as políticas sérvias centradas no nacionalismo sérvio provocaram o aumento do nacionalismo em outros grupos étnicos. Seu conflito com o nacionalismo croata, em particular, tinha sido horrível, com massacres de ambos os lados.
Os refugiados eram um grupo multirracial, mas provavelmente desenvolveriam um senso de identidade comum por meio de alegria e tristeza compartilhadas. Essa identidade comum poderia assumir uma face nacionalista que separa os refugiados dos demais. O Império Gran Caos havia gerado faíscas que poderiam desencadear esse tipo de situação horrível no futuro.
Jirukoma franziu a testa.
— Você acredita que a política do Império está errada?
— Não… eu não iria tão longe — falei. — É uma diferença na nossa maneira de pensar. Madame Maria escolheu sua política porque acredita que é a melhor. Não posso escolher porque temo que seja o pior. Isso é tudo que há para dizer.
Eu havia percebido isso com a Declaração da Humanidade: o Império tinha uma tendência a escolher políticas com alto retorno, mesmo que também carregassem um alto risco escondido dentro delas. Enquanto isso, nosso reino estava menos focado em retornos e mais em gerenciamento de risco nas políticas que escolhemos.
Nenhuma das abordagens era inerentemente melhor. Era uma questão de saber o que era mais adequado para a época em que vivíamos, e isso era algo que só saberíamos depois do fato.
— Então, Vossa Majestade, o que pretende fazer conosco? — perguntou Jirukoma. — Quer que desistamos de voltar para nossas casas e nos tornemos pessoas deste país, ou saiamos se não o fizermos. Você não vai nos fazer cultivar a terra, não vai nos recrutar ou escravizar… O que exatamente pretende fazer conosco?!
Jirukoma ergueu a voz pela primeira vez. Até Komain, que estava esperando por essa explosão, estremeceu quando isso aconteceu.
Jirukoma carregava o destino de todos os refugiados em seus ombros. Essa intensidade foi algo emprestado a ele pelo peso de seu fardo. No entanto, eu também carregava um fardo pesado.
— Owen…
— Sim, senhor.
— Traga-me o que discutimos.
— Entendido.
Pedi a Owen que pegasse um tubo longo para mim. Era cerca de duas vezes mais grosso do que o tipo de tubo em que se colocaria um diploma, e mais de cinco vezes mais longo. Dentro havia um grande pedaço de papel enrolado em um cilindro. Desenrolei aquele papel na frente de todos. Quando viram o que estava desenhado naquele papel, Jirukoma e Komain arregalaram os olhos.
— Isso é… uma cidade? — perguntou Jirukoma.
— Sim — falei. — A nova cidade que está sendo construída no litoral. Seu nome é Venetinova.
Mostrei a eles um mapa da nova cidade, Venetinova, que construí como um ponto estratégico de transporte e comércio a fim de acelerar a distribuição.
— Esta é uma cidade que construí ao mesmo tempo em que implantei uma rede de transporte quando vim para este reino, mas só recentemente ficou pronta para as pessoas morarem — falei. — Nós criamos apenas o bairro residencial, o bairro comercial e o porto de comércio até agora. De agora em diante, haverá mais instituições sendo adicionadas e pretendo desenvolvê-la como uma cidade na vanguarda da cultura. Além disso, vamos fazer um anúncio para residentes em breve.
Olhei para Jirukoma e Komain e disse:
— Estou pensando em incluir os refugiados nesse grupo de residentes.
Minhas palavras fizeram Jirukoma e Komain engolirem em seco.
— Se desistirem de retornar à sua terra natal e se tornarem um povo deste país, prepararei residências para vocês — falei. — Por ser uma cidade nova, haverá muito trabalho disponível. Tudo, desde trabalho físico, como a indústria de transporte, até funcionários nas lojas. Por um tempo, também continuarei a fornecer suporte financeiro. Caso se tornem membros deste país e trabalhem honestamente como os lobos místicos, estou preparado para lhes dar um lugar onde não morrerão de fome e não congelarão.
— Isso é…
As expressões de Jirukoma e Komain tremeram.
É estranho para mim mesmo dizer isso, mas me pergunto como pareço através dos olhos de Jirukoma e Komain neste momento. Sou um salvador estendendo a mão a eles em seus momentos de necessidade… ou um diabo, enganando-os com palavras doces?
Jirukoma e Komain abriram a boca praticamente ao mesmo tempo.
— Você pode realmente nos oferecer algo tão maravilhoso?! — disparou Jirukoma.
— O que você está nos oferecendo é horrível! — gritou Komain.
Jirukoma e Komain se olharam. Os dois pareciam mais surpresos do que qualquer outro, já que, embora tivessem falado ao mesmo tempo, suas opiniões eram totalmente opostas.
— O-O que você está dizendo, Irmão?! É como se ele dissesse: “Aqui está uma isca saborosa, agora abane o rabo para mim”!
— Komain — disse Jirukoma. — Vossa Majestade está nos oferecendo uma base para apoiar nosso estilo de vida. Sem a necessidade de cultivarmos a terra nós mesmos como no Império Gran Caos.
— Mesmo assim, como ele pode exigir que desistamos de voltar para casa?! Isso não te frustra?!
— Se pudermos deixar de lado essa frustração, ele está dizendo que vai nos impedir de morrer de fome ou congelar. Você não entende como isso é importante para os refugiados?
Os irmãos tinham duas visões completamente opostas da minha oferta. Provavelmente era assim que as coisas eram.
— É uma pequena surpresa que vocês dois discordem — falei. — Eu mesmo acho que esta proposta pode ser considerada muito doce ou muito cruel. Não há garantia de que duas pessoas que olham para a mesma coisa venham necessariamente a ter a mesma opinião. Se alguém vai pensar se isso é gentil ou não, vai depender de como essa pessoa vê e se sente sobre as coisas.
Ambos ficaram em silêncio.
Respirei fundo e coloquei minha mão no mapa.
— Isto é o melhor que posso fazer por vocês no momento. Agora, tudo que posso fazer é ter esperança de que você pegue a mão que eu estendi. A partir daqui, cabe a você decidir.
Quando eu disse isso, Jirukoma gemeu de angústia.
— Há pessoas nesta aldeia que continuarão com a intenção de voltar para casa.
— Você quer dizer… como sua irmã mais nova? — perguntei.
— Não! Komain é flexível! Ela apenas se opôs anteriormente para representar as pessoas que vivem nesta aldeia que não podem desistir de seu sentimento por sua terra natal!
— I-Irmão…
— Tenho certeza de que isso é verdade — disse Jirukoma. — A razão pela qual você disse que era horrível foi em consideração àqueles que você conhece e que se sentem assim. Porque você… é uma garota que entende a dor dos outros.
— Urgh… — Komain ficou em silêncio. Ele acertou em cheio?
Jirukoma endireitou-se e curvou a cabeça.
— Estamos profundamente gratos por sua gentileza, senhor. Isso não é algo que eu posso decidir sozinho, então gostaria de reunir outras pessoas da vila para discutir isso.
— Acredito que disse que vim aqui para pressioná-lo a tomar uma decisão, não disse? — perguntei.
— Eu sei. No entanto, quero persuadir o máximo possível a pegar a mão que você gentilmente estendeu, senhor. Mesmo se… isso significar dividir os refugiados.
Fiquei em silêncio.
Dividir os refugiados. Em outras palavras, qualquer um que não pudesse aceitar isso teria que ser expulso.
Isso era o melhor que eu podia fazer? Se eu os apressasse demais, nada de bom sairia disso.
— Mas não há muito tempo — falei. — Mesmo se eu puder adiar a busca por residentes, não posso adiar a mudança da estação. O inverno está chegando.
Uma estação que falta de preparação resultaria em congelar até a morte. Crianças e idosos, aqueles com menos capacidade de resistência, seriam os primeiros a morrer. Se possível, eu queria que tomassem uma decisão em um ponto em que pudessem ser totalmente transferidos antes que o inverno ficasse muito rigoroso.
Jirukoma curvou a cabeça profundamente mais uma vez.
— Sim, senhor! Estou bem ciente.
— Bem, então tudo bem.
O resto era com eles. Não importa qual fosse a decisão, eu teria que dar a resposta apropriada a ela.
Se possível, não queria ter que mostrar meu lado “sem coração”…
Aconteceu exatamente quando estava começando a parecer que as reuniões estavam encerradas.
Foi quando um homem de jaleco branco invadiu rudemente a tenda.
Ele era um homem com olhos penetrantes que parecia estar no final dos seus vinte e poucos anos. O que era distinto nele era seu cabelo despenteado que, apesar de sua idade aparentemente jovem, era totalmente branco, até a raiz.
— Ouvi dizer que Hilde esteve aqui — disse bruscamente o homem.
Carla e Owen seguraram cautelosamente o cabo das espadas.
O homem não deu atenção a eles. Ao avistar Hilde, caminhou bruscamente até ela.
Hilde se levantou, olhando diretamente para o rosto dele.
— Brad! Como você ousa empurrar aulas de ensino para mim!
O nome desse homem de cabelo branco era Brad Coringa. Junto com Hilde, era o outro médico que ajudava com a revolução médica neste país.
Brad não ligou para as reclamações de Hilde, de repente agarrando-a pelo braço.
— Espere, o que você está fazendo?! — gritou ela. — Não é assim que você deve tratar uma mulher.
— Se você quiser reclamar, ouvirei isso mais tarde — retrucou ele. — Desculpe… Mas eu preciso que você me ajude.
Talvez ela tivesse percebido algo na seriedade nos olhos de Brad, já que Hilde ficou com uma expressão séria no rosto.
— Aconteceu alguma coisa?
Brad soltou o braço que segurava e assentiu.
— Sim. Temos um caso de emergência.
Brad Coringa era o Médico Traidor.
Em um continente onde quase todos na profissão médica eram praticantes de magia de luz (magia de recuperação que funcionava ativando os sistemas do corpo), ele era o único cirurgião do país. Ele tentou tratar doenças graves sem depender de magia, usando apenas exames médicos e cirurgia.
“Mesmo sem se apegar aos deuses, as pessoas podem curar umas às outras com seu próprio poder.” Essa era a opinião pessoal de Brad.
Neste continente, as pessoas tinham a tendência de ver a magia de luz como “a bênção dos deuses”, especialmente na Ortodoxia Lunariana, onde era considerada sagrada. Isso a tornava uma opinião muito perigosa de se ter.
Brad havia vagado por muitos campos de batalha em muitos países diferentes. Ele tomaria a custódia dos restos mortais de soldados desconhecidos que morreram em combate, dissecando seus corpos para estudar as estruturas dos corpos das diferentes raças. Ele desenvolveu seu próprio campo independente de tratamento cirúrgico, que usava anestesia e operações.
Ele também procurou o conhecimento da raça três-olhos sem preconceitos e o absorveu. Ele sabia muito sobre a existência de microrganismos e os efeitos dos antibióticos e aplicou essas técnicas em seu trabalho.
Suas habilidades eram tais que seria justo chamá-las de milagrosas. (Embora, para o Brad, que odiava essa coisa de deus, isso soasse sarcástico.) O maior fator disso era que ele foi capaz de curar tumores malignos, que eram intratáveis com magia de luz, removendo-os com cirurgia.
“A luz não é a única coisa que pode curar as pessoas. A escuridão também pode confortar.”
Quando disse isso ele parecia ter um caso de síndrome do ensino médio, mas eu poderia simpatizar. Pedi sua ajuda, mas não foi fácil convencê-lo.
Quero dizer…
“Busquei esse poder (cirurgia) para poder salvar os pobres que não podiam pagar pelo tratamento e as pessoas em áreas remotas onde não há magos de luz. Não tenho interesse em dinheiro, poder ou coisas do gênero.”
Foi o que ele me disse…
Agora, quanto a como eu fiz ele cooperar, fisguei… erm, negociei com ele… usando não dinheiro, ou poder, mas coisas.
Para ser mais preciso, para que todos no reino tivessem fácil acesso a cuidados médicos, criei um sistema nacional de seguro de saúde, como o do meu mundo, e prometi que o melhor ferreiro do país forjaria um bisturi, agulhas de sutura e um conjunto completo de equipamentos médicos para ele. Então, ao arranjar um sistema em que seria um colaborador, não um subordinado, ele finalmente concordou em cooperar.
Até então, ele trabalhou com Hilde para guiar o sistema de medicina deste país.
Sua coleta e dissecção de cadáveres ofenderam muitas pessoas, então ele era visto como um herege no mundo médico. A parte mais difícil de contratá-lo foi livrar-se daquele preconceito contra ele. Do jeito que ele agiu, eu não podia contar com ele para se defender, afinal.
Não tendo outra escolha, pedi que examinasse um importante executivo que tinha boas relações neste país e estava doente. Ao fazer com que tratasse uma doença que se acreditava ser intratável, fiz aquele executivo reconhecer suas habilidades.
Uma vez que as pessoas sabem que algo é eficaz, seus pontos de vista mudam rapidamente. O número de médicos procurando aprender a cirurgia também começou a aumentar. Assim sendo, ao colocar no comando o importante executivo que ele ajudou a ter uma recuperação total, estávamos agora treinando novos cirurgiões neste país.
Quanto a mim, no momento estava correndo para refazer as leis e emitir licenças cirúrgicas para que os falsos cirurgiões que não tinham as habilidades necessárias não aparecessem. No início, eu só exigiria licenças para cirurgia. Eventualmente, pretendia fazer o tratamento com magia de luz e tudo relacionado à farmacologia também exigir licenças.
De qualquer forma, vamos voltar à história.
Quando ouviu sobre o caso de emergência, a expressão de Hilde ficou séria, como se alguém tivesse ligado um botão.
— Fale-me sobre o paciente.
Ela agora estava no modo doutora. Isso sim era profissional.
Brad explicou a situação a Hilde com clareza:
— É uma mulher grávida desta vila. A bolsa já estourou. O bebê pode nascer a qualquer momento, mas a posição do feto está ruim. Ele está deitado de costas para a saída do útero da mãe.
— Posição transversal, hein… Isso é incomum e perigoso…
Eu não entendi o que eles estavam dizendo, mas deduzi que seria um parto difícil.
— Parece que a parteira já desistiu — disse Brad.
— Bem, nenhuma surpresa — disse Hilde. — Vai ficar preso no osso pélvico. Normalmente, a mãe ou o filho… um deles teria que ser sacrificado aqui. Para salvar os dois…
— Sim… Uma incisão cirúrgica é provavelmente a única opção.
Incisão cirúrgica… Oh, uma cesariana! Mas Hilde estava olhando para ele com ar de dúvida.
— Você pode fazer isso? Ouvi dizer que a taxa de sobrevivência para mães que têm o útero aberto é inferior a vinte por cento.
— Há uma razão muito clara pela qual essa taxa de sobrevivência é tão baixa.
— Oh… E o que poderia ser?
— Nem você nem eu realizamos o procedimento — disse Brad, como se fosse óbvio.
Ele falou com tanta convicção, que fez Hilde franzir a testa.
— Você diz as coisas mais incríveis como se não fossem nada…
— É uma questão de fatos — disse ele. — Para ser mais preciso, é porque eles não têm minhas habilidades e o conhecimento dos três-olhos sobre doenças infecciosas. O processo deles é apenas abrir a barriga, tirar o feto, fechar a ferida e curar com magia de luz. Eles não têm anestesia, então a mãe grávida sofre. Sua incisão e técnica de sutura são subdesenvolvidas, então, mesmo que usem magia de luz, a ferida não fecha corretamente e o paciente morre devido à perda de sangue. Eles não têm os antibióticos dos três-olhos, então, é fácil para o paciente desenvolver uma doença infecciosa após o procedimento. É por isso que a taxa de sobrevivência é baixa.
Brad estendeu a mão para Hilde.
— Mesmo sozinho, posso aumentar a taxa de sucesso para oitenta por cento. No entanto, se você estiver ao meu lado fazendo a gestão da higiene, podemos chegar perto de cem por cento.
— Nossa, isso não me deixa muita escolha, deixa? — Hilde coçou a nuca antes de pegar a mão de Brad. — Perante um médico, todos os pacientes são iguais. É por isso que os médicos não são exigentes sobre quem tratam.
— Obrigado. Ter você lá é melhor do que ter cem de qualquer outra pessoa.
Hilde se virou para encarar o resto de nós.
— Vossa Majestade! Chefe dos refugiados! É como vocês ouviram. Desculpe, mas queremos pedir emprestados seus subordinados para isso.
— Claro, claro que você pode — falei.
— Claro — disse Jirukoma. — Nós somos uma família. É dever do chefe amparar a família.
— Obrigada — disse Hilde. — Garota meio-dragão!
— E-Eu?! — Carla deu um pulinho quando foi chamada.
— Vá ao laboratório médico da capital, o mais rápido que puder. Traga equipamentos e suprimentos médicos para nós. Se você pedir minha bolsa preta, os pesquisadores de lá saberão o que você quer dizer. Você pode simplesmente trazer a bolsa inteira.
— Entendido! — Carla saiu da tenda correndo.
Em seguida, Hilde olhou para Jirukoma.
— Chefe dos refugiados, quero esta tenda emprestada. É melhor mover a paciente para o lugar mais higiênico que pudermos gerenciar.
— Eu não me importo — disse Jirukoma. — Use o que quiser.
— Além disso, estaremos procurando por alguém com o mesmo sangue da mãe, então reúna os refugiados.
— Entendido.
Aprendi isso mais tarde, mas este mundo também tinha tipos sanguíneos A, B e O (embora o esquema de nomenclatura fosse diferente). Misteriosamente, mesmo entre as raças, se os tipos de sangue correspondessem, quase sempre poderiam ser usados para transfusões de sangue. Eu disse “quase sempre” porque havia alguns tipos de sangue que não aceitavam transfusões, independentemente do tipo de sangue usado. Talvez pudesse ser porque havia tipos de sangue Rh positivo e negativo neste mundo também.
— Em seguida, você sabe algumas coisas sobre higiene, certo, senhor? — perguntou Hilde. — Explique para o chefe daqui e seu pessoal. Quero que o ambiente em que vamos trabalhar seja o melhor possível. Além disso, ferva bastante água para nós. Queremos desinfetar nossas ferramentas.
— Entendi! Liscia, Owen, vamos fazer isso!
— Certo! — disse Liscia.
— Entendido! — concordou Owen.
— D-Deixe-me ajudar também! — interrompeu Komain.
Komain nos seguiu, arrumando as coisas dentro da barraca e ajudando a ferver muita água. Sem levar em conta nossas respectivas posições, cada um de nós trabalhou duro para fazer o que podíamos.
Aqueles que podiam fazer algo o fizeram.
De certa forma, senti como se estivéssemos incorporando o estado atual deste país.
Terminados os preparativos, não havia mais nada para fazermos.
Dentro da tenda, Brad e Hilde deviam estar fazendo o procedimento. Eu podia ouvir a respiração irregular da mãe lá dentro. Tudo o que podíamos fazer era esperar do lado de fora da tenda até o procedimento terminar.
Liscia, que estava vigiando a porta, falou com uma voz cheia de preocupação:
— Ouvi dizer que eles estão abrindo a barriga da mãe. Ela vai ficar bem?
— Se foi só isso que você ouviu, soa como se fosse algum tipo de crime bizarro, não é? — falei. — Não há nada com que se preocupar.
Eu coloquei minha mão no topo da cabeça de Liscia.
— A cesariana é um método comumente usado para partos difíceis no mundo de onde vim, e a taxa de mulheres que morrem durante o parto é muito baixa. A grande maioria das pessoas lá nem pensa sobre o fato de que uma mulher grávida pode morrer ao dar à luz. Simplesmente presumem que a criança vai nascer bem.
— O mundo de onde você veio é incrível como sempre, Souma.
— Sim, mais ou menos — falei. — Além disso… aqueles dois podem fazer algo semelhante à medicina do meu país. Bem, meu mundo carece de magia de luz, então não é fácil fazer uma comparação direta. — Virei-me para Jirukoma, que estava ao meu lado. — E o marido da mãe?
— Não sabemos se ele está vivo ou morto — disse ele. — Parece que foram separados enquanto escapavam do norte, sabe. Ainda assim, ela disse que estava determinada a dar à luz à criança em seu ventre e que esperariam pelo pai juntos.
— Entendo…
Mães são fortes. Parece que isso era verdade em qualquer mundo.
— Para o povo desta vila, a criança dentro dela era a esperança — disse Jirukoma. — Isso nos deu a sensação de que não estaríamos apenas perdendo coisas. É por isso que todos nós decidimos que toda a aldeia criaria a criança juntos, com amor.
— Entendo… Ei, Jirukoma. — Me virei para encará-lo. — Eu sei como Brad e Hilde são capazes. É por isso que estou confiante de que tanto mãe quanto filho sobreviverão. Com isso em mente, quero dizer algo.
— O que seria…?
— Essa criança está nascendo neste país. Este país é onde ela vai crescer. Ela vai chamar este país de sua pátria, nunca tendo conhecido a terra de seus antepassados.
Jirukoma fechou os olhos e ficou em silêncio. Ele parecia ter entendido o que eu estava tentando dizer.
— Você disse que iriam criá-lo como filho de toda a aldeia, com amor, certo? Bem, não há necessidade de forçar uma criança que nada sabe a herdar sua tristeza. Vocês podem decidir por si mesmos se desejam permanecer neste país ou partir. No entanto, é um pouco demais, forçar uma criança que tem a opção de tomar esta terra como sua pátria, a viver como um povo cuja terra está em ruínas.
— Você não precisa dizer mais nada — disse ele calmamente.
— Irmão…
Jirukoma colocou uma mão tranquilizadora no ombro da preocupada Komain.
— Já me decidi. Vou confiar o papel de chefe a Komain.
— O-O que você está dizendo, Irmão?! — gemeu ela.
— O que você está planejando fazer? — perguntei.
Jirukoma soltou um suspiro triste.
— Para ser franco, as pessoas desta aldeia estão cansadas de vagar. Se essas pessoas exaustas puderem chamar esta terra de lar, eu acho que é uma coisa maravilhosa. No entanto, há um punhado de radicais que não conseguem desistir de voltar para sua terra natal e atualmente estão tentando levar as pessoas de volta. — Jirukoma se voltou para o céu do norte. — Acho que vou pegar esses poucos radicais e tentar voltar para o norte. Seremos voluntários para ir a um país que esteja em busca de soldados e esperar na linha de frente pela hora de recuperar nossa pátria.
— Irmão! — Komain agarrou os braços de seu irmão com força, como se estivesse tentando segurá-lo no lugar. — Esta vila precisa de você, Irmão! Fui eu quem disse que a proposta do rei é cruel! deixe esse trabalho comigo!
— Você não pode — disse ele. — A razão pela qual você sentiu que a proposta de Sua Majestade era cruel foi porque se preocupa com as pessoas da aldeia, certo? Com um coração assim, você será uma líder comunitária melhor do que eu.
— Mas você não disse que a proposta do rei era maravilhosa?! — gemeu ela.
— Eu sou simplesmente melhor em mascarar meus verdadeiros sentimentos do que você. — Jirukoma suavemente afastou as mãos de Komain. — No meu coração, não posso desistir de voltar para a nossa terra natal. No entanto, fui incumbido de ser o chefe desta vila. É por isso que coloquei uma tampa sobre esses sentimentos, engarrafando-os bem no fundo do meu peito.
— Irmão…
— No entanto, não há mais necessidade disso. Sua Majestade disse que se o povo da vila amar este país, este país está preparado para aceitá-los. As pessoas chegaram a uma terra onde podem encontrar paz e segurança. Isso significa que meu trabalho já está feito. Agora posso libertar esses sentimentos.
Komain estava chorando, mas Jirukoma sorriu para ela. Essa expressão já estava cheia de determinação.
Caramba…
Falei:
— Não faça sua irmã mais nova chorar, seu maldito idiota.
— Não tenho resposta para isso — disse ele. — Por favor, cuide de Komain e dos outros por mim.
— Praticamente tudo o que faço é lidar com a papelada — admiti. — Se alguma coisa pode realmente protegê-los, é o próprio país.
— Então, por favor, faça com que este país resista ao teste do tempo. Para que ninguém possa destruir isso.
— Eu vou tentar…
Foi quando ouvimos um choro fraco de dentro da tenda.
Enquanto eu me perguntava o que era, Liscia gritou:
— Nasceu!
— Ohh! Então foi o choro de um bebê, hein? — perguntei. — Sempre pensei que seria mais alto, mais estridente…
A criança nasceu em segurança. Agora, é só uma questão da mãe…
Olhamos para a entrada da tenda, orando pelo bem-estar da mãe.
Uma semana depois.
— Tão foooofo — disse Liscia.
— É-É tão macio… — murmurou Komain.
— Liscia, d-deixe-me segurar também — implorou Carla.
O bebê com orelhas pontudas dormia nos braços da mãe, e Liscia, Komain e Carla se revezavam para segurá-lo.
Naquele dia, uma semana atrás, ouvimos de Brad que o procedimento foi um sucesso, mas não pudemos encontrá-los no dia em que aconteceu. É por isso que estávamos ansiosos para ver como eles estavam e, por isso, aparecemos para visitar com o mesmo grupo daquele dia.
Eu também queria ver o bebê de perto, mas as três estavam o monopolizando e eu não conseguia encontrar nenhum lugar para me enfiar. E-Era assim que era a natureza maternal…?
— Ahh, minhas companheiras parecem estar fazendo uma cena — falei. — Desculpe por isso.
A mãe da criança sorriu.
— Não, temos sorte de ter a princesa e os outros paparicando meu filho assim.
A mãe era uma mulher-fera calma e com orelhas de gato. Fiquei aliviado ao vê-la tão saudável. Sua recuperação também não parecia estar indo muito mal.
Ela segurou a mão do bebê.
— Nós realmente somos afortunados. Quero dizer, temos até Vossa Majestade preocupada conosco.
Tínhamos revelado nossas identidades para a mãe. Meu rosto e o de Liscia eram amplamente conhecidos, então parecia inútil tentar manter isso em segredo. No começo, a mãe ficou apavorada (quase como depois que Mestre Koumon tirou seu selo), mas agora ela já havia se acostumado conosco.
— Bem, eu concordo com você sobre a criança ter sorte — falei. — Uma sorte incrível, na verdade. Afinal, nasceu quando não apenas um, mas os dois maiores médicos deste país estavam aqui juntos.
— Isso é verdade — disse ela. — Eles não salvaram apenas minha criança, também me salvaram.
Foi pura coincidência que Hilde tinha visitado a aldeia naquele dia. Porque ela nos encontrou por acaso nas antigas favelas, porque por acaso tínhamos negócios na vila de refugiados e porque Hilde decidiu ir junto, os dois grandes médicos estiveram presentes. Se a criança tivesse nascido um dia antes ou um dia depois, não teria sido capaz de receber os cuidados desses grandes médicos. Quando pensei dessa forma, essa criança tinha até salvado a vida de sua mãe.
— Quase como um deus de fuku… — murmurei.
— Fuku…? — perguntou ela.
— É uma palavra do meu mundo. Significa boa fortuna ou felicidade.
— Felicidade… Hm, Vossa Majestade? — A mãe se dirigiu a mim. — Esse nome, Fuku. Você poderia dar a esta criança?
— Hm? Você não está perguntando se pode dar esse nome, mas para eu dar esse nome? — perguntei.
Liscia estava segurando a criança. Ela explicou:
— Neste mundo, quando uma pessoa de alto status ou importante dá a você seu nome, acredita-se que você receberá um pouco de sua energia. Então, por favor, dê esse nome à criança.
Bem, acho que não tinha nenhum problema com isso.
— É um menino, certo?
— Sim.
— Bem, então o nome dele será Fuku. Crie-o para ser saudável.
Quando eu disse isso e dei um tapinha na cabeça dele, o pequeno Fuku soltou um som fofo de bebê e balançou a cabecinha com os olhos ainda fechados.
Ele me respondeu enquanto dormia?! Esse garoto… ele podia ter um grande futuro quando crescer. Enquanto eu pensava nisso, Liscia olhou atentamente para o meu rosto.
— O-O que? — perguntei.
— Os bebês de outras pessoas são legais e tal, mas ter nosso próprio bebê seria muito mais fofo, certo? — perguntou ela, lançando olhares significativos em minha direção.
Ahh, sim… Isso provavelmente significava exatamente o que eu pensei que significava. Hakuya e Marx estavam dizendo a ela que já precisávamos produzir um herdeiro. Agora que o país havia se estabilizado, provavelmente a pressionavam ainda mais.
— Sim… Você está certa — falei timidamente. — Já temos o método de parto cesáreo estabelecido e há cada vez mais especialistas em obstetrícia e ginecologia. Seria seguro para você dar à luz a qualquer hora.
Liscia arregalou os olhos.
— Pensei que você fosse se acovardar de novo.
— Agora, ouça… Certo, sim, é parte disso — falei. — Porque estou preparado para ser seu marido, mas ainda não estou pronto para ser pai.
— Oh! C-Certo… Entendo…
Eu queria aproveitar meu relacionamento com Liscia e as outras. Mas, a fim de aumentar o número de membros da realeza que declinou precipitadamente na luta pela sucessão após a morte do rei antes do último, o mordomo, Marx, insistia: “Não vou apoiar você usando o controle de natalidade como desculpa até que você produza pelo menos um filho!” Dá para ver por que eu seria cauteloso.
— Bem, além disso, esse alto índice de mortalidade durante o parto neste mundo também estava me preocupando — falei.
Quando examinei a população deste país, fiquei surpreso com a alta taxa de mortalidade de recém-nascidos e mulheres grávidas. No Japão moderno, embora pudéssemos nos preocupar sobre o bebê nascer em segurança, dificilmente pensávamos na possibilidade de a mãe morrer no parto. No entanto, parecia que, neste país, mulheres grávidas costumavam morrer. Se houvesse mil mulheres grávidas, um punhado delas morreria. Neste país que carecia de um estudo formal de obstetrícia e ginecologia, as mulheres grávidas estavam literalmente colocando suas vidas em risco para dar à luz.
Como rei, me disseram para gerar muitos filhos com várias mulheres. Se uma criança nascesse de Liscia, Aisha, Juna ou Roroa, e eu perdesse uma delas durante o parto… eu não suportaria isso.
— Para me certificar de que isso não aconteça, para reduzir ao mínimo o risco de perder alguém da minha família, tenho avançado com reformas médicas — falei. — No entanto, pode parecer que eu estava abusando um pouco da minha autoridade.
— Está tudo bem, não está? O resultado foi que você acabou ajudando a todos. — Liscia envolveu o braço em volta do meu. — E-Ei, Souma. Se fazer bebês está tudo bem agora, você quer tentar trabalhar nisso esta noite?
Quando Liscia disse isso, remexendo-se timidamente, não pude deixar de amar isso. Mas, como eu disse antes, ainda não conseguia me convencer de que deveria ser pai, então tive que virar a cabeça e desviar o olhar.
— Oh! Hm… você acha que poderia esperar um pouco mais?
— Caramba! No final, você continua se esquivando! — gritou ela.
Quando Liscia levantou a voz, isso assustou Fuku, e ele começou a se agitar.
— Wah… Wahhhhhhhh!
Nós o devolvemos para sua mãe e tentamos diverti-lo com caretas engraçadas. Owen tentou se juntar e fazer o mesmo, mas seu rosto assustou Fuku novamente, fazendo-o chorar alto e fazer uma grande cena.
Algum dia, também faremos uma cena grande e barulhenta como essa no castelo real.
No meio daquela felicidade barulhenta, foi o pensamento que tive.
Tradução: Bucksius
Revisão: Sonny Nascimento(Gifara)
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