Havia um caminho pela floresta cortando um trecho de árvores quase uniforme. Ele não era pavimentado e era todo irregular, não passando de uma brechinha onde não tinha árvores crescendo.
Acima dele, voava uma única garota em sua vassoura. Os galhos balançando sussurravam enquanto ela passava, e as árvores jogavam suas folhas para o ar como se estivessem comemorando um brinde.
A adorável jovem era uma bruxa e uma viajante.
Seu cabelo cinza cintilava à luz do sol, e seus olhos lápis-lazúlis pareciam estar olhando além de seu caminho, para algum lugar distante. Ela usava um robe preto, um chapéu pontudo e um broche em forma de estrela, e não seria exagero dizer que sua aparência de bruxa apenas aumentava o seu charme.
Esta jovem, que ninguém poderia descrever como outra coisa senão adorável… quem será?
Isso aí. Euzinha.
— …
Eu já tinha conseguido algumas informações sobre o país que deveria estar à frente. Entre os mercadores que ganhavam a vida nesta área, era chamado de todos os tipos de nomes estranhos: “O grande, mas pequeno país”, “O país só de homens bonitos e belas mulheres”, “O país murado”, “O antiquado país moderno”, “O país proibitivo”, “O país curioso”, e assim por diante. Eu queria que eles fossem pelo menos um pouco mais consistentes.
De qualquer forma, a única coisa de que tinha certeza era que um lugar estranho estava diante de mim. Me perguntei que tipo de estranheza encontraria, e também o que a tornava tão misteriosa. Tentei interrogar os comerciantes, mas não adiantou. No final das contas, se quisesse saber como o lugar realmente era, não havia nada a fazer a não ser ir lá e conferir por mim mesma. Fiquei meio ansiosa com isso.
Um pouco mais de tempo se passou e meu destino apareceu no horizonte. Consegui distinguir uma muralha relativamente baixa e o portão de madeira aberto.
Estacionei minha vassoura em frente ao portão e desmontei.
Um guarda apareceu do nada e começou com uma saudação excessivamente entusiasmada.
— Você aí… Ah, uma bruxa? Que incomum. — Ele olhou para o broche no meu peito e arregalou os olhos. — O que a traz a essas partes?
— Sou uma viajante.
— Oh-ho, isso é ainda mais incomum.
— É mesmo?
O guarda acenou com a cabeça duas ou três vezes.
— De fato. A propósito, Senhora Bruxa, você sabe alguma coisa sobre este país?
— Bem, eu sei um pouco.
— Ah, sério? Nesse caso, tenho certeza de que ficará tudo bem.
— …? — Espera, o que vai ficar bem? Fiquei confusa.
— Bem, então, Senhorita Bruxa, por favor, responda a algumas perguntas simples antes de entrar. Em primeiro lugar…
As perguntas rotineiras dissiparam quaisquer dúvidas que eu estava sentindo. As que ele me fez eram coisas comuns, como meu nome, minha idade, quanto tempo planejava ficar e o motivo da minha visita. Respondi tudo de modo sucinto.
— Tudo bem, isso é tudo de que precisamos. Pode entrar.
— Valeu.
Incitada pelo guarda, entrei em uma nova terra.
Pois bem, que tipo de lugar é este?
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Apenas dar um passeio por ali não seria suficiente para mostrar se este país era tão estranho quanto ouvi. Ao cruzar o portão, tudo parecia excepcionalmente comum, embora fosse mais apropriado chamar o lugar de uma vila murada do que de um país qualquer.
Quase tudo era construído de madeira e todas as casas pareciam ter sido feitas com um estilo rústico. Era provável que as pessoas simplesmente limparam o caminho pelo qual eu tinha acabado de passar e usaram as árvores para construir casas. O problema é que estavam todas caindo. Estavam tão malcuidadas que pareciam ter dado de cara com o Grande Lobo Mau.
Aliás, as pessoas que moravam nas casas… eram porcos!
Não, eram humanas, é claro…
Uma mulher magra saiu de uma das residências enquanto segurava uma cesta. Depois de olhar para mim por apenas um momento, ela se virou e partiu.
Que reação mais desinteressada. Parece que visitantes não são tão raros por aqui.
E não foi só a mulher segurando a cesta. Todos que encontrei pareciam totalmente indiferentes. Ou talvez fosse melhor dizer que estavam agindo de forma absolutamente normal.
Lá estava a mulher pendurando sua roupa para secar em um varal entre duas árvores em um jardim. Lá estavam os homens sentados ao redor de uma fogueira distante, conversando amigavelmente e jogando galhos nas chamas. Havia também o jovem que estava intensamente focado em cortar lenha com um machado.
Vi os moradores do país só de longe, mas assim que se deparavam com o meu olhar, desviavam os olhos, como se estivessem pensando: Ah, uma viajante. Ho-hum.
Como me disseram, todos pareciam ser homens e mulheres bonitos, e provavelmente eram um pouco antiquados. No entanto, no momento, eu não tinha achado nada do local, só estava o vendo como totalmente comum e um tanto quanto chato. Isso não está bem à altura das críticas, não é?
— Ora, ora, que raro.
Enquanto eu caminhava sem rumo, alguém me chamou. Olhei na direção de onde a voz tinha soado e vi uma mulher mais velha, claramente uma maga, caminhando em minha direção. Quando meus olhos encontraram os dela, ela sorriu. Era um sorriso transbordando com uma certa bondade enigmática. A julgar por sua aparência, provavelmente tinha a mesma idade que os meus pais.
Olhei para trás apenas no caso de ela estar falando com outra pessoa. Depois de ter certeza de que não iria me envergonhar, perguntei:
— Eu?
A mulher concordou com um aceno de cabeça.
— Sim, você. Você é uma viajante, certo? Se veio para este país, deve ter gostos realmente estranhos.
— É mesmo?
— Com certeza.
— Ouvi dizer que era um lugar estranho, então chamou minha atenção.
— Hmm, você é estranha.
— É mesmo?
— Com certeza.
A maga inexplicavelmente iniciou uma conversa amigável, então me acusou de ser uma pessoa estranha com gostos esquisitos. O que está acontecendo? Não entendi.
— Mas isso aqui não parece nada estranho. Acho que é só um lugar simples, comum e normal.
— A propósito, o que você ouviu sobre nós antes de vir aqui?
— Um… — Contei os diferentes nomes que os comerciantes usavam para se referir ao país.
— Hmm… “O país só de homens bonitos e belas mulheres”, hein… Oh-ho-ho, estou corando.
— … — Você só está escutando as partes que quer?
— Bem, então — disse a maga —, você veio com grandes expectativas e ficou desapontada, certo?
— Sim, bem, algo assim.
— Entendo… Nesse caso, acho que você deveria dar uma olhada no interior. Suspeito que será capaz de encontrar o que esperava.
— No interior…? O que quer dizer com isso?
— Quero dizer exatamente o que eu disse. Venha comigo.
— Um, espera…
Ela agarrou minha manga com força, depois me vi sendo arrastada por uma maga cujo nome nem sabia.
Por que eu…?
Ela me levou a um portão.
Não era aquele pelo qual passei na entrada do vilarejo, mas sim um mais extravagante. O topo do portão de madeira era adornado com uma moldura de ferro. De alguma forma, o muro ao seu redor parecia mais alto do que aquele pelo qual passei primeiro.
O portão estava aberto e uma carroça puxada por cavalos estava estacionada ao seu lado. Homens mais velhos e gordos descarregavam pacotes de todos os tamanhos, enquanto o cavalo mastigava grama, já que não tinha nada melhor para fazer.
Mas o que no mundo é isso?
— Existe outro país dentro deste país…? — perguntei, e a maga soltou minha manga.
— Sim. E o território além deste portão é o país real.
— Nesse caso, o que há neste lado? — Apontei para o chão.
— Vou te contar se você escutar o que estou dizendo.
— … — Tenho um mau pressentimento quanto a tudo isso.
— Você não quer fazer negócios comigo?
— Esta é uma transação de negócios?
— Com certeza.
— Depende do que você tem a dizer — falei, e os olhos da maga brilharam como se dissessem: Entendi.
— Vá me comprar um livro. Te darei o dinheiro.
— Um livro…? — Achei que ela fosse pedir algo meio doido, mas era um item muito normal. — Por que não compra você mesma? Ou há algum motivo pelo qual não pode comprá-lo?
— Sim, eu tenho um motivo. Posso contar com você?
Eu estava prestes a perguntar qual era o motivo, mas poderia dizer, pelo olhar em seus olhos, que ela apenas se esquivaria da pergunta e prometeria me contar depois que eu aparecesse com o livro.
Bem, se é uma tarefa tão simples, então não tem problema.
Não me senti bem por deixar essa maga me colocar em sua incumbência, mas também estava muito curiosa sobre o que havia do outro lado daquele portão.
— Eu aceito.
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Passei pelo cavalo que parecia ser bem lento e também pelos homens gordos, cruzando o portão secundário.
Dentro havia um outro mundo, tão diferente que me fez imaginar o que diabos estava acontecendo com o vilarejo abandonado pelo qual eu havia passado.
A terra crua e não pavimentada pela qual eu estava andando… sumiu. Tijolos cor de ferrugem e aparentemente sólidos estavam alinhados formando a estrada.
Não, eles não parecem sólidos, eles são sólidos.
As casas construídas ao longo da estrada suavemente sinuosa também eram feitas de tijolos, e não de madeira. Com certeza poderiam enfrentar qualquer lobo que soprasse e bufasse.
Enquanto eu caminhava, o aroma de café alcançou meu nariz e avistei uma cafeteria. Várias pessoas lá dentro sorriram para mim.
Prosseguindo, vi uma padaria, uma do meu tipo favorito. Este país não parecia ter barracas de rua ou qualquer outro comércio de beira de estrada. A própria padaria foi montada dentro de uma casa comum. Pensando bem, não comi nada desde esta manhã.
Mas eu deveria dar uma olhada antes de colocar qualquer coisa na minha boca. Além disso, desde que me dei ao trabalho de vir aqui, quero comer alguma especiaria local famosa.
— Ei, ei, Mãe, tem uma feiosa ali. Olha como ela é feia!
— Shh! Não olhe.
— …
Hein…? O que foi isso?
Quando me virei para quem havia feito aquele comentário muito, muito rude, vi uma mãe e uma criança obesas de mãos dadas e franzindo o nariz para mim, cheias de nojo.
Falaram aquilo sobre mim? A mãe e a criança cruzaram olhares comigo enquanto se afastavam, e a criança começou a gritar:
— Eek, a feiosa me encarooooou!
— Ei, pare de olhar! Você vai ficar feio!
Mas o que foi isso…?
Fiquei intrigada com isso, mas nenhuma resposta surgiu. Por fim, concluí que estava imaginando coisas.
Quanto mais adentro eu ia, pior ficava.
Ou, devo dizer, por quanto mais pessoas eu passava, mais olhos desaprovadores se voltavam para mim. As pessoas às vezes diziam algo apontando para mim e zombavam, e às vezes sussurravam com quem estava ao lado delas.
Feia, diziam.
— Ah, minha nossa! Dói só de olhar!
— Santa mãe, que rosto horrível. Ela não deveria mostrar isso a ninguém.
— Como ela ousa andar por aí como se não houvesse nada de errado? Tenha um pouco de respeito.
— Quanta magreza.
— Aquela garota parece um esqueleto.
— Ela é uma má influência para as crianças. Alguém pode mandar ela embora?
— Mas ela é uma bruxa.
— Ah, ela é. Uma bruxa feia.
Bem, já deu para entender o cenário.
Como seria de se esperar, não me importei nem um pouco por estar os incomodando.
O quê, vocês estão com inveja? Queria dizer a eles. Mas quando se está caminhando por um ambiente em que a discriminação é clara e socialmente aceita, é natural esperar que coisas questionáveis acabem acontecendo.
Por exemplo, ter um homem (que se parece com um porco inchado) rindo de você.
— Hya-ha-ha! Ela é horrível demais! Parece até com uma servente!
Por exemplo, assustar um velhote (que se parece com um porco inchado).
— Eek! É a ceifadora! Não me diga… Minha hora chegou…?
Por exemplo, fazer com que uma criança (que se parece com um porco inchado) atire pedras em você.
— Saia daqui, feiosa!
A criança ao menos não arremessou com muita força, então foi fácil desviar das pedras.
A propósito, usei magia de ar para soprá-las de volta com o vento. Isso me ajudou a aliviar um pouco o estresse, e ele era tão gordo que eu achei que poderia amortecer o impacto todinho.
Mas as coisas desagradáveis não acabaram depois da minha modesta vingança.
— Ei, você está no caminho, maldita feiosa — rosnou alguém, batendo seu ombro em mim enquanto passava.
Que belo espécime está me chamando de feia desta vez?
Quando me virei para olhar, me deparei com uma mulher grande e carnuda.
Uau, mas quanta carne. Ela parece uma leitoa pronta para o abate.
Colocando de outra forma, era uma jovem extremamente gorda com um rosto extremamente suíno. Seu corpo perfeitamente roliço estava coberto com um vestido de babados, e ela caminhava pelo centro da estrada com uma expressão de orgulho.
No entanto, estava sendo banhada de elogios.
— Nossa, que beldade!
— É desse jeito que uma garota deve ser.
— Ela não está meio gorda?
— Isso é o melhor. Você não entende?
— Que incrível… Eu quero que ela seja minha esposa.
— Comparado a ela, o que há com aquela bruxa?
— Aquela bruxa está só a pele e osso.
— Tão magrinha.
Foi isso que aconteceu. Achei muito, muito desagradável que seus comentários de alguma forma começaram a me incluir.
— Fu…
Com o tempo, voltei à estrada por onde havia chegado e entrei na cafeteria. Tive que fugir. Isso tudo era muito desconfortável.
— Bem-vinda. O que deseja…? Tch… — Um homem com uma cara de cachorro (gordo, é claro) me perguntou, um sorriso assustador se espalhou por seus lábios.
— Um, vou querer o café da manhã. — Escolhi a primeira coisa do menu. E a mais barata.
— Certamente. — O garçom logo saiu de perto de mim e começou a sussurrar alguma coisa com outro garçom.
Bem, suponho que estão zombando da minha aparência.
— …
Não era algo importante o suficiente para me fazer pensar ou dizer qualquer coisa a respeito. Qual é o problema com este país? Além do segundo portão, o conceito de feiura era bem diferente do normal.
— Ei, olha… uma feiosa está sentada ali.
— Seu idiota! Tenha cuidado ao falar sobre os feios. E se você for infectado?
— M-merda… sinto muito!
— Céus…
Deixando de lado a questão de saber se a feiura era contagiosa, mesmo dentro da cafeteria, os outros clientes estavam me olhando de um jeito bem afiado. Eu realmente não estava entendendo nada, mas parecia que tinha me tornado um alvo para preconceito.
— Sinto muito pela demora. Aqui está seu combo matinal. — O garçom olhou de canto de olho para mim enquanto colocava o café e o pão na mesa. E geleia.
Um combo modesto. Como esperado da coisa mais barata do menu.
Ainda mantendo seu sorriso assustador, ele disse:
— Perdão pelo pedido, senhorita, mas quando terminar de comer pode, por favor, ir embora? Os outros clientes estão reclamando, então…
— Um…
Ouvi risadas vindo de algum lugar.
Depois de terminar meu café da manhã, que tomei lenta e delicadamente, fui a uma livraria.
Não posso negar que queria fugir o mais rápido possível, mas eu tinha feito uma promessa, então ainda não podia ir embora. Caminhei pela cidade, relutante, mantendo meu olhar fixo no caminho enquanto mais pessoas riam e apontavam, até que finalmente cheguei na livraria.
Do lado de dentro, a loja estava quase silenciosa – como seria de se esperar de um local tão sagrado. As senhoras e senhores dentro do local (todos gordos, sem exceção) estavam absortos vasculhando as prateleiras ou lendo os livros que tinham em mãos, e nem ao menos me cumprimentaram.
Um espaço seguro.
— Hmm… — Vaguei pela loja tentando lembrar o título do livro que a maga me pediu para comprar. Depois de um tempo, o encontrei. Sua capa estava sendo exibida na vitrine de novas publicações. Peguei uma cópia e me dirigi ao balcão.
— Bem-vinda. — A balconista pegou o livro com uma atitude devidamente educada. — Devo embrulhar?
— Sim, por favor.
Ela não foi abertamente rude comigo, mas imaginei que devia estar rindo por dentro.
À toa, por um momento, desviei o olhar e me deparei com uma pilha de marcadores um tanto quanto estranhos… Olhando mais de perto, eram aranhas empalhadas, todas achatadas. Tinham “ISTO É UM MARCADOR” escrito nelas, então aquelas coisas nojentas de fato eram marcadores. Sem dúvidas.
— Ah, posso pedir para colocar um desses marcadores a cada cinquenta páginas?
— Você com certeza tem mau gosto, hein?
Bem, então por que eles estão aqui?
Quando eu estava saindo da livraria, um grupo de adultos me cercou. Eu não sabia o que estavam me dizendo, nem exatamente o que havia acontecido. A multidão era composta por pessoas (todas gordas, sem exceção) que eu havia encontrado antes.
— Ei, você é aquela viajante que entrou aqui escondida, certo? — perguntou um dos homens gordos.
Tentei me lembrar de quem ele era e então percebi que era um dos homens que estava descarregando pacotes da carroça perto do segundo portão.
— Entrou escondida? — Mas quanta presunção.
— Você passou despercebida enquanto nós, guardas, pegávamos os pacotes de fora, certo? E sabe muito bem que gente feia não tem permissão para entrar nesta parte do país. O que foi, está tentando nos irritar?
— Hein? — Não tem permissão?
— Não se faça de besta. Quando você passou pelo primeiro portão, o guarda de lá deveria ter explicado. O segundo portão marca um lugar especial onde apenas pessoas selecionadas podem entrar. Quebrar essa regra de propósito é um ato extremamente malicioso.
— Aham. — Com certeza, lembrei-me do guarda no primeiro portão me perguntando se eu sabia alguma coisa sobre esta terra.
— Como você pode ter essa atitude conosco? Você está causando muitos problemas aos residentes só por estar aqui. Ande logo e vá embora.
— Não precisa me pedir isso. Eu já estava indo. — Já cumpri com minha incumbência.
— Hmph, não volte mais…
Não precisa se preocupar. Eu não voltaria mesmo se você me implorasse, quase respondi. Mas, como não sou estúpida o suficiente para jogar lenha na fogueira, só disse: “Sim, claro”, e deixei por isso mesmo.
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— Ora, ora, você finalmente voltou.
Eu havia retornado ao vilarejo antiquado que cercava a florescente cidade do interior.
Ela estava esperando por mim na frente do portão secundário quando saí. Fiquei feliz por a maga ter me poupado do esforço de procurá-la, mas tive a sensação de que tudo, até mesmo o momento em que iria encontrá-la, havia sido de alguma forma previsto. Era como se eu estivesse correndo na palma da mão dela o tempo todo.
Mas provavelmente era só a minha imaginação.
— Olá. Peguei o livro, como prometido.
— Ótimo, obrigada. — A mulher se moveu para pegá-lo de minhas mãos.
— Mas, primeiro, poderia me falar sobre este lugar? Te entregarei isso depois — falei, suspendendo o livro bem alto no ar.
Ela puxou sua mão de volta para trás.
— Parece justo. Certo, devemos ir a algum lugar onde possamos nos sentar?
Então a maga me levou a um banco particularmente indescritível. Ele com certeza já estava ali há muito tempo. Havia musgo crescendo em suas pernas, as tábuas estavam cheias de buraquinhos, e ele rangeu quando me sentei. Fiquei até com um pouquinho de medo de, a qualquer momento, o banco ruir.
Meu coração estava batendo tão forte que parecia até que eu estava segurando uma bomba-relógio, mas a maga me ignorou e olhou para o cenário quieto e tranquilo.
— Aqui é muito melhor do que lá, não é? É pacífico.
— Bem, suponho que sim…
Mas não acha que é um pouco pacífico demais?
— O que você quer perguntar?
— Acho que você já sabe, não é?
A maga ficou em silêncio por um tempo. E então, aos trancos e barrancos, me contou a história.
— Há muito tempo, quando esta terra ainda não estava dividida, havia uma rainha muito feia…
— Uma rainha feia? — Inclinei a cabeça, perguntando silenciosamente: Para os padrões de quem?
— Bem, as pessoas do outro lado daquele portão a teriam chamado de bonita, mas a rainha era feia por causa das suas sensibilidades.
— Você não está poupando palavras, eh?
— É só a verdade.
— …
— Voltando à história, a rainha sempre se sentiu inferior, já que era muito feia. Naquela época, todo mundo pensava que as rainhas deveriam ser bonitas, então ela sentia muita vergonha da sua aparência.
Mm…?
A maga continuou falando:
— E então, ela fez um pedido a uma certa bruxa errante. “Deixe meu rosto bonito”, pediu. No entanto, a bruxa recusou. Ela não conhecia nenhum feitiço para mudar o rosto das pessoas; além disso, pensou que seria antiético.
— E aquela bruxa errante era você?
Ela balançou a cabeça.
— Não. Sou uma simples maga. Olha, eu não tenho um broche nem nada, tenho? — A mulher puxou a frente do seu robe e me mostrou. E, conforme dito, não havia nada lá.
— Então, como você sabe que a rainha pediu à bruxa errante para fazer isso?
— Porque eu sou amiga dela. Nós nos demos bem quando ela veio para este país, embora tenhamos ficado juntas só por um tempinho. Afinal, ela era uma viajante.
— Ah.
— Nós tínhamos quase a mesma idade que você, e ela era parecida com você. E também era muito inteligente e bonita.
— Ahhh…
Ela está tentando me agradar? Não sei…
— De qualquer forma, a bruxa recusou o pedido da rainha. Pelo visto, a rainha não aceitou o não como resposta, e até acabaram discutindo por causa disso. Num acesso de raiva, a rainha disse: “Como se atreve a recusar um pedido meu!” e a impediu de retornar ao país.
— A propósito, também acabaram de me banir de lá.
— Foi o que imaginei.
— …
Como eu suspeitava, ela sabia exatamente o que aconteceria quando me mandasse em sua pequena incumbência.
— Depois disso, a rainha inverteu os conceitos de feiura e beleza e mandou as pessoas que considerava feias para morar do lado de fora do portão. E então viveu em paz, feliz para sempre.
— …
— O que achou?
— Um, não sei nem o que dizer… — Minha cabeça começou a doer.
Vamos começar perguntando as coisas que quero saber.
— Então ela simplesmente exilou todos para a área além do portão, e ficou tudo bem? Imagino que alguns dos moradores iriam se queixar.
— Claro, alguns reclamaram. Mas ninguém pensou em se revoltar.
— Ah…
— As pessoas que ficaram chateadas com a decisão foram mandadas embora com grandes quantias de dinheiro. Então provavelmente conseguiram se estabelecer em algum outro lugar, não acha? Mas eu não posso dizer que essa foi uma das melhores ideias. Se quisessem viver no conforto, a melhor opção seria ficar aqui. Aqui você pode conseguir alimentos básicos e dinheiro, mesmo sem trabalhar. Parece um vilarejo pobre, mas na verdade é o outro lado do portão que está perdendo.
— …
— Graças à infeliz rainha impondo seus valores a todos, vivemos uma vida pacífica e sem intercorrências, e as pessoas de lá podem viver suas vidas livres de decepções. Nos desprezar é algo que faz com que se sintam melhor.
— Ah… — Entendo.
Então, para quem está olhando do outro lado, todos aqui vivem uma vida horrível que os deixa pensando: Não quero ser assim nunca. Cada lado mantém a ideia de que as pessoas além do portão estão em situação pior do que elas, e isso mantém a paz.
É inteligente, mas patético, e simplesmente… ridículo.
— Bem, isso conclui minha história. O que achou? Respondi todas as suas perguntas? — Ela estendeu a mão.
Ao colocar o livro que comprei em suas mãos, falei:
— Sim, a maioria. Não tenho mais perguntas. — Mas ainda estou estressada. — A propósito, por que você queria este livro?
— É a última novidade, mas só vendem lá dentro. Então, pedi a ajuda de uma viajante que estava só de passagem.
— …
Entendo. Ela me usou para algo muito trivial, não foi?
— E você não ficou feliz por ver como é do lado de lá?
— Sim… mas fiquei um pouco brava quando começaram a me discriminar tão abertamente.
— Ah… S-sinto muito por isso — desculpou-se sinceramente.
— Sem problemas.
Além disso, tenho uma vingancinha te esperando a cada cinquenta páginas desse livro.
— Como uma viajante, o que achou desta terra? — perguntou a maga enquanto abria o livro.
É muito pacífica, mas é meio esquisita. Dois lugares em um. Se eu fosse expressar meus pensamentos em uma palavra, seria…
— Estranha. Acho que é um país estranho.
Senti que essa palavra resumia tudo.
— Também acho — concordou a mulher, virando a página.
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