Rose podia ouvir a chuva caindo.
O som das gotas do lado de fora chamou sua atenção.
Ela estabilizou a respiração, então abaixou seu florete de prática.
Depois de usar a mão para enxugar o suor que escorria pelo rosto, arrumou o cabelo.
Apenas a chuva quebrava o silêncio no escuro centro de treinamento.
Por um momento, Rose fechou os olhos e se concentrou no barulho. O ar úmido formou um nó em sua garganta, mas ela o engoliu.
Sempre achou o som da água lindo.
Rose nasceu no Reino Oriana, uma terra de arte e cultura. Ela tinha sido exposta a inúmeras formas de arte em sua infância, e sua sensibilidade estética era excelente. Ao longo de suas vidas, cada membro da realeza Oriana escolhia uma única forma de arte para se destacar. Poderia ser pintura, música ou atuação. Cada um era livre para escolher o que quisesse.
Embora a jovem Rose expressasse grande interesse pelas artes, nunca foi capaz de se decidir por uma. Aos seus olhos, todas as formas de arte eram belas e únicas.
Pintura, música, atuação, design de moda, escultura e o resto eram todos tão maravilhosos – era impossível escolher apenas um. Consequentemente, se envolveu com tudo e recebeu muitos elogios por seu trabalho em cada área.
Todos os artistas do Reino Oriana esperaram com a respiração presa para ver que caminho artístico Rose escolheria seguir.
Mas ela escolheu a arte da lâmina.
Um dia, do nada, deixou de lado todas as outras coisas e começou a treinar com a espada.
— Por que a espada? — perguntavam todos a ela.
E ela falava pouco sobre o assunto.
Era só que tinha visto beleza na esgrima.
Entretanto, o povo do Reino Oriana considerava este um domínio de brutos e selvagens. Poucos estavam dispostos a reconhecê-la como uma legítima forma de arte.
Ignorando as objeções da sua família, Rose se matriculou na Academia Midgar de Cavaleiros Negros.
Um certo belo trabalho com a espada estava gravado no fundo de seu coração.
Nunca contou sobre isso a ninguém, mas era uma memória que guardava em seu coração. A única razão pela qual embarcou neste caminho era a admiração silenciosa por um único espadachim.
Sabia que jamais esqueceria a beleza da esgrima que viu naquele dia.
O trabalho de sua vida era algum dia reproduzir aquela beleza.
Ninguém em seu país reconheceria tal conquista, mas ela não se importava. Não estava perseguindo isso por querer elogios.
Estava determinada a trilhar esse caminho, mesmo que ninguém mais o considerasse digno.
E estava tranquila com isso.
Há alguns dias, porém, recebeu uma carta.
— Meu pai irá ao Festival Bushin… — murmurou, com seus lábios da cor de flores de cerejeira. Era uma raridade que o rei, um homem que desprezava a esgrima, aparecesse para assistir ao evento. Rose tinha certeza de que só estaria presente para arrastá-la de volta para casa.
Havia muita especulação, mas um boato em particular atraía a atenção de Rose.
Diziam que um homem fora oficialmente escolhido para ser seu noivo.
Assim que soube disso, enviou uma carta para a sua família na mesma hora, perguntando se era verdade. Entretanto, ainda não havia recebido uma resposta.
Mas já se decidira por outro homem. Aquele homem, aquele que não temia a morte, cuja alma era ígnea e pura, era aquele que escolhera como o seu companheiro para a vida.
Era por isso que precisava forçar seu pai a ver suas habilidades no Festival Bushin… com a sua espada.
Então, orou, ele poderia… Rose estapeou as suas bochechas.
— Foco — murmurou, tirando a sua túnica encharcada de suor.
Sua pele, brilhando de suor, estava exposta. A única coisa escondendo seus seios consideravelmente fartos era seu sutiã esportivo da Mitsugohi.
Era um pouco indecente da parte dela, mas sabia que ninguém apareceria, então optava por não se preocupar com essas coisas.
Preparou seu florete de prática, em seguida, invocou uma imagem em sua mente.
Imaginava o seu melhor desempenho… de volta a quando a academia estava sob ataque.
O Festival Bushin começaria em breve. Teria que recriar aquele sentimento antes que isso acontecesse.
Seu florete piscava pelo ar e gotas de suor voavam.
Seu elegante cabelo cor de mel ficava todo despenteado.
Ela afastava os fios caídos em seu rosto e continuava fazendo mais do mesmo.
O tempo todo podia ouvir a chuva caindo lá fora.
O sentimento recusava-se a retornar.
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A temporada do Festival Bushin estava chegando.
Caminhei pelas estradas movimentadas da capital. A composição da multidão estava diferente do normal.
As pessoas que passavam por mim na rua tinham raças, nacionalidades e profissões diferentes, mas compartilhavam do objetivo em comum de querer aproveitar o ambiente. Nunca tinham falado uns com os outros antes, e provavelmente nunca voltariam a fazê-lo, mas, mesmo assim, compartilhavam de um estranho senso de unidade.
Era assim que os festivais funcionavam.
Eu não odiava esse tipo de vibração. Afinal, era necessária para uma coisa: quando todos estavam focados em algo, isso criava o maior palco imaginável.
O Festival Bushin.
— Há uma grande onda chegando e eu serei amaldiçoado se não surfar nela.
Iria marcar o primeiro item da minha lista de desejos.
Era aquele caminho em que um fodão misterioso se juntava a um grande torneio, e todos começariam com Espera aí, aquele cara vai acabar morto! e mudariam para Ei, ele na verdade é super forte! e depois para Quem é aquele cara?!
Para fazer isso, precisaria da cooperação de todas.
Depois de abrir caminho em meio à multidão, acabei chegando à filial da capital real da Mitsugohi.
Ignorando a fila de pessoas esperando a sua vez pacientemente, entrei direto. Sou amigo da dona, então está tudo bem, certo?
A loja estava lotada, já que era temporada de movimento e tal, mas não demorou muito para que uma vendedora atraente aparecesse e me arrastasse.
— Sei que pode parecer que estou mentindo, mas sou amigo da dona. Eu juro.
— Estou ciente.
Eu estava um pouco preocupado sobre ela realmente estar ou não, mas acabou estando sim.
Me levou para aquela sala, aquela da última vez com uma cadeira incrível. Sentei nela.
Droga! Sentar naquela coisa realmente fazia a pessoa se sentir um rei.
Me levaram até um copo de suco de maçã. Um não tão concentrado.
Bem pensado da parte deles, sabendo que gosto mais do suco de maçã do que de laranja. Era gostoso e suave, por isso era realmente bom para os dias quentes de verão.
O vento de verão entrava para a sala. Ting, ting, soou algo.
— Sinos de vento, hein…?
Olhei pela janela e os vi pendurados contra um céu azul e grandes nuvens de verão ao fundo.
— Por favor, espere aqui por um momento.
Balancei a cabeça. A vendedora iria ao encontro de Gamma, e outra entrou para me abanar. Seu vestido de verão deixava muito da sua pele exposta.
— Sabe, eu tô meio que varado de fome.
— Irei preparar algo agora mesmo.
Enquanto eu olhava para as nuvens, decidi que com certeza iria vagar por esse lugar sempre que quisesse comida.
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Ouvindo que seu amado mestre chegara, Gamma na mesma hora deixou todo o seu trabalho para seus subordinados e correu para o Salão das Sombras.
Ela usava um vestido preto e fino, na altura do joelho, e para combinar com o verão calçava um par de saltos altos brancos. Depois de passar uma fragrância perfumada, ela marchou para o salão.
— Estou aqui, meu lorde.
Seu mestre estava sentado no trono das Sombras, olhando para o céu e de braços cruzados. Era aquele olhar penetrante dirigido às nuvens ou a algo ainda mais profundo?
Gamma não poderia dizer.
— Tenho um pedido. — Seu mestre voltou o olhar a ela enquanto falava.
Quando ela encontrou o seu olhar sempre digno, o coração de Gamma palpitou. Era um pouco inapropriado da parte dela ter qualquer esperança, mas perguntou-se se ele havia percebido que seu penteado mudara.
— Peça e farei acontecer.
— Quero me disfarçar e entrar no Festival Bushin — disse o seu mestre.
No instante em que as palavras saíram da sua boca, o considerável intelecto de Gamma já entrava em ação.
Pensou com fervor, tentando descobrir não apenas a intenção do seu mestre, como também seu verdadeiro objetivo, aquele que estava além disso.
Entretanto… ela ficou no escuro.
Por que era necessário que ele executasse essa ação?
Não importa o quanto tentasse, não conseguia desvendar esse mistério. Foi forçada a vergonhosamente perguntar:
— Por quê?
Seu mestre desviou os olhos de Gamma e encarou o céu.
E quando o seu olhar a deixou, Gamma sentiu quase como se todo o interesse dele fora roubado. Seus olhos se moveram rapidamente.
— Se importaria… em não me fazer essa pergunta? — pediu ele, com seu olhar distante.
Gamma olhou para baixo e mordeu os lábios.
Quando soube que ele lutou com Aurora, a Bruxa da Calamidade, um pensamento passou pela sua mente. Se ela estivesse lá, seria capaz de descobrir o seu plano?
Não tinha fé de que o seria.
Nenhum dos membros do Jardim das sombras que estava presente tinha sido capaz de entender a profundidade dos acontecimentos. No final, a escolha dele acabou sendo ótima, mas ninguém conseguia pensar da mesma forma. Se Gamma estivesse lá, não teria escolha a não ser deixar de determinar as intenções de seu mestre.
Gamma era o cérebro do Jardim das Sombras. Essa era a sua raison d’être.
Se não podia fazer isso, então de nada valia para a organização. E embora soubesse disso, estava mais uma vez confusa.
— Perdoe-me… Deve ser algo que você não pode contar a ninguém.
Gamma não foi capaz de deduzir qualquer fragmento dos motivos ou emoções do seu mestre.
Ela era um completo fracasso.
Seria muito melhor se apenas parasse de tentar ser inteligente e fizesse o que lhe era ordenado.
— Não perguntarei mais nada, mas isso será feito.
Gamma ajoelhou-se, escondendo o rosto para esconder as lágrimas de desgosto brotando nos cantos de seus olhos.
Depois de enxugá-las, deu instruções rápidas aos seus subordinados. Eles foram em busca de algo.
— O que é aquilo? — perguntou seu mestre enquanto olhava para o que traziam.
— Slime… modificado com base em sua Sabedoria das Sombras. Ao passar magia por ele, assume exatamente a mesma sensação da pele.
— Oh…?
Gamma ofereceu o slime cor de carne para o seu mestre.
— Então só preciso colocar isso na minha cara?
— Correto.
Seu mestre esticou o slime sobre o rosto.
— Parece até que é argila — observou ele enquanto se olhava no espelho.
— É aqui que entra a Nu.
— Perdão. — Nu deu um passo à frente de seu mestre e pegou uma faquinha parecida com um cinzel. — Vou esculpir o slime.
— Ah, entendo.
— Que tipo de rosto você gostaria?
— Boa pergunta… Um que pareça meio fraco.
— Fraco, hein…? — Nu pensou por um minuto.
— Que tal este homem? — Gamma abriu uma pasta e mostrou a Nu os dados do censo de um jovem.
— Jimina Senen. Membro da aristocracia do Império Altena. Vinte e dois anos. Ele é preguiçoso, fraco para os padrões dos cavaleiros negros e foi rejeitado há cinco anos. Depois disso, trabalhou em vários lugares como mercenário e guarda. Seu trabalho final foi proteger uma carruagem cheia de possuídas.
O homem era preguiçoso, mas isso não era pecado algum. Estava guardando uma carruagem, mas não sabia o que havia dentro. Foi então que a sua sorte acabou.
— A estrutura óssea dele é semelhante, então deve funcionar. Também já temos os seus documentos de identificação.
— Bom. Assim será melhor do que forjar tudo. Isso é aceitável, meu lorde?
— Sim, vamos com esse cara, Mundane.
— Por enquanto, sem mais delongas. — Nu pegou a sua faca e começou a raspar o slime.
Ela era excelente com maquiagem. Na verdade, se tratando de cosméticos, era a garota ideal.
Terminou de esculpir em um instante, e o rosto de um homem comum estava gravado em cima do de seu mestre.
Ele deixou um grunhido impressionado escapar ao se ver no espelho.
— Ooh, isso é bom…
— Isso serve?
— Aham, isso é perfeito. Pareço tão fraco.
O rosto carecia de traços notáveis e passava uma impressão simples. Existiam olheiras doentias sob seus olhos, uma barba por fazer patética, uma boca flácida e pele opaca. O homem parecia completamente não confiável.
Ver o seu mestre tão satisfeito aqueceu o coração de Gamma.
— O rosto vai endurecer quando você passar a magia por ele, então, depois, pode tirá-lo e colocá-lo como quiser.
— Jóia.
— No que diz respeito aos seus pontos fracos, é menos elástico do que os macacões de slime e oferece quase nenhuma proteção física.
— Entendi, então é apenas para uso cosmético. Não faria sentido fazer um macacão completo com isso.
— Correto. E também…
Depois que Nu terminou com a breve explicação, seu mestre se levantou.
— Eu provavelmente ficaria mais bonito se curvasse as costas. — E tentou andar com as costas um pouco torcidas.
— Bravo — elogiou Gamma, sorrindo enquanto aplaudia.
Era possível dizer o quão fisicamente apta uma pessoa era apenas avaliando o seu andar e postura. A força vinha principalmente dos pés. Pessoas que eram boas em manipular seus corpos se comportavam de forma a transferir o máximo de força deles a si mesmas. Claro, não era esse o objetivo principal ao avaliar alguém, mas era um ponto de referência útil.
O mestre de Gamma uma vez lhe ensinou isso, e ela entendia perfeitamente. Entretanto, essa perfeição não se estendia à capacidade de colocar tal coisa em prática. Sua postura era elegante, nada mais. Ela era um clássico exemplo de como essa regra não se aplicava a todos.
— Eu também deveria abaixar os meus ombros… Aham. E preciso tomar cuidado para não desalinhar a minha pélvis. Seria um saco se isso travasse.
Gamma ficou cheia de sentimentos agradáveis enquanto observava seu mestre praticar e andar de forma a passar a impressão de fraqueza. Então deu instruções aos seus subordinados.
— Prepare roupas e uma espada barata.
— Ah, bem pensado.
Ao ouvir essas três palavras, o coração de Gamma pulou uma batida.
— Aham, essas parecem boas. Vou me inscrever no Festival Bushin.
Seu mestre devia ter feito algo com suas cordas vocais, pois sua voz saiu baixa e rouca.
— Aqui estão os seus documentos. Tome cuidado lá fora.
Gamma abaixou a cabeça e observou seu mestre partir.
— Obrigado. Ah, é mesmo, mais uma coisa.
Seu mestre parou diante da porta.
— Esse penteado fica bem em você.
O cérebro de Gamma congelou.
E a porta se fechou.
— Plergh!
E o salto de Gamma estalou.
— Gamma?!
Seu rosto afundou no chão, mas, apesar do sangue escorrendo do seu nariz, sua expressão era de absoluta felicidade.
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As inscrições para o Festival Bushin eram feitas na recepção da arena.
Entrei na fila, olhando para os outros cavaleiros negros ao meu redor.
O cara na minha frente, sendo alto e forte, parecia forte mesmo de longe, mas seu centro de equilíbrio era um lixo.
Hmm. Difícil de dizer, mas achei que parecia mais fraco do que ele.
Mais guerreiros fizeram fila atrás de mim.
Um dos caras tinha um centro de equilíbrio bem definido, mas era meio atarracado. Caramba, seu senso de equilíbrio provavelmente só era bom por causa disso. Cara, era isso que se ganhava sendo um beberrão.
Mas achei que eu estava bom. A expressão dele era intimidante, então eu ainda parecia mais fraco.
Continuei olhando ao redor e julgando as pessoas. Era como se estivesse fazendo o meu próprio mini torneio de quem parecia mais fraco.
Afinal, queria ir de Espera aí, aquele cara vai morrer , para Quem é aquele cara?! então tinha que começar parecendo o cara mais insignificante de todos.
Aquele cara não é ninguém, aquele outro nem é grande coisa; o cara na frente daquele lá é um nanico; esse otário é menos que ninguém… Drogas, eram muitos merdosos.
Mas eu ficaria bem. No momento, era Jimina Senen1Jimina Senen é um jogo de palavras que significa “Pessoa Comum”. Em inglês, foi traduzido Mundane Mann, e também pensamos em traduzir como Kara Komun. Porém, como muitos o conhecem pelo nome utilizado no mangá, optamos por deixar Jimina..
Depois de conduzir minha avaliação justa e imparcial, determinei que ainda era provavelmente o menos impressionante de todos.
Quando balancei a cabeça, satisfeito, alguém me chamou.
— Ei, criança. É melhor você já ir desistindo.
— Hmm?
— Se não fizer isso, vai morrer.
Me virei e me deparei com uma cavaleira negra parada atrás de mim.
Meu coração bateu forte. Poderia ser aquele clichê clássico?
— Quem é você?
— Eu sou Annerose. Se está planejando entrar sem nem pensar direito, é melhor desistir agora mesmo. — Annerose lançou um olhar severo para mim.
Quando o fez, eu apertei meus punhos.
Eu sabia… Era a cena que sempre acontecia quando um fracote tentava entrar em um grande torneio.
— Você é um amador. Posso dizer isso só de te olhar.
Annerose caminhou em minha direção, então ficou a um braço de distância.
Seus olhos azul-claros emitiam uma vibração teimosa, e combinavam com a cor de seu cabelo que batia em seus ombros.
— Sua espada é barata e seu corpo é frágil.
Annerose bateu levemente em minha arma e colocou o dedo indicador no meu peito.
— O torneio é disputado com lâminas cegas, mas se você levar isso na brincadeira, vai morrer.
Ela voltou a me encarar.
Retornei o seu olhar e pensei por um momento. Qual seria a melhor reação…?
— Você não deveria julgar as pessoas pela aparência — acabei dizendo, depois me afastei.
A premissa era de eu parecer fraco, mas secretamente forte. Ficar todo tímido a essa altura não faria sentido.
Seria melhor para mim se ela achasse que eu era arrogante demais para escutar qualquer coisa.
— Ei, não precisa ser tão ríspido. Só estou tentando te ajudar, e…
— Guarde a sua preocupação para você. — Tornei o meu tom o mais confiante possível.
— Você realmente precisa…
De repente, outro homem se intrometeu em nossa conversa.
— Yo, criança. Você deve ouvir o que a moça está te dizendo.
Se eu tivesse que descrever a sua aparência, diria que ele pareceria um lutador profissional durão. Por outro lado, a facilidade com que usava a grande espada nas costas e as cicatrizes de batalhas gravadas em seu rosto o faziam parecer um guerreiro grisalho.
Sério, ele provavelmente era a pessoa mais forte que estava por perto, fora eu e Annerose.
— Meu nome é Quinton. Entrei em alguns desses Festivais Bushin, mas todo ano aparecem alguns punks fracotes para estragar o clima. Então estou te avisando: só corra para casa e vá chupar as tetinhas da sua mamãe.
Quando as pessoas ao nosso redor ouviram o desprezo desmedido que Quinton estava lançando em minha direção, a multidão soltou gargalhadas e gritos de aprovação.
Minha única resposta foi um olhar de soslaio para ele e deixar o canto da minha boca se curvar em um sorriso.
— Ao menos sou mais forte do que você. — O rosto de Quinton ficou vermelho.
— Ah ha ha ha! Ei, Quinton! A criança está tirando uma com a sua cara!
— Quinton, vai mesmo deixar esse pirralho falar assim com você?!
Estimulado pelos outros, Quinton franziu a testa e me levantou pelo colarinho.
— Ei, presta atenção para quem você está respondendo. O que foi isso sobre ser mais forte do que eu? — Não ofereci uma resposta.
Apenas sorri.
— Parece que alguém… precisa te ensinar uma lição!! — Quando as palavras saíram da sua boca, Quinton me soltou.
Bati em alguém e acabei caindo no chão.
— Isso aí, acerta ele!!
— Ah ha ha ha! Vá com calma com essa criança!!
A esta altura, um anel se formou ao nosso redor. Então, para os deslocados nisso: ninguém gosta de perder uma luta.
— Se vai se desculpar, a hora é agora — ameaçou Quinton enquanto estalava o pescoço.
Eu balancei a minha cabeça.
— Cara, você realmente é de terceira categoria.
— Seu fodido! — Quinton brandiu o punho e investiu contra mim.
Sua forma era uma verdadeira merda.
Para ser franco, as pessoas deste mundo eram péssimas quando se tratando de combate corpo a corpo. Ou melhor, eram mais fortes quando usando armas. A menos que um lado se sentisse totalmente seguro da vitória ou se deparasse com as costas contra a parede e incapaz de encontrar alguma saída, as brigas não aconteciam com tanta frequência.
Se alguém fizesse um torneio no qual ninguém pudesse usar armas, eu acabaria ganhando. Estava bastante confiante nisso.
Inúmeras estratégias sobre o que fazer a seguir passaram pela minha mente.
Contra-atacar com um soco direto de direita ou um gancho de esquerda seria simples, mas eficaz. Pará-lo com um soco ou um chute frontal e depois recuar seria seguro. Ir para a defensiva na mesma hora seria ainda mais seguro. Também existiam outras opções – usar meus joelhos ou cotovelos seria uma boa escolha, e pular nele enquanto estivesse caído também seria uma boa.
Se fosse um inimigo poderoso com quem eu planejasse lutar a sério, provavelmente começaria com um soco. Entretanto, eu não fecharia o meu punho; em vez disso, iria manter a minha mão aberta, estenderia o meu alcance e iria direto para os seus olhos.
Contra esse cara, porém, não havia necessidade de ir tão longe. Além disso… ainda não estava com vontade de lutar.
— Toma essa!!
O punho de Quinton afundou na minha bochecha.
Isso me fez sair voando, batendo na parede de espectadores.
— Ainda não terminei com você!! — Os punhos de Quinton caíram sobre mim.
Esquerda, direita, esquerda, direita, direita, direita.
Não movi um dedo em direção dele, levando os golpes e desmaiando quando senti que era o momento certo.
— Ei, aquele cara é fraco! Ele é fraco pra caralho!
— Ah ha ha ha! Ele levou uma surra!
Me deleitei de felicidade com as zombarias da plateia.
— O quê? O gato comeu a sua língua? Seu punkzinho covarde. — Quinton olhou para mim e sorriu.
Olhei para ele e retribuí o sorriso.
— Meus punhos são valiosos demais para desperdiçá-los com você.
— Parece que alguém ainda não aprendeu boas maneiras!
— Já basta!! — Annerose parou o punho que Quinton brandiu com o seu próprio comentário. — Você já está indo longe demais. Se quiser continuar, faça isso comigo. — Ela olhou para ele e o encarou.
— Ei, ei, aquela garota acabou de te dizer “faça isso comigo”!!
— “Faça isso comigo” também, moça!!
Ao contrário de todos ao seu redor, porém, a expressão de Quinton ficou grave. Ele estalou a língua e deu as costas.
— O que houve, Quinton? Precisa mijar ou algo assim?
— O quê? Já acabou? Boo!
Quinton foi embora e a multidão se dissipou.
— Sinto muito. Não pensei que isso iria tão longe. — Annerose me ofereceu a sua mão.
Ignorei e me levantei sozinho.
— Se você fosse impedi-lo, poderia ter feito isso desde o início. Estou errado?
Ao ouvir a minha pergunta, Annerose recuou.
— Achei que seria melhor você levar uma surra do que sofrer algum dano irreparável no Festival Bushin, mas ele foi longe demais. Você está gravemente ferido?
Annerose estendeu a mão para me tocar, mas levantei a minha própria mão e a detive.
— Estou bem.
— Não, você… O quê?
Ela parecia ter percebido. Apesar de ter sido espancado até dizer chega, não sofri nenhum dano notável.
Minha única ferida era um cortezinho no canto da boca.
Usei meu polegar para limpar o sangue, depois, virei as costas para ela.
— Já faz um tempo… desde a última vez que senti o gosto do meu sangue… — murmurei alto o suficiente para que Annerose ouvisse.
— …! Espera! Qual é o seu nome?!
Pude sentir o olhar dela queimando as minhas costas.
— Jimina…
Com isso, desapareci em meio à multidão… e levantei o meu punho.
Isso aí, caralho!
Mandei bem.
“Todo mundo o despreza, mas alguns poucos percebem que há algo de estranho nele…!” Amo essa rota.
Se me perguntassem, as pessoas que mostram a verdadeira força antes de um torneio são de terceira categoria.
Afinal, como deveriam se divertir? De que adianta se vai revelar o verdadeiro poder da maneira e no lugar mais entediante imaginável?
Seria melhor se todos achassem se tratar de um idiota, até que as batalhas reais começassem. Então, uma vez que a coisa real começasse, poderia fazer todos pensarem: Espera, ele é meio forte! E então, no clímax, essa transição mudaria para Não… Ele é poderoso demais! Então essas eram algumas das primeiras coisas.
Controlar as expectativas do público até o momento decisivo seria a minha missão neste Festival Bushin.
Por um tempo, fiquei escondido atrás de uma cobertura enquanto refletia a respeito do que acabara de fazer.
Então, quando vi que Annerose e os outros foram embora, voltei sorrateiramente para a fila e terminei o meu registro.
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As preliminares do Festival Bushin começariam na próxima semana. Voltei a ficar como o Cid, passei algum tempo olhando do topo da arena para baixo e imaginando vários resultados para o torneio, depois comprei dois sandubas do Rei Tuna e comi no caminho de volta para o dormitório.
Enquanto seguia por um caminho iluminado pelo sol poente, de repente lembrei que tinha prometido em algum momento levar Alpha para comer um Rei Tuna.
Ela parecia estar sempre tão ocupada, então nunca chegamos a fazer isso. Ah, bem. Eu tinha certeza de que algum dia desses acabaria comprando um desses sandubas para ela. Ela era uma elfa, então poderia facilmente viver por uns trezentos anos, e eu estava planejando usar magia para passar dos duzentos. Contanto que fizéssemos isso antes de morrermos, estaria tudo bem. Não precisava de pressa.
Quanto mais perto eu chegava do campus, mais alto ficava o som das cigarras. Afinal, as noites de verão eram o domínio delas. Ou ao menos é assim que eu gostava de pensar.
A academia brilhava à luz da noite, e poderia dizer que o trabalho de restauração do incêndio estava progredindo sem problemas. Nesse ritmo, terminaria dentro do prazo, quase junto ao término das férias de verão. Uma vez, Skel se irritou e disse: “Gostaria que essa maldita coisa tivesse queimado toda”, e não pude deixar de concordar com ele. Poxa, todo o corpo discente esperava a extensão das férias de verão, então eu podia apostar que também se sentiam da mesma forma.
Passei ao lado da escola e desci pelo caminho dos dormitórios.
Não havia ninguém por perto.
A maioria dos alunos tinha voltado para as suas casas. Na verdade, assim que pensei nisso, lembrei que minha irmã ficou toda irritada e me disse para também voltar para casa com ela. A ignorei e fui para a Terra Sagrada, é claro, mas me perguntava o que tinha acontecido a ela após aquilo. Provavelmente estaria de volta assim que as primeiras rodadas do festival começassem.
Enquanto esses pensamentos flutuavam em minha mente, enfiei o último pedaço do meu primeiro sanduba na boca.
Então fui tirado do meu devaneio.
— O descuido é o maior de todos os inimigos, sabe.
Senti a bainha de um florete de treino tocar o meu ombro. Não havia nenhuma intenção assassina, então não me incomodei em responder.
A portadora da bainha soltou um risinho e guardou a sua espada. Ela era uma jovem atraente com cabelos cor de mel e aparência gentil – Rose.
— Eai. Treinando?
— Uhum. Estava com algum tempo livre, então vim praticar um pouco. Você foi ao Rei Tuna?
— Sim, sou amigo do dono de uma das lojas que ficam por perto. E só descobri isso recentemente.
— Esses dias nós três fomos lá. Estava realmente muito saboroso.
— Vocês três?
— Sim. Eu, a Senhorita Natsume e Alexia.
Ainda não tenho certeza de o que as três tinham em comum, mas pensando nisso, também as tinha visto juntas na Terra Sagrada.
— Vocês são amigas?
— Eu e a Senhorita Natsume nos damos maravilhosamente bem. E a Alexia é uma boa pessoa, então tenho certeza de que ela vai ficar mais próxima.
Eu duvidava que ela algum dia seria capaz de fazer amizade com Alexia, ainda mais com Rose pensando nela como uma pessoa decente.
— Infelizmente, porém, Alexia e a Senhorita Natsume parecem estar em péssimos termos — comentou ela, triste.
Não era difícil imaginar Beta e Alexia no mesmo grupo. Eu sentia que elas eram feitas do mesmo tecido.
— Tenho certeza de que eventualmente irão superar isso.
— Espero que sim… Se eu algum dia tiver que partir, fico preocupada em como elas se sairiam. Temos que trabalhar juntas. Não sei se algum dia conseguiremos realizar algo, mas espero que possamos mudar o mundo para melhor.
— Afinal, a paz mundial é importante.
— Uhum. — Rose sorriu feliz. — Ah, perdão. Está ficando tarde e realmente preciso ir.
Pouco a pouco, nossos arredores foram ficando mais escuros.
— Certo. Nos vemos depois.
— Um…
Mesmo que ela só alegasse que tinha que ir, Rose parecia querer dizer algo.
— E então?
Ela hesitou por um momento.
— Estou indo ver o meu pai. Ele irá me apresentar ao meu noivo.
— Sério?
— Sim.
— Bem, parabéns… ou não, sei lá.
Estava escrito na cara de Rose que não era isso que ela queria.
— Sou uma princesa do Reino Oriana. Assim sendo, vivi minha vida carregando o peso de várias expectativas, mas, por egoísmo, as traí.
— Uhum.
— Depois disso, posso continuar a traí-las ainda mais. — Rose sorriu com tristeza. — Desta vez, porém, não será por egoísmo. Espero que esses meus medos não se provem reais, mas… se algo acontecer… você vai acreditar em mim?
— Aham, pode deixar.
— Só peço que acredite em mim, Cid, e nada mais. Rezo para que tenhamos outra chance para conversar assim.
Rose abaixou a cabeça, escondendo o rosto, e se virou para tentar partir.
— Ei.
Gritei para detê-la e, depois, entreguei-lhe meu outro sanduba.
— Aqui. Relaxa e goza.
— Obrigada.
Rose me deu um sorriso gentil.
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No dia seguinte, fui acordado por um grito de Skel.
— Rose, a presidente do conselho estudantil, esfaqueou o noivo e fugiu!!
Ainda deitado na cama, inclinei a minha cabeça. Me perguntei o que a fez querer partir para isso.
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— O que aquela garota pensa que está fazendo…? — Alexia estalou a língua.
Natsume fez um comentário prático do sofá do quarto de Alexia.
— Parece que a Princesa Rose fugiu para o lado norte da capital. Provavelmente ainda está na cidade.
Alexia lançou um olhar irritado para Natsume, então estalou a língua de novo.
Era graças a Natsume que ela ouviu os detalhes do atentado de Rose contra a vida de seu noivo. Por mais inescrutável que Natsume fosse, sua rede de informações era útil. Ela foi capaz até de desenterrar uma série de rumores sobre o Culto de Diablos.
— O Rei Oriana provavelmente quer lidar com esse assunto de forma interna. Ele pediu para o Reino Midgar não se envolver.
— Isso é suspeito.
— Muito. As ações de Rose estão sob a jurisdição das leis de Midgar, mas processá-la teria um efeito óbvio na relação entre os dois países. Midgar provavelmente se absterá de intervir.
— Verdade. Meu pai provavelmente vai esperar para ver como as coisas acontecem.
O pai de Alexia era um forte adepto em não criar problemas e, quando o rosto dele flutuava em sua mente, ela estalou a língua de novo.
— O noivo de Rose é Doem Ketsuhat, o segundo filho de um dos duques do Reino Oriana. Se ela for pega, imagino que sua punição não será leve.
— Ela é da realeza, então não receberá a pena de morte, mas será presa ou exilada… De qualquer forma, devemos encontrar Rose antes que o Reino Oriana o faça, para que possamos perguntar a ela o que está acontecendo.
— Bem, vamos pensar um pouco. A Princesa Rose não discutiu nada disso conosco. É possível que estava tentando evitar nos envolver e tornar isso em um incidente internacional.
— E então?
Natsume encarou o olhar de Alexia.
— Acho que devemos evitar fazer qualquer coisa imprudente.
— Você está dizendo que devemos abandoná-la?
— Nunca falei isso. Só acho que devemos pensar no nosso próximo passo antes de agirmos.
— O quê, então você está tentando dizer que não estou pensando?
— Nunca falei isso. Só acho que devemos tomar um pouco mais de tempo pensando nas nossas opções.
— O quê, então você acha que eu sou uma idiota?
— Nunca falei isso. Só acho que cada uma de nós tem seus pontos fortes e fracos.
— O quê? Se você tem algo a dizer, simplesmente vá e diga logo!
— Ah, eu nunca poderia ser tão rude… — disse Natsume. Seus olhos dispararam ansiosamente.
Alexia caminhou rapidamente em direção a ela, em seguida, levantou Natsume pela gola. Os dois montes no peito exposto de Natsume balançaram.
Alexia a encarou.
— Não vá bancar a inocente comigo.
— Eek! P-por favor, não me mate…!
Natsume se contorceu para tentar se libertar, fazendo seu peito balançar ainda mais. Alexia percebeu que havia uma pinta em uma dessas coisas balançantes, e isso a irritou ainda mais.
— Vê? Você está fazendo tudo de propósito.
— Eeeep…
— Vou chutar o seu traseiro.
— O-o-o-o…
Natsume olhou para cima com lágrimas nos olhos, e Alexia estalou a língua e a soltou.
A autora desabou no sofá.
— Rose deve ter tido algum motivo para o que fez, e eu sei que ela estava tentando nos impedir de nos envolvermos nisso. É isso que me irrita.
— O-o que? — perguntou Natsume.
— Quando alguém me diz para não fazer algo, isso me dá ainda mais vontade de fazer, e quando alguém diz que não quer que eu me envolva em algo, isso me dá vontade de me enfiar até o pescoço.
— Um… — Natsume olhou para Alexia, sem saber como responder.
— Somos aliadas. Nenhuma de nós sabe realmente o que está no coração das outras, mas concordamos que agiríamos como uma equipe. Não é?
— C-certo.
— Sendo assim, não vou abandonar uma companheira de equipe. Isso significa que também não vou te abandonar. Entendido?
— Sim… — Natsume ficou cabisbaixa. — Então eu vou coletar informações sobre a Princesa Rose. Ouvi alguns rumores desagradáveis sobre o noivo, então vou tentar descobrir mais coisas.
— Olha só que cooperativa. Vou começar consultando a minha irmã.
— Vamos nos encontrar hoje à noite para trocar informações.
— Uau, você se move rápido.
— Então, até.
— Ah, e fique segura.
— Você também, Princesa Alexia.
Natsume se curvou, em seguida, foi embora.
Alexia a observou ir embora, depois soltou um suspiro pesado.
— Bem, parece que tenho trabalho a fazer…
Ela alisou as roupas amassadas e também saiu.
Tradução: Pimpolho
Revisão: PcWolf
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