A asura passou por mim e não pude deixar de dar um passo para trás enquanto meu estômago se revirava e minha força diminuía diante de sua aura. Apesar de meus melhores esforços, tentei evitar voltar meus pensamentos para examinar minhas muitas feridas, mas a força esmagadora da presença da asura tornava minhas próprias dores inevitáveis.
Cada centímetro do meu corpo estava machucado, meus ouvidos zumbiam e havia uma pulsação consistente e irritante vindo da parte de trás da minha cabeça. Não conseguia sequer olhar para minha mão, grande parte da pele havia se desprendido para revelar a carne descolorida por baixo.
À minha frente, a dragão olhou para cima, mas seu olhar estava desviado da batalha paralisada acima da montanha.
Ao sul, um pequeno aglomerado de formas escuras aproximava-se rapidamente dos picos das montanhas. Eles não estavam se preocupando em esconder suas assinaturas de mana e não havia como confundi-los com outra coisa senão o que eram.
Cada nervo do meu corpo começou a se desfazer com a visão, me senti verdadeiramente desesperada pela primeira vez desde que os dragões chegaram.
— Foi tudo realmente em vão? — perguntei, as palavras um sussurro em meus lábios.
O peso da mana da dragão aumentou, o ar ficou denso, sua pressão palpável na minha pele. A dor me assolou quando caí de joelhos e olhei para a entidade não humana, certo de que sua mera presença me destruiria completamente.
A asura suspirou.
Lágrimas escorreram dos meus olhos e involuntariamente me virei, incapaz de suportar a visão do poder bruto da asura, apenas para ver um raio como uma estrela negra caindo sobre nós. Incapaz de emitir um grito de alarme, senti meu corpo ficar rígido, então a aura da dragão se manifestou como um escudo prateado, capturando-me dentro dele por conta da minha proximidade.
Um pântano fervilhante de pontas de metal pretas se agitou ao nosso redor, mastigando a barreira como se mil dentes rangessem. Com um grunhido, a asura empurrou seu escudo para fora. Feixes de luz prateada perfuraram o metal frio, e todos os espinhos explodiram ao mesmo tempo, a poeira resultante se espalhou pelo vale abaixo.
Tive um segundo de puro terror ao ver o chão se abrir abaixo de mim antes de deslizar para trás, sendo engolida por uma enorme boca de terra. Pedras quebradas, rochas, meia carruagem e várias toneladas de terra desabaram ao meu redor.
Estendendo a mão, agarrei o ar e observei enquanto a mulher asura de um braço só flutuava no ar e acelerava em direção a Perhata, então tudo, exceto a montanha caindo, desapareceu e a escuridão se fechou acima de mim.
Desesperadamente, lutei para criar uma barreira protetora de água ao meu redor. A mana crepitava e estagnava enquanto minha concentração quebrada se debatia, depois crescia, envolvendo-me em uma esfera fria, mas protetora. Saltei para longe, onde cascalho, pedra e terra batiam em mim de todas as direções, apenas flashes intermitentes de luz visíveis através dos escombros em cascata, então, com uma rapidez que fez minha cabeça girar, parei bruscamente.
O barulho do desabamento da montanha continuou em todos os lugares ao mesmo tempo, o estrondo dentro da minha cabeça, do meu peito, das minhas entranhas. Não conseguia ver, tampouco respirar. Minha barreira estava desmoronando, sendo esmagada em minha direção pelo peso da montanha. Estava presa pelo meu próprio feitiço, paralisada, minha concentração fraturada.
O feitiço estourou. Passei os braços em volta da cabeça, então terra e pedras caíram em cima de mim. Algo pesado esmagou minha perna.
Gritei, mas a terra engoliu o barulho. Meu coração batia rápido, tão rápido que parecia querer subir pela garganta.
Era isso. Tudo que eu fiz — aprender magia, me rebelar contra os Alacryanos, sobreviver à guerra — me trouxe aqui, literalmente ao meu túmulo. Enterrada viva. Era melhor ter morrido ao lado de Jarrod, pensei amargamente. Pelo menos teria sido rápido.
Então, porém, lembrei-me do homem descendo a montanha com a família. Do casal com o bebê. Do menino.
Eles lutaram para sobreviver, não desistindo durante ou depois da guerra, até mesmo continuando a lutar por suas vidas enquanto as divindades faziam chover morte e destruição ao seu redor.
Pessoas comuns, agricultores, pastores, artesãos… passaram por tudo isso e optaram por continuar tentando viver…
Movi meus braços, tomando cuidado para proteger minha cabeça e abri um pouco de espaço. Depois, meus ombros e quadris, fiz só um pouquinho mais. O feitiço protetor impediu que o solo e as pequenas pedras se compactassem ao meu redor, mas, ao mesmo tempo, alguma coisa dura e pesada pressionava minha perna.
Fechei os olhos, embora isso não fizesse diferença no que podia ver. Respirando fundo o ar rarefeito e bolorento, escutei e procurei com todos os sentidos disponíveis.
Minha respiração ficou presa.
Abaixo, não muito longe, conseguia sentir mana, uma grande quantidade de mana atmosférica do atributo água.
Tremendo de nervosismo, cuidadosamente comecei a usar o pouco de mana que ainda tinha para borrifar jatos de água de alta pressão no chão, abrindo um pouco de espaço.
O chão que pressionava ao meu redor cedeu pouco a pouco. Com medo de ser descuidada e ainda assim sabendo que não havia tempo para me recompor, usei pequenos jatos de água para descer em direção à mana atmosférica que pude sentir, tentando abrir espaço suficiente para rastejar para frente em minha pequena caverna, mas a pedra na minha perna me imobilizou firmemente; Não conseguia me mover um centímetro.
Fechando os olhos, parei de me mover e lançar feitiços por um momento, concentrando-me na respiração. Minha cabeça estava nebulosa, meu corpo havia se entregado à agonia e meu núcleo estava quase vazio.
Apoiando-me nos cotovelos, reuni forças e lancei um jato de água na pedra, tentando movê-la. Alguns pedaços de rocha se desprenderam, mas a pedra não se moveu. Reuni minhas forças e golpeei-a repetidas vezes, cada jato no mesmo lugar, até que, com um estalo abafado, a pedra se partiu. As metades deslizaram só um pouco e, suprimindo um grito de pura agonia, me libertei.
Choveu terra sobre mim, depois pedrinhas, enquanto o chão ao meu redor também se movia.
Reunindo o que parecia ser o que restava das minhas forças, lancei um jato poderoso para baixo e o chão do meu pequeno buraco cedeu.
Mergulhei no ar livre, tive uma breve sensação de luz contra meus olhos, então bati na rocha sólida com um impacto estridente que tirou o fôlego dos meus pulmões e todos os sentidos do meu crânio. Meus sentidos iam e vinham enquanto eu lutava contra o impulso de desmaiar, então algo me trouxe de volta à consciência.
Olhei para o teto, que havia desmoronado parcialmente onde eu havia atravessado.
O que era isso? Algo experimentado nas bordas dos meus sentidos defeituosos…
Virar o pescoço foi pura tortura, mas tinha que encontrar o que quer que tivesse trazido meus sentidos de volta à vida. Ao meu lado, a apenas alguns metros de distância, uma ponta de metal preto se projetava do chão e subia até o teto, com uma rede de filamentos estendendo-se dela para manter o teto no lugar. Ao olhar mais longe, vi outro e depois um terceiro espigão preto.
Então aconteceu de novo e percebi o que era: uma voz.
Apesar da dor profunda, virei na outra direção, rolando para o lado e me apoiando em um cotovelo.
Sob uma luz fraca e sem fonte, pude distinguir a forma de um homem enrolado em posição fetal próximo ao preto vítreo de um corpo de água subterrâneo. Olhos vermelhos olharam para mim, brilhando na escuridão.
Respirei fundo e minhas costelas doeram. Apertando os olhos, percebi que ele tinha longos chifres em forma de saca-rolhas se projetando de sua cabeça, e havia uma nitidez e definição em suas feições que o faziam parecer não humano.
— O Soberano — murmurei fracamente.
— Ah, você me conhece, bom, isso é bom… — Ele tentou me dar o que deve ter pensado ser um sorriso desarmante, mas isso só o fez parecer ainda mais predatório.
Exceto que…algo estava errado. Ele não tinha assinatura de mana. Olhando mais de perto, percebi que ele estava firmemente amarrado com pesadas correntes e algemas.
— Você é uma menor Dicathiana, certo? Um maga, pelo menos. — Uma língua escura passou por seus lábios pálidos. — Preciso da sua ajuda imediatamente, como pode ver. Solte-me agora e eu…
— O quê? — gritei, incapaz de me conter.
A irritação passou pelo rosto do homem.
— Não seja estúpida. Não sou mais um inimigo de sua nação. Se o barulho lá fora for alguma indicação, seus aliados dragões estão atualmente lutando contra os soldados que me sequestraram. Liberte-me e me entregarei a qualquer lagarto que estiver no comando, você será uma heroína.
Pisquei, incapaz de processar o que estava acontecendo devido à dor e exaustão que me pressionavam como a montanha caída acima.
— Excelente… — ele bufou. — Depois de tudo isso, uma maga ainda respirando cai no meu colo, por assim dizer, e ela é uma imbecil. Ou está em choque. — Ele estreitou os olhos para mim. — Menor. Você fala essa língua, certo?
Engoli em seco e me sentei. Minha mão ferida saltou para as costelas, que pensei que deviam estar quebradas.
— Sim, claro — respondi com os dentes cerrados. — Mas não acho que possa ajudá-lo. Você é um…
— Um covarde — disse uma nova voz, uma voz que soou pela encosta da montanha durante toda a batalha.
Congelei, incapaz de me virar, mas, então, não precisei.
— Soberano Oludari Vritra do Domínio de Truacia. — Os pés de Perhata esmagaram o sedimento que cobria a pedra nua do chão. — Jurado em serviço ao Alto Soberano, Agrona Vritra, pai de nossa nação e de nosso povo. Traidor, desleal… um fracasso. — Perhata se materializou na escuridão. — Perdi algum dos seus títulos, Soberano?
Ele pareceu desinflar quando soltou um suspiro profundo.
Perhata se ajoelhou ao meu lado, segurou meu queixo e me puxou para encará-la, examinando-me de perto.
— Se não é a garota que prometi deixar viva. Você tem sido uma boa garotinha?
De repente, senti como se estivesse de volta ao buraco sem luz, presa e esperando para morrer, cega e sufocando. Um calafrio percorreu meu corpo, compensado apenas pelo calor úmido que se espalhava pelas minhas calças manchadas e arruinadas.
Perhata me olhou com desdém.
— Você sobreviveu, o que suponho que deveria valer alguma coisa. E ainda…
Suas sobrancelhas franziram e ela franziu os lábios pensativamente, depois se levantou e foi até Oludari. Houve uma faísca de mana e ela colocou um dispositivo no chão ao lado dele.
— Desculpe pela demora, Soberano. Estávamos esperando por isso, que o grupo de batalha de Khalaen teve a gentileza de trazer para nós. Com mais cinco Assombrações do nosso lado, a batalha acima deve estar quase acabada, você não acha?
Ela respirou fundo e soltou o ar com uma energia quase vertiginosa.
— Se houve uma coisa boa em sua tentativa infrutífera de desertar, foi que meu propósito foi cumprido neste dia. Sangue de dragão derramado… — Um canino alongado mordeu seu lábio inferior quando ela de repente fechou os olhos e virou o rosto para o teto, visivelmente tensa.
Depois o seu sorriso desapareceu, os seus olhos abriram e Perhata se virou, olhando para cima através da montanha como se pudesse ver o céu mais além. Mesmo sob a luz incolor, pude ver seu rosto ficando pálido.
Demorou mais um pouco antes de sentir a intenção que se aproximava.
Uma raiva fervilhante e furiosa parecia endurecer o ar. Mais três assinaturas de mana, ainda mais poderosas do que os dragões que já estavam lá, e entre elas, algo mais. Algo frio, furioso e… perigoso.
Perhata girou, mergulhando em busca do dispositivo. Oludari se contorceu nas correntes, atacando com o joelho e derrubando o artefato em forma de bigorna para o lado. Ele deslizou na terra, balançando em direção à água e Perhata lutou para pegá-lo, com mana aumentando enquanto tentava ativá-lo.
— Menor, o tempus warp! — Oludari insistiu. — Desative…
Perhata, que por um momento pareceu esquecer minha existência, estendeu a mão, irritada. Um raio escuro correu em minha direção, tão rápido que nem tive tempo de fechar os olhos.
Houve um clarão roxo brilhante na minha frente, e então alguém estava entre nós, uma figura envolta em arcos violetas de relâmpagos. Na mão da figura, pequenas faíscas roxas saltando ao redor dela, estava o espinho que estava apontado para minha garganta. Chamas violetas lamberam seus dedos e a ponta preta queimou até desaparecer.
A silhueta ardente de um lobo irrompeu dele, lançando-se sobre Perhata, enquanto sua cabeça girava ligeiramente, o cabelo loiro de comprimento médio balançando como uma cortina e um único olho dourado encontrando o meu quando seu perfil foi revelado.
— Vá — disse Arthur, sua voz, assim como sua expressão, sombria e solene, mas por baixo disso, congelada com uma fúria tão amarga e fria que causou um arrepio na minha espinha.
Enquanto Perhata lutava contra a criatura ao fundo, feitiços começando a brilhar e voar por toda a caverna, estendi a mão e agarrei seu braço.
— Os dragões, eles… não se importaram, eles nos deixaram…
Aquela intenção fervilhante de cólera que sentia explodiu e os olhos de Arthur brilharam.
— Eu sei.
Antes que pudesse dizer ou fazer qualquer outra coisa, Arthur piscou e seu braço se desfez do meu alcance quando ele reapareceu do outro lado de Perhata, tirando-a de perto do Soberano e do artefato. Um feixe brilhante de luz ametista varreu a caverna escura, e a Assombração se jogou para trás, arrastando a besta de mana lupina com ela.
Uma rajada de pontas de metal preto encheu a caverna, lançando-se para fora da Assombração. Meus sentidos não foram rápidos o suficiente para acompanhar todos, mas ao mesmo tempo, diversas espadas moldadas a partir de energia violeta apareceram no ar, cortando em diversas direções ao mesmo tempo, cada uma desviando ou destruindo um espinho.
Um deles atingiu o chão ao meu lado, errando por pouco minha perna depois de ter sua trajetória desviada por uma das espadas..
Livrando-me da paralisia, tentei ficar de pé apenas para perceber que minha perna esmagada não aguentaria meu peso. A dor foi um eco distante que só se manifestou quando comecei a me mover, mas não tinha forças. Então rolei e rastejei desesperadamente em direção ao córrego subterrâneo.
Mais projéteis quebraram a pedra ao meu redor e, com cada empurrão agonizante para frente, esperava que algum perfurasse minha carne e me prendesse no chão. Foi quase uma surpresa quando meu corpo escorregou pela encosta molhada e entrou na água fria com um pequeno respingo. Empurrando com mana, me projetei ao longo do rio estreito, empurrando a corrente para me levar ainda mais rápido. Um segundo depois, escorreguei em uma fenda por onde a água escoava e fui rapidamente afastada da batalha.
O leito subterrâneo não era grande e tive que navegar inteiramente pelos meus sentidos, auxiliada pela mana e a corrente. Não havia como saber se encontraria uma saída à frente ou se ficaria presa em uma abertura cada vez mais estreita, mas sabia que não podia ficar na caverna.
Quando o riacho ficou muito estreito, empurrei para fora com o máximo de mana do atributo água que consegui, quebrando afloramentos de pedra que criavam pontos de aperto intransponíveis. Nadei por um minuto ou mais, até minha cabeça começar a ficar leve e meus pulmões gritarem por ar, antes de chegar ao fim da fenda.
Terra e pedras bloqueavam o caminho a seguir. Num pânico repentino, agarrei a terra com a mão boa, mas não adiantou. Cavar poderia levar horas, mas eu tinha apenas alguns segundos…
Conjurando balas e feixes de água, ataquei a obstrução. Cada feitiço foi mais fraco que o anterior. Repetidamente bati, até que a água se transformou em lama e meu núcleo gritasse a cada feitiço. Percebendo que não conseguiria, tentei virar e nadar rio acima, mas a fenda era muito estreita. Não consegui reverter a direção e não tive forças para enviar tanta água contra a gravidade para me puxar para trás.
Minha necessidade de respirar estava superando minha capacidade de prender a respiração. Quando isso acontecesse, engoliria água lamacenta e me afogaria…
Senti minha mente deslizar para a inconsciência e fiquei grata. Pelo menos não estaria acordada para isso.
Mesmo quando aceitei meu destino, uma força aguda puxou meu corpo e bati contra a parede de pedra. Eu estava me movendo! A fenda era tão apertada que eu raspava constantemente nas paredes, mas a corrente estava fluindo novamente, puxando-me para frente em velocidade cada vez maior. Alguns segundos desesperadores se passaram, então as paredes se alargaram antes de desaparecer. Abri meus olhos.
Água turva me cercava, mas podia ver a luz e, então, nadei em sua direção, meus movimentos selvagens, sem recursos para lançar um feitiço para acelerar minha ascensão. Parecia tão longe… tinha certeza de que ainda iria me afogar, de que não conseguiria percorrer aquela distância.
Minha cabeça saiu da água para o ar livre, foi a respiração mais dolorosa de toda a minha vida.
Em algum lugar muito próximo, uma criança gritou.
Tossindo descontroladamente, me esforcei para manter a cabeça acima da água. Na costa, várias figuras corriam em movimentos apressados. Após um splash, mãos fortes me seguraram, puxando-me para a terra firme. Caí no solo macio, sem me importar com a lama que se formava em volta do meu rosto. Tudo o que pude fazer foi puxar ar para respirar.
Haviam vozes, várias delas, ao meu redor, mas não consegui processar suas palavras.
Uma sombra passou sobre mim e instintivamente me concentrei em sua origem. Tudo estava embaçado e barulhento. Tão alto…
A montanha, o Soberano…
— Arthur! — Sentei-me ereta, examinando os arredores.
Eu estava à beira de um rio escuro e lento. Toneladas de pedra e terra caíram da montanha acima, quase interrompendo o fluxo. Estava no vale na base da montanha. Acima, ela ainda estava desabando, o barulho cacofônico de pedra contra pedra era alto o suficiente para me deixar zonza.
No entanto, foi para acima disso, muito acima, que meu olhar foi atraído.
Um dragão verdadeiramente enorme dominava o céu. A monstruosidade marcada pela batalha tinha escamas brancas e olhos roxos vibrantes que podia ver até mesmo do chão. Suas asas, embora esfarrapadas e desgastadas, se esticavam tanto que seu bater limpava a poeira do céu.
Um dragão menor, negro como a noite e quase esguio em comparação ao grande dragão branco, voava ao seu lado, permanecendo em formação. Logo atrás dela estava um homem… não, um asura, pensei, acompanhando o ritmo no ar, voando como se tivesse asas.
Os três estavam causando estragos entre as Assombrações enquanto defendiam dois dos três dragões originais que chegaram em busca do Soberano. Contei rapidamente sete Assombrações, embora fosse difícil acompanhá-las, pois voavam mais rápido do que meus olhos podiam acompanhar. Apesar de seu tamanho, o dragão branco com cicatrizes movia-se com incrível velocidade e precisão, esquivando-se dos feitiços das Assombrações ou afastando-as com suas asas enquanto disparava densos raios prateados de energia de sua boca.
O asura humanoide não atacou, mas parecia totalmente focado em proteger o dragão negro, contra-atacando qualquer feitiço que chegasse perto. Não tinha certeza do que o dragão negro estava fazendo, apenas que sua assinatura de mana parecia flutuar estranhamente.
Tive apenas alguns segundos para absorver tudo antes que a figura agachada ao meu lado chamasse minha atenção de volta para o chão. Um suspiro doloroso explodiu de mim.
— Tanner! Mas o que…
O cavaleiro do Asas de Lâmina, que trabalhava para Vanessy Glory durante a guerra, estava inchado e descolorido em todo o lado esquerdo. Sua pele estava manchada de cinza e verde esfumaçado, suas feridas abertas escorriam um fluido amarelo espesso. Antes das Assombrações chegarem, Tanner e seu Asa de Lâmina foram atingidos por um feitiço e derrubados do céu, então presumi que estava morto. Olhando para ele agora, fiquei ainda mais surpresa ao encontrá-lo vivo.
— Prazer em ver você também, Lady Helstea —, ele disse com um sorriso sombrio, envolto simultaneamente em tristeza e alívio. — Como você conseguiu… você sabe, deixa para lá. Nós precisamos sair daqui.
Quando ele disse “nós”, concentrei-me nas outras pessoas que estavam ao redor.
Havia pelo menos vinte pessoas agachadas na beira do rio, todas olhando para mim. Imediatamente vi Rose-Ellen, a turbulenta domadora de feras que provocava Jarrod em todas as oportunidades, e seu estoico vínculo, uma grande besta de mana semelhante a um pássaro. O homem musculoso que ignorou meus apelos para ajudar os idosos estava lá, assim como sua família, e…
Quase comecei a chorar ao ver o casal com o bebê que ajudei a escapar da montanha. Senti uma repentina centelha de esperança e orgulho quando vi que o menino que resgatei permanecia com eles.
— São alguns quilômetros ao norte e oeste antes de chegarmos à estrada novamente — explicou Tanner, oferecendo-me a mão para me ajudar a levantar. — Precisamos nos afastar mais da montanha. Você pode ver até onde alguns desses deslizamentos de rochas estão chegando.
As engrenagens da minha mente de repente começaram a girar novamente e percebi que, abaixo de toda aquela pedra e terra, não muito longe de onde estávamos, eu podia sentir as explosões de mana enquanto Arthur lutava contra Perhata.
Agarrei Tanner e ele estremeceu.
— Não para o norte. Oeste, mais fundo nos pântanos, o mais longe possível da batalha.
Tanner olhou incerto para o rio atrás de mim.
— Não sei se podemos…
O chão tremeu, mais do que já estava, e uma imponente lança obsidiana com pelo menos doze metros de altura surgiu da base da montanha a menos de trinta metros de distância. Ela fez um arco no ar acima de nós antes de cair sem ser vista no vale. Logo atrás da lança, uma figura sombria saiu do buraco resultante a uma velocidade impossível.
Perhata segurava o lado do corpo, o rosto contorcido numa careta de dor e medo, não se preparou para a batalha acima, mas desviou para o sul e voou a toda velocidade possível. O ar à sua frente crepitava com relâmpagos ametistas e Arthur apareceu do nada. Um cone de energia rugiu de sua mão, e a Assombração mergulhou sob ele, liberando uma saraivada de espinhos mortais de volta enquanto passava voando, mas Arthur desapareceu, aparecendo mais uma vez na frente dela, desta vez conjurando e cortando com uma lâmina de pura energia.
Gritando de frustração e raiva quando uma armadura de centenas de pequenos espinhos pretos apareceu ao seu redor, Perhata pegou o pulso de Arthur enquanto bloqueava sua lâmina com o braço. Os dois permaneceram suspensos por um instante antes da lâmina de Arthur inverter, a ponta da espada encolhendo quando uma lâmina cresceu da outra extremidade do cabo e atingiu o esterno de Perhata, faíscas voando onde a energia violeta atingiu o metal preto.
Chamas negras irromperam ao seu redor, jogando Arthur para trás e fazendo chover pontas de metal em todas as direções. Mesmo enquanto caíam, estavam aglomerando-se, combinando-se e construindo uns sobre os outros para formar algo.
Arthur desapareceu novamente, reaparecendo no ar onde Perhata estivera, mas a Assombração não estava mais lá. Em vez disso, Arthur estava cercado por várias dezenas de formas blindadas, cada uma moldada de forma idêntica a partir de centenas de minúsculos espinhos pretos. Mesmo quando o olhar de Arthur passou por elas, cada figura disparou para longe, voando em uma direção diferente.
Arthur olhou para uma figura em retirada, conjurou uma lâmina e cortou-a ao meio. Os espinhos se espalharam, caindo no chão como granizo mortal. Não havia carne por baixo deles.
Enquanto o resto das figuras armaduradas se espalhavam pelo céu, duas mergulhavam mais baixo, voando diretamente em direção ao nosso grupo cansado. Ao meu lado, Tanner gritou. Alguém gritou e todos começaram a correr, mergulhando na água ou correndo ao longo da margem.
Só pude assistir até que o braço de Tanner envolveu meus ombros e me colocou de pé, me apoiando, mas já era tarde demais. Tanner me girou para longe da amálgama de pontas pretas que parecia saído de um pesadelo, colocando-se entre mim e eles.
O tempo parecia desacelerar. Senti o tremor de seu corpo tenso, vi como os espinhos pareciam fluir uns sobre os outros como um líquido, pulsando com uma mana monstruosa…
Contudo, meus olhos foram atraídos para Arthur à distância.
Ele caiu no ar como se estivesse afundando na água, os olhos fechados, a expressão focada, pensativa, quase pacífica.
Seus olhos se abriram com um brilho dourado e sua lâmina se borrou em um corte amplo.
Um feixe brilhante de energia violeta surgiu do ar, cortando lateralmente e dividindo as figuras blindadas. Espinhos pretos explodiram, espalhando-se pelo chão à nossa frente e transformando o solo macio em terra morta.
Clarões violetas semelhantes apareceram por todo o campo de batalha e uma dúzia de outras formas em retirada se desfizeram. A lâmina inverteu a direção, cortando o ar na frente de Arthur, desta vez, vi a própria lâmina desaparecer, e mais algumas armaduras conjuradas desabaram ao serem atingidas simultaneamente por todo o céu.
Algumas, porém — muitas, na verdade — ainda estavam fugindo, voando sobre as montanhas e através dos pântanos baixos. E nenhuma das formas que Arthur abatera continha o corpo vivo e respirante de Perhata.
A expressão de Arthur ficou tensa de frustração pouco antes dele desaparecer de vista, caindo no chão a alguma distância no vale.
Respirando fundo, coloquei peso na perna esmagada, reforçando-a com mana, então me afastei de Tanner. — Vamos, vamos tirar todo mundo daqui.
POV SYLVIE LEYWIN
Apesar de tudo, senti uma pontada de alívio quando o peso de Arthur pressionou minhas costas, o pulso de éter liberado pelo uso do God Step ondulando contra minhas escamas. Eu me mantive firme ao lado de Charon, não permitindo que as Assombrações nos separassem. Windsom ainda estava grudado em mim como minha sombra, toda a sua energia gasta me protegendo dos ataques violentos das Assombrações.
Minha ligação com Arthur me disse que ele estava irritado, apesar de não poder ver seu rosto.
— Vá atrás dela.
— Qual delas? — perguntei, ainda sentindo as formações de ferro-sangue restantes escapando em diferentes direções.
Forçada a mergulhar para a direita, evitei um jato de mana preto-esverdeado e soltei um raio de mana pura de volta para o lançador.
Arthur não respondeu, mas não era necessário. Não havia como saber, e não havia razão para perseguir uma armadura vazia por meia Dicathen quando havia várias Assombrações bem na nossa frente, mesmo que isso significasse que ela escapasse.
Não ofereci ao meu vínculo nenhuma palavra de conselho ou conforto. Não era o momento nem o lugar para gestos tão fúteis. Até a batalha terminar, sabia que Arthur precisava daquela armadura de fúria devastadora em que se envolveu, por isso permaneci em silêncio. Até os pensamentos de Regis estavam quietos enquanto ele guardava Oludari Vritra abaixo da montanha.
Senti a intenção de Arthur antes dele agir. Seu peso deixou meu corpo e ele apareceu no ar a dez metros de distância de uma Assombração. Aether condensou-se em seu punho, formando uma arma. Várias outras apareceram ao seu redor, formando, em cada uma delas, uma representação física da fervente raiva apoplética mal contida sob a superfície de sua compostura. As espadas flutuantes atacaram simultaneamente, varrendo o ar para pontos ligeiramente diferentes.
Ao mesmo tempo, sua espada de éter primária, a que estava em sua mão, avançou. A Assombração previsivelmente se esquivou do punhado de espadas voadoras, colocando-o no lugar perfeito no momento em que outro avanço através dos caminhos etéreos levou Arthur para sua linha de recuo. Mesmo para uma Assombração, não houve tempo para reagir quando a lâmina desceu através de seu ombro, coração e núcleo antes de piscar meio segundo depois.
A gravidade mal tinha começado a puxar Arthur para a terra quando ele estava novamente nas minhas costas, sua fúria fria e inabalável pela morte calculada.
A chegada de Arthur ao campo de batalha finalmente quebrou a vontade das Assombrações restantes de continuar lutando e todas as seis se separaram, tentando fugir em direções diferentes.
— Peguem aquelas três! — Charon trovejou, inclinando-se bruscamente para a esquerda e iniciando a perseguição. — Windsom, fique com a patrulha!
Hesitei, sabendo que estávamos fazendo exatamente o que o inimigo queria de nós. Windsom também claramente queria discutir, mas Charon já estava se afastando e o foco de Arthur estava inteiramente em nossos alvos. Deixei sua fúria me guiar e girei, baixando a cabeça e as asas, voando em alta velocidade. Uma estava indo para o sul, as outras duas para sudeste, sobre as montanhas. Senti suas assinaturas de mana derretendo enquanto concentravam toda a sua energia em se protegerem de mim.
— Estou pronta — enviei, segurando o feitiço que vinha tecendo lentamente desde a nossa chegada.
— Agora — ordenou Arthur, continuei com a tentativa da nova arte do éter que estava tentando aprender.
O ar ondulava em uma supernova ao meu redor enquanto minha magia se espalhava pela atmosfera. Senti que tudo — exceto Arthur e eu — começou a desacelerar. Em instantes, as Assombrações em alta velocidade começaram a rastejar, parecendo três moscas presas em âmbar claro.
Arthur e eu caímos de repente e respirei fundo enquanto me lembrava de bater as asas. O feitiço tirou toda a minha concentração, tanto que até respirar, e até mesmo as batidas do meu coração, parecia difícil.
Arthur não se teletransportou novamente. Em vez disso, se levantou e conjurou sua arma. Estremeci com a intensidade de seu foco. Ele ajustou cuidadosamente sua postura, sua forma e o ângulo de sua lâmina.
Eu sabia que só conseguiria segurar o feitiço por alguns segundos no total. O éter já estava lutando comigo, o tempo não querendo ser preso dessa forma, mas não o apressei, não quebrei sua concentração. Seria o suficiente.
Seu foco era tão completo que não pude deixar de me envolver com ele. Éter canalizado para a runa divina God Step queimando em suas costas, os caminhos etéreos se iluminaram em nossa visão, pintando o céu com raios irregulares de ametista. Além das barreiras de mana que revestiam sua pele, passando por nuvens de vapor de mana venenosa e auras ardentes de fogo da alma, até os pontos entre a armadura e a pele… era ali que Arthur se concentrava.
Sua concentração cessou e a lâmina cortou da esquerda para a direita. Senti ela deslizando pelos caminhos etéreos, primeiro um, depois um segundo, então um terceiro, todos dentro do espaço do movimento quase instantâneo da lâmina. Mortal e caótico como um redemoinho. As lentas Assombrações brilharam em luz violeta.
Meu feitiço foi liberado e cambaleei para frente e para trás, lutando para nos manter no ar.
Três faixas de sangue brilhante se espalharam pelo horizonte à nossa frente.
Tradução: NERO_SL
Revisão: Crytteck
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