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Como um Herói Realista Reconstruiu o Reino – Vol. 02 – Cap. 09.1 – A Batalha Final

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Parece que, nos últimos anos, muitas dramatizações de época descreveram Souma Kazuya como um governante sábio e corajoso. O descrevem como um governante que foi para o campo de batalha, eliminando muitos oponentes poderosos em um único combate, tendo confundido os exércitos inimigos com a sua engenhosidade e conquistando a felicidade para o seu povo com as suas excelentes políticas.

Entretanto, os historiadores contestam essa avaliação dele.

Para começar, em toda a sua vida, Souma lutou apenas em guerras que poderiam ser contadas em uma mão. Ele teve pouquíssimas oportunidades para mostrar esse tipo de destreza militar. Quase todas as conquistas pelas quais é lembrado foram na verdade realizadas por aqueles que serviram sob o seu comando.

Quanto à engenhosidade que o permitiu brincar com os seus inimigos, não existem provas de que qualquer uma das ideias foi dele. Na época em que ele viveu, existiam muitas pessoas, entre elas o primeiro-ministro, Hakuya, que eram mestres da engenhosidade, então Souma podia ter implementado apenas os melhores planos sugeridos por essas pessoas.

Claro, ele adotou muitas políticas excelentes, mas a coisa de levar todo o seu povo à felicidade é questionável.

De vez em quando, surgiam indícios de que a posição de Souma o fazia sofrer. Se todas as suas políticas tivessem surtido os efeitos desejados, provavelmente não teria sofrido. Assim, as habilidades dele não deviam ter sido tão fenomenais quanto era demonstrado nas dramatizações. Esse era o consenso estabelecido pelos historiadores.

Porém…

Mesmo assim, poucos afirmam que Souma não foi um grande governante.

Outro ponto de consenso entre os historiadores é que “Souma era bom em reunir as pessoas e usá-las bem”. Ele não tinha grandes habilidades, mas era um gênio em como colocava as pessoas capazes onde eram necessárias e podia enviar o número certo de tropas para onde eram precisas.

O primeiro evento que espalhou o nome de Souma pelo continente, sua vitória na guerra contra o Principado da Amidônia, foi em grande parte um resultado desse dom. Ele tinha uma compreensão sólida do que era e do que não era capaz, e era capaz de delegar aos outros as coisas que não podia fazer sozinho.

Pode ser que seja esta a mais importante qualidade para um governante.

— São mais teimosos do que eu esperava…

Enquanto observava o desenrolar da batalha no acampamento principal do exército do Reino de Elfrieden, fiquei surpreso com a boa luta que as forças do Principado da Amidônia estavam travando.

Eram 55.000 soldados do reino bem animados contra 25.000 soldados exaustos do principado. O resultado devia ser óbvio para qualquer um, mas as forças do principado estavam resistindo bem. Não, talvez seja porque nossas forças não foram totalmente capazes de atacar.

Primeiro, os wyverns do reino e do principado começaram a brigar igual a cães nos céus. Por não terem sido pegos na emboscada no Vale Goldoa, a unidade wyvern do Principado da Amidônia era a unidade mais descansada do exército do principado.

Havia menos de 500 cavaleiros, mas se ficassem na defensiva, até mesmo a Cavalaria Wyvern Elfriedeniana, que ostentava o dobro de seus números, teria problemas para atacá-los. Se pudéssemos tomar a supremacia aérea, isso decidiria o resultado da batalha, mas parecia que isso levaria algum tempo para acontecer.

No final, a batalha foi deixada para ser decidida pelas forças terrestres.

O exército do reino estava adotando a formação asa de garça. No centro dela estava a Guarda Real liderada por Ludwin, mais um total de 20.000 tropas, incluindo 10.000 soldados que se reportavam diretamente a mim no Exército Proibido e 10.000 do Exército. Na ala esquerda, havia cerca de 15.000 tropas do Exército lideradas por Glaive (Halbert e Kaede também estavam nesta unidade). Por último, na ala direita havia uma força de cerca de 15.000 soldados liderados por Liscia, consistindo em tropas do Exército e auxiliares da aldeia dos elfos negros.

Eu queria que ela ficasse no acampamento principal, mas Liscia disse: “Esta é a batalha final. Deixe-me fazer o que eu puder” e me forçou a deixá-la fazer o que quisesse.

Em parte porque ela era atualmente a única pessoa que ainda conseguia manter as confusas forças do Exército unidas, aceitei, mesmo que hesitante.

Afinal, Liscia tinha sido um tipo de ídolo durante seu tempo com o Exército. Graças ao treinamento de Georg, também não havia problemas com a sua capacidade de comandar as tropas. Tomei a decisão imaginando que ela enfrentaria pouca resistência.

Eu, porém, ao menos enviei Aisha como sua guarda-costas. Afinal, ela era uma princesa, e eu não queria que agisse de forma muito imprudente.

De qualquer forma, como eu estava no acampamento principal, na retaguarda da força central comandada por Ludwin, a única pessoa que tinha para conversar era Carla, que estava sendo mantida por perto, como refém.

Mesmo sendo uma refém, suas mãos e pés não estavam presos com correntes. Ela estava usando uma coleira de escrava, então seria estrangulada assim que tentasse fugir ou machucar o seu mestre. Deixá-la assim era supostamente seguro. Me parecia que se ela pegasse uma espada de um dos guardas ou me apunhalasse com aquelas suas garras afiadas, poderia me matar com facilidade, mas… Acho que era assim que a coleira funcionava. Então, de novo, Carla não parecia ter qualquer intenção de me machucar.

Tentei falar com ela.

— Então, o que acha? Achei que eles debandariam com mais facilidade.

— Ninguém vai para a guerra pensando na derrota… — disse ela. — Farão de tudo para evitar a derrota.

— Sim, acho que vão mesmo.

Carla talvez tivesse ficado entediada por ficar só ao meu lado, já que respondeu com surpreendente facilidade. Como ex-comandante da Força Aérea, ela devia entender a situação melhor do que eu.

Estão sendo teimosos por causa do número inferior deles, hein. Isso pode ser um pouco problemático, pensei.

— Nossas alas esquerda e direita, ou seja, as unidades comandadas por Liscia e Glaive, não parecem estar se movendo tanto — falei. — Se fossem um pouco mais proativos em formar um cerco, não acha que poderiam eliminá-los?

— Se acha isso, por que não envia um mensageiro em um cavalo com essa ordem…? — perguntou Carla.

Com o tom que ela usou, era como se estivesse perguntando: “É isso que você acha?” Isso me fez parar para pensar um pouco. Porém, não consegui chegar a uma conclusão.

— Não sei… — respondi. — Meu conhecimento a respeito da guerra é exclusivamente teórico, então Liscia deve ser muito melhor comandando as tropas do que eu. Em vez de abrir a boca em um momento inoportuno, é melhor deixar a tomada de decisões para aqueles que estão em ação.

Carla riu um pouco.

— Ha ha ha. Essa é provavelmente uma boa ideia.

Essa parecia ser a resposta certa.

— Carla, sabe o motivo? — perguntei. — Se importa em me informar?

— É o número de tropas do inimigo — disse ela.

— O número de tropas?

Carla apontou para o campo de batalha.

— Só sei o que ouvi dizerem, mas aqueles são os 30.000 soldados que sitiaram Altomura, certo? Eles também sofreram uma emboscada enquanto se retiravam.

— Sim, isso mesmo.

— Não parece que o número deles diminuiu tanto, considerando tudo o que aconteceu.

— Hm? Agora que você mencionou isso…

Com uma força tão grande, era difícil dizer qualquer coisa de relance, mas pareciam ter cerca de metade do tamanho da nossa própria força, que tinha 55.000 tropas. Imaginei que deviam ter cerca de 25.000 soldados.

Era verdade que, considerando que foram emboscados pelos marinheiros de Juna no Vale Goldoa, não pareciam ter sofrido muitas perdas.

— A emboscada não resultou em nada? — perguntei.

— Não, pelo que vejo da batalha, existem vários níveis de moral nas diferentes unidades do exército do principado. Provavelmente substituíram as tropas que perderam na emboscada, pegando recrutas nas cidades ao longo da rota até aqui. É por isso que algumas parecem estar com moral baixo.

— Entendo…

Os países deste mundo costumavam ter exércitos permanentes.

Em um mundo com a existência de animais gigantes que, do ponto de vista de alguém da Terra, poderiam ser como monstros correndo soltos, era necessário ter tropas que poderiam ser mobilizadas a qualquer instante. Em Elfrieden, o Exército, a Marinha, a Força Aérea e as tropas que estavam sob o meu controle direto no Exército Proibido eram tropas permanentes. Claro, em tempos de necessidade, as pessoas comuns também poderiam ser recrutadas. No nosso caso, a maioria dos exércitos pessoais dos nobres, exceto dos três duques, era composta por soldados recrutados.

Depois da guerra, eu planejava criar um exército unificado que também iria incorporar as várias forças dos nobres, mas pretendia liberar o povo do serviço militar e autorizar que retornassem às suas cidades. No momento atual, aumentar a produtividade era uma preocupação mais urgente do que o declínio do poder militar.

Claro, o exército usado pelo principado para nos invadir também devia ser composto por uma combinação entre tropas permanentes e tropas recrutadas. Deviam ter recrutado todas as pessoas que puderam pelo caminho.

Então, depois da emboscada, essas pessoas recrutadas deviam ser aquelas que não puderam recrutar antes.

Podiam, por exemplo, ser idosos, deficientes ou mesmo aventureiros que por acaso estavam em seus domínios. (A guilda dos aventureiros oferecia um contrato que permitia os países a recrutar todos que estivessem em seu território em um momento de crise. Em troca, o país precisava pagar uma quantia fixa e mensal à guilda, então eu já havia rescindido esse contrato.)

Carla estava observando que não poderiam ter o moral elevado, caso fosse esse o caso.

— Se deixar pessoas assim em paz, acabarão fugindo por vontade própria — disse ela. — Por outro lado, se as cercasse, surgiria o risco de fazer com que se unissem como um só. É por isso que Liscia e Glaive estão esperando que rompam a formação e fujam.

— Entendo — falei. — Então acertei em deixar meus comandantes em campo tomarem a decisão.

Percebi que, em uma situação assim, em vez de fingir que sabia o que estava fazendo e proferir declarações superiores, era melhor confiar nas pessoas que sabiam o que estavam fazendo e deixar as coisas com elas. Afinal, eu tinha gente capaz por lá.

— Sou só uma figura representativa, então deveria ficar no acampamento principal, girando os meus polegares — falei.

— Acho que isso também pode ser um problema… — disse Carla. — Você é o rei, não é?

— O trabalho do rei é sempre antes e depois da guerra — falei. — Além disso, bem… Se for o caso, talvez possa oferecer a minha própria cabeça e implorar que poupem a vida das minhas tropas e dos comandantes.

Quando falei isso, Carla arregalou os olhos. Ela olhou para mim como se estivesse vendo algo completamente inacreditável.

Hein? Por que estava me olhando assim?

— Falei alguma coisa estranha? — perguntei.

— Você… Você não tem medo de morrer? — questionou Carla.

Do que ela estava falando?

— Claro que eu tenho medo de morrer. Não sou um suicida.

— Mesmo assim, você acabou de dizer que ofereceria a sua cabeça, caso necessário, não disse? — perguntou ela. — Você já aceitou isso?

— Hein? Ah… Acho que sim. Que estranho…

Carla estava certa. Agora que ela mencionou isso… era estranho.

Por que falei que ofereceria a minha cabeça, fazendo parecer que era completamente natural?

Eu sabia que isso era algo esperado de um rei. O poder estava concentrado em minhas mãos, como o representante do país, então eu tinha que assumir o mesmo nível de responsabilidade. Era isso que significava ser rei.

Mas por que parecia “natural” que eu fizesse isso?

Digo, sempre fui… meio covarde, não fui? Eu valorizava a minha vida, não valorizava? Assumi o trono e trabalhei muito nos assuntos internos para evitar que fosse entregue ao Império, não foi?

Quando foi que parei de considerar a minha vida querida…?

Carla olhou para mim, ansiosa.

— V-você está bem? Está se sentindo mal?

Fiquei em silêncio.

Mal… não é bem isso. Quebrado…

Havia algo quebrado na minha pessoa.

Sim. Isso fazia bastante sentido.

Só quando isso foi apontado que percebi que o meu atual estado mental era confuso.

Senti que estava tratando a vida de forma leviana. Tanto a minha quanto a dos outros.

Foi por isso que fui capaz de tratar a vida alheia como simples números. Estava subtraindo o número de vidas salvas do número de vidas perdidas e escolhendo a opção que resultava em um número positivo.

Como se fosse um sistema de computador que controlasse essas coisas.

Foi então que as palavras que eu uma vez disse para Liscia cruzaram a minha mente.

“Mesmo se eu não quiser fazer isso, eu preciso. Porque agora sou o rei.”

Ah… Entendi. Então é isso…

— Em algum momento, virei um rei… — murmurei.

— O que é isso tão de repente? Você foi rei o tempo todo.

Carla parecia não entender o que eu estava dizendo, mas agora começava a fazer sentido para mim.

— Eu só estava seguindo os eventos conforme eles aconteciam — falei. — Em algum momento… sem que eu percebesse, comecei a agir como um sistema de estado que chamamos de “rei”. Ao dizer a mim mesmo que isso faz parte da minha programação, consegui sempre escolher a “melhor” opção…

— Sistema? Programação? Ei, do que você está falando?! — disparou Carla.

Tudo o que pude fazer foi soltar uma risada autodepreciativa.

— Carla, eu posso ser uma “farsa”.

— Quê?!

— Afinal… Se não posso assumir o papel de rei, não posso enviar soldados para o campo de batalha — falei.

Fui um covarde. Não queria ser ferido ou morto. E também não queria ver os outros feridos ou mortos.

Para alguém como eu ir à guerra como rei, tive que abraçar completamente o meu papel como um sistema do estado.

Dizendo a mim mesmo que era isso que um rei fazia, fui capaz de suprimir a minha própria vontade e fazer o que era necessário. Se não… Senti como se tivesse sido esmagado pelo peso de todas as vidas que poderiam ser perdidas graças às minhas decisões. Quando vi o quão longe já tinha ido, só pude rir com desdém de mim mesmo.

— Cara… Não posso mais rir do rei anterior, hein — falei. — Se eu tivesse um substituto viável, desistiria agora mesmo.

— Qual o benefício em você me deixar escutar um de seus momentos de fraqueza, igual agora…? — perguntou ela, incrédula.

— Você entendeu errado — falei. — Acha que eu poderia deixar Liscia e os outros me ouvirem falar isso?

Por Liscia, que me disse que queria que eu fosse rei; por Aisha, que me servia como o seu rei; e por Juna, Hakuya, Poncho, Tomoe e todos os outros, nunca poderia deixar que me ouvissem dizer isso. Principalmente por Liscia, sendo a pessoa séria que era, que parecia se sentir responsável pelo fato de seu pai ter empurrado o trono para mim.

— Por você ter lutado contra mim, posso deixar que ouça — falei.

— Isso não me deixa nada feliz…

E então aconteceu. Aconteceu enquanto conversávamos. Percebi que houve uma mudança no campo de batalha.

Naquele campo de batalha, onde uma batalha campal estava sendo travada, o exército do principado de repente começou a cair.

Membros da força que tinham lutado arduamente para resistir aos ataques do exército numericamente superior do reino, até aquele momento, começaram a fugir. Os primeiros a bater em retirada foram aqueles que tinham sido pressionados às pressas desde a saída da força do Vale Goldoa e sua chegada às planícies.

O Principado da Amidônia mantinha o serviço militar como obrigatório para todos os homens, que eram forçados a se alistar assim que chegassem a certa idade, então eram treinados para o combate, mas eram pessoas que costumavam viver como civis. Se fossem, de repente, enviados para uma batalha desvantajosa, seu moral não seria bom.

Os soldados eventualmente começaram a fugir para o lado sul, onde o cerco ainda não estava fechado.

Os Amidonianos mataram os soldados fugitivos, tentando manter os demais lutando, mas havia cerca de 10.000 dessas tropas dentre as convocadas, então isso foi de pouca ajuda.

Porém, quanto mais deles tentavam fugir, mais as suas linhas ficavam desordenadas, e isso acabava atrapalhando a capacidade de que funcionassem como uma unidade. Elfrieden não deixou a chance de atacar passar.

— Hal, está na hora, sabe! — gritou Kaede.

— Eu estava esperando por isso! — gritou ele de volta. — Vamos pegar esses palhaços!

— Siiiiiiiim!

Na ala esquerda do exército do reino, Halbert avançou com as suas tropas para fechar o cerco ao inimigo. Nessa batalha, ele liderava algo entre dez e vinte homens do Exército e lutava como comandante de pelotão sob o comando de Kaede. Ele não montava a cavalo, girando suas duas alabardas e jogando seus inimigos confusos para longe. O general Amidoniano percebeu o que estava acontecendo e gritou do lombo de seu cavalo:

— Não deixe que eles nos cerquem! Usem fogo indireto para parar a ala esquerda do inimigo!

No momento seguinte, uma saraivada de flechas e magia voou do exército do principado em direção a Halbert e a sua unidade.

— Muralha de Terra! — gritou Kaede.

Isso convocou uma muralha de terra com quase cem metros de comprimento e três de altura, que por pouco salvou a unidade de Halbert.

Também devia ter surpreendido as forças do principado. Não devia haver mais do que cinco magos capazes de conjurar uma muralha de terra tão impressionante em um único instante pelo continente. Kaede podia ter uma personalidade tímida, mas era um gênio quando se tratava do seu raciocínio rápido e magia de terra.

Halbert pressionou as costas contra a muralha de terra para se proteger e deu uma ordem aos seus homens, os quais estavam fazendo a mesma coisa:

— Não podemos deixar a Kaede ficar com toda a glória! Precisamos devolver na mesma moeda!

— Sim!

Desta vez foi Halbert e seu pelotão que disparou flechas e magias sobre a muralha de terra, rumo ao exército do principado. Halbert jogou uma das lanças de fogo que mostrou na batalha perto de Randel, uma daquelas que usou contra os mercenários Zemeses.

As forças do principado estavam atacando a pé, por isso não puderam se preparar a tempo. Foram atingidos por flechas ou queimados, e a formação foi jogada em completo caos.

Vendo essa chance, Halbert deu um pulo.

— Agora é a nossa chance, enquanto eles estão desordenados! Atacar!

Enquanto isso, no caos desordenado das forças do principado, o general deles tentava restaurar a calma.

— Homens, não sejam pegos pela confusão! Se quebrarmos a formação, daremos ao inimigo exatamente o que ele quer!

Ele freneticamente tentou encorajar as suas tropas, mas o caos não deu sinais de que diminuiria. Ficando impaciente, o general cavalgou até um dos seus soldados em pânico e de repente cortou a cabeça do homem.

— Calem a boca! Se não se acalmarem, vou decapitá-los, assim como fiz com esse idiota! — berrou.

— Não, cale a boca você — disse uma voz.

— O quê?! — gritou o general.

Quando ele notou, já era tarde demais. Halbert estava diante dele com os braços cruzados.

Quando ele descruzou os braços, as lâminas das suas duas alabardas agiram como uma tesoura, pegando o torso do general e cortando-o em partes.

A parte superior do torso do agora ex-general caiu no chão.

A visão do sangue jorrando do cavalo ainda de pé e sem cabeça, e do cavaleiro sem torso na sela, roubou a vontade de lutar dos soldados em um instante.

Halbert sacudiu o sangue coagulado de suas duas alabardas em um instante, e então rugiu:

— O oficial do Exército Proibido, Halbert Magna, matou um general inimigo! Agora, qual de vocês quer ser o próximo a morrer?!

Com sangue escorrendo das alabardas em cada uma das suas mãos, ele devia parecer um monstro terrível.

Neste dia, Halbert foi enviado para competir com Souma e Kaede, que tinham a mesma idade que ele. Souma montou esse exército enorme, enquanto Kaede apoiava Ludwin com a sua engenhosidade estratégica.

Não vou deixar ficarem ainda mais à frente de mim! Era esse o sentimento que estava o movendo.

Quando viram ele com toda essa intensidade, os soldados Amidonianos reagiram como se tivessem se deparado com um ogro no meio da escuridão. Lutaram para recuar, pensando: Não temos como lutar contra essa coisa!

Um soldado do principado, que viu Halbert neste momento e sobreviveu à batalha por pouco, mais tarde contou a história da seguinte forma:

— Naquela época, eu tinha certeza de que morreria. Ele ainda era jovem, mas feroz, nem os guerreiros veteranos queriam enfrentá-lo. Quando, depois, descobri que era “Hal, o Ogro Vermelho”, isso me deu uma sensação estranha. Sinceramente… Fico surpreso por ter sobrevivido…

Seria justo dizer que para “Hal, o Ogro Vermelho”, que nos anos seguintes seria usado em histórias como um representante dos seguidores de Souma, a sua lenda começou nesta batalha.

Seu estilo de ficar na vanguarda, liderando seus subordinados no ataque, permaneceria inalterado mesmo quando recebesse o comando de um exército inteiro. Souma avisou várias vezes que essa não era a forma que um líder devia se comportar, mas Halbert dizia: “Assim é melhor para mim”, e nunca ouvia.

Na verdade, por ele sempre conseguir sobreviver e conquistar resultados, Souma não poderia dizer nada demais. Isso acabaria resultando em muitas preocupações para Kaede, mas essa é uma história para outra hora.

— Hahhhhhhhhh!

Enquanto isso, na ala direita do exército do reino, Liscia soltou um grito de guerra.

Atuando como comandante da ala direita, ela também montava a cavalo, chegando bem perto da linha de frente.

Cada vez que Liscia empurrava seu florete em direção do inimigo, lâminas de gelo eram formadas no ar e destroçavam os soldados Amidonianos. Sua forma ao fazer isso fazia que parecesse uma valquíria. Isso tinha até uma certa beleza.

Mas, por outro lado, Liscia parecia estar com pressa, era como se o sangue tivesse subido à sua cabeça. Ela dava a impressão de que tinha perdido a calma.

Claro, se continuasse se destacando tanto, o inimigo iria atacá-la.

— Não vacilem! Cerquem-na e arranquem a sua cabeça! — ordenou um comandante de unidade inimiga.

Soldados inimigos avançaram em direção a Liscia.

Por mais corajosa que ela fosse, estava em desvantagem numérica. Caso deixasse ser rodeada pelos lanceiros, não seria capaz de escapar, mesmo usando a mobilidade superior do cavalo.

As lanças do inimigo aproximaram-se de Liscia. Então:

— Princesa! Por que, vocêêêêêêêê! Afaste-se dela!

Chegando bem a tempo, Aisha derrubou os soldados inimigos que enxameavam ao redor dela com um golpe amplo de sua grande espada.

A elfa tinha sido designada para cuidar de Liscia, mas sua grande espada não foi feita para ser balançada de cima de um cavalo, e ela ficou para trás porque estava a pé.

Depois que Aisha acabou com os inimigos mais próximos com um golpe da sua grande espada e uma rajada de vento, ela correu para o lado de Liscia com lágrimas nos olhos.

— Princesa, por favor, não seja tão imprudenteeeeeee!

— Sinto muito… — disse Liscia. — Perdi a cabeça ali.

Ver os olhos suplicantes e lacrimejantes de Aisha fez Liscia retomar os sentidos. Ela levou a mão à cabeça da elfa, que estava na altura da sua coxa, já que estava à cavalo.

— Mas tenho que ser um pouco imprudente — disse Liscia. — Porque… Quero acabar logo com essa guerra.

— Princesa? — Aisha inclinou a cabeça para o lado, confusa com a expressão preocupada no rosto de Liscia.

Enquanto as forças do principado mostravam a sua teimosia, a batalha estava correndo a favor de Elfrieden. Os soldados do lado Amidoniano já estavam começando a fugir, então se as forças do reino os cercassem lentamente, não iria demorar muito para que saíssem vitoriosas. Não havia necessidade de apressar essa vitória.

Entretanto, Liscia se virou para Aisha com uma expressão de dor no rosto.

— Ei, Aisha. O que acha da forma como Souma tem estado ultimamente?

— Como assim? — perguntou Aisha.

— Ele parece… estar se esforçando demais, você não acha?

— Bem… sim, acho que você tem razão.

Mesmo aos olhos de Aisha, alguém que oferecia inabalável lealdade a Souma, a expressão dele andava assustadora. Não… ela não tinha medo dele, tinha medo por ele.

Havia algo de frágil nele.

Claro, considerando que estavam no meio de uma guerra, teria sido igualmente preocupante se seu governante ficasse com um sorriso estúpido na cara. Ainda assim, ela não pôde evitar de sentir que Souma estava se esforçando para agir como um rei. Aisha queria que ele sorrisse.

— Assim que esta guerra acabar… acha que Sua Majestade vai voltar a sorrir? — perguntou Aisha.

Liscia arregalou os olhos por um momento, então mostrou um enorme sorriso.

— Trataremos para que ele possa sorrir.

— Ah! Isso mesmo! — Aisha ergueu a cabeça, voltando a assumir uma postura de combate com a sua grande espada, depois ficou à frente de Liscia. — De qualquer forma, princesa, por favor, fique atrás. Se acontecesse algo com você, Sua Majestade nunca mais poderia sorrir.

— Certo… — disse Liscia. — Vou tentar ser mais prudente.

— Deixe a luta comigo! — exclamou Aisha.

— Não, isso eu não posso fazer. Aisha, você sabe que se acontecer algo com você, Souma nunca mais voltaria a sorrir, certo?

— Acha mesmo…? — perguntou Aisha.

— Eu sei.

— Você sabe?

As duas se entreolharam e sorriram. Então, um momento depois, exibiram rostos de guerreiras.

— Então, princesa, vamos cuidar das nossas vidas.

— Sim — concordou Liscia. — Vamos, juntas, acabar com essa guerra agonizante.

As duas dispararam pelo campo de batalha.

A batalha entre os exércitos de Elfrieden e da Amidônia chegaram a um ponto de virada.

No centro do exército do principado, que estava sendo aos poucos cercado, o Príncipe Soberano da Amidônia, Gaius VIII, mantinha uma expressão sombria no rosto.

Seu plano inicial era emboscar o exército do reino enquanto ele cercava Van e, depois, pegá-lo em um ataque de pinça com as tropas da guarnição, que estava em chamas. As forças do reino não sitiaram Van. Em vez disso, esperaram pela chegada da força principal do seu exército nas planícies.

O exército do principado estava exausto da marcha e da emboscada no Vale Goldoa, e então tiveram que ir para a batalha contra o bem descansado exército do reino, que tinha quase o dobro de soldados.

O exército do reino não estava visando a capital, Van, mas sim a força principal do exército do principado, ou, para ser mais específico, a cabeça de Gaius VIII. Esse era um fato que fazia Gaius VIII ranger os dentes.

As forças do principado tinham lutado bem no início, mas estavam exaustas e sua qualidade foi afetada pelos novos recrutas, de modo que não podiam esperar resistir por muito tempo. Os soldados já haviam começado e fugir e não existiam esperanças de reagrupar.

Nesse ponto, Gaius se decidiu e chamou Julius de volta do comando da vanguarda.

Quando voltou ao acampamento principal, seu filho parou diante dele cheio de raiva.

— Pai! Por que de repente me chamou de volta aqui?! Você sabe que se eu sair da vanguarda, Elfrieden pode passar por ela!

— Julius… — Gaius falou com uma atitude anormalmente calma. — Retire-se deste campo de batalha.

— O-O que você está dizendo? A guerra só começou… — gaguejou Julius.

— Já perdemos esta guerra — disse Gaius ao filho perplexo, em tom de auto-zombaria. — Os soldados do meu exército são fortes. Não são mais fracos se comparados aos do reino. Entretanto, nesse estado de exaustão após a nossa marcha, será impossível reverter a diferença de poder entre as nossas forças. Vou ganhar tempo, então você vai trilhar um caminho de sangue para fora daqui enquanto o cerco deles ainda está incompleto e fugir sozinho.

Gaius havia aceitado a derrota.

Quando percebeu esse fato, Julius sentiu suas pernas começando a ceder. Porém, se ele considerasse o que Gaius estava dizendo, não poderia se permitir desmaiar neste local.

— Não… Se alguém deve fazer isso, é você, Pai! — gritou Julius. — Sou eu quem vai ganhar tempo!

— Isso não é possível — disse Gaius.

— Por que não?!

— Porque Elfrieden pretende arrancar a minha cabeça.

Tendo escolhido este como o lugar no qual morreria, a mente de Gaius VIII estava agora mais clara do que nunca. Isso o deixava como o objetivo de Souma e Hakuya.

— Eu fico constantemente irritando Elfrieden — disse Gaius. — Muitos dos nobres do país deles estão em dívida conosco. Ao me derrubar, devem esperar acabar com essa ameaça.

Julius ficou em silêncio.

— Além do mais, sou o porta-bandeira da facção anti-reino do principado — continuou Gaius. — A razão pela qual podemos assumir uma posição linha-dura contra o reino é porque os linha-dura têm mantido os moderados sob controle. Mas, se eu desaparecer, os moderados do principado ganharão força.

A diferença de poder entre o Principado da Amidônia e o Reino de Elfrieden era clara. Fosse território, população, número de soldados ou prosperidade, perdiam em todos os aspectos.

Além disso, a Amidônia compartilhava fronteiras com o Estado Papal Ortodoxo Lunariano, uma teocracia ao norte que tinha seu próprio conjunto único de valores; a República de Turgis ao sul, com sua política expansionista para o norte; e o estado mercenário de Zem, o estado neutro que enviaria as suas tropas para qualquer lugar que pagasse o preço, ao oeste. Não havia como dizer quando aqueles que eram fracos de coração poderiam se acomodar a um desses outros estados em uma tentativa de autopreservação.

Era por isso que, para manter a Amidônia sendo a Amidônia, Gaius precisava manter o controle sobre essas coisas. Elfrieden estava agora tentando removê-lo.

Julius arregalou os olhos.

— Não… Quer dizer que Souma planejou tudo isso só para arrancar a sua cabeça, Pai?! Ele usou até mesmo a própria terra como isca?!

— Tome cuidado, Julius — disse Gaius. — Este novo rei não parece nada com Albert.

Gaius não estava mais subestimando Souma por causa da sua juventude.

Ele continuou:

— É por isso que Elfrieden nunca vai me deixar fugir. Se eu tentar recuar, me perseguirão até as profundezas do inferno. Afinal, o único objetivo deles é a minha vida.

Julius não disse nada.

— É por isso que ficarei aqui, para mostrar o orgulho da Amidônia — concluiu Gaius.

— Então vou ficar com você! — gritou Julius.

— Você não pode! Se também te perdermos, o que será do principado?!

— Temos Roroa — disse Julius.

— Hmph… Ela não é boa o suficiente. — Mesmo falando da própria filha, Gaius cuspiu palavras de desgosto. — É preciso ser uma cobra venenosa para liderar a Amidônia. Uma cobra venenosa que um dia afundará suas presas no reino e o matará. Roroa pode até ter o sangue de uma cobra astuta, mas ela não é venenosa.

Mesmo enquanto Julius tremia de medo diante da loucura que seu pai começava a exibir, ele perguntou:

— Pai, o que é esse “veneno” de que você está falando?

— O ardente desejo de vingança contra Elfrieden — retrucou Gaius. — Mesmo rodeado por estados poderosos, nosso Principado da Amidônia manteve a sua independência, desenvolveu suas terras improdutivas, suportou a fome, cavou minas em condições adversas e se preservou como um estado, tudo por causa do nosso desejo de vingança contra o reino. Nosso ódio pelo reino que roubou nossas terras férteis nos levou a nos tornarmos cada vez mais fortes, cada vez mais prósperos. Roroa, infelizmente, pode até ter um dom para as finanças, mas não tem o ímpeto para a vingança… O único que herdou ao menos um pouco do meu veneno, Julius, é você.

Com essas palavras, Gaius se levantou da cadeira e colocou as mãos nos ombros de Julius.

— É por isso que você precisa sobreviver. Você é o único que pode continuar com o meu desejo por vingança e manter a Amidônia da forma como ela deveria ser.

— Pai… — Julius ficou confuso.

Aquele sangue venenoso corria por suas veias? Claro, Julius via o reino como seu inimigo jurado. No entanto, ele poderia queimar com a mesma paixão que viu em Gaius?

Enquanto Julius continuava perplexo, Gaius disse:

— Nesse ponto, não podemos nos preocupar com a possibilidade de sermos transformados em um estado fantoche. Você deve buscar a ajuda do Império. Se fizer isso, deve ao menos evitar que o reino anexe a Amidônia.

— Mas… Como você estava dizendo antes, o Império nos perdoará por irmos contra a Declaração da Humanidade? — perguntou Julius.

— Jogue toda a culpa em mim — disse Gaius. — O diabo vingativo da Amidônia recusou-se a dar ouvidos até mesmo às advertências de seu próprio filho e conspirou para invadir o reino, mesmo contra a vontade do Império. Isso é tudo que há para se fazer.

Julius engoliu em seco. Gaius não pretendia apenas morrer, pretendia levar consigo toda a má reputação por suas ações. Até Julius, que era conhecido por sua frieza e compostura, sentiu seu coração movido por isso. Embora, ao mesmo tempo, houvesse uma raiva em relação ao reino em seus olhos.

Quando viu aqueles olhos, Gaius balançou a cabeça, satisfeito, e empurrou seu filho para longe.

— Vá, Julius. Você nunca deve permitir que a alma da Amidônia se esvaia.

— Me perdoe… — Julius bateu continência, deu meia-volta e partiu.

Mesmo depois de olhar para trás até ele sumir de vista, Gaius continuou parado por algum tempo. Ele respirou fundo e a sua expressão mudou.

Ele não sentia mais pressa ou indecisão. Puxou a espada de seu quadril com a expressão severa de um guerreiro.

— Agora, tudo o que resta é cumprir o meu dever de guerreiro e mostrar a eles o espírito da Amidônia.

 


 

Tradução: Taipan

 

Revisão: Milady

 


 

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