Já que Lucien de alguma forma veio parar neste mundo completamente diferente, ele não poderia ficar tão surpreso ou assustado ao descobrir que realmente tinha uma biblioteca inteira em sua mente. O que o confundia mais era o fato de que a maioria dos livros estava trancado.
Ele tentou manter a calma, e visualizar os livros como se fossem coisas sólidas, de verdade. Ele foi abrindo eles um por um para entender por que uns podiam ser abertos e outros não.
—História… sem problema… Economia… ok. Artes… liberado… Matemática, física, química e biologia… alguns deles estão bloqueados. Será que é porque eu estou em um mundo diferente, e assim não consigo ler esses livros? Porém, o conhecimento que eu adquiri na minha universidade não está bloqueado.
A maioria dos livros desbloqueados era do ensino médio, que representavam apenas uma pequena parcela do referencial teórico da biblioteca geral da universidade. Ainda tinha muitos outros livros trancados lá.
Lucien ainda não tinha muita vitalidade para passar por todas as categorias, e logo ele ficou cansado demais para continuar concentrado naquilo.
Ele se arrastou de volta para a cama para conseguir uma boa noite de sono, pois tinha que enfrentar o seu segundo dia neste mundo com um pouco mais de energia. Só sobrou um pedaço de pão. A sobrevivência era sempre prioritária, e Lucien também sabia disso.
Quando ele estava quase pegando no sono, um guincho agudo de um rato seguido de ruídos baixos de madeira sendo roída o acordaram.
Ratos!
Na primeira vez, ele ignorou, se virando na cama e quase caindo no sono novamente. Mas o barulho foi ficando cada vez mais alto e perturbador, como se alguém estivesse esfregando algo em uma rocha.
Lucien não conseguia mais dormir. Ele tentou cobrir seus ouvidos com o cobertor, mas a tentativa foi em vão; o barulho tinha um alto poder de penetração, e parecia estar vindo de todas as direções.
— Se f#@%$! — Se sentindo frustrado, Lucien xingou em voz alta. Ele estava quase enlouquecendo. A comida parecia madeira, o tecido das roupas era tão duro que irritava sua pele, o cobertor estava cheio de buracos. Agora nem mesmo uma boa noite de sono ele conseguiria!
*Squeak* — Ele ouviu os guinchos e os sons que pareciam milhares de ratos arranhando uma parede.
Lucien rangeu os dentes, tomado pelo ódio. Ele decidiu matar um ou dois ratos para espantar o resto deles. Levantando, ele tentou ouvir atentamente para achar onde estavam.
Eu tenho que me livrar dessa vida… E logo…
*Snirf Snirf* Agora havia no meio dos barulhos o som de alguém chorando.
Lucien tentou se concentrar, mas descobriu que havia apenas um lamurio medonho vindo de algum lugar nos arredores.
Alguém estava chorando… no meio da noite. O coração de Lucien batia acelerado, enquanto seu cérebro travou. Todos os pelos do seu corpo se eriçaram. Um vento gelado soprou por debaixo da porta rudimentar. Por puro reflexo Lucien agarrou o último pão-tábua para se defender.
A voz lamuriante soava como uma canção miserável. Lucien estava com ainda mais medo agora. É um mundo de magia e poder divino. Provavelmente existem fantasmas e espíritos também!
Respirando fundo, Lucien se esforçou para manter a calma e se moveu em direção à porta. Alguém estava chorando em luto. A noite estava tão quieta. Era como se todos os seus vizinhos estivessem no quinquagésimo primeiro sono.
Está vindo do… lado direito! Quanto mais perto Lucien chegava da porta, com mais clareza ele conseguia ouvir aquela voz, Espera um pouco… A bruxa! A bruxa morava pra lá!
Ele estava atordoado. Mas a casa dela tinha sido completamente queimada pela igreja. Talvez… eles deixaram passar alguma coisa, como uma câmara secreta. Ela poderia ter guardado seus experimentos maléficos lá.
A mente de Lucien viajou um pouco. Uma câmara secreta… como em muitos romances que ele tinha lido, ele provavelmente encontraria o tesouro da bruxa ou mesmo instruções sobre magia.
O choro agudo o arrastou de volta à realidade. Afe… cai na real. Algo deve estar de guarda lá. Como é que posso lutar contra um fantasma usando um pedaço de pão? Provavelmente eu morreria e seria possuído por um fantasma do mal!
Ele estava mais cuidadoso agora. Lucien ficou feliz que sua mente não se deixou controlar pela ganância, ao menos não agora. Mas ele também não queria ficar ali olhando o tempo passar. Quem podia ter certeza que o fantasma não viria atrás dele?
A mente de Lucien começou a se ocupar com as possibilidades. Naquele momento ele reuniu toda a força que ainda tinha e colocou cuidadosamente a mão na maçaneta da porta. O pão em sua mão já estava encharcado de suor. Ele abriu a porta lentamente. Estava muito escuro lá fora e ele conseguia ouvir o som sibilante do vento frio.
Não havia nada aterrorizante lá, e depois que ele deixou seu barraco a voz choramingante diminuiu um pouco. Ele se sentiu um pouco aliviado e respirou fundo, em seguida, começou a gritar o mais alto que podia:
— Fantasma!!! Tem um fantasma aqui!
Foi tão alto que até o próprio Lucien ficou surpreso. Em resposta veio uma série de latidos dos cães nos arredores, e Lucien saiu correndo loucamente em direção à catedral. Esses caras eram profissionais neste tipo de coisa!
Como o vizinho da finada bruxa, ele ainda podia estar sob a vigilância da igreja, além de suas ações trazerem mais um benefício: Lucien pedir ajuda por conta própria faria ele a ganhar um pouco de sua confiança por parte da igreja, reduzindo a suspeita.
Lucien gritou bem alto para acordar os outros vizinhos para que, se eles quisessem roubar o tesouro e jogar a culpa nele, ou até o matar por causa disso, não seriam capazes de fazer isso na frente da população. Ele tentou de todas as maneiras pensar em meios para salvar a sua vida nesse curto espaço de tempo.
Logo ele viu a catedral à sua frente, com luz de velas saindo para fora das janelas.
Dois guardas armados vigiavam o portão da frente. Ao ver Lucien vindo correndo em pânico na sua direção, um dos guardas sacou metade de sua espada, demonstrando que poderia usá-la a qualquer momento.
— O que você quer? — O outro guarda perguntou enquanto estendia a mão para parar Lucien.
Lucien respondeu com a voz trêmula.
— Fantasma. Tem um fantasma lá! Na casa da bruxa!
O guarda ficou agitado depois de ouvir isso. Como um guarda novato, ele não saberia dizer se Lucien estava dizendo a verdade ou não. Então ele pediu ao seu parceiro para ficar de olho no menino e voltou para a catedral para informar o pastor de plantão. O ruído de sua cota de malha foi sumindo à medida que ele chegava nos fundos da Igreja.
Pouco tempo depois, um pastor loiro jovem, vestindo um manto branco, saiu pela porta, acompanhado do guarda. O pastor tinha um rosto fino, e andava de um jeito elegante.
— Eu sou o Pastor Benjamin. Você pode me contar o que aconteceu?
Os dois guardas estavam de pé em silêncio, com medo que qualquer ruído pudesse perturbar o Pastor Benjamin.
Lucien, tentando ser o mais educado e sincero possível, descreveu em detalhes como ele ouviu a voz e os lamentos do fantasma, e como ele saiu correndo da sua casa para vir aqui pedir ajuda.
Depois de ouvir tudo, Benjamin sorriu gentilmente para Lucien.
— Você agiu correto, meu filho. Sua coragem mostra a sua devoção a Deus. — Em seguida, ele ordenou aos guardas — Thomson, vá chamar Gary, Paul e os outros dois cavaleiros aqui. A bruxa era apenas uma aprendiz. Assim, não há necessidade de relatar isso para o bispo.
— Sim, senhor, — Thomson respondeu com reverência. Embora Benjamin fosse apenas um Pastor de nível elementar, ele era capaz de lidar com as armadilhas ou feitiços deixados por uma bruxa aprendiz. Havia uma enorme diferença entre um pastor já formado e um aprendiz.
Benjamin pediu o nome de Lucien, mas eles não conversaram muito porque os outros quatro cavaleiros chegaram. Eles também estavam usando cotas de malha, mas pareciam muito mais imponentes em comparação aos outros dois guardas.
Uma multidão já havia se reunido a alguma distância da casa queimada. As luzes das velas cintilavam como estrelas espalhadas acompanhando a lua no céu. Lucien descobriu que a lua neste mundo era prateada. As pessoas pararam de sussurrar quando Benjamin apareceu. A multidão de repente se sentiu aliviada e começou a chegar mais perto da cabine da bruxa, voltando a tagarelar.
— Eu não ouço nada.
— Não importa se é verdade ou não, não faz mal realizar uma purificação aqui.
Mas Lucien ainda conseguia ouvir a voz macabra. Ele pensou, Por que essas pessoas não conseguem ouvir?
Benjamin, como se soubesse o que ele estava pensando, respondeu a Lucien calmamente:
— Sim. Há fantasmas neste local.
Obviamente ele também ouvia, bem como os quatro guardas, que concordaram com a cabeça.
Tradução: Vermillion
Revisão: Barão
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