Não desejando ir para casa, voltei apenas para cumprimentar a Senhorita Bobtail depois da escola, depois fui direto para a casa da Senhorita Messalina com minha mochila ainda comigo. Caminhamos ao longo de nosso habitual caminho às margens em direção ao prédio quadrado de cor creme, mas não cantamos como de costume.
Subimos as escadas e nos dirigimos ao final do segundo andar, paramos diante da porta e apertamos a campainha. Eu ouvi o som da campainha de dentro, mas não havia outros sons. Não importava quantas vezes eu apertasse o botão, a Senhorita Messalina não apareceu. Aparentemente, ela saiu hoje. Não se pode fazer nada a respeito. Afinal, os adultos eram ocupados.
Voltamos parte do caminho ao longo da rota para chegar em casa antes de seguir em direção à colina usual. Desta vez, na subida do parque onde frequentemente víamos o pai de Kiriyuu, optei por virar à direita em direção à casa da Vovó. Eu tinha ido ver a Minami ontem, então decidi que deveria ver a Vovó primeiro hoje. Subi a colina ao lado de minha amiga de pelo brilhante, enxugando o suor da minha testa. Se eu pudesse ver um rosto amigável e conversar com eles, talvez meu coração ficasse um pouco mais leve. No entanto, a casa da Vovó também não trouxe alegria ao meu coração. Não importa quantas vezes eu batesse na grande porta de madeira, nunca ouvi nenhuma voz em resposta.
Suspirei e olhei para minha amiguinha.
— Todos os adultos me abandonaram. — disse.
— Miau.
E então eu não tive outra opção senão visitar Minami, a adulta com a idade mais próxima da minha.
Descemos a colina e, desta vez, subimos a escada da esquerda. Minha amiguinha de pelo preto estava tão animada como sempre, saltando com leveza. No entanto, conforme os minutos passavam, meu próprio corpo parecia cada vez mais e mais pesado, como se estivesse sendo preenchida com bolas de chumbo.
Quando abrimos o portão de ferro e subimos o resto da escada, chegamos à clareira no topo. Lá estava a caixa grande e gelada como sempre, como se tivesse simplesmente sido jogada no meio do campo.
Quando entrei na caixa e subi as escadas, Minami estava esperando por mim. Sentei-me ao lado dela, sem dizer nada. A Senhorita Bobtail assumiu sua posição habitual no colo da Minami. Foi quando percebi que Minami parecia diferente do normal. Embora tenha sido um pouco rude da minha parte, tirei a franja de seu rosto. Atrás dela, seus olhos estavam gentilmente fechados.
— Minami? — falei.
Ela os abriu devagar, tão delicadamente quanto abrir uma caixa de bolo. Ela encontrou meu olhar com apenas um olho.
— Yo.
— Saudações. — respondi. — Este parece ser um lugar muito bom para uma soneca.
— Tive aquele mesmo sonho de novo…
— Que sonho foi?
— Um sonho sobre quando eu era criança. Acontece direto. A escola foi divertida hoje?
— Não, de jeito nenhum.
— Imaginei. Você não parece que se divertiu.
Embora eu não achasse que estava olhando para mim, ela deve ter olhado secretamente por trás de sua longa franja. Não queria discutir como estava me sentindo, então decidi mudar de assunto. Achei que se falássemos sobre algo de que gostasse, meu rosto se iluminaria o suficiente para que ela não soubesse. Assim como as cicatrizes nos pulsos da Minami pareciam estar desaparecendo, eu tinha certeza que aquelas bolas de chumbo iriam desaparecer.
— Estive pensando. — disse.
— Sobre por que o ensino fundamental não é divertido? Você não pode se divertir o dia todo.
— Isso é verdade, mas não é isso. Eu estava pensando… e se você mostrasse sua história para um daqueles lugares que publicam livros?
Em um movimento raro, ela olhou diretamente para mim com um olhar assustado.
— O que você está dizendo de repente?
— Percebi que muitas pessoas não conseguem ler a sua história porque ela está apenas anotada no seu caderno especial, que significa que ninguém pode ler sem vir aqui. Então, você deve transformá-la em um livro. Assim sua história estará na biblioteca e eu poderei mostrá-la para a Senhorita Messalina e para a Vovó.
— Quem é esta “Messalina”?
— Minha amiga.
— Você tem alguns amigos estranhos.
— Ela não é estranha. É uma pessoa maravilhosa. Ela trabalha como uma senhora em um tribunal noturno. Não é maravilhoso?
A boca da Minami torceu-se estranhamente.
— Você sempre sai com esquisitos? — ela perguntou.
— Provavelmente. — respondi, imitando-a, imitando-me, imitando-a.
— Você também tem um trabalho maravilhoso, Minami. Se as pessoas nas empresas que fazem livros lerem sua história, tenho certeza que ficarão maravilhadas. Então você poderia escrever histórias todos os dias. Poderia criar outro mundo no coração das pessoas em todo o mundo, assim como Mark Twain ou Saint-Exupéry.
— Fácil para uma pirralha como você dizer.
— E você também pode escrever livros de casa, então pode ter uma família e um filho, e pode brincar com eles, e fazer viagens com eles, e ir para seus dias de observação de aula, e eles nunca estariam sozinhos.
De repente, cada fragmento do meu coração se derramou. Ela deixou tudo de lado com um suspiro gentil.
— Não é assim tão fácil, pirralha.
— Sim, é muito difícil. Escrever histórias maravilhosas, é claro. É por isso que quero que mais pessoas saibam sobre você e as coisas maravilhosas que escreve.
Ela suspirou ainda mais profundo do que antes.
— Escute — disse ela, em um tom que poderia ser entendido como raiva ou tristeza. — As histórias que escrevo não são tão incríveis. Eu apenas gosto de colocar palavras na página. Existem pessoas neste mundo que são muito mais talentosas do que eu. Você vai perceber isso logo. As coisas que escrevo não são tão interessantes. — Ela falou como se tivesse acabado de engolir algo amargo. — Eu… nunca poderia ser uma autora. — ela disse.
Eu entendi o significado de suas palavras da maneira mais infantil. Inclinei a cabeça.
— O que você está dizendo não faz sentido.
— E o que tem isso?
— Você já é uma autora, não é?
Agora foi a vez da Minami inclinar a cabeça, mas não consegui descobrir por quê.
— Os autores são chamados assim porque criam um novo mundo no coração das pessoas, não é? O que significa que, embora eu ainda não seja uma autora, você já é. Você criou um novo mundo maravilhoso em meu coração.
Claro, até uma criança como eu sabia que as pessoas trabalhavam para ganhar dinheiro e que as pessoas chamadas de autoras recebem dinheiro com a venda de livros. Porém, na verdade, não me ocorreu que “autor” fosse o nome de uma profissão. A ideia de que existia uma ligação entre escrever histórias e vender livros foi além da minha imaginação.
Na minha opinião, os autores não eram pessoas que vendiam livros, mas pessoas maravilhosas que criam mundos do coração. Para mim, o nome da Minami agora estava conectado a eles. Portanto, o que ela disse me deixou perplexa.
Minami parecia entender isso também. Ela inspirou e expirou em silêncio, então sorriu apenas com a boca.
— É mesmo?
— Sim, é. É por isso que precisamos transformar sua história em um livro, para que todos possam lê-la.
Ela não respondeu. Em vez disso, simplesmente olhou para frente, sorrindo. Fiquei muito feliz em saber que ela poderia fazer uso da minha ideia e formei a mesma expressão que ela, olhando para o céu enquanto ele se desdobrava.
No entanto, esse sentimento de alegria não durou muito.
— O que é felicidade? — perguntou Minami, bem quando eu pensei que o céu acima poderia simplesmente me engolir. — Você já tem uma resposta? Sobre o que é felicidade?
Meus olhos caíram para o chão de concreto, de repente forçada a lembrar a coisa que eu estava tentando esquecer.
— Está tudo bem, acabou.
— Então você encontrou uma resposta?
— Não. Mas agora acabou.
— Que diabos isso significa? Droga, eu até tinha uma resposta para você.
Fiquei surpresa ao ouvir isso. Embora tivesse tentado dizer que não me importava mais, não pude deixar de me interessar.
— O quê? Diga-me!
— Mas você disse que estava acabado agora.
— Sim, está, mas ainda quero saber sua resposta!
Ela olhou significativamente através de sua franja nos meus olhos, depois para longe, na direção do céu. Falou suas palavras sinceras como se simplesmente as largasse naquele telhado.
— Ter alguém reconhecendo você. Para dizer que não há problema em você estar aqui. — ela disse.
Inclinei a cabeça.
— Aqui? Quer dizer no telhado? Você conseguiu permissão do proprietário do edifício?
— Provavelmente. — ela disse, imitando minha imitação dela me imitando quando eu a imitei.
Eu ainda não entendi o significado de sua resposta. Eu só teria que procurar minha própria resposta. Quando contei a ela sobre o novo livro que comecei a ler, o céu ficou vermelho e o vento, mais frio, e antes que percebesse, ouvi o som distante de um sino tocando.
— Ei, hora de ir para casa, pirralha. — ela disse, mas eu não me levantei, nem chamei minha amiga de quatro patas como sempre fazia.
— Você não tem que ir para casa? — ela perguntou.
— Não quero ir para casa.
— Olha, não preocupe seus pais.
— Não me importo.
Minami deu uma risadinha.
— Eles estão bravos com você?
— Eles não estão bravos. Tivemos uma briga.
Ela olhou para mim, ainda sorrindo.
Que rude, pensei fugazmente, não havia nada de engraçado nisso.
— Escuta aqui pirralha. Quando você chegar em casa, sua mãe estará fazendo o jantar para você, como sempre. Um jantar delicioso, como sempre. E quando você estiver comendo, você dirá apenas uma coisa: “Desculpe por ontem”.
— Não quero.
— Você é teimosa, hein?
— Mas era ela quem estava errada.
— Não importa qual foi o motivo da briga.
O jeito que ela estava falando me irritou.
— Mas é realmente algo importante! Mamãe e papai estão sempre, sempre quebrando promessas comigo, dizendo que é por causa do trabalho.
— O trabalho é muito mais importante do que você pensa.
— Eu sei disso. É muito importante. Mais importante do que seus próprios filhos.
— Não é isso.
— Então por que eles sempre decidem que o trabalho é mais importante do que suas promessas comigo? Foi a mesma coisa dessa vez. Ela disse que eles não podem vir ao meu dia de observação porque têm que fazer uma viagem de negócios.
— O q…?!
Quando Minami estava prestes a dizer algo, um vento forte soprou. A brisa repentina me forçou a fechar os olhos. Quando o vento decidiu que estava acabando de brincar com meus longos cabelos, eu os abri lentamente de novo para olhar para ela.
Foram apenas alguns segundos. O vento tinha soprado apenas por um instante. Eu não tinha ideia do que poderia ter acontecido naquele escasso tempo.
— Minami…?
Ela parecia uma planta de mimosa. Eu tinha certeza que encolheria se eu a tocasse. O sorriso que estava usando tinha desaparecido completamente de seu rosto. Fiquei surpresa com esta transformação repentina.
— Qual é… o problema? — perguntei a ela claramente.
Mas não obtive resposta. Ela apenas balançou a cabeça para frente e para trás, baixinho. Talvez quisesse dizer “Não é nada”, mas até uma criança poderia dizer que havia algo.
— Ei, Minami?
— Ei, Nanoka.
Sua voz estava trêmula e disse meu nome com aquela voz trêmula. Foi a primeira vez que ela me chamou de qualquer coisa além de “pirralha”. Tive uma sensação estranha. Eu não sabia porque ela estava tremendo, nem porque disse meu nome.
— O que aconteceu?
— Nanoka… me prometa uma coisa.
Ela ignorou minha pergunta. Em vez disso, me encarou de frente, segurando-me pelos ombros. Vendo-a de frente, seus olhos eram de uma cor que eu nunca tinha visto antes.
— P-Prometer? — repeti.
— Uma promessa. Ou, um pedido meu, de qualquer maneira. Escute.
— O que está acontecendo, Minami?
— Apenas ouça. É só uma coisa. Quando você for para casa, terá que se reconciliar com seus pais.
Não consegui entender o significado deste pedido. Balancei a cabeça.
— Escuta aqui — continuou ela. — Eu entendo como você se sente. Tenho certeza que está ferida, solitária. Conhecendo você, tenho certeza de que disse algo terrível. Eu sei que quer se manter firme, e não recuar. Você ainda tem que se desculpar hoje. Diga a eles: “Sinto muito”.
— E-Eu não quero. Não foi-
— Você vai se arrepender para sempre se não fizer isso!
Sua voz me cortou como o vento, e agora eu estava tremendo. Eu estremeci, olhei para o rosto da Minami e estremeci mais uma vez. Agora, ela estava brava. Por algum motivo, tive a sensação de que sua raiva não era dirigida apenas a mim.
Eu estava completamente perdida. Ignorando minha angústia, ela continuou falando, dizendo mais coisas que eu não entendia:
— Eu… me arrependo. Sempre me arrependi. Por que não me desculpei naquela época? Agora não podemos nem mesmo ter uma briga de novo. Eles nunca poderão ficar com raiva de mim novamente. Nós nunca poderemos… jantar juntos… de novo.
— Minami… o que você está dizendo?
— Eu nunca poderei me desculpar com eles. É por isso que eu te imploro.
Uma lágrima escorreu pela bochecha de Minami. Pelo que eu sabia, os adultos nunca choravam simplesmente para assustar as crianças. Talvez ela tenha percebido que estava chorando, pois tentou disfarçar, enxugando os olhos furiosamente com a manga.
— Escute aqui — ela disse. — A vida é uma história que você mesmo escreve.
Embora tenha imitado minhas palavras habituais, não entendi de imediato. Inclinei minha cabeça, perguntando o que os outros geralmente me perguntavam.
— O que quer dizer?
— Com revisões e correções, você pode reescrever um final feliz com suas próprias mãos. Ouça, não estou dizendo que você nunca deveria ter brigas. Só estou dizendo o que eu gostaria de saber, naquela época, que se reconciliar faz parte de uma briga tanto quanto a própria briga. Mas já que você é tão inteligente, tenho certeza de que entenderá. Sua mãe ficou tão triste quanto você quando descobriu que não poderia comparecer ao seu dia de observação. Ela ficou igualmente desapontada ao saber que não poderia ficar com você. É por isso que trabalhou tanto para fazer todas as suas comidas favoritas, para ter certeza de que poderia jantar com você. E tenho certeza de que você pode entender porque seu pai sempre se certifica de comprar coisas que você realmente deseja no seu aniversário.
Eu pensei no que ela disse. Sobre minha mãe, que voltava para casa apenas para jantar comigo, embora ainda não tivesse terminado o trabalho. Meu pai, que viajou longe só para comprar o bichinho de pelúcia que eu tanto queria, já que nenhuma das lojas próximas tinha. Ouvi uma despedida calorosa nas minhas costas quando saí esta manhã, embora ainda estivesse com raiva demais para dizer uma palavra ou comer qualquer parte do café da manhã que foi feito para mim.
Eu me lembrei.
— Não quero que você perca a chance de vê-los novamente sem ter feito as pazes, como eu fiz. — ela disse.
Com essas palavras, finalmente entendi. Eu sabia porque ela estava chorando.
— Então me prometa. Tudo bem se você não puder fazer isso hoje. Pode ser amanhã. Mas tem que fazer as pazes com eles. Você não pode voltar no tempo.
Ela afastou a franja e me olhou diretamente nos olhos. Foi a primeira vez que vi seu rosto inteiro. Era tão claro quanto o da Senhorita Messalina e tão gentil quanto o da Vovó. Era bonito.
Eu não era o tipo de criança que desprezava um pedido de um amigo. No entanto, não era tão estúpida a ponto de banir todos os pensamentos da noite anterior tão facilmente. Então pensei. Pensei muito e muito. Girei as engrenagens do meu cérebro minúsculo tão forte quanto pude.
O que era certo? O que era inteligente? O que era gentil?
E então, depois de pensar bem, olhei para o rosto da Minami e balancei a cabeça.
— Muito bem. Prometo.
A última lágrima caiu do canto do olho dela.
— Obrigada.
— Mas você também tem que me prometer uma coisa. — disse.
Agora foi a vez de Minami parecer curiosa.
— Você quer que eu lance um livro? — ela perguntou.
— Sim, isso também. Mas tem outra coisa. Eu quero que você me prometa. Você entende o que é felicidade, não é? Mas também me disse que não estava feliz. Não suporto que meus amigos não sejam felizes. Então, por favor. Reescreva sua história também.
Ao vê-la chorar, lembrei-me do lenço que me deu e de como rezei por sua felicidade. Que meus amigos sempre teriam um sorriso no rosto.
Minami ficou pasma com o meu pedido. No entanto, sorriu e acenou com a cabeça.
— Prometo. Sim, é uma promessa.
Colocamos nossos dedinhos juntos e os cruzamos para fazer uma promessa de mindinho, minha amiga de olhos dourados cuidando de nós. Tenho certeza que a Senhorita Bobtail não tinha ideia do que estava acontecendo. Honestamente, eu ainda não tinha ideia do porquê Minami estava tão preocupada com minha mãe. No entanto, eu sabia porque precisava fazer as pazes com ela.
— Vejo você mais tarde. — disse Minami quando minha amiga e eu partimos do telhado.
Normalmente, ela apenas acenava para nós, mas hoje nos viu sair. Fiquei tão feliz que sorri de volta para ela. Hoje, Minami e eu nos tornamos melhores amigas do que nunca. Fiquei emocionada.
Corri para casa mais rápido do que o normal. Eu poderia dizer pelo carro azul estacionado em frente ao prédio que minha mãe já havia chegado. Despedi-me da minha amiguinha e respirei fundo. Então, peguei o elevador até o décimo andar onde morávamos, caminhei pelo corredor e fiquei diante de nossa porta. Respirei de novo, ruidosamente. Eu tinha que abrir meu coração. Tristeza, solidão, dor e todos aqueles outros caras maus — eu tinha que empurrá-los até o limite. Então, disse a mim mesma, poderia me encher de bons sentimentos. Repetidamente, pensei no rosto da Minami.
Assim que fiquei pronta, respirei várias vezes mais e parei com os pulmões ainda cheios de ar. Só assim, destranquei a porta, girei a maçaneta e deixei minha voz soar alto no apartamento, soprando todo o ar para fora do meu peito.
— Estou em casa…!
Era o intervalo da tarde, depois do almoço. A sala de aula normalmente estava cheia com as vozes turbulentas daqueles meninos idiotas, mas hoje, as vozes dos adultos soavam como o riso de passarinhos.
Eu já sabia que era dia de observação de aula, um evento especial, mas, quando cheguei, o clima estava bem mais desagradável do que imaginava. Sem ideia do que fazer comigo mesma, simplesmente coloquei minha cabeça na minha mesa. Talvez supondo que eu não estivesse me sentindo bem, Kiriyuu me chamou:
— K-Koyanagi… você está bem?
— Sim, estou. Obrigada por perguntar.
— Sua mãe vem? Ou seu pai?
Sério, justo agora ele decide abrir a boca, pensei, mas segurei minha língua.
— Nenhum dos dois pôde vir. Eles tinham trabalho.
— O-Oh, entendi.
— Seu pai veio hoje?
— Não, ele tinha que trabalhar, então minha mãe veio. Era o dia de folga dele quando encontramos você no rio daquela vez.
Talvez fosse a alegria de ter sua mãe por perto que deixava Kiriyuu tão falador? Para ser franca, achei isso maravilhoso. Não queria continuar falando sobre coisas dolorosas, então decidi não perguntar a ele se o trabalho de seu pai tinha alguma coisa a ver com o parque.
Finalmente, a aula começou e a Professora Hitomi pediu que fizéssemos nossas saudações. O refrão estava mais alto do que o normal, e era óbvio que todos estavam se exibindo para seus pais.
— Todos estão cheios de energia hoje. — disse a Professora Hitomi, então ela deve ter pensado que era fora do comum também.
Para a lição de hoje, deveríamos apresentar nossos pensamentos sobre a felicidade. Um por um, começando da frente da sala de aula, nos levantamos e falamos sobre nossos pensamentos.
Kiriyuu e eu ficávamos na última fila, então éramos os últimos. Como estávamos sentados no fundo, pude ouvir muitos dos pais conversando entre si e me perguntei porque a Professora Hitomi não os advertiu por isso.
Escutei em silêncio as outras apresentações, me perguntando se uma delas poderia me dar alguma pista sobre minha própria felicidade. No entanto, não ajudaram em nada. Tudo o que eles tinham a oferecer eram doces e brincadeiras, todas as ideias que eu já tinha pensado e descartado de cara. Não fiquei surpresa ao saber que Ogiwara foi o único a mencionar livros.
À medida que se aproximava da minha vez, finalmente chegou a de Kiriyuu.
Fui uma idiota em pensar que ele poderia mencionar o desenho, a ponto de ter pelo menos um fio de esperança sobre isso. Ele se levantou timidamente, seu texto escrito em mãos, e deu a mesma resposta enfadonha que o garoto três lugares antes dele.
— Covarde. — murmurei.
Não tenho ideia se minha voz o alcançou quando ele se sentou novamente. No entanto, como sempre, ele não disse nada. Agora era a minha vez.
Eu me levantei devagar. Olhei para a folha que a Professora Hitomi tinha entregado para que escrevêssemos nossas respostas. Olhei diretamente para a folha, para não a interpretar mal. A primeira frase da minha composição era:
Ainda não sei o que é felicidade.
Não que eu tivesse pulado o dever de casa simplesmente porque meus pais não viriam. Eu pensei muito sobre isso. Quando considerei a resposta que Minami me deu, me lembrei dela chorando. Mesmo assim, faltava-me palavras para descrever a forma do sentimento que se instalou no fundo do meu coração. Eu também não sabia mentir. Então pensei e pensei, e me conformei com isso.
Olhei para o rosto sorridente da Professora Hitomi, e para Kiriyuu com a cabeça baixa, e Ogiwara olhando para mim. Levantei minha composição em minhas mãos e comecei a ler. Ou melhor, tentei.
Nesse momento ouvi o som de alguém correndo pelo corredor. Clack clack clack. Não era o som dos calçados internos que qualquer um de nós usava. Sério, os adultos esqueceram que não deveriam correr nos corredores? Decidi ignorar o som aberrante e ler minha apresentação.
No entanto, eu não poderia fazer isso. O barulho parou um pouco antes da nossa sala de aula e a porta dos fundos se abriu rudemente.
Caramba, quem está interrompendo minha apresentação? pensei, mas em vez de emitir uma repreensão para este adulto horrível, um sorriso brilhante saltou no rosto da Professora Hitomi.
— Vocês chegaram bem a tempo!
Bem a tempo de quê? pensei, inclinando minha cabeça.
Por alguma razão, o sorriso radiante da Professora Hitomi, que tinha sido direcionado ao fundo da turma, virou-se para mim.
Por instinto, me virei para olhar. E então, dei meia-volta. Depois, com a mesma expressão em meu rosto que no da Professora Hitomi, apresentei.
— Minha felicidade está aqui e agora, com minha mãe e meu pai!
Ah, quebrei minha promessa à Senhorita Messalina. Eu disse a ela que iria mostrar aos meus pais o quão inteligente era. Eu não pude dar nada além da resposta que me veio na hora, assim como aquelas outras crianças idiotas.
No entanto, não houve uma única mentira. Como eu não tinha preparado de antemão, minha apresentação foi mais curta do que a de todos os outros. Mesmo assim, a Professora Hitomi estava radiante e aplaudindo.
— Conversei com seu pai sobre o quanto eu queria ir e acabamos tendo a tarde de folga. — Minha mãe me disse naquela noite, enquanto nós três jantávamos juntos pela primeira vez em muito tempo. Eles se ofereceram para me levar a um restaurante, mas eu disse que queria comer a comida da minha mãe. Ela perdoou meu egoísmo com um sorriso.
Terei de agradecer a Minami, pensei enquanto comia um grande e saboroso croquete, determinada a ir para o telhado com minha pequena amiga assim que as aulas acabassem amanhã.
No dia seguinte, encontrei-me com minha amiga de pelo preto assim que as aulas acabaram e me dirigi para a colina. Normalmente, neste ponto, eu teria que decidir quem iria ver, indecisa como se fosse um cardápio em um restaurante, mas hoje meu destino estava definido.
Como de costume, havia crianças menores correndo pelo parque na base da colina. Normalmente, eu teria ciúmes deles passando um tempo com suas mães no parque, mas hoje foi diferente. Eu já sabia que meus pais me amavam.
Escolhi rapidamente as escadas à esquerda. O sol estava queimando com todas as suas forças, mas não era a única causa do suor que pontilhava minha testa. Era porque minha cabeça estava queimando de animação com a ideia de ver a Minami.
Enquanto subia as escadas, passamos por outra pessoa. Poderia ser o dono daquele prédio? Se fosse esse o caso, eu tinha que agradecê-lo por nos deixar usá-lo o tempo todo. No entanto, considerei a possibilidade que ele ficaria bravo conosco por causa disso e, em vez disso, apenas disse “Olá” para o velho de terno.
Ele me lançou um olhar estranho, mas respondeu com um “Olá” gentil.
Porque os adultos sempre olham para você com estranheza quando os cumprimenta, apesar de dizer às crianças que elas devem cumprimentar a todos que encontram?
Não muito depois disso, o velho portão de ferro apareceu. Quase sempre estava aberto, mas às vezes estava fechado como se alguém tivesse vindo para verificar.
Hoje, ele estava fechado e uma cena que eu não tinha visto antes se desdobrou diante de mim. Normalmente, eu podia ver as escadas além, mas hoje elas estavam escondidas por dois adultos.
O que estava acontecendo? Fui direto até os adultos para perguntar o que era. Um dos dois, um homem que parecia mais velho que meu pai, se virou para mim.
— Desculpe interromper sua caminhada, mocinha, mas você não pode passar por aqui.
— Sério? Por quê?
— Por aqui há um canteiro de obras. É perigoso, então não podemos deixar ninguém passar.
Inclinei a cabeça.
— Obras?
— Há um prédio antigo lá no topo. Está desmoronando, é perigoso, por isso vai ser demolido.
Havia apenas um prédio antigo no topo da escada.
— V-Você não pode! — gritei, sem pensar.
Os adultos pareciam chocados.
— Aquele lugar era sua base secreta? — perguntou o homem. — Sinto muito, mas o lugar é realmente perigoso. Se você tocar lá, ele pode desabar bem em cima de você.
Base secreta. Essa foi a palavra perfeita para descrever a atmosfera daquele lugar. Fiquei muito desapontada por aprender este termo mais adequado apenas quando o lugar estava prestes a ser destruído. Mais do que tudo, temia a expressão de tristeza no rosto da Minami.
— Diga, uma menina colegial passou por aqui hoje?
— Uma colegial? Nah, não vi nenhuma. Ei, você viu alguém? — perguntou o senhor.
O jovem apenas balançou a cabeça.
— Você deveria encontrá-la aqui?
— Sim, pois é. Então, essa construção foi decidida pelo dono do prédio?
— Hm? Sim, isso mesmo.
Não posso fazer nada, então, pensei. Até uma criança sabia que dependia do dono se algo deveria ser valorizado ou destruído. Se possível, eu esperava que o prédio fosse valorizado como um tesouro, mas nenhum adulto se importaria com os desejos de uma criança que eles nunca viram.
Fiquei extremamente triste, mas sabia que não poderia desistir.
— Ei, tenho uma coisa para te perguntar. — perguntei ao velho gentil e sorridente.
— O que foi?
— Se uma colegial chamada Minami vier aqui, você pode dizer a ela que estarei na casa grande no topo da colina?
— Prometo!
Enrolei meu dedo mindinho no do velho e desci as escadas com a Senhorita Bobtail, em direção à casa da Vovó.
Esperei lá a tarde toda por Minami, comendo os doces da Vovó, mas logo chegou a hora de ir para casa e ela ainda não tinha aparecido. Ela não apareceu no dia seguinte e nem no outro, e embora eu tenha dito à Vovó para me dizer se ela aparecesse, isso nunca aconteceu.
Pouco tempo depois, fui para a clareira onde ficava o prédio da Minami, mas não havia nada além de entulho. A decepção teve gosto de uma tigela de sopa de milho sem um único pedaço de milho nela.
Eu nunca mais seria capaz de me encontrar com a Minami aqui.
Isso me fez pensar sobre uma série de coisas estranhas. A primeira era que, embora morássemos na mesma cidade, nunca passei por Minami na rua, nem mesmo por uma única colegial usando o mesmo uniforme. A segunda foi que o lenço que recebi dela, que guardei cuidadosamente em minha escrivaninha, tinha desaparecido. Não importa o quanto eu procurasse, não conseguia encontrar. Comecei a sentir um desespero que ia além do desespero.
A última coisa foi a mais peculiar. Não importa o quanto eu tenha falado sobre a história da Minami, não conseguia me lembrar de nada sobre ela. Fiquei tão emocionada. Eu tinha visto um mundo novo tão maravilhoso e me lembrava do sentimento da mais profunda satisfação, mas não importa o quão profundamente eu procurasse no meu cérebro, não tinha uma única lembrança do conteúdo.
Eu sabia, por ler histórias, que mistérios eram coisas maravilhosas, mas os mistérios nascidos da minha época com a Minami apenas me deixaram coçando a cabeça.
E foi assim que Minami e eu nos separamos.
Tradução: SoldSoul
Revisão: Guilherme
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