O som de sinos pesados badalando acordou Ronie, e ela viu uma luz brilhante já entrando pelas cortinas finas da janela.
Piscando e esfregando os olhos, ela se sentou, examinando o quarto em uma névoa de sonolência enquanto se enrolava na capa que usava como cobertor. Muito rapidamente, ela avistou o espadachim de cabelos negros dormindo profundamente na cama próxima. Oito horas haviam se passado, e o efeito das ervas havia desaparecido, pois seu rosto adormecido estava pálido novamente e surpreendentemente querubínico. Isso colocou um sorriso em seu próprio rosto.
Mas, então, os fatos se assentaram: ela passara uma noite no mesmo quarto que Kirito, camas diferentes ou não. A constatação espantou o sono de sua mente, e seu rosto corou. Ela pressionou as mãos nas bochechas, que estavam frias por estarem fora da capa, e respirou profundamente até se acalmar. Logo depois, ela saltou de pé.
Ronie caminhou até a cama e sacudiu gentilmente o ombro de seu superior, dizendo:
— Acorde! Acorde! São oito horas!
Foi nesse ponto que ela percebeu que todas as melodias dos sinos que indicavam as horas que ouvira desde a noite anterior eram exatamente as mesmas tocadas pelos sinos da Catedral Central.
O que poderia explicar isso? Por que os sinos presos à Igreja Axiom no Reino Humano e os sinos nesta distante capital sombria tocariam a mesma melodia? A pergunta saiu de sua mente quando Kirito resmungou e tentou se esgueirar para mais debaixo do cobertor.
— Mmrm… Só mais um pouco.
— Não, não volte a dormir!
Ela puxou o cobertor, mas Kirito agarrou com força a ponta com ambas as mãos, protestando como uma criança teimosa.
— Cinco minutos! Só mais três minutos, Eugeo!
Ronie ofegou. Ela soltou o cobertor e levou a mão à boca, recuando.
O melhor amigo de Kirito, o Discípulo de Elite Eugeo, morrera quase dois anos antes, na luta contra a Administradora, mas, para Kirito, seu tempo com Eugeo ainda não era passado. Como Tiese, ele ainda o via.
Ela voltou sorrateiramente para o sofá e sentou-se novamente.
A Subdelegada Espadachim Asuna dormia no mesmo quarto que Kirito. Ela provavelmente conhecia seus pensamentos secretos, a profunda tristeza que ele mantinha escondida sob a superfície. E, ainda assim, ela encontrara uma maneira de ficar ao seu lado, sempre sorrindo, calorosa e gentil.
Quando voltasse à Centoria, Ronie teria uma conversa adequada com Asuna. Ela não podia revelar os sentimentos secretos que nutria, mas as duas estavam unidas em seu desejo de ajudar Kirito.
Para sua surpresa, cerca de três minutos depois, como prometido, Kirito se sentou. Ele olhou ao redor do quarto com os olhos mais do que semicerrados.
Quando avistou sua companheira, bocejou enormemente.
— Bom dia, Ronie.
— B… bom dia, Kirito.
— Desculpe, dormi um pouco demais. Que horas são?
— O sino das oito acabou de tocar!
— Entendo. Então chegaremos a tempo para o checkout… er, para a hora que ela quer que a gente saia.
Ele bocejou novamente e saiu da cama, depois foi até a janela e abriu as cortinas cinzas com um puxão.
— Ei, Ronie, olha! Dá para ver o palácio! — Ele disse.
— Sério? Dá?
Ela se levantou do sofá para se juntar a ele. Com certeza, ao longe e um pouco à direita, pairando sobre o caos da cidade, estava a figura clara do palácio negro como breu, elevando-se ao céu.
Ele rasgava a névoa da manhã, que era muito mais vermelha do que ela conhecia em casa. Sendo esculpido em grande parte em rocha natural, era compreensivelmente mais rústico que a Catedral Central, mas isso lhe conferia uma beleza própria. Mesmo Kirito, que o via pela segunda vez, exalou longa e lentamente com admiração.
— Diferente da Catedral Central, que a Administradora construiu com seus poderes sobre-humanos, aquele palácio foi esculpido na rocha por mãos mortais. — Ele disse.
Ronie maravilhou-se com o pensamento.
— Quantos meses? Quantos anos deve ter levado…?
— Dizem que levou mais de cem anos… Bem, de qualquer forma, deveríamos ir. Se demorarmos muito, será meio-dia antes que percebamos.
— Não vamos esquecer quem foi o responsável por dormir demais! — retrucou Ronie. Ele deu um sorrisinho travesso para se esquivar da responsabilidade e começou a arrumar as malas.
Assim que aplicaram novamente a solução de chá de cofil e pagaram pela noite, encontraram uma cidade iluminada em vermelho pelo sol da manhã, em vez de lâmpadas de minério.
A estalagem ficava a mais de cinco kilors de distância do Palácio de Obsidia, mas a caminhada mal pareceu longa devido a todas as paisagens novas.
A estrada ficava mais larga à medida que se aproximavam do palácio, e os edifícios que a ladeavam também ficavam maiores e mais sofisticados. Mas o número de pessoas andando pelas ruas diminuía, e não havia mais um único demi-humano à vista.
Eventualmente, chegaram a um rio de tamanho considerável — pelo menos para os padrões locais — e uma grande ponte de pedra que o atravessava. Do outro lado, havia um grande portão, atrás do qual uma suave encosta ascendente levava à agulha de obsidiana anormalmente afiada que era o palácio.
Kirito parou ao pé da ponte. Ronie perguntou a ele em voz baixa:
— Então… Você já descobriu como vamos entrar no castelo?
O rosto do espadachim inclinou-se pensativamente.
— Hmm… Não acho que apenas agir como habitantes do Território Sombrio será suficiente para nos fazer entrar no palácio. E se tentarmos voar até o topo dele, os guardas vão nos ver, então…
— Então, você não encontrou uma resposta. — Ela concluiu.
Ele se apressou em protestar.
— N-não, eu não disse isso. Ainda tenho o truque secreto na manga! — Ele gritou, puxando-a pela mão por um caminho à beira do rio à esquerda da ponte.
À medida que a rota para o castelo se distanciava, ela se preocupou que ele estivesse prestes a sugerir que nadassem pelo rio e escalassem a colina rochosa para entrar sorrateiramente no palácio.
Kirito parou em um local onde o rio era mais largo, colocou as duas bolsas no chão e olhou novamente para o Palácio de Obsidia. A montanha de rocha negra tinha cerca de trezentos mels de diâmetro na base, mas quase o dobro dessa altura, então parecia mais uma torre do que uma montanha. A maior parte da face voltada para a cidade era esculpida na forma de um castelo, com pilares majestosos e janelas que brilhavam ao sol da manhã. A face posterior ainda era quase inteiramente rocha bruta, com apenas um grande terraço se projetando, provavelmente como uma plataforma para dragões.
Ele ergueu a mão direita e apontou para o topo da montanha. Seu dedo se contraiu, como se estivesse procurando por algo.
— Hum, Kirito… o que você está…? — Ronie começou a perguntar, sentindo-se subitamente apreensiva.
Ele não disse nada, mantendo a mão erguida por mais cinco segundos. Depois, assentiu como se tivesse encontrado a resposta que queria.
Ele alinhou os dedos daquela mão em posição de corte. Então, ergueu o braço reto, recuou o pé esquerdo e baixou o centro de gravidade. A mão, ereta como uma espada, começou a vibrar fracamente e assumiu um brilho branco, para o choque de Ronie.
Kirito não pronunciara uma palavra de qualquer comando, o que significaria que este era o poder mais secreto dos Cavaleiros da Integridade, uma força que atuava sobre as próprias leis do mundo, a Incarnação. Mas, normalmente, ela não produzia nenhum som ou luz. Quanto poder ele estava concentrando para fazê-la reagir desta forma?
— Hah!! — Ele gritou, baixando a mão com força tremenda.
Uma luz branca disparou na forma de um fio de lâmina, muito parecida com as Lâminas de Duas Asas de Renly, cruzando instantaneamente mais de um kilor de espaço e atingindo o corrimão de um pequeno terraço bem no topo do palácio. Com sua excelente visão, Ronie pôde ver pequenos fragmentos de obsidiana caindo do corrimão.
— Espere! K-K-Kirito, o que você está fazendo?! Você acabou de danificar o palácio!! — Ela sibilou, ainda mais assustada com isso do que com o fato de ele ter lançado uma Espada Incarnada a um kilor inteiro de distância.
Ela puxou sua capa preta em pânico, mas ele se levantou com facilidade praticada.
— Isso não é nada. Misture um pouco de pó de carvão com cola e aplique, e as marcas desaparecerão. Eu acho. Além disso, olhe! — Ele disse, erguendo a mão novamente para apontar.
Ela pôde ver uma pequena figura emergindo no distante terraço que ele acabara de atingir. Estava longe demais para que pudessem distinguir seu rosto, mas a silhueta era esguia o suficiente para ser definitivamente um humano. A pessoa notou o dano no corrimão; depois, se inclinou sobre a borda para olhar o mundo abaixo.
Não havia onde Kirito e Ronie se esconderem na margem do rio, mesmo que o palácio estivesse a mais de um kilor de distância. A pessoa no terraço os avistou, ou era o que parecia.
A figura levou a mão à boca.
Ronie só percebeu que o gesto era um assobio quando um dragão cinza abriu as asas e alçou voo da plataforma de lançamento maior, no lado posterior da montanha. O dragão subiu, contornando a lateral da montanha, e, depois, pairou perto do terraço em questão. A figura saltou em suas costas e apontou diretamente para a margem do rio onde Ronie e Kirito estavam.
— Is-is-isso são m-m-m-más notícias! Eles nos viram completamente!!
— Isso foi rápido. Muito perspicaz.
— Não acho que seja hora para admiração ociosa! Precisamos nos mexer, ou…
Mas seu puxão na capa dele se mostrou fútil. Kirito agarrou o braço de Ronie e a colocou na frente dele. O dragão agora mergulhava para baixo, diretamente em direção a eles.
— Bem, acho que tenho que cumprir meu dever como guarda-costas! — Ela disse a si mesma, apertando o punho de sua recém-adquirida espada longa.
Apenas três segundos depois, o dragão cinza alcançou o espaço acima deles e bateu as asas para controlar sua descida. O cavaleiro saltou agilmente de suas costas, pousando na margem rochosa do rio sem fazer barulho. Como os dois, usava uma capa com capuz que escondia seu rosto.
A pessoa não usava espada, mas, baseando-se em sua maestria com o dragão, devia ser um cavaleiro sombrio de elite. Ronie postou-se diante de Kirito, mantendo vigilância máxima para garantir que estivesse pronta para sacar sua espada a qualquer momento.
Mas…
O dragão cinza pousou depois de seu cavaleiro, o chão tremendo sob seus pés, e estendeu seu longo pescoço para cheirar primeiro Ronie, depois Kirito. Então, ele soltou um trinado, suave e amigável, e esfregou a cabeça de Kirito com o lado de seu longo focinho.
— Huh…? — Ronie ficou atordoada. Ouvira dizer que os dragões do Território Sombrio, como os de sua terra natal, eram muito orgulhosos e arredios com estranhos.
Era impossível que um deles baixasse a guarda dessa forma perto de um estranho. Mas, então, ela notou as muitas cicatrizes de lança nas escamas cinzentas do dragão.
— Oh…! Esse é…?
Mas Kirito respondeu à pergunta antes que ela pudesse formulá-la completamente. Ele coçou sob o queixo do dragão com ambas as mãos.
— Pronto, pronto. Que bom te ver de novo também, Yoiyobi. Como você tem estado?
Ela nunca esqueceria aquele nome. Pertencia a um dragão lendário que lutara bravamente sozinho contra um exército de cavaleiros vermelhos na Guerra do Underworld. Era o parceiro não de um soldado das trevas, mas de uma Cavaleira da Integridade — uma pessoa que era outra figura lendária, a Cavaleira Silenciosa.
— É… É você… Lady Sheyta? — Ronie perguntou ao soldado encapuzado.
A figura baixou o capuz.
— Kirito! Ronie! O que estão fazendo aqui?!
Sheyta Synthesis Twelve.
Entre o estado atual da cavalaria, ela era uma das cavaleiras mais antigas depois de Fanatio e Deusolbert, e, segundo rumores, sua habilidade com a espada era igual à do comandante original, Bercouli Synthesis One.
Sua arma divina fora um presente da própria pontífice. A Espada Lírio Negro podia cortar qualquer coisa no mundo, e Sheyta a usara com grande efeito contra as hordas de pugilistas e cavaleiros vermelhos na guerra, em uma verdadeira batalha de um contra muitos. Porém, assim que a guerra terminou, ela deixou a Catedral Central; agora vivia no Palácio de Obsidia como embaixadora plenipotenciária do conselho.
Em outras palavras, ela era a pessoa perfeita para Kirito e Ronie fazerem contato — o único problema fora como Kirito a convocaria para encontrá-los. O fato de ele ter lançado uma Espada Encarnada no castelo, e a única pessoa de que precisavam ter saído para investigar, parecia mais um resultado planejado do que uma feliz coincidência.
Ronie reprimiu o desejo de interrogar Kirito, optando por observar a interação deles com a respiração suspensa.
— Sinto muito por assustá-la assim, Sheyta. — Kirito se desculpou, baixando o capuz e coçando a cabeça, envergonhado. — Foi a única ideia que consegui ter para chamar sua atenção.
A mais leve expressão de desgosto cruzou as feições reservadas e belas de Sheyta.
— Sim, você me assustou. Quando percebi que alguém havia atingido a borda com uma Lâmina de Encarnação do outro lado do rio, pensei que o Comandante Bercouli havia voltado à vida.
Sua maneira de falar era simples e direta, sem nenhuma delicadeza de seu sexo, mas ela estava mais falante do que no passado, e o tom de sua voz parecia mais suave, de alguma forma.
— Mas como você sabia que eu estava naquele quarto? — Sheyta perguntou.
Kirito deu de ombros.
— Porque pareceu o mais perigoso, eu acho.
Sheyta repetiu o gesto dele, parecendo um pouco descontente.
— Pensei que estava desligando meu espírito de espada. Se você consegue me sentir de tão longe, então, ainda tenho muito a melhorar.
Isso finalmente revelou a Ronie que Kirito não estava simplesmente adivinhando o alvo de sua Espada Encarnada. O gesto que ele fizera com os dedos antes que a luz aparecesse ao redor de sua mão devia ser ele procurando pela presença de Sheyta. Era uma habilidade que ela sabia que nunca conseguiria replicar. Mas…
— Hum, Kirito, se você tem poderes tão incríveis, realmente precisava se envolver no que é essencialmente uma criança jogando uma pedrinha na janela do amigo? — Ela interveio.
Kirito virou-se para ela e sorriu.
— O que é isso? Já foi visitada por um garoto assim antes?
— E-eu não estava falando por experiência própria!
— Então, talvez fosse você quem estava usando para…
— N-não! Claro que nunca fiz nada parecido! — Ela protestou vigorosamente.
Sheyta deu-lhes um sorriso fino e irônico.
— A longa jornada deve ter sido cansativa. Você pode descansar no castelo.
Ela gesticulou com a mão, e Yoiyobi baixou o corpo. Não havia sela nas costas do dragão, mas isso significava que havia espaço suficiente para os três se espremerem juntos.
Com Ronie na frente, Kirito na retaguarda e Sheyta sentada entre eles, o dragão veterano deu uma corrida rápida ao longo da margem do rio e decolou graciosamente, lidando facilmente com o peso de três pessoas e duas armas divinas.
Com um poderoso bater de asas, o dragão subiu rapidamente, rumo ao topo do Palácio de Obsidia. Os guardas já deviam ter notado, mas saberiam que era o dragão da embaixadora, e não haviam soado o alarme sobre a cena.
Em dois minutos, Yoiyobi os levou ao terraço, desceu o trio, depois piou e retornou à plataforma maior do outro lado da montanha. Quando a enorme criatura desapareceu de vista, Ronie caminhou até o corrimão de obsidiana para inspecionar o local que Kirito atingira com sua Encarnação. Como temia, faltava um pedaço de mais de um cen de profundidade na estrutura.
“Isso vai nos render uma bronca!” — pensou ela, desviando o olhar, mas quando realmente olhou para a vista à sua frente, aquela breve preocupação dela foi completamente esquecida.
— Oh! Uau!
Abaixo dela, estava toda a cidade de Obsidia. Diferente de Centoria e seus padrões radiais e ordenados, esta era uma cidade de caos e desordem, mas isso apenas a fazia parecer ainda mais ousada e viva.
— Ali, parece que o próprio chão está empilhado em várias camadas. Ah, e aquilo é um coliseu? É enorme! Kirito, olhe! — Ronie disse, apontando com excitação.
Por cima do ombro dela, Sheyta disse:
— Há muitas outras coisas para ver aqui, e se você tiver tempo, eu recomendaria um pouco de turismo, mas… por outro lado… — Ela se afastou de Ronie e lançou um olhar penetrante a Kirito. — Presumo que você não saiu escondido para visitar por diversão. Aconteceu alguma coisa em Centoria?
— Isso mesmo. — Kirito confirmou. Ele se endireitou. — Embaixadora Plenipotenciária Sheyta, solicito uma reunião urgente com o Comandante Iskahn.
A sala que dava para o terraço estava cheia de luz quente e brilhante, para os padrões do Reino Sombrio. As paredes e o teto eram pintados de um rosa pálido, as cortinas eram amarelo-claras e o tapete era do verde da grama fresca. A grande lareira queimava pedras em vez de lenha, e estava quente o suficiente para que, se Ronie mantivesse sua capa, pudesse começar a suar.
Era uma escolha de decoração surpreendente, se este fosse o quarto de Sheyta, pensou ela, mas a verdadeira resposta tornou-se aparente para ela muito rapidamente.
Havia uma pequena cama de cerca de um mel de comprimento do outro lado da lareira, e, enquanto Sheyta caminhava em direção a ela, havia um sorriso incrivelmente caloroso e gentil em seu rosto. Ela se virou e acenou para Ronie e Kirito em silêncio. Eles se aproximaram sorrateiramente e espiaram a cama, onde um bebê envolto em um cobertor branco puro dormia profundamente.
A criança não tinha mais de três meses, com um tufo de cabelo macio vermelho-escuro; seu nariz, boca e as mãos cerradas ao lado da cabeça eram tão pequenos que era difícil de acreditar.
Segundo as histórias, este bebê era filho de Sheyta e Iskahn, o líder da guilda dos pugilistas. Era uma menina, Ronie se lembrava. Ela sussurrou para a mãe:
— Qual é o nome dela?
— Leazetta — Sheyta disse com uma nota de orgulho. Ela olhou para Kirito. — Peguei a primeira sílaba da Espadachim Verde, Leafa.
— Você pegou…? Eu não fazia ideia — murmurou Kirito, sorrindo enquanto olhava para o bebê adormecido.
Um silêncio suave e reconfortante preencheu os vinte segundos seguintes, apenas para ser quebrado pelo som da porta do corredor se abrindo e a pior imitação do mundo de uma voz de bebê manhosa jorrando.
— Lea, é hora do seu leitinho gostosinho.
Um jovem carregando duas bandejas entrou na sala. Seus cabelos curtos e cacheados, da cor vermelho-dourada do fogo, eram presos por uma simples tiara de prata e, apesar da estação de inverno, ele usava apenas uma fina camisa de linho. Ele usava calças curtas e sandálias, mas os músculos ondulantes e as inúmeras cicatrizes visíveis em seus ombros e braços expostos, juntamente com seu olho direito arrancado, indicavam que ele era um guerreiro endurecido pela batalha.
Em contraste, no entanto, o sorriso frouxo e bobo no rosto daquele guerreiro era muitas vezes mais feliz do que até mesmo a expressão de Kirito ao comer uma torta de mel. Isso deixou Ronie boquiaberta.
O homem de um olho só finalmente notou Ronie e Kirito perto da cama, e seu sorriso desapareceu. Suas sobrancelhas grossas se curvaram para cima com desconfiança, e seus olhos correram de um lado para o outro entre eles e Sheyta.
Antes que o homem dissesse qualquer coisa, Kirito levantou a mão.
— Ei, Iskahn. Já faz um tempo.
O comandante supremo do Território Sombrio e campeão da guilda dos pugilistas, Iskahn, arregalou seu único olho o máximo que pôde.
— É… É o K-K-Kirito?! Por que seu rosto está colorido assim? Quero dizer, o que… você está fazendo aqui?! A próxima reunião não é até março?!
— Na verdade, eu tinha um pequeno assunto a resolver. Me desculpe por invadir assim sem avisar.
— B-bem, tudo bem, mas… espere. Espere, espere, espere. — Um sulco profundo percorreu a testa de Iskahn.
Sheyta deslizou para perto do marido e pegou as bandejas de suas mãos. O pugilista pareceu nem notar, tão perdido estava em seus pensamentos.
— Kirito, você… você acabou de ouvir isso?
— Ouvir o quê? Ah, sobre o leitinho gostosinho? Você realmente se adaptou à paternidade, não é? Ha-ha-ha.
— Não me venha com “ha-ha-ha”! Agora que você ouviu isso, não posso te deixar sair ileso. Tenho que arrancar essa memória da sua cabeça à força! — Ele gritou, cerrando seu punho poderoso, a pele brilhando com chamas vermelho-pálidas.
— Hum, K-K-K-Kirito…? — gaguejou Ronie, sem saber como cumprir seu papel de guarda-costas no momento. Ele estendeu a mão para empurrá-la para trás e postou-se diante de Iskahn, estendendo a palma da mão esquerda.
— Pode vir!!
— Raaaah!!
Iskahn saltou. Ele deixou um rastro vermelho flamejante no ar, lançando um soco com tal velocidade que Ronie não conseguiu acompanhá-lo a olho nu. Atingiu a palma da mão de Kirito.
Houve um impacto explosivo que fez as cortinas e outros tecidos decorativos balançarem. Foi claramente um soco devastadoramente poderoso, mas Kirito permaneceu no lugar com não mais do que uma leve inclinação para trás, parando o golpe de Iskahn com uma única mão.
O líder dos pugilistas e o delegado espadachim do Reino Humano ficaram imóveis, mãos direitas e esquerdas conectadas. Eventualmente, Iskahn ergueu a cabeça e sorriu.
— Bom ver que você não perdeu o jeito, Kirito.
— Digo o mesmo, Iskahn.
Ao lado dos homens sorrindo assustadoramente um para o outro, Sheyta segurava as bandejas com irritação mal disfarçada. Ronie aproximou-se da cama, imaginando se o som havia acordado o bebê. Em vez disso, Leazetta dormia feliz, sem dar qualquer sinal do tumulto que acabara de acontecer. Ela realmente era filha do cavaleiro e do pugilista mais fortes do mundo.
Quando os guardas chegaram, atraídos pelo som da explosão, Iskahn os empurrou para fora da porta e instruiu-os a trazer mais duas cadeiras, que se juntaram às duas já alinhadas perto da janela. Os guardas desconfiaram de Kirito e Ronie, é claro, mas cederam quando Iskahn lhes disse para não se preocuparem, e que explicaria mais tarde. Esse foi o efeito ou da Lei do Poder ou da confiança que Iskahn inspirava como líder.
Depois que os guardas saíram, os sinos das nove horas tocaram, e o bebê acordou como se por comando, enrugando o rosto e chorando. Sheyta pegou Leazetta da cama e sentou-se em uma das cadeiras para lhe dar leite de uma mamadeira feita de nozes da árvore phibo, que também existia no Reino Humano.
Quando aquecidas, as nozes phibo tornavam-se tão translúcidas e ocas quanto garrafas de vidro, e o caule semelhante a um mamilo tinha até mesmo a quantidade certa de resiliência e perfuração para permitir a passagem do líquido. Por essa razão, dizia-se que Terraria criara a planta precisamente para bebês. Agora que Ronie sabia sobre o mundo real, era difícil não levar essa afirmação de forma literal — que elas realmente haviam sido criadas, apenas por pessoas do mundo real, não por Terraria.
Sheyta, em transe, observava Leazetta beber ruidosamente. Depois, ergueu a cabeça.
— Você gostaria de segurá-la? — Ela perguntou.
— Posso? — Ronie perguntou.
— Claro!
Ela pegou o bebê com o braço esquerdo e a mamadeira com o direito e a levou à boca do bebê. Os olhos de Leazetta encararam Ronie, cinzentos como os de sua mãe, mas ela retomou a mamada imediatamente. Ronie dera leite a Berche assim várias vezes na catedral, mas segurar uma menina parecia muito diferente.
— Eu gostaria de tê-la amamentado, mas os pugilistas têm sua própria mistura secreta de fórmula láctea. — Sheyta explicou.
Iskahn percebeu o comentário e desviou-se de sua conversa sobre as últimas notícias com Kirito para dizer:
— Pode apostar. Se ela beber a fórmula, nunca ficará doente, seus ossos crescerão fortes e ela será uma criança boa e forte.
O termo “leite”, no caso desta mistura, era uma palavra sagrada comum — um termo que não se originava da língua comum, mas era entendido por todos — e se referia a leite de vaca ou cabra aquecido à temperatura da pele e misturado com certos elementos medicinais especificamente para bebês. A composição dessa mistura variava por família e região — daí a referência de Sheyta à fórmula secreta. Ronie frequentemente ouvia dizer que o leite materno era o melhor, como Sheyta dissera, e talvez fosse verdade, mas se não fosse pelas mamadeiras de noz phibo e pela mistura de leite, seria muito mais difícil para famílias ocupadas de agricultores e comerciantes criarem bebês.
Por sua vez, Leazetta não tinha queixas sobre a receita secreta da guilda dos pugilistas, e bebeu tudo rapidamente; depois, arrotou. Ela ainda parecia sonolenta; então, Sheyta a pegou de Ronie e a deitou na cama novamente.
Quando ela voltou e sentou-se na cadeira, sua expressão mudara da de uma mãe para a de uma cavaleira.
— Então, o que aconteceu? — Ela perguntou, toda profissional.
Kirito passou a lhes contar sobre o assassinato ocorrido dois dias antes em South Centoria. Iskahn e Sheyta ouviram em silêncio, mas quando a história chegou ao tópico de Oroi, o goblin da montanha e suspeito do assassinato, ambos inspiraram, mas não interromperam. Então, Kirito continuou a história, explicando como ele e Ronie usaram um “dragão” para voar para fora do Reino Humano e chegar a Obsidia na noite anterior.
— Entendo. Que provação terrível nós te fizemos passar! — disse o comandante, mas o delegado apenas balançou a cabeça.
— Não, eu só gostaria de ter podido enviar um mensageiro para avisá-los antes,… mas sabia que levaria até o próximo mês para eles obterem uma resposta e completarem a viagem de volta.
O contato entre Centoria e Obsidia no momento acontecia através de mensageiros a cavalo que viajavam entre uma série de dez cidades e fortes. Todo o processo levava duas semanas inteiras para ir de uma ponta à outra. E isso sem nem levar em conta o perigo das muitas bestas mágicas maiores que viviam no Território Sombrio e poderiam atacar os mensageiros.
— Verdade. Se ao menos pudéssemos encontrar aquele crânio mestre…— resmungou Iskahn, provocando um aceno de concordância de Kirito.
— Hum, o que é um… crânio mestre? — Coube à Ronie perguntar.
— Ah, isso. Eu também não sabia sobre isso até depois da guerra. Durante a Guerra do Underworld, o Imperador Vecta usou um Objeto Divino para dar ordens a Iskahn e ao resto dos dez lordes. Eram um grande crânio mestre e dez crânios escravos que iam juntos. Quando ele falava no mestre, sua voz saía instantaneamente dos subsidiários, não importava o quão longe estivessem.
Sua explicação a deixou de olhos arregalados.
— I-instantaneamente…?! Se tivéssemos tal coisa, não haveria necessidade de cartas ou mensageiros.
— Não, não haveria, mas é uma conversa unilateral de mestre para escravo. Então, você não poderia realmente ir e vir com apenas aquele conjunto. — Kirito observou.
— Mas, depois da guerra, o crânio mestre e vários dos escravos desapareceram. Então, mesmo isso está fora de alcance por enquanto. — Iskahn explicou, exalando profundamente e balançando a cabeça. — Mas o maior problema é este assassinato no Reino Humano. É impossível. As pessoas que tiram férias no Reino Humano têm que levar um documento proibindo roubo, luta e assassinato, em nome do Conselho Sombrio dos Cinco e de mim mesmo, comandante supremo do Exército Sombrio. Eu assino cada um deles. Então, enquanto a Lei do Poder existir, há apenas uma pessoa em todo o Reino Sombrio que pode ignorar essas ordens.
Ronie presumiu que ele estivesse falando de si mesmo, é claro. Mas então Sheyta interveio:
— Duas pessoas.
— Apenas duas pessoas. — Iskahn se corrigiu, carrancudo. Os cantos da boca de Kirito se curvaram para cima brevemente.
— Concordo com você. — Ele disse — Na verdade, a adaga que Oroi supostamente usou para matar o encarregado humano desapareceu do arsenal. Acho que muito provavelmente era uma arma temporária, gerada com elementos de aço,… embora essa fosse suspeita de Ronie, não minha.
— Parece que sua pupila tem uma boa cabeça sobre os ombros.
— E-ela não é uma pupila, na verdade. — Kirito disse, sem jeito.
Ronie começou a se perguntar exatamente o que ela era para Kirito, mas afastou o pensamento e levantou a mão para dizer:
— Hum, eu estava pensando um pouco mais sobre isso. A arma do crime era uma recriação de uma adaga de goblin da montanha que era realista o suficiente para Oroi confundi-la com a real por um momento. Então, estivemos presumindo o tempo todo que um mago sombrio estava envolvido no incidente de alguma forma. Mas…
Ela parou momentaneamente, olhando para Sheyta e Iskahn por sua vez, e reuniu coragem para perguntar:
— A esse respeito, qual é o estado da guilda dos magos sombrios agora?
Marido e mulher trocaram um rápido olhar. Iskahn pigarreou e respondeu:
— Eu ia relatar sobre isso na próxima reunião. Lamentavelmente, não temos uma ideia clara do estado atual da guilda.
— O que isso significa? — Kirito perguntou, com as sobrancelhas franzidas.
— Depois que a Espadachim Verde matou Dee Eye Ell, uma maga chamada Kay Yu Vee assumiu. Mas, embora eu não saiba muito sobre artes sombrias, até eu poderia dizer que ela não tinha força para manter a guilda — disse Iskahn.
Sheyta acrescentou para esclarecer:
— Até mesmo minha habilidade com tais artes é superior à dela.
— Após investigação mais aprofundada, descobrimos que quando Dee ainda estava viva, Kay era, no máximo, a décima na hierarquia interna. Isso significa que um monte de membros seniores simplesmente desapareceu.
— Quase dois mil magos sombrios não morreram na batalha no Portão Oriental? Isso não sugeriria que eles estavam naquele grupo? — Kirito apontou.
Iskahn fez uma careta.
— Duvido. Eles são tão tenazes quanto bestas mágicas quando se trata de se agarrarem teimosamente à vida. Se Dee não tivesse lutado com a Espadachim Verde, ela ainda estaria viva hoje. Eles não são atenciosos o suficiente para que os dez melhores magos simplesmente morram juntos em batalha.
Ele olhou de volta para Ronie e concluiu:
— Então é possível que a guilda dos magos sombrios que atualmente participa do Conselho dos Cinco seja apenas uma casca vazia. A verdadeira força dos magos pode estar escondida em algum lugar. E isso significa que eles podem ter tido uma participação neste problema no Reino Humano. Mas… Ronie, era isso? Você parece pensar diferente.
— Isso mesmo. Não tenho provas para negar completamente essa possibilidade,… mas achei estranho. Se o verdadeiro culpado é a guilda dos magos sombrios escondida, por que eles precisariam criar uma arma falsa com elementos de aço? Não teriam conseguido uma adaga de goblin de verdade com bastante facilidade?
— Esse é um bom ponto. Para um goblin, uma adaga com o símbolo de seu clã é um item muito importante, mas ainda são peças de ferro fundido produzidas em massa. Você poderia facilmente conseguir uma ou duas roubando ou comprando da pessoa certa. — Iskahn murmurou.
— Se o objetivo do verdadeiro culpado é incriminar Oroi pelo assassinato e aumentar as tensões entre os dois reinos, ter uma adaga de verdade seria um método mais eficaz. — Kirito concordou — Então, se eles não conseguiram fazer isso, significaria que o culpado é… alguém do lado humano?
— Isso levantaria um mistério ainda maior. — Sheyta observou, e seus olhos amendoados se estreitaram ainda mais. — No lado humano, estamos sujeitos a leis muito mais rígidas do que no Reino Sombrio. O assassinato é uma violação muito clara do Índice de Tabus. Então, se a pessoa que matou o encarregado é do Reino Humano, isso significaria que ela é capaz de ignorar o Índice de Tabus.
Kirito e Ronie assentiram juntos em silêncio. Esse ponto também fora levantado na discussão com Fanatio após o incidente. Mesmo um Cavaleiro da Integridade não vinculado pelo Índice de Tabus não poderia simplesmente tirar a vida de um cidadão inocente como Yazen, o encarregado, inteiramente por vontade própria.
— Nós simplesmente não sabemos de nada com certeza. — Kirito murmurou, balançando lentamente a cabeça.
Iskahn balançou a cabeça, perdido em pensamentos. Eventualmente, ele bateu palmas, cortando a névoa figurativa que os cercava.
— Tudo bem! Entendemos a situação agora. Infelizmente, provavelmente precisaremos cancelar o negócio de turismo para o lado humano por um tempo.
— Sim. Estamos mantendo as informações sob sigilo em Centoria por enquanto, mas se ocorrer um segundo ou terceiro incidente, nem mesmo o Conselho de Unificação conseguirá controlar a situação. Pretendo fechar temporariamente o Portão Oriental e fazer com que os visitantes atualmente hospedados em Centoria retornem para casa o mais rápido possível — disse Kirito, com profundo pesar. — Além disso,… quanto a Oroi, o goblin da montanha… Estamos mantendo-o na Catedral Central por enquanto, mas não podemos soltá-lo imediatamente. Ele pode ser capaz de nos dar mais informações, e podemos descobrir por que ele foi incriminado. Oroi é do clã Ubori da Colina da Serra. Receio que…
— Entendo. Enviarei um emissário aos Ubori para explicar a situação. — Iskahn concordou.
Ele virou seu único olho para a janela, depois olhou de volta para Kirito.
— Isso resolve a questão dos turistas indo para o reino humano… mas e os comerciantes vindo para cá do seu lado? Há uma caravana deles hospedada em Obsidia no momento.
— Hmm, essa é uma boa pergunta — disse Kirito, cruzando os braços.
Como parte do intercâmbio cultural entre os dois lados, além dos turistas que visitavam o reino humano vindos do Reino Sombrio, o lado humano enviava suas próprias caravanas comerciais para Obsidia. Por enquanto, era em escala de teste, com apenas algumas carroças de mercadorias selecionadas para troca, para ver o que funcionava e o que não, mas havia muitas coisas exóticas aqui que não podiam ser encontradas dentro do reino humano, como aqueles minérios de iluminação. Os maiores comerciantes sentiam o cheiro de uma grande oportunidade de negócios se formando e batiam à porta com pedidos para fazer parte das caravanas.
— Se o responsável é um poder organizacional e tem membros aqui em Obsidia, eles poderiam estar procurando causar o inverso do assassinato de humanos! Digamos, um dos comerciantes humanos matando um residente de Obsidia. Mas as caravanas têm homens de armas veteranos e usuários de artes como guardas pessoais, e também não podem andar por aí livremente. Então, não seria tão fácil, estou pensando. — Kirito explicou.
Sheyta concordou.
— Não acho que haja necessidade de cancelar o negócio de comércio. Não imediatamente, pelo menos. As caravanas estão trazendo muitos medicamentos e reagentes valiosos para cá; então, sua presença é mais bem-vinda do que eu poderia ter pensado. Por via das dúvidas, colocarei um pupilo na caravana enquanto eles estiverem hospedados em Obsidia.
— P-pupilo…? Pensei que você estivesse aqui em uma missão solo, Sheyta. — Kirito observou, seu rosto escurecido arregalado de surpresa.
Com uma mistura de preocupação e orgulho, Iskahn disse:
— Essa é a questão. Sheyta é atualmente tanto a embaixadora plenipotenciária quanto uma mestra convidada da cavalaria sombria.
— O-o que significa “mestra convidada”?
— Quando ela foi observar os cavaleiros, o jovem capitão deles a desafiou para um duelo de treino, então ela usou uma espada emprestada — e nem mesmo a espada de verdade, apenas a bainha — e o surrou. Agora ela tem seu próprio salão de treinamento no quartel-general dos cavaleiros.
— Tenho apenas um punhado de pupilos; menos de dez. Mas todos eles têm grande potencial. — Sheyta explicou.
— Ah… entendo — disse Kirito, que estava claramente sem palavras.
— Você deveria ir ao salão e lhes dar uma boa demonstração. — Ela acrescentou.
— Oh, uh, c-céus! Mal treinei nos estilos tradicionais de esgrima! — Kirito resmungou, tentando se afastar com a cadeira.
Iskahn estendeu a mão e segurou seu ombro.
— Isso é perfeito. Depois dos cavaleiros, você pode ir ao salão de treinamento dos pugilistas também. Há muitos lá que duvidam de sua verdadeira habilidade, e preciso que você lhes mostre a Lei do Poder.
— P-prefiro não! Mudei de ideia; quero ser um burocrata!
“Oh, céus! Acho que ele não vai escapar desta!” — pensou Ronie, divertindo-se com o pânico de Kirito.
Kirito e Ronie usaram o banheiro privativo de Sheyta e Iskahn para tirar a poeira da viagem, assim como lavar os rostos, e foram levados para quartos de hóspedes no mesmo andar do palácio. Sua visita não anunciada foi explicada ao resto da equipe como uma comitiva de enviados urgentes.
Não foi mencionado que Kirito era o delegado espadachim do Reino Humano. Então, os guardas olharam para sua armadura leve com desconfiança — enviados normalmente não andavam armados — mas mudaram de atitude quando notaram as armas que os dois carregavam. Objetos Divinos eram ainda mais raros no Território Sombrio do que em Centoria.
Eles descansaram um pouco nos dois quartos de hóspedes adjacentes. Depois, se juntaram a Iskahn e Sheyta para o almoço à tarde. Foram guiados por Obsidia até o quartel-general da cavalaria sombria e da guilda dos pugilistas de carruagem à tarde. Kirito quase foi colocado em uma luta com o enorme vice-capitão de um braço só da guilda dos pugilistas, mas, por pouco, conseguiu se safar argumentando:
— Estou apenas em missão secreta!
Depois disso, visitaram o Mercado Central e o Grande Coliseu, mas é claro, o dia inteiro não foi apenas sobre turismo. Kirito e Iskahn passaram grande parte da viagem trocando opiniões sobre o incidente e o negócio de intercâmbio cultural, e Ronie esteve sempre vigilante em seu dever como guarda-costas. Claro, com a Elite Cavaleira da Integridade Sheyta, a Silenciosa, junto, era improvável que os serviços de Ronie fossem necessários.
Nesse ponto, um pensamento tardio lhe ocorreu. Quando Sheyta descera em Yoiyobi, e ao longo de sua viagem pela cidade, ela não estivera usando uma espada. Enquanto a carruagem voltava lentamente em direção ao palácio, Ronie se moveu pelo longo banco na direção de Sheyta.
— Hum, Lady Sheyta? Você não está com uma espada…?
Os olhos da cavaleira se estreitaram brevemente com uma reminiscência afetuosa.
— Não. A Espada Lírio Negro foi minha primeira e última lâmina.
— …
Ronie ainda não conseguia entender bem o que significava para uma Cavaleira da Integridade perder a arma divina com a qual seu coração e alma estavam fundidos.
Ela não tinha nenhuma pergunta complementar. Então, Sheyta tocou a mão de Ronie de forma tranquilizadora e sorriu.
— Não sou mais Silenciosa. Sou Sheyta, a Desarmada. E estou muito feliz com isso… embora haja momentos em que me lembro do Lírio Negro e sinto saudade.
— Ah,… entendo.
“Eu nunca poderia imaginar as alturas distantes que ela habita” — a aprendiz percebeu naquele momento.
Então foi a vez de Sheyta fazer uma pergunta inesperada.
— Você acabou de pegar essa espada?
— S-sim… Isso mesmo. Ainda não lhe dei um nome. — Ronie admitiu. Ela traçou o cabo prateado.
— Entendo. Seus laços com ela ainda são superficiais, mas é uma espada muito boa. Valorize-a… porque as guerras podem acabar, mas as batalhas de um cavaleiro nunca terminam.
— Sim, senhora! — Ronie disse com firmeza. Do outro lado, Kirito e Iskahn olharam surpresos.
Eventualmente, a carruagem passou pela cidade-castelo e cruzou a ponte até o portão que era a fronteira oficial do Palácio de Obsidia.
Com quinhentos mels de altura, o palácio estava longe da altura da Catedral Central, mas ainda tinha cinquenta andares, ao todo. Não possuía, no entanto, uma plataforma de levitação automatizada para transportar pessoas para cima e para baixo. As escadas eram o único meio de chegar aos níveis superiores, mas dizia-se que isso também servia como contramedida contra ataques.
Os quatro subiram sem parar até o quadragésimo nono andar, onde Iskahn e Sheyta viviam. Kirito e o casal não se cansaram com a viagem, mas Ronie ficou ofegante por um minuto ou dois depois que pararam — um sinal de que ela precisava de mais melhorias físicas.
Ela agradeceu aos três por esperarem enquanto recuperava o fôlego, mas, então, notou que a grande escadaria continuava mais para cima.
— Hum… Lady Sheyta, o que há acima de nós?
Foi o Comandante Supremo, não a Embaixadora Plenipotenciária, quem respondeu à pergunta.
— O quinquagésimo andar é a sala do trono. Embora eu só tenha entrado uma ou duas vezes.
— Sala do trono…? Para o imperador? — Kirito perguntou.
Iskahn fez uma careta e assentiu.
— Isso mesmo. Quando o Imperador Vecta apareceu há mais ou menos um ano, aconteceu no andar logo acima de nós.
— P-podemos ir ver…? ele perguntou, com a curiosidade estampada no rosto.
Iskahn abriu as mãos.
— Eu ofereceria, claro… mas no momento em que Vecta morreu — no momento em que você o matou — a porta para o quinquagésimo andar foi trancada novamente pelas Correntes de Selamento, e não há nada que se possa fazer para rompê-las. Há uma lenda que diz que se pode ver as Montanhas do Fim e o Portão Oriental do quinquagésimo andar. Então, eu gostaria de poder entrar de novo.
A Cavaleira da Integridade de quem se dizia que “não havia nada que ela não pudesse cortar” assentiu severamente.
— Peguei emprestada uma espada do tesouro para testar, e não consegui cortar as correntes. Poderia ter feito isso com um único golpe com a Espada Lírio Negro, no entanto.
— Hmm…
Ficou claro para Ronie, pela expressão no rosto de Kirito, que ele realmente queria tentar algo com a Lâmina do Céu Noturno. Então, ela rapidamente puxou sua manga duas vezes. Ele captou os sinais mentais de “Não se atreva!!” dela e recuou, mas não antes de um último olhar saudoso para a escadaria.
— Tudo bem. Acho que terei que esquecer de ver a sala do trono.
— Vou compensá-lo, no entanto. Prepararemos um jantar com todo tipo de coisas que você nunca comeu antes.
— Isso parece divertido. — Kirito concordou.
Percebendo que a conversa havia terminado, Sheyta deu um passo para trás.
— Vou dar o leite de Leazetta agora. Vejo vocês no jantar.
— Opa! Tenho que ir com você. Só vi o rosto da minha filhinha uma vez hoje.
Os dois novos pais partiram. Kirito acenou para eles enquanto iam; depois, deu outra olhada para as escadas do último andar. Ronie apenas balançou a cabeça em silêncio.
— Eu sei, eu sei. — Ele disse, sorrindo. — Vamos… Voltemos para nossos quartos.
Tradução: Gabriella
Revisão: Fabio_Reis
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