Nosso destino era a praça central.
E lá estava ela, deitada bem no meio das fileiras de corpos. Um pano branco a cobria, garantindo que não fosse facilmente identificada – por mim ou por qualquer outra pessoa. Há-há. E eu me perguntando onde ela estava… Isso não é engraçado.
Abra seus olhos.
Eu não podia acreditar.
Abra seus olhos.
Eu não queria acreditar. Por quê? Por que acabou assim…?
Ao meu lado, pude ouvir Gobta gritando e soluçando:
— Gobzoooooooooooo?!
O mais alto que conseguiu. Não liguei para ele enquanto meus ouvidos se voltavam para a explicação de uma voz que me parecia distante.
Shion estava protegendo uma criança visada por um dos invasores. Ela fez isso com seu próprio corpo, enfraquecido pela baixa quantidade de magículas. Ela não conseguia se mover, e então um agressor veio…
Gobzo estava tentando proteger a Senhorita Shuna.
Ele não tinha força para isso.
O agressor apenas riu dele enquanto balançava…
As palavras eram para mim, mas eu não queria ouvi-las. Cada uma de suas sílabas invadiu meu cérebro. Abra os olhos Shion… Eu queria chorar, mas não conseguia. Meu coração parecia prestes a explodir, mas este corpo não sentia a necessidade de derramar lágrimas.
Sim, pensei. Acho que eu realmente sou um monstro. De alguma forma, parecia tão convincente agora.
— Eu sinto muito. Me deixem sozinho por um tempo…
O silêncio tomou conta da praça. Eu podia sentir todos se afastando de mim. Shuna foi a única a me dar um abraço choroso antes de se juntar a eles ao lado de Gobta. Hakuro estava com as mãos em seus ombros. Desculpe, Gobta. Sei que você só quer dizer adeus ao Gobzo, mas…
… É. Eu queria ficar sozinho. Eu não tinha mais controle sobre mim mesmo. Senti como se estivesse enlouquecendo, mas minha mente ainda estava afiada como uma faca. Havia níveis tempestuosos de tristeza, arrependimento e raiva, todos colidindo uns contra os outros em uma competição louca para encontrar uma saída.
— Por que tudo isso aconteceu?
Relatório. Impossível calcular, compreender ou responder.
— Qual seria a coisa certa a fazer?
Relatório. Impossível calcular, compreender ou responder.
— Nos envolver com seres humanos foi um erro?
Relatório. Impossível calcular, compreender ou responder.
— Me responda… Eu estava errado?
Relatório. Impossível calcular, compreender ou responder.
Entendo. Mesmo com os poderes inimagináveis do Grande Sábio, havia alguns problemas que simplesmente não tinham resposta.
Que desgraça. Se esta não fosse a nossa cidade… se esta não fosse a nossa cidade, eu poderia simplesmente ceder ao ódio e ceifar tudo em meu caminho. Maldito seja este mundo. Levando tantas pessoas queridas para mim…
Olhando para trás, esta foi a primeira vez que estive lá para ver alguém próximo a mim morrer. Eu nunca havia passado por uma perda como esta e agora entendia a tristeza envolvida. Senti ela na pele, com uma dor tão, mas tão intensa que a Dor Ignorada não era o bastante – não contra as fortes correntes de magia e emoção dentro de mim.
Talvez fosse demais para minha máscara nova. Uma rachadura apareceu nela, quase igual a uma lágrima de tristeza. Eu não conseguia chorar, então parecia que a máscara fazia isso por mim.
Em algum momento, a noite caiu. Eu olhei para a lua.
O que devo fazer?
Não houve resposta. Minha mente estava lúcida, mas não conseguia pensar em nada. Eu olhei para a lua e continuei me perguntando, repetidamente, por uma eternidade. Mesmo sabendo que não havia como encontrar uma resposta. Mas eu não conseguia parar.
E eu nunca notei a pequena luz, o reflexo da lua, que pairava sobre mim.
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Três dias se passaram. Shion não acordou. Ela está dormindo tarde demais. Eu gostaria que ela parasse com isso.
………….
Não, eu sei. Eu sabia que ela nunca mais abriria os olhos, mas não queria admitir. Eu queria que ela voltasse a fazer suas travessuras estúpidas de sempre; a fazer suas refeições terríveis. Gobzo também. Eu não o conhecia muito bem. Trocamos algumas palavras no caminho para o Reino dos Anões, mas Gobta o amava como um camarada precioso. Ele era seu amigo.
Todos os monstros que viviam aqui tinham relacionamentos valiosos em suas vidas. Não era como se fossem monstros sem nenhum tipo de sentimento. Eles eram os meus companheiros mais queridos. Minha família. Eu queria aproveitar a vida com eles mais uma vez… mas isso simplesmente não iria acontecer.
Não há como ressuscitar os mortos.
O que devemos fazer?
Os monstros não contam como pessoas? Isso significa que seremos forçados à subjugação sem pensarem nem uma vez sequer em nossos próprios sentimentos? Isso significa que eles também estão preparados para serem subjugados. Emoções sombrias começaram a tomar conta de mim.
E então:
Relatório. Concluída a Análise e a Avaliação da barreira composta e da Magia Superior: Área Anti-magia que a cobre. Remover a barreira composta será difícil, mas a Magia Superior pode ser cancelada.
Executar?
Sim
Não
Não, ainda não é necessário. O Grande Sábio deve ter acabado de terminar esse pedido para mim. Ao fazer isso, percebi que as mensagens da Comunicação de Pensamento já vinham chegando através do Fio de Aço Pegajoso enrolado em meu pescoço há algum tempo. Eu fui contatado sem parar nos últimos três dias. Fiz Soei se preocupar comigo, me arrependi disso.
— … Desculpe. Eu nem tinha notado.
— Ah…! Você está seguro? Estou tão aliviado.
Ficou claro pelo tom de voz de Soei que ele estava bem aflito. Também me fez perceber que todos os outros deviam estar igualmente preocupados. Eu poderia reclamar e lamentar para mim mesmo mais tarde. Tínhamos um limite de tempo e havia coisas que eu precisava fazer.
Então pedi para Soei me atualizar sobre a situação. Nossos inimigos montaram acampamentos nas quatro direções cardeais ao redor da cidade, cada um com uma companhia de cavaleiros. As maquinações mágicas que protegiam cada um aparentemente projetavam o mesmo tipo de barreira que enfraqueceu os residentes de Tempest. Infelizmente o poder de Soei e sua equipe por si só não era o suficiente para derrubar nem mesmo um desses acampamentos. Ele também detectou o uso de magia de transporte; se demorássemos demais, reforços poderiam ser chamados.
— Tudo bem. Não tente fazer tantas coisas ao mesmo tempo. Junte-se ao Gabil e descanse.
— Mas…
— Isso é uma ordem. Descanse.
— … Sim, meu senhor.
Eu não ia aceitar nenhuma outra resposta. Eu não podia deixar a equipe de Soei fazer algo imprudente e matá-los no processo. Simplesmente não conseguia.
Então, sobre aquela barreira.
Apenas cancelar a magia não nos ajudaria em nada. O que eu realmente queria fazer era neutralizar o efeito enfraquecedor que ela causava. Ser uma barreira “composta” ou o que quer que fosse tornava a questão muito mais complicada do que eu imaginava.
Mas isso podia esperar. E sobre a outra busca que eu estava fazendo?
Relatório. Nenhuma solução foi encontrada. Falha ao encontrar qualquer magia relacionada à ressurreição completa dos mortos.
… Ah. Não, acho que não. Algo tão conveniente não pode ser encontrado tão facilmente. Faz sentido. Mas nunca se tem certeza antes de tentar. Por mais inútil eu pensasse que fosse, por mais sem sentido que esse esforço pudesse parecer, não consegui me conter.
Shion não abriu os olhos. Nem Gobzo, nem ninguém. Claro que não. Eles não estavam dormindo.
Mas eu ainda usarei tudo ao meu alcance para tentar encontrar alguma solução. Todos os corpos, incluindo da Shion, estavam sendo preservados pela minha força mágica – para evitar que se decomponham, voltem a se transformar em punhados de magículas e desapareçam. Eu sabia que era inútil, mas ainda estava apostando na possibilidade.
Porém, não deu em nada.
Não havia feitiços de ressurreição nos livros de magia que examinei naquela biblioteca. Acho que não vai ter mesmo. Tenho que parar de sofrer assim. Vamos apenas dar a eles o descanso que merecem em meu corpo, enquanto oro para que acordem algum dia.
Ao decidir isso, me prepararei para absorver todos eles – e foi quando meu Sentido Mágico me alertou sobre vários indivíduos se aproximando.
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Era o trio de Kabal e seus amigos. Faz sentido. Com a ordem que dei, teria que ser alguém de fora da cidade chegando perto de mim agora. Acho que eles estiveram viajando dia e noite na carroça que lhes dei para virem aqui.
— Desculpe pelo atraso, chefe.
— Rimuru, hum, não sei nem o que dizer…
Kabal e Gido sem dúvida queriam falar: Calma cara, você vai superar isso. Esse tipo de coisa. Elen os deteve antes que pudessem.
— Rimuru, eu… não posso garantir que a chance de sucesso seja alta…. nem que ela exista… mas existem vários contos de fadas sobre como voltar à vida…
Agora não era hora de ficar deprimido. A declaração fez com que minha mente confusa e perdida voltasse ao normal.
— Você pode me contar mais sobre eles, Elen?
Eu me virei para ela. Se houvesse alguma chance, eu não iria deixar de tentar. Ela balançou a cabeça em concordância e começou a falar.
………..
……
…
É uma história sobre uma garota e seu companheiro dragão. Devido a diversos acontecimentos, o dragão da garota foi morto. Ela lamentou a perda de seu único amigo e, com o coração cheio de ódio, trouxe a ruína ao país que o matou – massacrando as várias centenas de milhares de pessoas que viviam lá.
A garota evoluiu para uma lorde demônio, e então um milagre aconteceu – o dragão ligado a ela evoluiu bem ao seu lado, mesmo estando morto. Mas esse foi o fim do milagre. O dragão havia perdido a alma no momento em que morreu e, como resultado, reviveu na forma de um dragão do caos. Ele ainda seguia as ordens de sua mestra, mas agora não trazia nada além de morte e destruição.
Não mais movida pela raiva, a lorde demônio derramou lágrimas por seu companheiro, seu melhor amigo, enquanto o selava sozinha. E esse é o fim da história.
A história de Elen era um conto de fadas, mas tinha muitos detalhes para ser apenas isso. Também havia relatos de vampiros usando um feitiço chamado Linhagem de Sangue, bem como necromantes usando Ascensão dos Mortos em cadáveres para torná-los seus servos. O Grande Sábio sabia disso tanto quanto eu, mas não era o que eu estava procurando. Eles mudam muito o alvo, tornando-o uma pessoa diferente de quando estava viva.
No reino da magia sagrada, havia algo denominado Ressurreição, o assim chamado milagre dos deuses… mas tinha uma tonelada de restrições sobre isso. Não era uma panaceia. Além disso, todas estas magias (exceto Linhagem de Sangue, que era exclusiva da espécie) foram classificados como “feitiços proibidos”, passados apenas oralmente e nunca escritos em livros.
Mas isso não importa. A questão era aquela coisa de “evoluir”. Monstros evoluem toda hora por motivos que não compreendo. Apenas lhes dar um nome já era motivo de comemoração. Talvez houvesse algo a mais aí? Talvez se eu pudesse me tornar um lorde demônio…
…. Assim como o companheiro daquela garota evoluiu e reviveu…
Mas eu não queria lacaios assustadores e sem alma em minhas mãos. E nem mesmo o Grande Sábio poderia usar suas ferramentas de análise para determinar se suas almas ainda estavam lá ou não.
Mas… Pera aí. No momento, esta cidade está completamente coberta por uma barreira que nenhum monstro pode atravessar. Talvez ela esteja mantendo suas almas aqui também, impedindo-as de voar aos quatro ventos.
Entendido. As chances das almas de Shion e do resto dos monstros serem preservadas neste espaço é de… 3,14 por cento.
Meu deus! É o número pi!
Bem, ok, talvez não exato. Parecia um número baixo para mim, mas eu tinha que pensar sobre isso por outro ângulo. Quero dizer, são 3 por cento de chance de ser literalmente capaz de ressuscitar alguém. Além disso, não tem como uma pessoa tão tenaz como Shion ou tão idiota quanto Gobzo morrer. Eu não podia deixar isso acontecer. Eles deviam estar lutando com todas as suas forças para se manterem neste mundo, esperando minha ajuda.
Finalmente eu tinha alguma esperança. Agora só teria que torná-la real. Claro, presumindo que eu poderia até mesmo me tornar um lorde demônio…
Entendido. Atualmente você atende os requisitos para evoluir para um lorde demônio. A fim que a evolução para um “lorde demônio verdadeiro” tenha sucesso é necessário o sacrifício de pelo menos dez mil humanos.
Oh, é isso? Bem, fácil demais então. Lorde demônio? Há, tá no papo. Processo muito mais simples do que eu imaginava. Com sorte, aquelas escórias nos arredores da cidade somam pelo menos mais de mil. Que se foda também, se não houver o suficiente vou apenas adicionar mais alguns. Se isso trouxer Shion e todos os outros de volta, não tenho nenhuma razão para hesitar.
E então voltei aos meus sentidos.
— Obrigado por me contar sobre isso. Mas você tem certeza do que disse? Quero dizer, você está basicamente me dizendo para me tornar um lorde demônio.
Eu olhei para Elen. Ela olhou para o chão em silêncio, mas apenas por um momento enquanto se decidia. Em seguida, olhou de volta em meus olhos com o rosto decidido.
— Bem, como sabe, eu venho da Dinastia Feiticeira de Thalion, e… eu realmente admiro os aventureiros e a liberdade que eles têm. Mas quer saber de uma coisa? Chega. Quero ajudar Shion também. Não posso deixar Farmus e a Santa Igreja Ocidental se safarem depois de terem feito isso. Eu odeio as pessoas que pensam que os monstros são maus só por serem monstros. Eu sei que não tem como voltar atrás com minhas palavras, masssss… não sei. É simplesmente horrível, eu acho, deixar as coisas assim.
Ela também explicou que continuar a ser aventureiros colocaria uma pressão indevida sobre a Guilda Livre, então ela queria mudar o “lar” do seu grupo para nossa nação. Viver aqui mesmo, se possível.
Ao que parecia o nome verdadeiro de Elen era Ellewyn, e ela vinha de uma família nobre de Thalion. Depois de ser treinada na academia real, deixou o país em busca de uma carreira de aventureira.
A revelação fez Kabal balançar a cabeça silenciosamente e Gido levantar a sua em direção ao céu com os olhos fechados.
— Ah, bem — disse Kabal. — Se é isso que a senhorita quer, seu guarda-costas não tem nada a reclamar.
— Eu também não. Acho que será “senhorita Elen” a partir de agora, hein?
Os outros dois, ao que parece, também não eram aventureiros normais. Após mais algumas perguntas, Kabal e Gido revelaram que haviam seguido Elen para fora de Thalion para servir como seus guardas pessoais. Eles também eram bons amigos, obviamente, dado como confiavam nela sem questionar. Que trio admirável. Até senti um pouco de ciúmes deles.
— Então, hum, provavelmente quando você se tornar um lorde demônio, Rimuru, vai ficar na cara muito rápido que eu que te contei sobre a história. A agência de espionagem de Thalion já sabe que estou envolvida com você, então não demorará muito tempo até que eles liguem os pontos. Até lá, quero ajudá-lo o máximo que eu puder aqui. Quero ver como tudo vai acabar no fim.
Ela sabia que não viveria como uma livre aventureira por muito mais tempo. E queria usar seu último pedaço de liberdade em Tempest.
Todos os três olharam para mim, com os rostos sérios. Se eu permitisse que vivessem aqui, isso poderia me forçar a me envolver com Thalion no futuro. Eu não sabia como reagiriam quando soubessem disso, mas eles não podiam simplesmente ignorar alguém de sua nobreza sob custódia de uma nação estrangeira. Porém, não parecia que ela estava em perigo real, e tudo que Elen queria agora era ver esta batalha de perto… eu não tinha certeza do que pensava sobre isso, mas era uma questão que poderíamos deixar para resolver mais tarde.
— Ok. Bem, vamos deixar isso para o futuro. Eu meio que gostaria de evitar fazer mais inimigos do que o necessário…
— Oh? Ah, mas está tudo bem se eu ficar por aqui por tempo o suficiente para ver se você conseguirá salvar Shion?
— Não tem problema. Afinal, foi você quem me deu essa fagulha de esperança. Pode ficar aqui até que tudo acabe. Mas entenda que me tornar um lorde demônio pode me mudar. Posso até acabar atacando vocês. Não consigo assumir a responsabilidade se acontecer. Estão de acordo com isso?
— Hmm… Não quero nem imaginar, não, mas é um pouco tarde demais para me preocupar agora! Vou ter que acreditar em você, Senhor Rimuru!
— Há-há! Estamos envolvidos até o pescoço agora, não é? Eu diria que demorou um pouco demais.
— Realmente, Gido. Demorou até demais. Essa é a Senhorita Elen que a gente conhece, não acha? Padrão ela fazer uma coisa dessa.
Os dois guarda-costas suspiraram. No entanto, isso não pareceu afetar sua lealdade. Graças a tudo isso, eu finalmente tinha um plano. Eu poderia salvar Shion, Gobzo e todos os outros! E se isso significasse me tornar um lorde demônio, então estou dentro. As forças inimigas atacariam em quatro dias. Eu tinha um bom entendimento da situação. Agora era hora de agir.
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Com a decisão tomada, as coisas poderiam progredir mais rápido.
O primeiro passo era impedir que todas as almas desses monstros se dissipassem. Para tal, ajustei a magia superior que adquiri com Analisar e Avaliar e a usei para fortalecer a barreira ao redor da cidade. Não estava exatamente claro quanto tempo a magia de Mjurran duraria, e eu estava com medo de que ela sumisse do nada e deixasse as almas escapar. Me custou uma quantidade surpreendentemente vasta de magículas, mas não era nada com o que eu não pudesse lidar agora.
Comparado com o desespero sem fim que senti nos últimos dias, hoje eu transbordava de energia. Ainda bem que pensei em analisar essa barreira, embora não tenha visto muito sentido no início. Isso conectou tudo muito bem, abrindo as portas para a grande chance de trazer Shion e o resto de volta.
Ter usado aquela magia superior fez com que Benimaru e os outros viessem correndo em minha direção chocados, é claro.
— Senhor Rimuru, o que você…?
— Benimaru, reúna todos aqui! Vou realizar uma conferência para decidirmos nossos planos futuros!
— Qu…?! Sim, meu senhor!
Eles saíram correndo, minhas ordens motivando seus passos.
— Elen, Kabal, Gido… me desculpe por ter feito todos vocês se preocuparem. Estou muito melhor agora.
— Rimuru…
Sorri para Elen enquanto colocava minha máscara rachada de volta no bolso. O show pareceu aliviá-los também.
— Se houver algo que possamos fazer — disse Elen —, é só nos falar!
— Heh heh! Sim, você tem nos ajudado tanto. Agora é a hora de retribuirmos!
— Pode crê, Kabal!
Fiquei feliz em ouvir isso. Eu gostei, mas não queria que o trio participasse ativamente da guerra por mim. No entanto, ainda queria que eles explicassem a situação mais uma vez na conferência. Queria todos nós, não apenas eu, trabalhando juntos.
— Ok — eu disse antes de deixá-los. — Vocês se importariam de se juntarem a mim na conferência, então? Tenho algo para lidar enquanto isso.
Então caminhei em direção aos aposentos ocupados por Yohm e sua equipe. Yohm pareceu confuso ao me ver quando entrei pela porta.
— R-Rimuru?!
— Eu decidi sobre a punição de Mjurran. Onde ela está?
— Hum, descansando lá em cima, mas…
A palavra punição o inquietou ainda mais. Eu me senti mal por isso, mas o que eu tinha em mente não era algo que pudesse dizer a ele. Pelo menos ainda não.
No momento em que subi as escadas, encarei Mjurran e disse.
— Mjurran, você vai morrer por mim.
— Ei?!
Eu ouvi Yohm gritar, mas o ignorei. Mjurran olhou para mim, com os olhos cheios de surpresa, porém, me deu um aceno resignado. Ela estava preparada para esta eventualidade.
— Senhor Rimuru, que
Gruecith tentou me impedir, mas eu não ia deixar. Então Yohm ficou entre ela e eu.
— Sinto muito, amigo. Mas estou aqui para protegê-la!
Ele sabia que não tinha a menor chance, mas ainda tentou resistir a mim. Yohm é um cara tão legal quando age assim. Não estou nem brincando.
Então amarrei ele e o Gruecith com o Fio de Aço Pegajoso.
— Rimuru, por favor!!
Mjurran deu-lhes um leve sorriso.
— Eu te amei, Yohm. Você é a primeira pessoa por quem me apaixonei em toda a minha vida. Se a reencarnação for real, espero poder viver ao seu lado na minha próxima vida… Adeus, Yohm. Tente não se apaixonar por uma mulher má da próxima vez, ok?
Ela sorriu mais uma vez, e então fechou os olhos. Amei este desfecho. Não se vê mulheres tão boas quanto ela frequentemente. Sendo honesto, fazer isso estava me deixando extremamente culpado… Mas ei.
Então, sem hesitar, mergulhei minha mão direto no peito de Mjurran em um movimento cortante. Sua cabeça tombou para frente, impotente, enquanto Yohm e Gruecith gritavam. Então – com uma expressão de total confusão e perplexidade no rosto – ela abriu os olhos mais uma vez.
— Hã… Eu não morri. Isso nem doeu.
É. Sei que eu disse que ela morreria por mim, mas não planejava matá-la. Você ouve histórias sobre pessoas morrendo e voltando à vida o tempo todo, não? Eu tinha um monte de pessoas que precisava vivas novamente, incluindo Shion, e achei que deveria tentar a sorte aumentando um pouco as probabilidades de isso acontecer.
— Acho que você morreu por uns três segundos?
— … Hã?
— Quê-?
— Como assim?
Relatório. O coração artificial de Mjurran funciona de maneira regular e adequada.
Ufa. Deu tudo certo. Com a confirmação do Sábio, retirei minha mão do peito de Mjurran.
— Bem, a operação foi um sucesso, eu acho, então agora me deixem explicar o que fiz. Vocês não precisam ficar me olhando desse jeito, pessoal. Vamos, sentem-se e relaxem se quiser.
— Ei, cara, que porra é essa que você tá falando?
— É melhor haver uma boa explicação para isso — resmungou Gruecith.
Olhe para eles! Chorando até há pouco e agora choramingando e reclamando. Mjurran, entretanto, estava tão calma como sempre.
— Calem a boca, pessoal! Mjurran vai rir de vocês se continuarem assim. Então o negócio é: o coração temporário dentro dela estava sendo usado como uma escuta para Clayman. É um método de comunicação criptografado que funciona com sinais elétricos e magnetismo natural, então não tem nenhuma magia envolvida.
Em essência, além de proporcionar um pulso e sinais elétricos para o corpo, seu coração também emitia sinais criptografados que percorriam a Terra e chegavam até Clayman. Ele a obrigava a enviar relatórios detalhados apenas para ter certeza de que ela nunca notaria isso.
Era um truque dissimulado digno de um lorde demônio. Aqueles rumores sobre como ele tratava sua equipe eram verdadeiros. Mas eu tinha que admitir, se Clayman fazia a mesma coisa que fez com Mjurran com todos os seus outros subordinados, então ele tem que lidar com uma vasta quantidade de informações codificadas e desvendar tudo mentalmente. Não é à toa que o chamam de Mestre Marionetista. É essa enorme rede de dados que ele coleta que servem como “fios” invisíveis em seus fantoches.
Foi uma coincidência engraçada eu ter conseguido notar isso. Ou talvez nem tanto, na verdade. Essa poderia ser considerada a prova de que Shion ainda está me ajudando. Quando usei aquela magia superior para evitar que as almas se perdessem, o Grande Sábio descobriu um sinal puramente eletrônico ao qual a barreira reagiu. Era fácil decifrar a mensagem decodificada, então imaginei que poderia usar aquele dispositivo para enganar Clayman e fazê-lo pensar que matei Mjurran.
— … Foi tudo apenas uma brincadeira da minha parte! Desculpe!
— Apenas uma brincadeira?! Caralho, cara!!
— Calma, Yohm! Não era algo com que ele pudesse lidar facilmente! Quero dizer, esse é todo o segredo por trás do poder do lorde demônio Clayman! Algo que ninguém mais sabe!
E lá vamos nós de novo. Que inferno.
— Não vamos nos preocupar com os detalhes, tudo bem assim, pessoal? Então, Mjurran! Acho que realmente existe algo como reencarnação, hein?
— … O quê?
Foi nesse momento que ela percebeu que a maldição sobre sua vida desapareceu.
— Você é uma mulher livre agora, Mjurran. Bem, mais ou menos. Antes disso, tenho um favor a pedir.
Ela se virou para mim, ainda não totalmente ciente do que estava acontecendo.
— Me peça qualquer coisa. Se deseja minha lealdade, eu a darei com prazer.
— Nah, precisa não. Na verdade, tem uma chance de conseguirmos ressuscitar Shion e todos os outros – assim como você morreu e voltou, sabe? E eu quero que me ajude com isso.
— Hã?
— Ressuscitar?
— Como? — Perguntou Gruecith. — Ressuscitar os mortos não é possível nem para nascidos da magia de alto nível como eu.
— É apenas uma hipótese por enquanto. Mas vou fazer acontecer.
Sim. Apenas uma possibilidade. Mas eu nunca me poderia me permitir estragar tudo. Eu faria tudo que pudesse para aumentar minhas chances e, para isso, precisava de Mjurran.
— Mas — eu disse —, se tudo der certo, o que você vai fazer depois disso?
— Bem… eu posso ser livre, mas se estiver limitada a uma curta vida humana de agora em diante… talvez eu não me importe de ficar um pouco confinada, afinal.
Ela olhou para Yohm de uma forma que o fez corar da maneira mais fofa possível. Até suas bochechas ficaram vermelhas. Mas eu me senti um pouco mal por Gruecith. Ele havia sido rejeitado, pura e simplesmente assim.
— Vamos lá, se anime!
— Não sorria para mim desse jeito! — Ele protestou. — Além disso, Yohm é humano, então ele viverá o quê? Uns cem anos? Depois disso é a minha vez!
— Que porra você está falando? Era nessa merda que você estava pensando, seu vira-lata?
— Cale a boca! Se você não gosta disso, tente viver mais do que eu.
— Seu pedaço de bosta! Você pode uivar o quanto quiser, mas seu mestre Carillon permitiria isso?!
— Há! Lorde Carillon é um líder generoso. Ele me pediu para ampliar os horizontes aqui. Minha lealdade está com ele, mas não é como se eu fosse forçado a ficar no Reino da Feras, sabe!
— Como é que algo assim está ok?!
— Cale a boca!
— … Na verdade, retiro o que eu disse. Fiquei muito triste por um momento.
— Ah, que isso, Mjurran!
Foi uma bagunça completa, mas fez eu sorrir um pouco também. Se fosse em outro momento, ofereceria até uma celebração, mas agora não era hora para isso. Voltei a me concentrar e fui para o próximo tópico.
— A propósito, Yohm, eu tenho um favor para te pedir, também.
— Manda! Eu faço o que quiser, parceiro!
Ótimo. Achei que ele diria isso. Eu estava contando com isso, e foi por tal razão que ajudei Mjurran. Geralmente eu não sou tão calculista assim, mas tudo bem. Não podia me dar o luxo de cometer qualquer erro aqui.
Então:
— Preciso que você seja um rei para mim.
Yohm deu ao meu comentário improvisado um olhar perplexo enquanto eu explicava. Basicamente, era assim: íamos matar todo o exército que nos atacava. Eu me comprometi a isso e não está aberto à discussão. Isso leva à próxima pergunta – o que fazer com Farmus. Devemos matar todas as pessoas naquela nação? Não, não havia o porquê. Quero dizer, a história seria outra se não tivesse sacrifícios o suficiente para me tornar um lorde demônio, mas vamos nos concentrar primeiro em suas forças armadas.
Soei havia relatado que seu número total provavelmente excedia os dez mil. Isso, honestamente, foi um grande alívio. É engraçado agradecer pelo inimigo ter uma força tão grande. Como é certo que mataremos todos eles, não tenho razão para me segurar. Isso tornou as coisas muito mais simples para mim. Eu queria evitar ao máximo ter que matar um civil, então ter uma grande multidão de soldados aglomerados perto de mim atendeu bem às minhas necessidades.
Então, o que acontecerá quando este exército for aniquilado e eu me tornar um lorde demônio? Esse era o problema. Se Farmus continuasse me atacando, eu teria que matá-los, mas, se possível, gostaria de arranjar um armistício em algum momento. No entanto, todos pertencentes à alta elite de Farmus morreriam. Eles têm que assumir a responsabilidade. Claro, isso significava que o núcleo central do governo seria exterminado – colocando o povo em uma situação difícil.
— Entende? E é aí que você entra.
Eu dei a Yohm um olhar autoritário. Seu papel, essencialmente, seria de limpar o governo podre. Eu mataria qualquer um que saísse do país, e ele cuidaria do lixo deixado dentro dele. Também lideraria o povo e assumiria o papel de novo rei – e então construiríamos relações formais um com o outro.
— Heh. Você faz isso parecer fácil. Quero dizer, eu, um rei?
— Vai ser fácil. Olhe para mim! Eu, EU, sou um rei! Você deveria experimentar também.
Rei, lorde demônio, tudo a mesma coisa.
— Yohm, o senhor… Rimuru acredita que você pode fazer isso. Eu prometo que vou te dar todo o meu apoio, então por que não injetar um pouco de adrenalina em sua vida?
M,jurran aparentemente não era fã de homens chatos. Suas palavras motivaram Yohm.
— Vou te ajudar também, Yohm.
— Hã? Você não estava ocupado esperando que eu morresse até agora há pouco, Gruecith?
— Há-há! Do que está falando? Como eu disse, você só precisa viver mais do que eu e tudo ficará bem.
— Pfft. Aí perdi no argumento. Ok, estou dentro!
Ele acenou com a cabeça firmemente para mim enquanto apertávamos as mãos. Algo me dizia que iríamos nos dar bem.
Podíamos acertar os detalhes assim que tudo acabasse. Primeiro, eu tinha que me tornar um lorde demônio. Tinha que trazer Shion e os outros de volta. Quando uma vida é perdida, ela nunca é recuperada, mas eles ainda não estavam perdidos. Havia uma chance.
Eu sou ateu. Não acho que há um Deus por aí. Porém, agora estou disposto a orar. Orar para o ser que controlava todos os milagres. Em outra situação, eu provavelmente riria de uma coisa sem sentido como essa. E talvez fosse sem sentido. Mas, sabe, quando oro, sinto que é real. Que posso acreditar que Shion está bem.
O brilho do luar me iluminou, coruscando levemente em aparente aprovação a minha oração.
Tradução: Another
Revisão: Flash
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