Posso resumir a luta entre Shion e Sufia em uma palavra: intensa.
Ambas eram do tipo que se alegravam com a batalha; verdadeiras berserkers. Não se importavam com os arredores enquanto estavam imersas na luta. Até o momento, estavam em pé de igualdade, com velocidade e força semelhantes. Pelo que eu poderia dizer, no entanto, Sufia possuía um estoque muito maior de magículas. Então imaginei que Shion estaria em desvantagem – mas eu estava enganado.
Ela estava lutando contra Sufia com sua enorme espada ainda na bainha. Era porque não queria matá-la? Ou apenas porque não queria ir com tudo? Acho que não é uma maneira muito inteligente de lidar com um nascido da magia de alto nível. Eu não esperava que Shion entrasse na briga, mas como entrou, eu queria que ela desse tudo de si.
— Shion ficará bem? Ela está lutando na especialidade da oponente, sem desembainhar sua espada…
— Ela ficará bem, Senhor Rimuru. Pode não parecer, mas a única pessoa mais forte que ela é o meu irmão mais velho.
Pelo menos, aos olhos de Shuna, Shion era a número dois entre os ogros magos. Fiquei impressionado que ela foi capaz de entender a luta das duas. Sua habilidade única, Analisar, também não era algo a se desprezar. Ela deve ter visto quão poderosa Sufia era, mas parecia totalmente imperturbável frente a isso. Um sinal de confiança, será?
— Verdade — acrescentou Soei, espreitando dentro da minha sombra. — Em um combate frontal como este, Shion provavelmente me supera, por mais que eu odeie admitir.
Acho que ela era mais do que apenas uma secretária mal qualificada.
Continuamos a observar enquanto conversávamos. Shion e Sufia estavam inteiramente ocupadas em seu combate, testando seus poderes e habilidades uma contra a outra, tentando gradualmente revelar todo seu potencial. A luta continuou em um ritmo acelerado, permanecendo equilibrada em um nível surpreendente.
Entretanto, a batalha de Yohm foi uma exibição de técnicas avançadas sendo usadas umas contra as outras. Ele realmente tinha ficado mais forte. Vários meses o tornaram uma pessoa quase diferente, enquanto fazia jornadas para matar monstros nas florestas, nas cidades e nas vilas de Farmus, seu reino natal. Isso fez seu nome como campeão e lhe rendeu muita experiência. Sem dúvida, estava ficando cada vez mais poderoso. Eu não teria nenhum problema em classificá-lo como rank A.
Poderia perdoar o espectador comum por pensar que ele estava apenas cortando com sua pesada Matadora de Dragões no ar, dependendo inteiramente da força bruta. Mas não estava. Esse ataque foi apenas o primeiro de uma série de movimentos metricamente calculados. Ele esperou que seu inimigo esquivasse, deixando-o desprevenido o suficiente para levantar sua lâmina e conectá-la a um ataque combinado. Ele empunhava aquela Matadora de Dragões como se fosse feita de papelão, suas habilidades e força sobre-humanas o mantinham constantemente no encalço de seu oponente nascido da magia.
Mas Gruecith não estava ali para perder. Continuamente se esquivou dos vários ataques assassinos da espada de Yohm por um mero fio de cabelo. Os cutelos em suas mãos permitiram que ele desencadeasse muitos combos rápidos, como uma bela dança que inevitavelmente encurralou seu inimigo. Poderia dizer que ele era extremamente confiante em sua velocidade.
Ser confrontado por um talentoso nascido da magia não intimidou Yohm. Ele sorriu, obviamente se divertindo. Ser capaz de lutar contra um nascido da magia que o deixou exercer todos os seus poderes permitiu que sentisse exatamente o quanto progrediu.
O ataque seguiu o desvio, e o desvio seguiu o ataque, todos a meros instantes uns dos outros. Gruetich jogou uma faca em Yohm que a evitou facilmente, balançando sua Matadora de Dragões em um clássico movimento de finalização. Mas Gruetich se lançou para frente, caindo no chão para desviar do golpe e escorregando bem entre suas pernas.
Enquanto Yohm girava para persegui-lo, o cutelo de Gruecith voltou para ele, girando de volta para sua mão como um bumerangue. Cruzou as duas lâminas frente ao peito, levando todo o impacto da lâmina gigante do adversário. Foi uma disputa equilibrada, o tipo de batalha épica que faz alguém suspirar de admiração.
— Yohm não é tão ruim — comentei. — Ele está lutando em equilíbrio com aquele nascido da magia…
— De fato — concordou Shuna —, é um esforço notável.
Estava começando a parecer que Yohm teve ainda mais progresso do que eu pensava. Também foi assim com Gobta, as instruções de Hakuro colocaram a velocidade acima de tudo. Se o seu tempo de reação fosse um pouco lento, poderia esperar uma retribuição seriamente dolorosa dele. Não gostou? Então se recomponha e trabalhe suas habilidades de intuição. Essa era a chave para a surpreendente velocidade de reação de Yohm.
Isso e mais uma coisa. Havia um segredo na Exo-Armadura que dei a ele. Era conhecida por seu peso leve e notável capacidade de proteção, mas isso não era tudo – também auxiliava os movimentos do usuário, aumentando seus reflexos. Armas e armaduras infundidas com magículas se modificam com base em quão compatíveis seus donos são – quanto mais as usa, melhores elas se tornam em suas mãos. A Exo-Armadura não era exceção e agora estava totalmente acostumada com o estilo de luta de Yohm. Isso provou que, em vários meses de experiência em batalha, ele havia feito da Exo-Armadura algo verdadeiramente seu.
Esses dois fatores foram o que deram a Yohm a força para não apenas enfrentar o nascido da magia Gruecith, mas também lutar como seu igual.
As duas lutas foram ficando cada vez mais intensas. Os ataques trocados por Shion e Sufia eram ardentes e fervorosos, como se cada uma medisse o quão longe a outra iria.
— Ha-ha-ha! Eu não esperava me divertir tanto.
— Hmph! Me ridicularizou por sua conta em risco, licantropa! Deixe-me mostrar a você o poder destruidor do céu e da terra de um ogro mago!
— Ha-ha-ha-ha-ha! Vá em frente! Torne isso mais emocionante!
O momento decisivo estava se aproximando. Ainda rindo, Sufia golpeou Shion com suas longas garras que brilhavam com um branco pálido, liberando eletricidade – o tipo de habilidade que seria esperado de alguém que pode domar Tigres Trovão, suponho.
Shion estava preparada para isso. Com sua espada ainda embainhada parou as garras infundidas de raios com as mãos nuas. No momento em que o fez, raios de eletricidade percorreram seu corpo como um para-raios. Sua pele grossa os absorveu por completo, prevenindo quaisquer cortes ou queimaduras, e a corrente subiu para a terra sem machucá-la seriamente.
Vendo o que aconteceu, Sufia relutantemente endureceu o olhar em admiração. Seu inimigo tinha acabado de usar o Caminho Diamante, uma das habilidades da Vontade de Batalha dos ogros magos. Isso permitiu a ela controlar sua mente e solidificar seu corpo, quase com a consistência do metal. Sua força de combate protegeu sua pele, dissipando qualquer ataque inimigo. Não é como se fosse uma habilidade para iniciantes, nem é preciso dizer, e mesmo assim Shion conseguiu executá-la perfeitamente em batalha, como um instrutor ensinando seu oponente.
— Se prepare! Agora é minha vez…
— Pode vir! Meu sangue está pegando fogo!
Depois de Sufia, foi a vez de Shion – com Sufia concordando ou não, Shion se preparou, ainda sem armas. Hakuro estava nos ensinando artes marciais com as mãos nuas – mas nada como isso. Parecia que ela estava prestes a lançar um enorme raio de magia de suas mãos, concentrando toda sua autoridade no esforço. Ela devotou toda a sua vontade meio-enlouquecida a se envolver em sua aura, espalhando-a ao seu redor. Se essa fosse uma habilidade de Hakuro, seria uma parte natural de seu conjunto de combate, não essa explosão ostensiva que percorreria cada fibra de seu ser.
Fique com tantas aberturas em um combate e isso apenas dará ao seu oponente a chance de atacar. Mas Sufia apenas ficou ali, de braços abertos, como se fosse uma ação perfeitamente normal de se fazer. Nunca consegui descobrir o que esses maníacos loucos por batalha fariam a seguir.
Agora Shion estava pronta. Para nós na audiência, apenas um curto período de tempo havia passado; para os lutadores teria sido um atraso fatal. Um que Sufia acabara de passar parada ali, sorrindo como se nada estivesse acontecendo. Shion sorriu de volta.
— Desculpe pela espera. Agora, experimente um pouco disso!
A aura que percorreu o caminho em torno de suas mãos formou uma bola temível e destrutiva, que ela estava prestes a lançar…
— Basta!
Quando uma voz nos informou que a batalha havia acabado. Um cajado de ouro foi empurrado de repente diante de Shion. Albis interveio.
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Sua cauda também estava apontada diretamente para Sufia, ela aparentemente poderia liberar um raio de energia próprio. Albis era, de fato, metade humano e metade cobra, a parte superior de seu corpo uma mulher atraente, a metade inferior transformada em um grande réptil cor de ébano.
Essa “transformação” em sua forma bestial aconteceu sem que ninguém percebesse. Até deslizar entre eles não atraiu a atenção de ninguém até o momento em que ela falou. Nem mesmo eu poderia bloquear totalmente a aura que havia sentido antes, e ainda nada disso exalava de seu corpo. Foi impressionante. Os Três Licantropos realmente mereciam a reputação que ostentavam.
Ouvindo o grito de Albis, Grucith cessou imediatamente os ataques. Yohm fez o mesmo, me dando um olhar confuso. Levantei a mão e acenei para ele.
— É o suficiente para você? Significa que passamos?
— Sim. Vocês certamente demonstraram suas habilidades para nós. Não é mesmo, Sufia? Você agora está disposta a reconhecê-los por quem são?
— Estou — respondeu ela com um sorriso claro e sincero. — Não tenho queixas. Eles parecem ser mais do que dignos de serem tratados como iguais, agora acredito firmemente nisso. — Ela se virou para os outros licantropos em sua comitiva. — Acredito que tenham convencido vocês também. Não vou permitir que nenhum de vocês reclamem sobre eles e seus humanos daqui em diante.
Gruecith concordou com a cabeça.
— Você está certa, Senhorita Sufia. São raros os humanos que podem lutar comigo tão bem. Preste a essas pessoas o respeito que merecem!
Ele soltou uma risada alta e calorosa, então estendeu sua mão para Yohm. Seu oponente aceitou isso com um sorriso irônico – e naquele momento tudo ficou resolvido.
As ações de Albis confirmaram isso para mim – eu estava certo sobre suas motivações. Estavam nos testando, nos cumprimentando deliberadamente com hostilidade para avaliar nossa reação. Comecei a suspeitar disso quando Sufia passou a rir de mim por ser um slime. Carillon, seu chefe, já sabia quem eu era, ou o quê era. Ele tinha falado com a maioria dos meus oficiais monstros, e tinha jurado para mim (até por seu próprio nome) que trabalharia em termos amigáveis conosco. Parecia improvável que ele instruísse seus representantes a rirem da situação.
Eu poderia dizer que Sufia estava apenas me usando como uma forma de provocar uma reação agressiva de todos. Ela devia ter pensado que pelo menos um de nós ficaria furioso quando começasse a insultar o mestre.
Também tive outro motivo para suspeitar do comportamento deles. Estavam, de certa forma, revelando muito sobre si mesmos, em meio a toda essa discussão.
Tome seus apelidos como exemplo. Abis se referia a si mesma como a Cobra de Chifres Dourados, e agora eu poderia dizer que era uma maneira bastante literal de colocar as coisas. Cobra na parte inferior do corpo, dois chifres cintilantes saindo de sua cabeça, ramificando-se como os de um dragão e sugerindo todo tipo de segredo não revelado. Sufia, por sua vez, era a Garra do Tigre das Neves, o que sugeria algo felino sobre sua transformação. Ela usou garras eletricamente carregadas durante a luta, então fazia sentido. Phobio, a Presa do Leopardo Negro, presumivelmente se destaca no uso de longas e afiadas presas em combate. Ou talvez tivesse alguma arma escura modelada a partir de uma presa negra. Quem sabe.
Independentemente disso, tudo isso significava que os licantropos eram notavelmente honestos com seus oponentes, usando seus apelidos para revelar os tipos de habilidades que realmente estariam em uma situação melhor se escondessem dos inimigos. Eu acho que estavam orgulhosos de manterem as coisas justas e corretas no ringue – e não havia como desafiarem as ordens de seu mestre, o Lorde Demônio. Sorte minha que meus dois palpites se mostraram corretos.
Isso deixou apenas mais uma coisa para lidar.
— Você está bem com isso, Shion?
Ainda havia uma bola gigantesca de pura energia pairando sobre as mãos estendidas de Shion. Ela olhou para mim, preocupada.
— Não é um problema para mim, Senhor Rimuru… mas o que devo fazer com isso?
Isso seria a bola, presumi.
— Não pode fazer isso desaparecer?
— Não posso… Minha força mágica está no limite.
Olhando de perto, pude ver todo o corpo da Shion começando a tremer. Ela parecia pronta para lançar aquela bomba-relógio de um raio mágico a qualquer momento. Havia lágrimas em seus olhos. Ela não estava mentindo – algo que todo mundo também poderia dizer, a julgar por como de repente estavam mantendo distância. Quem entrou mais em pânico, claro, foi o alvo da bola.
— E-Espere, tenha calma. Lentamente… bem lentamente aponte para cima.
Albis já havia guardado seu cajado e não perdeu tempo para correr – ou mais precisamente, deslizar – para fora da mira. Sufia havia tentado se esquivar, mas a eletricidade de alta voltagem indo e vindo entre ela e Shion tornava isso impossível. O raio infundido no corpo de Sufia estava reagindo com a própria aura da Shion, criando uma espécie de campo de energia do qual ambas tinham problemas para escapar.
— Vamos! Coloque seu coração nisso!
Esta bola estava colocando o temor de deus em Sufia. Eu poderia dizer pela maneira como ela gritou com Shion com todas as forças. Juro, não há nada que eu possa fazer quanto a isso. Condensando todo aquele poder em uma bola tão fortemente concentrada, nem mesmo ela poderia controlá-la…
Saltando dos braços da Shuna, me posicionei agilmente na frente de Shion, me transformando na forma humana e apontando minha mão esquerda para ela.
— Shion! Atire!
— Mas…
— Está tudo bem! Confie em mim!
— S-Sim senhor!
Ela gaguejou, confusa. Mas já estava no seu limite. A gigante bola de magia foi lançada – então, deixando apenas um pequeno brilho para trás, foi absorvida por mim. Pus a habilidade única, Glutão, em ação novamente.
Isso tanto chocou os licantropos quanto aliviou Shion, que caiu exausta no chão. Aplausos explodiram ao nosso redor quando a paz finalmente voltou para o campo de batalha.
Enquanto guiava os oficiais de Carillon, decidi fazer uma pergunta que estava pesando na minha mente por um tempo.
— Diga, o que você pretendia fazer se não aceitássemos seu pequeno desafio?
— Hm? Isso teria sido um problema para nós, não teríamos motivos para reconhecê-los como amigos. Teríamos cancelado tudo, imagino, e tenho certeza de que Lorde Carillon teria entendido perfeitamente.
Mas que livro aberto. Não há segundas intenções com essa gente. Eu estava começando a achar que nos daríamos muito bem em nossas trocas. Certamente me animava pensar assim.
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Naquela noite, realizamos um banquete de boas-vindas para eles. Shuna estava pondo todos os seus esforços em cozinhar para esse evento, e eu mal podia esperar a noite chegar. Também estávamos tomando todo o álcool que tínhamos.
Assim que todos os pratos foram colocados, a festa começou. Gobta, que tinha acabado de sair do serviço de patrulha, fez uma dancinha engraçada, provocando risos estridentes. Hakuro fez uma demonstração mais séria de suas habilidades com a espada, ganhando o respeito dos licantropos na plateia. Todos os anões tentaram cortejar Shuna, apenas para serem abatidos, um por um. Nem é preciso dizer que passaram a afogar suas tristezas depois disso.
Yohm e seus homens, entretanto, já estavam na mesa de jogos. Eu tinha começado a propagar o jogo de mahjong pela cidade como um passatempo, e o mágico Gruecith, tendo recém-lutado contra meu campeão, se juntou à partida por curiosidade.
Eu queria ir direto para lá, mas Shuna me impediu.
— Senhor Rimuru — falou ela com raiva, — você sabe que não tem uma boa mente para o jogo. — Ela me pegou ali, tenho que admitir. Sempre que eu ficava realmente apaixonado por algo, me tornava muito imprudente. Eu poderia seguir as instruções do Sábio, que diziam na minha mente: “Há noventa e nove por cento de chance de a peça do sul estar esperando capturar aquela peça se você a jogar”, mas eu jogaria de qualquer jeito. “Eu sou um homem”. Eu pensaria. “Dane-se as porcentagens! Tenho que avançar!” E eu pagaria por isso todas as vezes.
Uma história muito comum – amar um hobby, mesmo quando é péssimo nele. Pensariam que eu seria inteligente o suficiente para contar com o Grande Sábio para me levar à vitória todas as vezes. Se alguém não mantiver a cabeça fria ao jogar, está fadado a perder muito. Eu sei disso, mas não consigo parar. Sempre acontece.
Esta noite, pelo menos, minha principal responsabilidade era ser um anfitrião amigável. Prestar atenção ao conselho de Shuna e apresentar alguém para os licantropos conversarem. Então me virei para Albis e Sufia… apenas para ser saudado por duas bestas totalmente destruídas. Seus atendentes estavam insistindo para que parassem, mas elas não tinham interesse em ouvir. Albis estava com o rabo enrolado em um barril, mergulhando a cabeça para beber um gole de cada vez. Era conhaque de maçã, doce e suave, mas definitivamente forte. Eu estava planejando guardá-lo para uma sessão de degustação mais refinada, dada sua qualidade premium.
— Quem diabos deu o barril inteiro para ela? — choraminguei para mim mesmo enquanto voltava meus olhos para sua companheira de bebida. Sendo o mais sucinto possível, lá encontrei um grande tigre branco. Não era uma meia criatura, mas Sufia em plena forma animal, lambendo ansiosamente um pouco de hidromel de nossos grandes copos. Isso não vai dar certo, pensei.
Havia cerca de dez barris vazios descartados como se não fosse nada ao lado dela, o que tornava simples calcular o quanto elas haviam bebido. Mas isso não importa. O mel não era o principal produto que Apito colhia para nós; usamos apenas mel retirado de um ninho de abelhas gigantes. Sendo ingredientes totalmente naturais, não tínhamos muito, mas sempre havia mais para colheita. O problema – talvez mais para eles do que para mim – eram essas duas licantropas revelando sua verdadeira identidade, algo que imaginei que seria melhor ficar escondido.
— Ei, ei — chamei em pânico —, acham que deveria mostrar tanto a sua transformação perto das outras pessoas?
Milim tinha compartilhado suas próprias opiniões sobre os licantropos para mim, então eu tinha certeza da resposta. Foi provado rapidamente que eu estava errado.
— Ah, Senhor Rimuru, sinto muito que você tenha que ver esse estado embaraçoso das coisas…
O manso jovem licantropo que me respondeu chamava-se Enrio, um confidente íntimo de Phobio, que veio nessa jornada para me agradecer. Ele havia baixado sua cabeça profundamente para mim várias vezes, cantando meus louvores aos céus por resgatar Phobio da enorme coisa que o levou.
— De fato — continuou ele —, nós, licantropos, variamos em nossas formas e estilos de nossas transformações. Não há nenhuma lei que diga que não podemos mostrá-la, mas… certamente, não as revelamos com frequência para os outros, exceto aqueles em quem confiamos plenamente.
Essa foi uma explicação ainda mais detalhada que aquela dada por Milim.
— Uau, você tem certeza que não é uma informação secreta dos licantropos ou algo do tipo?
— Não, nada disso. Isso não é um segredo. Qualquer nascido da magia de nível superior estaria ciente disso. Além disso — continuou, rindo —, nunca fomos muito bons em guardar segredos.
Ele parecia ser honesto o bastante para mim. O que significava…merda, Milim me enganou, não é? Não era grande coisa, mas ela agiu como se estivesse contando um dos grandes segredos do mundo quando começou a tagarelar. Ela simplesmente roubou meus doces de mim. Pensei que estava a enganando, mas ela estava um passo à minha frente. Melhor manter minha guarda alta, pensei.
Ordenei guiarem os licantropos para seus quartos, cada um com seus próprios barris. Fosse segredo ou não, ainda me sentia um pouco enjoado com as mulheres “se expondo” em público na minha festa e também queria mostrar um pouco de hospitalidade ao resto da turma.
O evento terminou sem contratempos e, na manhã seguinte, as duas beldades chegaram à mesa do café parecendo incrivelmente revigoradas. Nem sinal de ressaca. Nesse mundo, não há uma criatura que consiga beber mais que as duas sem cair de tão bêbada, pensei.
— Ah — começou Albis —, a noite passada foi como um sonho! Uma recepção maravilhosa. Mal posso esperar para contar ao meu mestre sobre tudo que senti.
— Ooh, nunca tomei uma bebida tão agradável. O simples fato de saber que tal coisa existe me deixa confiante de que estamos certos em construir relações com a sua terra.
— Oh, Sufia, pare de ser tão grosseira! Devo admitir, porém, que agradou muito o meu paladar. Não me lembro de ter provado nada tão forte na minha vida. O jantar em si também foi maravilhoso, é claro, mas, ah, aquele licor…
Minha bebida impressionou muito as duas, muito mais do que a comida de Shuna.
Enquanto conversávamos, o tópico voltou-se para nossos problemas com frutas e nossa incapacidade de encontrar pessoas suficientes para cultivá-las e fazer colheitas maiores.
A essa altura, nossa situação alimentar havia melhorado bastante, mas nosso foco ainda era cultivar coisas como trigo e cevada – sem falar nas batatas, que serviam como um ótimo acompanhamento. Também estávamos fazendo experimentos com o cultivo de planta e arroz, com o objetivo de preparar um grão de arroz que se adequasse ao paladar de todos. Fuze e seus homens me disseram que não conheciam nenhum lugar na terra que cultivasse arroz em um ambiente agrícola, então teríamos que construir tudo do zero. Assim que alcançássemos nosso objetivo, eu planejava transformar alguns dos nossos campos de trigo em arrozais e aumentar nosso ritmo de produção.
Devo ressaltar que não estava focado no arroz por razões meramente egoístas. É um alimento básico incrivelmente nutritivo, e mistura-lo com o trigo melhoraria o equilíbrio dos nutrientes que necessitamos. Eu agora sabia que monstros de carne e osso não eram construídos de maneira muito diferente dos humanos, então queria manter nossa produção de alimentos o mais equilibrada possível. Ter arroz também significava que poderíamos fazer vinho de arroz ou saquê em grandes quantidades, então vou admitir que tenho esse pequeno sonho em mente.
Entre isso, aquilo e as outras coisas, o cultivo de frutos se tornou uma prioridade secundária. Simplesmente não havia tempo para desenvolver novas terras agrícolas para isso. Nosso cronograma de desenvolvimento já estava lotado; eu já estava pedindo muito a Geld. Queria a doçura que a fruta traria para nossa dieta, mas não poderíamos pedir tais luxos, não até que estivéssemos mais preparados para encarar futuras crises de fome. Portanto, desisti disso por enquanto.
E, com isso, terminei de dar-lhes o resumo.
— Entendo — observou Albis. — Isso soa como um problema. Será que eu poderia providenciar para que os frutos oferecidos à Eurazania sejam repassados à sua nação? Com isso, você poderia…
Você poderia usar isso para fazer um licor mais interessante para nós, eu praticamente podia ouvi-la dizer isso nas entrelinhas.
— De que porcentagens estamos falando? — perguntei.
— Oh, você pode lidar com os detalhes — respondeu Sufia com um sorriso. —Contanto que eu tenha algo bom para beber, estou satisfeita. O domínio do nosso senhor tem uma grande quantidade de frutas de alta qualidade, então estou ansiosa para ver o que você pode fazer com elas!
Então a responsabilidade é nossa. Eu ficava feliz por isso, já que não estava em posição de divulgar números. Mesmo se elas quisessem apenas um suprimento para si mesmas, sem vender para todo o país, transportar uma quantidade tão grande de bebidas alcoólicas era uma questão logística na qual nem queria pensar.
Seria bom se pudéssemos ter um sistema monetário já em vigor, assim eu não teria que me preocupar com os detalhes de cada troca que fizéssemos. Mas mesmo que o Reino Animal entendesse o conceito, duvido que veriam qualquer necessidade disso. Mas que dor de cabeça.
Então me lembrei que tinha especialistas nesse tipo de problema, não tinha? Os mercadores kobold – passei a chamar seu líder de Koby, para simplificar – mencionaram que comerciavam em todo o domínio de Carillon. Seriam boas pessoas para abordar o assunto. Não há tempo a perder. Vamos trazê-los aqui agora.
Koby geralmente estava estacionado no escritório mercante na cidade de Tempest, então apareceu imediatamente após minha convocação.
— S-Senhor Rimuru, o quê…?
— Certo, então Koby vai enviar uma equipe de mercadores kobold para pegar as frutas, então certifique-se que tenham permissão para viajar por suas terras.
— Excelente — disse Sufia. — Vou garantir a segurança deles na Eurazania.
— Ah, hm, o quê?! E… ahhhh, Senhorita Licantropa?!
— Ótimo, obrigado. Ah, e se houver algo além das nossas bebidas que chame a sua atenção, teremos o maior prazer em vender a você. O que acha?
— Nesse caso — interrompeu Albis, esperando por esse momento —, tenho algo em mente. As roupas que vocês vestem são feitas de um tecido muito fino. A roupa de cama de ontem à noite era de qualidade semelhante, e gostei, parecia tão suave quando tocou minha pele. Eu simplesmente adorei. Se pudermos discutir isso…
Tínhamos acabado de aperfeiçoar a produção em massa da seda mágica a partir dos casulos de mariposas infernais, e parecia que havia ganhado alguns fãs fervorosos. Demos a elas alguns metros de tecido, seus olhos brilhavam enquanto o examinava.
— Por favor, ao menos um pouco!
Não era apenas bonito e macio ao toque, mas também era feito de um material protetor. Eu não estava preparado para dar permissão tão prontamente… mas, isso era uma negociação.
— Então acho que precisam de um pouco disso, Koby. Por mais lindas que sejam, não é de se admirar que essas belas mulheres tenham um gosto tão bom para tecidos.
— N-Não, por favor, espere um momento, senhor! Qual é o significado…?
— Sim, assim como Koby disse, esta é uma especialidade da minha nação. Bem raras e valiosas. Você teria algum produto próprio que proporcionasse uma troca justa?
Eu estava disposto a me desfazer de uma quantidade grande de bebidas e apenas um pedaço de tecido de mariposa infernal em troca do suprimento de frutas. Mas não queria ceder tão facilmente. Alguém tão ativo quanto Koby veria imediatamente os benefícios disso, sem dúvida.
— Bem — disse Albis —, quase tudo o que podemos oferecer agora são essas pedras decorativas. — Ela apontou para uma pequena coleção de pedras que brilhavam em uma gama deslumbrante de cores. Pareciam com os cristais mágicos que os anões refinavam do minério mágico, mas não poderia ser isso – para começar, nem eram de cor escura.
Peguei uma e executei o Analisar e Avaliar. Foi taxada como uma pedra preciosa – o que não deveria ter me surpreendido. Acho que este mundo também tem joias.
— Oh, uma joia, hein? Eu pessoalmente estava esperando que fosse ouro…
— S-Senhor… Senhor Rimuru, esses são licantropos quê…
— Ouro? Nós conseguimos arranjar, certo, Albis?
— Sim, estão guardados em nossos depósitos. Temos pouca utilidade para o que nos é oferecido além de decorar nosso palácio.
— Oh! Posso pedir por isso, então?
Havia toneladas de uso para o ouro. Decoração era uma delas, mas – que diabos, poderíamos simplesmente transportar essas coisas direto para o Reino dos Anões para alimentar a casa da moeda deles, por exemplo. Koby parecia tão animado com isso; com sorte, estava mais feliz com essa troca de agora. Ele estava balançando o rabo de um lado para o outro, então eu sabia que estava ansioso para aproveitar essa oportunidade.
— Aguente firme, Koby! Isso vai ser um grande trabalho para vocês!
— Mas, Senhor Rimuru! Este é um trabalho muito importante!!
Seu grito ecoou pela câmara. Como resposta, dei apenas uma risada.
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Koby logo ficou quieto, talvez resignado com seu destino. Ele percebeu que já estava tudo decidido, e que agora precisava estar pronto para o futuro. Um comerciante exemplar – com ele tudo é flexível!
Passamos rapidamente para os menores detalhes. Eram assuntos que os oficiais licantropos preferiam deixar com seus assistentes; o nascido da magia Enrio estaria cuidando deles. Koby, quando passou a levar isso a sério e agiu como o comerciante que era, logo se atirou de cabeça nas negociações. Enquanto isso, sentimos o cheiro de chá torrado que Shuna estava preparando para nós.
Sem que eu soubesse, descobri que os comerciantes kobold tecnicamente não tinham permissão para entrar no Reino Animal da Eurazania. Não apenas kobolds, o domínio era conhecido como um lugar de grande provação, especialmente para os fracos.
Cada centímetro de terra que o Lorde Demônio Carillon governava era obrigado a fornecer diversos tributos ao governo principal. Isso significava que as terras centrais do domínio tomavam tudo que poderiam desejar como dado. Os mercadores kobold, por sua vez, viajavam pelas cidades e vilas governadas pelas forças centrais, pagando tudo que fosse demandado. Se este novo acordo significasse que passariam de pequenos comerciantes para uma classe de mercadores de pleno direito aos olhos de Carillon, não era de se admirar que a cabeça de Koby estivesse prestes a explodir.
Esse caso se repetiu, mais ou menos, nos domínios dos outros Lordes Demônios. Com a Nação Alada de Fulbrosia – terra de Frey, a Rainha do Céu – monstros de nível baixo não seriam permitidos na cidade, a menos que tivessem asas. Rumores diziam que o espaço da cidade foi formado por camadas esculpidas em uma cadeia de montanhas, subindo até o céu. Como alguém que costumava trabalhar em construção, adoraria ver isso algum dia, mas não parecia que a permissão viria facilmente.
Fazer negócios com o domínio de Milim era um pouco difícil, dada a distância que ficava de nós. Isso fez com que restasse apenas o domínio do Lorde Demônio Clayman, o Mestre Marionetista. Ele era a exceção entre seus companheiros, permitindo o comércio livre e legal em todas as suas terras. A economia era uma preocupação urgente para ele, e seu domínio possuía um sistema monetário em funcionamento. Havia até histórias sobre ele negociando com o Império do Oriente.
Ele me pareceu um pensador muito refinado para os padrões desse mundo. Então, novamente, se os Lordes Demônios próximos pudessem ser confiáveis, Clayman era o único dentre eles que poderia arquitetar algo como aquele Lorde Orc. O único com capacidade financeira para equipar uma horda daquele tamanho com armas e armaduras.
Mas não havia nenhuma evidência concreta, e eu também não poderia negar completamente o envolvimento dos humanos. A questão teria que ser tratada depois.
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Discuti tudo isso com Albis e Sufia enquanto tomávamos chá. Quando terminamos, nossos respectivos subordinados concluíram suas próprias negociações.
— Senhor Rimuru, devo admitir que eu, seu humilde servo, Koby, não consigo lhe agradecer o suficiente. Para um bando de mercadores itinerantes como nós, a chance de recebermos um trabalho dessa magnitude é tão…
Ele parecia estar prestes a chorar quando se ajoelhou diante de mim, balançava o rabo tão rapidamente que tive medo de que pudesse acabar arrancado de seu corpo.
— Ei, imagina, Koby. Boa sorte com isso. Infelizmente, vai demorar um pouco até que possamos completar uma estrada, imagino. Então o transporte de início vai ser complicado.
Além de preparar uma estrada para o Reino dos Anões, eu havia pedido a Geld para trabalhar em um caminho semelhante ao Reino de Blumund. Pedir mais seria demais para ele.
— Sem problemas, senhor! É nessa hora que nós entramos!
Koby dissipou minhas preocupações com um sorriso. Apesar do seu rosto de cachorro, eu poderia dizer por sua aura de alegria que ele estava realmente sorrindo. Estavam acostumados a venderem suas mercadorias ao longo de marginais; as condições de viagem não pareciam preocupá-los muito.
— Você vai ter pessoal suficiente? — Pensei em perguntar, embora fosse um pouco tarde demais para desistir.
— Isso também não será um problema, Senhor Rimuru. Graças à sua permissão de construirmos uma base de operações nessa cidade, nosso negócio tem ocorrido de forma bem tranquila na Floresta de Jura. Acredito que temos pessoal o suficiente para o trabalho.
— Ah. Ótimo. Então vamos apenas fornecer sua escolta de guardas.
— Muito obrigado. Isso vai nos ajudar muito.
Ele me lançou um olhar determinado, olhos semicerrados, então correu de volta para seu escritório. O novo cliente dele o encheu de motivação para trabalhar. O que foi muito bom – muito bom mesmo. Poderíamos ter utilizado apenas os teletransportes, pelo menos para a quantidade de mercadorias discutidas, mas isso tinha seus limites e só funcionava com quantidades predeterminadas. Se esta fosse apenas uma troca de presentes realizada de vez em quando, seria uma coisa, mas o transporte físico era o principal neste trabalho.
Se não resolvêssemos os detalhes sobre bens e valores equivalentes logo, isso poderia ocasionar problemas mais tarde. Eu queria ter certeza de que tinha alguém de confiança para nos dar suporte, e para esse propósito, os kobolds e seu longo relacionamento com nossos goblins eram um parceiro mais do que capaz. Eu não poderia pedir por um melhor, na verdade.
Tudo isso me deixou tremendamente à vontade, livre dos problemas de se ter que barganhar sozinho. Também marcou o início das relações comerciais oficiais entre Tempest e Eurazania.
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Depois de ficar por mais vários dias, as Licantropas Sufia e Albis voltaram para casa. Enrio, o nascido da magia que as servia, permaneceu na cidade com os outros subordinados.
Eles aparentemente foram instruídos a aprender sobre as variadas tecnologias que usávamos e já estavam se esforçando para estudar. Kaijin e a oficina dos anões os impressionaram; quando visitaram um dos nossos canteiros de obra, assiduamente tomaram as medidas de resistência e estabilidade da estrutura. Em uma viagem de um dia para verem nossas rodovias, ficaram chocados ao ver como nossas equipes de construção eram eficientes.
Logo, queriam se familiarizar com essas coisas por conta própria.
— Se você permitir — pediram —, teremos o maior prazer em trabalhar com suas equipes.
Eles não tinham que seguir nenhum cronograma específico, mas queriam ficar por perto até que os substitutos deles chegassem. Depois de discutir o assunto com Rigurd, decidi permitir. Antes que um mês se passasse, já faziam parte integralmente da nossa operação de trabalho, muito mais sérios e bem-humorados do que eu imaginava.
Um dos licantropos estava envolvido com outros negócios. Este era Gruecith. Enrio e os outros receberam ordens de aperfeiçoarem seus conhecimentos técnicos, mas Gruecith não.
— Enquanto meu mestre, Phobio, a Presa do Leopardo Negro, está cumprindo sua penitência, recebi a ordem de fornecer qualquer ajuda que pudesse a você, Senhor Rimuru. Espero poder retribuir o favor, de alguma forma.
Assim, concordou em ajudar a patrulhar a cidade – embora cavalgasse com Gobta e treinasse com Hakuro ao lado de Yohm, parecia que ele estava apenas fazendo o que queria pela cidade. Mas como estava se divertindo, decidi fazer vista grossa.
E então, a delegação do Reino das Feras da Eurazania logo se encontrou conosco, se tornando amigos dos cidadãos de Tempest.
Tradução: Another
Revisão: ZhX
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