Rei Demônio ao Trabalho

Rei Demônio ao Trabalho – Vol. 02 – Cap. 01.2 – Uma Vizinha Atenciosa Ajuda nas Finanças do Rei Demônio

Olba foi detido pela polícia no final da última batalha. Ele acabou preso por violar as leis de porte de armas do Japão graças a pistola que carregava debaixo do manto, mas não iria demorar muito para que percebessem que era ele o culpado pela onda de assaltos que colocou a cidade em um estado de medo alguns meses atrás.

Exausto devido à luta e bem ciente de que a Heroína estava viva e bem no Japão, era provável que Olba não tentasse algo durante um tempo, mas havia uma chance de nomear Lúcifer como o seu cúmplice.

Em termos de aparência externa, a diferença entre “Lúcifer” e “Hanzou Urushihara” não era grande. Muito menor que aquela entre o resto dos grupos humanos e formas de demônios. Até que Olba encontrasse o seu destino, seja lá qual fosse, Urushihara não podia assumir o risco de sair.

Mas ele tinha um elemento essencial para fazer o seu nome, um que tornou o seu novo estilo de vida dentro de casa possível. Dois meses atrás, ele foi até um internet café e hackeou a rede do local de trabalho da Heroína. Ao perceber o seu grande potencial, Maou comprou um notebook e uma conexão com a internet para Urushihara, na esperança de que ele fornecesse suporte de dentro do Castelo Demoníaco.

O Rei Demônio ordenou que ele usasse suas habilidades com o computador para reunir informações sobre todas as culturas mundiais que podiam ter alguma relação com poderes mágicos, na esperança de que pudesse descobrir uma forma de recuperar a sua energia demoníaca ali, na Terra. Mesmo assim, a sua ética de trabalho estava provando-se ser um problema.

— Então, você encontrou algo de útil hoje?

Maou se intrometeu na discussão entre Urushihara e Ashiya com um olhar preocupado no rosto.

— Não vou conseguir nada de importante assim tão fácil. Você sabe muito bem disso.

Voltando à sua mesa do computador com a tigela de porco em mãos, Urushihara caiu de boca no seu jantar, não lançando um segundo — ou sequer primeiro — olhar a Maou.

Até mesmo Maou estava ficando irritado com esse ato.

— Isso é tudo o que você vem me dizendo durante os últimos dois meses, cara!

A reclamação caiu em ouvidos surdos.

— Bem, o que você esperava de mim? Não vou entrar em qualquer site e descobrir os segredos de toda a magia deste mundo assim.

Antes do Castelo Demoníaco ser ligado à rede de dados, Ashiya era obrigado a fazer caminhadas e mais caminhadas na missão para recuperar a força mágica do seu mestre. Ele passou por inúmeros círculos de pesquisa, indo a fundo em livros que pareciam promissores nas bibliotecas, indo de museu a museu para avaliar qualquer mostra especial, caindo nos livros de novo, descobrindo outro museu… Para Maou, ter acesso à internet em casa significava que a busca seria um caminho muito mais fácil de agora em diante.

— Olha, Maou…

Urushihara também era hostil assim com Maou na era de Lúcifer, mas até mesmo naquela época usava a terminologia apropriada, Vossa Majestade Demoníaca. Agora, em sua forma humana, sua mentalidade tinha mudando tanto que bastava dizer “Maou”. Isso levava a pelo menos uma discussão com Ashiya por semana.

— Você acha que um computador e internet são, tipo, algum tipo de poção mágica que irá resolver todos os nossos problemas?

— Nggh.

Maou gemeu de frustração. Ele sabia disso. Vendo que deu a resposta certa, Urushihara exalou um suspiro deliberado, com a boca cheia de pedaços de carne de porco esquentados no micro-ondas.

— Heh. Bem, cara, a internet não é uma máquina milagrosa, entendeu? Além disso, talvez você não tenha percebido, mas o governo está começando a sentenciar as pessoas nos dias de hoje se você ficar com esse tipo de bobeira online. Quer que os policiais coloquem os olhos na gente mais do que já estão fazendo?

Maou não conseguiu resistir contra a isca que foi jogada.

— E você ainda se chama de demônio?

— E você ainda se chama de Rei Demônio, Maou?

Ashiya permaneceu em silêncio, sem conseguir reunir a energia para intervir. Quieto, Urushihara pegou o lixo espalhado ao redor da sua mesa, e o seu rosto era o clássico de um jovem rebelde.

— Tipo, vamos dizer que tudo funcione e você realmente encontre uma exibição num museu, a qual pode nos ligar à força demoníaca. Acha mesmo que podemos simplesmente escalar o muro e roubar como se estivéssemos em um filme hollywoodiano?

— Eu não sei o que você está usando como exemplo, mas… tipo, talvez possa reprogramar as câmeras de segurança, ou quem sabe hackear o código do estoque do museu, ou até algo do tipo. Não pode?

— Pfft. Você parece uma daquelas crianças que assiste muita TV. E isso que nós nem temos uma aqui. — Urushihara não mostrou piedade — Quero dizer, sim, hackear permite que você leia e brinque com dados em qualquer computador que consiga acessar. Mas não dá para sair invadindo todo um sistema de administração de um museu. E você definitivamente não pode fazer isso com essa relíquia antiga.

O computador que Urushihara estava batendo foi a primeira compra que Maou fez com o seu cartão de crédito novinho em folha. Para ele, foi como um mergulho em um reino completamente desconhecido, mas a forma com que Urushihara dizia fazia parecer que ele foi iludido e comprou um equipamento velho e inútil.

— Dê uma olhada nisso aqui.

— Huh?

Urushihara chamou Maou até o computador. Um vídeo preto e branco estava sendo exibido no canto da tela de LCD. Maou deu uma olhada, sem saber ao certo o que estava assistindo, quando percebeu um carro passando pela câmera com uma taxa de frame extremamente lenta. Ao mesmo tempo, ouviu o motor do carro passando do lado de fora da janela.

— Uau… O que foi isso?

— Eu comprei uma webcam velha e a transformei em uma câmera de segurança. Viu só? Ali.

Urushihara apontou para a janela, em direção a um objeto esférico preso no topo de uma grade velha e com tinta descascada. Um cabo serpenteado saía do objeto de plástico e ia até o computador dele.

— Eu comprei porque achei que poderia nos dizer se alguém suspeito está por perto, mas… tipo, é preto e branco e essa coisa não consegue acompanhar o frame. Entende o que quero dizer? É inútil.

— Eu não aprecio como você quer que eu saiba disso por intuição…, mas aquilo pode ser bem útil por ter custado barato, não? E já que instalou do lado de fora, quer dizer que pode aguentar o clima?

— Nah. É velha e não é a prova d’água, por isso tenho que trazer para dentro sempre que chove.

— Opa, deixe quieto então.

Triste, Maou distanciou-se da mesa. Urushihara lançou um último aviso.

— Tipo, veja dessa forma. Qualquer alvo que eu estiver “hackeando” pode estar rodando em múltiplos servidores de supercomputadores, cada um deles carregado com firewalls e pacotes de segurança. Enquanto isso, eu tenho um computador com um disco rígido menor do que cem gigas, um processador Pentium III e apenas uma porta USB. Isso mal consegue rodar a porcaria dos programas que já vieram instalados. Como você quer eu consiga me virar com ele?

Maou tinha apenas uma frase curta para responder à onda de reclamações de Urushihara.

— Cara, fale em japonês.

Qualquer tentativa por parte dele para minimizar as habilidades do seu computador eram totalmente perdidas com Maou e a sua falta de conhecimento em informática. Todas as tentativas para falar mal das habilidades de compra do seu computador entravam por um ouvido e saíam pelo outro.

Por um momento, Urushihara ficou de cara com a resposta completamente leiga de Maou, tanto como Rei Demônio quanto um membro da sociedade moderna da internet. Depois, apontou mais uma vez para o computador.

— E mais uma coisa, se eu deixar esse computador velho funcionando o dia inteiro nesse calor, ele pode incendiar a qualquer hora. Eu não vou fazer muita coisa nele por um tempo.

Maou permanecia em silêncio. Até mesmo ele sabia que eletrônicos tinham problemas para lidar com altas temperaturas.

O ambiente dentro do Castelo Demoníaco não conhecia muito sobre as maravilhas modernas, como o ar-condicionado, por exemplo. Uma leve brisa percorria todo o aposento quando todas as janelas estavam abertas. O único recurso que tinham era torcer para que o ventilador pudesse amplificar um pouco mais o ventinho fresco.

O tal do ventilador também era outra compra do distrito comercial da Rua Cem, e ele fez com que Maou gastasse mil ienes no brechó. Além disso, também tinha as cortinas de bambu que compararam de uma loja de cama, mesa e banho para bloquear a luz direta do sol, permitindo que conseguissem sobreviver um pouco mais naquele calor todo.

— Ei, a propósito, o que foi toda aquela confusão lá fora?

Lúcifer fez uma pergunta do nada, abanando o rosto com um leque de papel feito com propagandas de um salão de bingo da vizinhança.

Maou e Ashiya trocaram olhares.

— Você esteve aqui o tempo todo e não percebeu?

Maou aponto para a parede que eles dividiam com o apartamento ao lado.

— Alguém se mudou para cá.

Urushihara olhou para a parede enquanto mordiscava o gengibre em conserva que veio na sua refeição.

— Hein?! Está zoando com a minha cara? Quem teria coragem para se mudar para essa pilha de lixo?

Não havia uma demonstração mais clara do quão inútil era a câmera de segurança, o que dirá a pessoa que a controlava.

— Você ouviu alguma coisa do quarto ao lado. Tinha um caminhão de mudança e tudo mais. Além disso, a janela do corredor estava bem aberta. Tem certeza que não viu o pessoal da mudança ou qualquer outra pessoa?

Urushihara balançou a cabeça.

— Nada. Nadica de nada.

— Você estava assistindo a vídeos e ouvindo música, não estava?

Maou tentou franzir a testa o máximo que podia para mostrar desaprovação, mas Urushihara balançava a cabeça enquanto continuava com o seu arroz com porco.

— Não, sério mesmo, não vi nada.

— Pare de falar com a boca cheia! Você está arremessando grãos de arroz por todo o lugar! E jogue fora aquela câmera de segurança inútil de uma vez!

O comentário rápido de Ashiya sobre o estilo de vida adotado por Urushihara se tornou outro costume de verão no Castelo Demoníaco.

— Sem chance, cara! Aquilo me custou cinco mil ienes com o programa junto!

As ondas de choque causadas pelo preço falado em voz alta fizeram com que a mão de Ashiya escorregasse enquanto ele tentava amarrar uma sacola plástica, a qual acabou sendo rasgada. Maou levou uma mão à testa e encarava o chão, sem entusiasmo algum.

— Então, vocês já se encontraram com o novo morador?

Maou deu de ombros quando ouviu a pergunta de Urushihara.

— Bem… meio que sim.

Nada, nem mesmo chacoalhar ou bater na bochecha, podia fazer com que a garota que caiu antes acordasse.

Sem mais opções em mãos, Maou a levou ao segundo andar, até ao quarto para o qual estaria se mudando — talvez. A porta do Quarto 202 foi mantida escorada com um peso de porta.

O espaço iluminado de cem pés quadrados, uma campainha morta na porta ao lado do Castelo Demoníaco, estava cheio até o teto com caixas de papelão novas e sem marca, assim como baús de roupa feitos de madeira polida e que pareciam valiosos, além de algo que se assemelhava a um braseiro sem chaminé — estranho o bastante para a estação.

A sua apreciação pelo estilo de vida tradicional do Japão aparentemente estava além do guarda-roupa.

Maou e Ashiya trocaram olhares por um momento, então se aventuraram para dentro da residência da mulher estranha. A levaram até o centro do quarto, deitando-a com gentileza lá.

Ela não mostrou sinais de que despertaria tão cedo, mas ainda respirava. Depois de uma conversa, Maou e Ashiya decidiram deixá-la sozinha, voltar para conferir mais tarde e chamar uma ambulância caso ainda estivesse desmaiada.

Removeram o peso de porta por questões de segurança, embora, naturalmente, não tivessem uma forma para trancar a porta pelo lado de fora.

— A garota deve ter uma porrada de coisas. O quarto estava transbordando de caixas.

— Não vou pedir para que fique fora de vista, já que ela está logo ao nosso lado, mas tente não se envolver com ela ao máximo possível, pode ser?

Os olhos de Urushihara lacrimejaram um pouco depois que Ashiya enfim perdeu a paciência e desferiu um golpe de punho fechado na cabeça dele, porém, não foi o suficiente para fazer com que terminasse logo o jantar.

— Hm. Então ela é jovem? Deve ser bem fora das ideias para se mudar para um lugar desses.

Ele se sentou enquanto tentava jogar a embalagem de papel dentro da sacola plástica.

— Quantas vezes eu tenho que te dizer!? Você tem que lavar as embalagens antes de jogá-las fora! Já disse milhares de vezes, se não as limpar, vão começar a feder em todo o quarto até o próximo dia de tirar o lixo!

Ashiya, de modo automático, saiu do sério mais uma vez.

Urushihara ficou claramente irritado, mas seguiu as ordens dele em silêncio e limpou a caixa de bento vazia. Ashiya gritou para ele de novo logo em seguida por não ter separado o lixo da forma que as autoridades locais exigem, mas Urushihara não deu muita atenção ao conselho.

— Ah, que se dane. Qual é, vamos à casa de banho! Já está escuro!

Como sempre, ele tinha as suas próprias prioridades.

Os apartamentos do Vila Rosa não tinham as instalações para banho. Esse era um dos motivos pelo qual o aluguel era tão barato, mas não tomar banho nos verões quentes e grudentos do Japão não era uma questão de estar limpo ou não, mas sim de saúde pública.

Urushihara, normalmente proibido de sair, podia acompanhar Maou e Ashiya até o banho público da região contanto que estivesse escuro e ele usasse um boné e o cabelo para se esconder.

— Uggh… Me dê um segundo. Estarei pronto depois que escovar os dentes. Pode marcar lá para mim?

O exasperado Ashiya gritou as ordens para Urushihara enquanto pegava sua escova de dentes.

— Senhores!

Os três demônios ficaram se encarando.

Era a voz de uma mulher. Os olhos do trio se viraram em direção à porta da frente. Então, a campainha tocou uma única vez.

Todos sabiam um pouco sobre “falar no diabo”, já que, eles mesmos, eram grandes demônios. O alívio de saberem que ela estava viva e bem misturou-se com uma sensação de nervosismo por ter que lidar com vizinhos pela primeira vez na vida.

— O-O que vamos fazer!?

Maou estava em pânico. Os seus dois generais estavam muito mais calmos.

— Você é o chefe da casa, Vossa Majestade Demoníaca.

— Está escrito Maou na placa, não? Então tira a bunda da cadeira e vai lá.

Era desse tipo de encorajamento caloroso que ele precisava.

Olhando para os seus dois humildes servos, Maou respirou fundo e respondeu ao visitante do lado de fora:

— J-Já estou indo!

Ainda preso a um nervosismo inexplicável, abriu a porta.

— Peço perdão por incomodar tão tarde da noite. O meu nome é Suzuno Kamazuki, e eu me mudei para o quarto ao lado hoje cedo.

Uma grande caixa de papelão estava diante da porta, apresentando-se de maneira educada a Maou.

— …

MACARRÃO UDON — USO RESTRITO A RESTAURANTE, era o que estava escrito.

— Hm.

— Se me permite, sobre mais cedo… — A caixa de macarrão abriu a boca de novo — Devo humildemente desculpar-me por minha grosseria abjeta em nosso primeiro encontro e por colocar um fardo oneroso em seus ombros.

A caixa de macarrão, que se apresentou como Suzuno Kamazuki, curvou-se para Maou, mantendo um balanço perfeito enquanto se inclinava para frente com graciosidade.

— Oner… quê? Não, é, não foi nada… De qualquer forma, eu me chamo Sadao Maou. É um prazer conhecê-la.

Não conseguindo encontrar outra opção, ele se curvou levemente para a embalagem de tamanho industrial.

— Agradeço por sua gentileza. Espero que aceite este presente, um símbolo da minha apreciação pelo meu estimado vizinho.

A caixa inclinou-se para frente… ou, para ser mais exato, foi oferecida a ele.

— Hm… isso…?

— Sei que uma oferenda de macarrão é o método mais apropriado e costumeiro de cumprimento aos novos vizinhos.

Era difícil dizer o que era apropriado ou costumeiro sobre o presente, se era o tamanho ou se era a qualidade, mas se a caixa estivesse mesmo cheia de macarrão, o Castelo Demoníaco poderia muito bem comer de graça até o final do ano.

— Oh… é, bem, obrigado pelo gesto gentil.

A sua voz oscilava enquanto agradecia ao pegar a caixa.

— Errr!

Estava tão pesada que ele quase a derrubou na hora.

Mas isso fazia sentido.  Ela, que era grande o bastante para ocupar toda a parte da frente do seu apartamento, só poderia estar cheia até a borda com macarrão udon. Era fácil imaginar quantas dezenas de libras pesava.

Fazendo uma careta para segurar o peso inesperado, Maou, instável, colocou a caixa aos seus pés, observando o vizinho logo depois.

— Espero que atenda ao seu paladar. Por favor, não há necessidade para modéstia.

A jovem garota, que se atirou de maneira dinâmica sobre os braços de Maou há pouco, estava ali de pé, agora com um kimono de cor escura, mas de alta qualidade, e um par de sandálias zori.

— Venho de uma antiga família agricultora que reside há muito tempo nas montanhas do interior. Temo que ainda há muito que eu preciso aprender sobre a vida na cidade, mas espero que você seja gentil o bastante para deixar os eventos lamentáveis de antes de lado e que provida qualquer apoio cortês que tenha a oferecer.

Suzuno Kamazuki, que não era mais uma caixa, mas sim uma jovem mulher, baixou a cabeça em uma reverencia deliberada e bem praticada.

— Hmmm. Ah, sim, pode ter certeza. Você também.

Maou curvou a cabeça em uma tentativa meia boca para retornar o favor.

Incongruente seria a única forma de descrever a impressão que ela passava.

A julgar pelo seu mergulho de cisne escada abaixo e as estranhas palavras de despedida logo depois, ele imaginou que ela pudesse ter um ou outro parafuso meio solto na cabeça. Agora que a viu com maior atenção, percebeu que “meio” podia ser facilmente retirado da frase.

Os olhos dela eram grandes, e seu nariz, bem definido. A sua pele branca e cabelo longo e lustroso eram uma combinação perfeita com o kimono azul-marinho e laço amarelo-claro. Ela parecia impressionante ali, no corredor, exibindo a sua postura perfeita sem precisar se esforçar.

A expressão no seu rosto era digna e escondia bem a força de vontade forte que residia dentro dela, adicionada a uma presença ainda mais poderosa do que a sua aparência.

Em termos de aparência, ela podia facilmente se passar por uma adolescente, mas a pura perfeição de sua vestimenta e maneirismos, somados a uma abordagem excêntrica com o linguajar, fez com que Maou imaginasse que ela tinha se transportado da sua casa para Sasazuka através de uma máquina do tempo.

Enquanto se curvava, mesmo os olhos leigos de Maou podiam ver que uma grande atenção foi dada ao cabelo dela. Um grampo de cabelo vermelho, decorado com uma flor de quatro pétalas, brilhava de maneira elegante na luz.

Agora, em pleno verão, ele via cada vez mais mulheres usando quimonos de estilo oriental e coloridos do lado de fora. Mas ela estava além. Não havia dúvidas de que esta era uma mulher que usava trajes japoneses como a sua primeira opção.

 

Depois de olhar para cima, Maou percebeu que os olhos afiados de Suzuno, brilhando com energia, estavam fixados no rosto dele. Por alguns segundos, ele estremeceu diante dela.

— Então você é… Sadao Maou?

— Hein? Ah, sim, mas…

Suzuno evitou o olhar, como se pensasse por um momento, aparentemente satisfeita em saber que aquele diante dela era mesmo o Maou. Então, assentiu mais uma vez e olhou de volta para ele.

— É verdade que você compartilha o seu quarto com um tal de Shirou Ashiya?

— Oi?

Sem sequer pensar, Maou virou a cabeça para trás e viu Ashiya tão surpreso quanto ele, enquanto este se aproximava da porta da frente.

— Ah, sim, me chamo Ashiya. O Maou é, hm, um velho amigo meu. Estamos compartilhando este quarto agora.

— Encantada em conhecê-lo. Me chamo Kamazuki. Ouvi muito sobre vocês dois.

Ela ouviu o quê? De quem? Ao perceber que Maou e Ashiya trocavam olhares entre si, Suzuno exibiu uma súbita mudança em sua expressão pela primeira vez até agora. Mesmo que fosse quase imperceptível, a área entre as suas sobrancelhas se enrugou, como se estivesse confusa.

— Ainda não me encontrei com a senhoria em pessoa. Mas, uma pessoa que eu acredito ser a senhoria, mandou-me uma carta pelo agente da imobiliária. Ela dizia que o único inquilino dela era Sadao Maou, vivendo aqui com o seu amigo.

Após dizer isso, Suzuno pegou um envelope de dentro do kimono, o qual era decorado e a este ponto muito bem conhecido pelos demônios.

Maou também não tinha ideia até agora que mulheres enfiavam coisas debaixo do kimono daquele jeito.

— Ela escreveu que as pessoas que aqui residiam eram gentis e de mente sensível, e que poderia confiar no apoio deles se eu cruzasse com qualquer dificuldade.

Não era o tipo de elogio que alegrava um servo maligno do submundo.

Além disso, Maou não tinha tanto interesse em cuidar dos afazeres administrativos do Vila Rosa da sua senhoria. E por que a Shiba não estava assumindo a responsabilidade por esta nova garota, ao invés de jogá-la para cima deles?

— Ah! Também tem uma fotografia inclusa. Eu queria lhe perguntar se esta é mesmo a nossa—

Suzuno, ao se lembrar de repente, fez uma tentativa de tirar algo a mais de dentro do envelope.

— Não! Não, não! Não precisa mostrar isso aí! Faço questão de não ver! É ela, pode ter certeza! Se você queria perguntar se a mulher nessa foto é mesmo humana ou não, eu lhe digo, sim, com certeza é a nossa senhoria!

Maou, por intuito, a parou com toda a força que conseguiu reunir. Os olhos de Suzuno se arregalaram um pouco ao ver o puro pânico que Maou exalava.

— Por que está tão nervoso, se me permite a pergunta? É apenas uma mulher com um par de óculos coloridos relaxando em uma boia enquanto—

— Não dê descrições! Por favor!

Ashiya, por sua vez, ficou tão assustado que correu para dentro do apartamento.

Ao ver Suzuno guardando novamente o envelope com relutância, Maou deu um suspiro de alívio. Talvez o choque fosse um pouco absorvido quando a pessoa que olhava era do mesmo gênero. Claro, a questão sobre poderem mesmo chamar a senhoria de mulher ainda era considerada uma dúvida, mas encontrar uma resposta conclusiva não renderia nada a ninguém. Além disso, Maou decidiu guardar todos os massacres da senhoria cheesecake em um arquivo-X trancado bem fundo no escuro, em um canto da sua mente coberto de concreto.

— Uh, certo. Então, fico feliz que não esteja machucada nem nada do tipo. Oh, e obrigado pelo macarrão. Eu normalmente não estou em casa na parte do dia, pois trabalho no MgRonald aqui perto, mas se aparecer algo, pode vir me procurar, então…

Ainda se recuperando do pânico temporário, a voz de Maou saía aos poucos enquanto falava com Suzuno.

— Sei que não é bem um convite, já que somos todos homens em um quarto só, mas, por favor, me avise se houver qualquer coisa a incomodando.

O convite cavalheiresco de Ashiya veio do lado de dentro.

— Ah… sim. Fico agradecida então.

Depois, já que era difícil perceber pela sua expressão impassível, pareceu para Maou que um traço de surpresa surgiu no rosto de Suzuno antes de ela baixar a cabeça.

— Oh, mas tenha em mente o seguinte, aquele cara fica meio levado às vezes, então não tenha medo de espantá-lo caso fique incomodada.

Maou tentou colocar uma parede defensiva, pois temia que estivessem adentrando demais na vida da vizinha logo no primeiro encontro.

Em momentos como este, se um homem fica amigável demais logo de cara, coisas ruins acontecem. Se bem que coisas ruins sempre aconteciam com Maou mesmo.

— Oh, não precisa se preocupar. Eu não esperava uma recepção tão calorosa, acho, mas me alegro em saber que tenho vizinhos em que posso confiar. Estou ansiosa para aprender tudo sobre a vida comum com vocês.

Ele não sabia dizer o que era tão inesperado nisso, mas o termo vida comum chamou a atenção de Maou. Ele teria que começar por ensiná-la a falar como alguém deste século.

Apesar desta resposta, Suzuno curvou-se uma vez mais, virou os olhos na direção do piso em que Maou estava e exalou de maneira suave e surpresa.

— Tem mais alguém com vocês?

— Hein?

— Oh… é que simplesmente percebeu outro par de calçado de tamanho diferente. Peço perdão se vocês estavam entretendo outro visitante.

— Não, é…

Maou e Ashiya se olharam por um tempo. Tentar esconder um colega de quarto da vizinha da porta ao lado só serviria para aumentar ainda mais suspeitas. E Urushihara ainda não tinha demonstrado interesse em ouvir os conselhos dos outros. Seria melhor, pensava Maou, agir antes do que continuar atraindo mais atenção indesejada.

— Nós acabamos acolhendo mais um colega de quarto recentemente. Mas ele é, tipo, um completo recluso, então não deve te incomodar muito.

— Eu não sou um recluso porque quero ser, cara! Ei, eu sou o Urushihara! Prazer em conhecê-la!

O tal do recluso gritou o seu cumprimento do outro lado do apartamento. Maou começou a se perguntar se ele se importava mesmo com a polícia o encontrando ou não.

— Entendo… o prazer é meu.

Isso foi o suficiente para fazer com que os olhos de Suzuno se mexessem rapidamente, como se estivesse agitada.

Nem mesmo o salto ornamental que deu das escadas tinha mudado a sua expressão rígida. O que um traste descuidado como ele fez para ela que aquilo não conseguiu? Era tão estranho assim ver três homens adultos vivendo no mesmo quarto?

Mas até mesmo aquela leve expressão facial durou um mero instante, pois ela mostrou uma reverência simples a Urushihara.

— Bem, é melhor eu não os atrapalhar mais. Desejo-lhes uma ótima noite. Adeus por enquanto!

Então girou sobre os calcanhares, e as suas sandálias rasparam contra o piso de madeira, e voltou ao seu quarto.

Quando teve certeza de que a porta estava fechada, Ashiya cruzou os braços e inclinou a cabeça.

— Bem estranha ela, não?

— Não acho que sejamos dignos de dizer essa palavra aí. Mas, ei, é legal ter vizinhos generosos, né? Foi por causa disso que conseguimos comida extra.

Ele ergueu a caixa de udon até a cintura enquanto comentava alegremente sobre o visitante inesperado.

Cara, isso aqui tá pesado.

O que veio em seguida foi um sussurro baixo, à medida em que sofria com o peso.

As caixas de papelão, grandes o suficiente para ocupar todo o canto do quarto, estavam empilhadas por toda a sua sala de estar.

Tinha decidido colocar três enormes caixas no hall por enquanto. Entre o layout do apartamento e os seus móveis, não havia um local conveniente para elas, mas isso também acabaria deixando apenas uma porta do armário livre para abrir.

Era o começo de uma nova semana, uma segunda-feira quente, úmida e opressiva. Emi Yusa, ainda em seu casual traje de escritório, resmungava enquanto pensava no problema diante dela e mantinha os dedos na testa. Queria tomar um banho assim que voltasse para casa, e a Entregas Sasuke lhe fez uma visita no mesmo instante, como se importuná-la fosse a intenção.

Ligando o ar-condicionado para se defender do calor extremo, Emi tirou o cabelo preso à sua testa encharcada de suor enquanto lia a nota fiscal.

Na seção “De”, a palavra Emeralda estava escrita em caracteres que pareciam uma pilha de pequenos vermes em um prato de Petri. Produtos alimentícios estava escrito na seção “conteúdo”.

Sem saber como explicar o que era aquela entrega, Emi parou por um momento antes de fazer qualquer movimento. Com o telefone na mão, ligou para um número que tinha na agenda.

— Alôôôôô…! Aqui é a Emeralda Etuuuuva.

Ela atendeu quanto tocou pela sétima vez, e a sua fala parecia um pouco preocupada por causa do nervosismo.

— Eu sei. Aqui é a Emi… Quero dizer, Emília, falando.

— Sim! Mesmo depois de todo esse tempo, ainda parece que fico nervosa com o telefooone.

— Você já teve bastante tempo para se acostumar com ele, não?

Emi riu para si mesma. Não estava falando sério, é claro. Não havia como esperar que a mulher do outro lado da linha ficasse “acostumada” com essa magia negra. Afinal de contas, a garota que se apresentou como Emeralda Etuva não estava no Japão. Ou, para ser mais exato, sequer estava na Terra.

— Não passei tanto tempo assim no Japão, entãããão…

Emi olhou para a torre de caixas à sua frente.

— Acabei de receber algumas caixas com o seu nome nelas… o que são?

Cada uma das três caixas era pesada demais, o suficiente para que o entregador da Entregas Sasuke as trouxesse para dentro do apartamento, a fim de poupar Emi e os seus braços magros daquele peso enorme.

— Na nota diz que é comida, mas…

— Oh, já entregaaaaram? Uouuuu, foi rápidoooo! Eu as enviei ontem!

Talvez fosse uma surpresa para alguém que ainda não estava familiarizado com a incrível velocidade da infraestrutura de entregas do Japão.

— Elas contêm energia sagrada para vocêêê! Modifiquei a aparência para que se camuflem no armazenamento dentro do Japão.

— Energia… o quê? — Emi empurrou a mesa para longe quando se levantou. — M-Mas por que está escrito Produtos alimentícios? Todas elas são, tipo, superpesadas. São sacos de arroz ou o quê?

— Arroz…? Oh, é mesmo, a comida principal no Japão? Não, não é issoooo. Eu arrumei para que ficasse dividida em pequenas porções, as quais são fáceis de manusear! São famosas na Terra, certo? Tipoooo, um gole te enche de energia, não é?

— Um gole?

Ela levantou uma sobrancelha à medida em que arrancava a fita da caixa mais acima. Jogando-a ao lado, abriu a caixa e deu uma olhada em seu conteúdo.

— Uau…

Estava cheia de várias caixas menores, com papel amassado entre elas. Cada uma delas tinha o logotipo de uma empresa farmacêutica famosa no Japão impresso. Ao abrir, a suspeita de Emi foi confirmada — onze pequenas garrafas marrons estavam lá, cada uma delas cheia de um líquido claro e com uma tampa dourada fixada no topo.

— “5-Energia Sagrada B”…?

— Oh, não é um B, é um β. Sabiiiiia? Tipo, um teste beta.

— Isso não é o importante, Emeralda. Então, se eu beber uma dessas, o meu poder sagrado irá ser reabastecido?

— Isso mesmo! A propósito, Emíliaaaa… — A voz do outro lado da linha tornou-se inquisitiva de repente — O que o Rei Demônio tem feito ultimamenteeeee?

— Bem… — Emi pensou por um momento antes de responder — O mesmo de sempre, aham. Nós quase sempre acabamos discutindo quando nos encontramos, mas estamos muito ocupados com o trabalho, por isso não tive tanta chance de me enfiar na vida pessoal dele.

— …

A indecisão era palpável.

— Emíliaaa… você compreende o que está me dizendoooo?

— Hein?

Emi estava confusa. Emeralda escolheu as suas palavras com cuidado para continuar.

— Você soa como alguém que reclama por estar tão ocupada que está tendo problemas para arranjar tempo para o seu namoraaado.

Pois é, talvez com cuidado fosse um tanto forçado. Direto ao ponto seria o certo. E ainda conseguiu atingir Emi em cheio.

Emi comparou a observação de Emeralda com o que ela acabara de dizer.

— Dah… o qu… nragh… — O microfone do telefone captou cada fase das suas emoções furiosas — Do que você está falando, Emer?! Você deveria saber que não há nada desse tipo entre nós! Q-Quero dizer, contanto que ambos estejamos vivendo no Japão, precisamos seguir as leis do país, ir ao trabalho japonês, ganhar o dinheiro japonês e todo o resto! Quando digo que não consigo o observar cada momento da vida dele, não significa nada mais do que isso… Unnghghh!!

— Eu sei, eu seiiii…

Emeralda ria enquanto provocava a sua amiga. A fúria de Emi continuava descontrolada, e a sua respiração estava acelerando.

— Pare de brincar comigo! Sou a Heroína de Ente Isla! E ele é o Rei Demônio! É o meu inimigo jurado, e isso jamais irá mudar! O mero pensamento de sermos na… na… namorados me deixa enjoada!

Realmente, a mulher que se chamava Emi Yusa era ninguém mais ninguém menos que Emília Justina, a Heroína que expulsou as forças demoníacas que serviam ao Rei Demônio Satan e trouxe uma paz duradoura ao seu mundo.

Assim como Satan agora era agora o chapeiro educado no MgRonald, Sadao Maou, Emília também estava se passando por Emi Yusa, trabalhando na companhia de telefone com base em Shinjuku, a Dokodemo, como uma operadora contratada da central de atendimento.

Emeralda Etuva, do outro lado da linha, era a companheira de viagem de Emília. A alquimista da corte do império de Santo Aile, a nação que tomava conta da maior parte do território da Ilha do Oeste de Ente Isla, ela seguiu Emília até o Japão quando esta perseguiu o Rei Demônio a dois meses atrás, a tempo de entrar na batalha da Heroína contra Lúcifer.

Depois de tudo aquilo, Emi ganhou uma grande vantagem sobre Maou, a habilidade de aceitar o apoio de Emeralda e seus companheiros.

Além disso, para evitar que as suas conversas baseadas no “elo mental” fossem interceptadas por alguém, ela enviou a Emeralda e aos seus amigos um aparelho conveniente para comunicação verbal a longas distâncias: um telefone celular, em outras palavras, deixando mais fácil a troca de informações em um nível mais íntimo.

— Ugh… então, vou admitir que tenho sido um pouco desleixada com a monitoração sobre ele. Irei checá-lo amanhã, pode ser? Será uma boa chance para testar essas garrafas também. Uma pena que não posso mandar a fatura do frete para a casa dele!

A antiga ferida no coração de Emi, causada por um policial infeliz que confundiu ela e Maou com um casal tendo uma briga quando foram levados à delegacia naquela noite, continuava infeccionando-a por dentro.

— Não sei o que você quer dizeeeer com isso, mas, de qualquer forma, ótimooo!

A voz de Emeralda mudou de repente no tom enquanto falava.

— Emer?

— Então… por favoooor, Emília… — O ritmo de fala normalmente tranquilo de Emeralda pareceu ter ficado ainda mais lento à medida em que se esforçava para colocar ênfase em cada palavra. — Por favooor, não faça nada que possa nos transformar em inimiiiigas, pode seeer?

— …!

Emi engoliu em seco, nervosa. Aquilo veio como uma completa surpresa.

— Eu sei sobre a “Emiii”, Japããão e Maooou também. Então, por favooor…

A voz dela era suave e acessível, fazendo com que o significado por trás de suas palavras fosse ainda mais poderoso.

— Terei isso em mente, não se preocupe. Eu sou a Heroína. Em nome do meu pai e da minha mãe, juro que não seguirei o caminho errado.

— Ah, é ótimo ouvir iiiisso!

Nord, o seu pai, desapareceu em meio às chamas intensas da batalha entre humanos e demônios, e:

— A sua mãããããe, sabe… Ela era uma mulher tãããão legal, Emília!

— Seria um pouco estranho se um anjo não fosse legal, não acha?

A mãe dela era o Arcanjo Laila. Esse era o poder garantido a Emília Justina, a Heroína que portava o poder criado pelo seu sangue meio-anjo.

— Mas como estão as coisas por aí? Sei que é estranho o quão pacífico está mesmo com o Rei Demônio correndo a solta, mas algo mudou com a Igreja e todas as outras nações?

— Beeeem…

Emi pôde ouvir Emeralda mexendo em uma grande pilha de papéis com as mãos.

— O plano para matá-la junto com o Rei Demôôônio foi liderado por uma pequena trama dos oficiais da Igreja. E, em público, você e todos nós somos os heróis que salvaram o mundo ainda! Por isso que nenhuma nação mostrou sinais aparentes de enviar assassinos no seu caminhoooo.

Emi imediatamente notou que Emeralda estava tentando ser cuidadosa.

— Aparente, você diz?

— Sim, beeeem isso aí!

Ela praticamente conseguia ouvir Emeralda rindo com amargura nessa frase.

— Mas mesmo que as potências principais não se movam, ainda há muita atividaaade suspeita vinda dos nobres poderosos que têm conexões com a Igreja, sem contar as nações menores e entidades, que têm a esperança de se integraaaarem à Igreeeeja.

— Me pergunto o que eu posso ter feito para que essas pessoas tenham tanto ódio por mim.

— Oh, não é como se lógica funcionasse com eles. A única coisa que importa para eles é a próóópria proteção e iiiinfluência.

A amargura agora ficou clara na voz de Emeralda.

— Ouvi sobre alguém estar recrutando a Guiiilda dos Assassinos, os caçaaadores de recompensas das sombras e até mesmo o Júri da Reconciliação para agir, mas essas coisas ainda não passam de ruuumores.

— Júri da… o quê?

Emi estava por fora deste termo estranho. Emeralda, ao perceber isso, corrigiu-se:

— Oh, sinto muito, me refiro ao Concelho de Inquiiisidores. Eles mudaram de nooome recentemente.

— O quê? Os Inquisidores…? Então por que eles estariam contra mim? Não é como se fossem se incomodar com o Rei Demônio agora também. Por que esse rumor está se espalhando?

— Talvez porque Olba ainda não tenha voltado, eu achoooo.

Olba Meiyer era um dos seis arcebispos, o grupo de ministros possui o peso do poder dentro da Igreja.

Os arcebispos estavam incumbidos de tomarem todas as decisões finais relacionadas ao destino da Igreja. Cada um dos membros possuía controle direto e exclusivo de sua própria seção na hierarquia da Igreja.

Olba foi capaz de ganhar uma posição de tamanha confiança com Emília, acompanhando-a por quase todo o trajeto contra o Rei Demônio, em parte porque ele controlava as operações diplomáticas e missionárias da Igreja.

Como arcebispo, Olba tinha uma grande experiência em espalhar os princípios da Igreja por todas as terras estrangeiras.

As viagens de Emília começaram na Ilha do Oeste, onde a Igreja possuía a maior força. Já que a Heroína ainda tinha pouca fama pelo mundo naquela época, Olba, com os seus talentos como administrador da Igreja e vasto conhecimento das terras onde os deuses que servia eram menos conhecidos e aceitos, era a escolha ideal para acompanhá-la enquanto desafiava o Rei Demônio.

O Conselho de Inquisidores era um tipo de subgrupo único dentro do departamento missionário da Igreja. O trabalho deles era um daqueles que não era revelado ao público, mas que ainda era de grande importância para toda a organização, de inspeção de terras estrangerias como um tipo de força de vanguarda para missionários, punição aos clérigos mais jovens por suas morais corruptas que se perdessem no deboche durante o treinamento até auxiliar os teólogos da Igreja enquanto estes nutriam e desenvolviam a doutrina sagrada.

Por outro lado, eles também serviam como um tipo de força policial pública dentro da burocracia da Igreja, declarando que um número não-trivial de pessoas era herético em suas inquisições regulares. Essa face mais pública do Conselho os atrelou com o tipo de reputação obscura que nenhuma organização política gostava.

— Isso soa como se o departamento missionário estivesse tentando descobrir o que aconteceeeeu com o Olba, então pode ser que alguns entre eles saibam sobre você também, Emíliiiia. Tente não baixar a guarda, tudo beeeem? Alguns deles podem tentar acelerar as coisas rápido demais e começar a se intrometer no Jaaapão logo.

— Manterei isso em mente. Então, você e o Al estão bem?

— Oh, eles estão de oooolho em nós, já que jogamos tudo aquilo para cima deles. Mas nada além disso nos aconteceu, nãoooo.

— Acho que não há descanso para a Heroína e seus companheiros, hein?

— Creio que nããão.

Nem Emeralda nem Albert eram algum tipo de pessoa inocente e boazinha que poderia ser facilmente eliminada da existência por um assassino meia-boca. Se ela dissesse que estavam bem, Emi ficaria muito bem ao acreditar nela.

— De qualllllquer forma, sei que conversar por tanto tempo assim vai destruir a sua conta de telefone, então é melhor desligar, heiiiiin?

— Na realidade, não tenho certeza se passa da taxa básica ou não. É o elo mental que está conectando nossas vozes, não? Os telefones são apenas uma forma mais fácil de acesso.

— Beeem, só por garantia, eu não iria querer exagerar na minhaaaa conta, então…

— Aprecio a consideração. Obrigada pela magia sagrada. Diga ao Albert que mandei um oi.

Justo quando estava prestes a terminar a ligação, Emeralda rapidamente interferiu.

— Ohh, espere, me esqueciii de algo! Cuidado para não beber muitas 5-Energia Sagrada β de uma só vez, entendeuuuu?

— Muitas? Tem um limite ou algo do tipo?

Girando a pequena garrafa de líquido em sua mão, ela percebeu que, onde o rótulo normalmente indicava a lista de ingredientes, dizia apenas poder sagrado.

— Sim! Quero dizer, podemos reabastecer nossos poderes sagrados aqui com a mesma facilidadeeee que temos para respirar, mas vamos dizer que duas garrafas por dia devem ser o limite, tudo beeem? Beba uma pela manhã e outra à tarde… Oh, mas se esquecer da dose da manhã, não tente compensar ao tomar duas de uma só vez.

— Eu não me importaria em fazer algumas perguntas sobre isso, Emer, mas, de qualquer forma, entendi.

— Maravilhoooso! Sempre tome cuidado com a dosagem certa, entendeeeu? Tchau, por enquannnnto!

Emeralda finalizou a ligação. Emi colou o telefone na sua mesa kotatsu, ainda confusa.

A nota da caixa, com a escrita japonesa instável e infantil de Emeralda. As caixas robustas que a Entregas Sasuke tinha acabado de lhe entregar. A estranha forma com que ela parecia se afundar na cultura e costumes japoneses, mesmo que tenha passado apenas algumas poucas horas no Japão.

— Onde é que… ela está será? — Ainda confusa, os seus olhos investigavam a garrafa em sua mão. — Acho que vou experimentar.

Ela girou a tampa de metal e foi instantaneamente recebida pelo cheiro incomum de xarope frio.

De maneira lenta e hesitante, experimentou algumas gotas.

 


 

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Bravo

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