Outer Ragna Outer Ragna – Vol 01 – Capítulo 30 – O Sacerdote Canta Louvores à Tropa Corajosa/A Guerreira Dragão Aceita o Povo do Fogo

Dei tudo o que tinha para estar aqui.

Por isso não deve haver mais nada a perder.

-Padre Felipo V-

 

O retorno de Lady Kuroi parece ter sido um sucesso graças ao apoio da Companhia de Origis… Um bom resultado. No final, é a única coisa que importa. O que mais sacrificamos para obter isso não é de importância.

Jashan son Peine… você se saiu bem ao tirar Lady Kuroi do meio daquela horda.

E, agora, centenas de corpos, centenas de bestas, ignorando os elfos diante deles, estão em disparada atrás de Lady Kuroi e a Companhia de Origis. Vejo que os vampiros reconheceram Lady Kuroi como uma clara ameaça, mas era de se esperar graças àquela demonstração de poder.

O desafio foi aceito. Tudo o que faremos é lutar para protegê-la.

Com a lança sagrada na mão direita e o escudo na esquerda, eu, Felipo Valkie Millennium, não recuarei, não mais do que um passo. Atrás de mim estão quinhentos soldados de infantaria. Continuo aqui, no ponto central da companhia.

O inimigo nos cerca agressivamente. Não há dúvidas de que vieram por nós. O tempo de lutas pequenas está no fim, e já não podemos mais deixar isso para os Cavaleiros Bombardeiros.

Começo a ouvir o grunhindo e gemidos das tropas… Ouço até mesmo o bater de dentes.

— Tropas, parem! Reforços ao pelotão!

Uma boa voz. As ordens do Lorde Willow ressoam com clareza, mesmo estando na ala direita.

— Iremos parar as forças que perseguem a Companhia de Origis aqui! Ala esquerda, Companhia de Marius, selecione os pelotões adequados como soldados de briga e use-os para atrair o inimigo para o centro, estreitem o campo de batalha!

— Entendido, senhor!

Será que ele está poupando palavras para libertar seu rugido no campo de batalha?

Que forte e confiável.

— Companhia de Magos! Preparem-se para disparos consecutivos e fiquem de prontidão!

— Pode deixar! Cambada, vamos usar as novas varinhas! Preparem todas com magia!

A voz de Odysson também é bastante impressionante. Digno de confiança. Até mesmo quando tempera suas palavras com frases estranhas em conversas do dia a dia, o desespero traz o aço no coração de um homem. Ele é outro herói digno de elogios ao lado de Lorde Willow. Trazer de volta a arte proibida da magia de chamas para o mundo é uma contribuição imensurável para a humanidade.

— Companhias de infantaria! Preparem-se para um combate defensivo! O inimigo está chegando até nós!

Uma voz ríspida. A voz de alguém arcando com o peso de vidas. E, sem dúvidas, ele está certo. Há muitos inimigos perseguindo a Companhia de Origis. Não importa como a cavalaria se mova, não tem como interceptar cada um deles.

— Beleza! Tropa da retaguarda, voluntários! Essa é a hora de usar nossas vidas! Cerrem os dentes!

A voz do Capitão Zakkow grita com o peso provocativo daquele que subiu nas patentes com unhas e dentes. Uma rispidez que os move adiante. Não é de se surpreender, já que estão prestes a enfrentar o sobrenatural sem o benefício de estar nas costas de um cavalo. Precisam manter-se firmes.

— O que aconteceu com o padre santo? Tropa da vanguarda! Não conseguimos ouvir vocês!

Minha voz, hein? Me dê um momento, estou me preparando, pois a voz é a primeira magia. Passar os pensamentos de pessoa em pessoa e influenciar diretamente seus corações, essa é uma das coisas mais importantes que alguém pode fazer pelo próximo.

Ó, voz, assuma tua magia. Tua força como magia. Torne-se e proteja teu lugar como magia humana. E, se tu usas da arte da magia, torne-se o fogo. Um fogo que possui a magia da voz. Forneça a fagulha com minhas palavras, minha verdade, torne-se a magia da chama permitida apenas à humanidade e acenda o fogo dentro de seus corações. Nos dê os corações de chamas.

Neste dia, estará em meu poder. Eu acalmo minha alma ressoante e espremo apenas minha força. Deixando minha magia fluir, falo como se cuspisse fogo.

— Ó, almas corajosas! Ó, receptáculos da bravura, almas poderosas que mostram a coragem neste campo de batalha! Vocês, as almas destemidas!

Ressoe, minha voz. Gritem, minhas palavras.

— Somos um grupo de guerreiros capazes! Almas audaciosas que desafiam o destino com lâminas afiadas em mãos! Aqueles que protegem a justiça atrás de nós e derrubam todo o mal! Somos aqueles possuídos pela chama!

Alcancem todos, ó palavras fortes. Os grandes significados. O ressoar agradável.

— Ergam neste solo! Uma montanha poderosa e imóvel! Alinhem sobre esta terra! Uma resolução inabalável!

Ó Deus, posso ver as chamas, as chamas invisíveis que faíscam em minha alma, engolindo as tropas ao meu redor. Iluminem seus corações, queimando e alimentando uma chama ainda maior.

— Agora é a hora! Movemo-nos em frente! Pela vitória da raça humana!

A resposta é um rugido da verdade, quente e quase fanático.

Deus Ex. Deus Ex. Deus Ex.

A expressão de esperança que ela será. A repetição daquele desejo, espalhando-se como um rugido.

A milícia formada por colonos, mercenários contratados e aventureiros, os magos da chama que foram escolhidos, soldados das Novas Terras Douradas, todos rugem em uníssono¹Uníssono é a reprodução de sons iguais ao mesmo tempo. Os Cavaleiros Bombardeiros ainda mantêm a disciplina, mas posso sentir a dedicação fervorosa deles. Se este fosse um feitiço, talvez eu chamasse de magia de fogo, Batalha Ardente. Parece que o medo e dúvida viraram cinzas, a moral chegou aos céus. É pretensão minha tentar controlar e portar tamanha intensidade.

— Todas as tropas, atenção às ordens! Preparar! O inimigo se aproxima! — grita Lorde Willow. Não há sinal algum de perturbação em seus comandos.

— Companhia de Magos! Três explosões em sequência! Preparaaaaar!

É hora de nós, infantaria, começar a trabalhar. Erguemos nossos escudos e preparamos nossas lanças.

— Fogo!

Agora só nos resta lutar.

-Guerreira Dragão Fleilyu IV-

O que é isso? O que está acontecendo?

Chamas mágicas que formam um arco no alto, cobrindo todo o campo de batalha, então caem como chuva, incendiando toda a terra. A magia de fogo dos humanos… como se fossem dragões de chamas. Os dragões malignos que serviam como familiares do Rei Demônio nas lendas antigas, aqueles que não temiam ninguém, nem mesmo os deuses.

Os sugadores de sangue se incendeiam, deixando cinzas para trás. Não há uma sombra sequer da resistência que mostram contra a magia de nós, elfos, pegando fogo como se não passassem de gravetos. Chamas, que queimaram até mesmo elfos, agora passam a desempenhar seu verdadeiro papel.

Sombras que se esgueiram sobre os campos em chamas. Lobos negros. Os vampiros que conseguiram evitar as chamas de alguma forma também disparam. Essa agressão é a verdadeira natureza deles. A fúria bestial que joga o continente em caos, algo que todos os elfos detestam e temem em medidas iguais.

Os guerreiros montados movem-se rapidamente para a interceptação. Isso é algo que eu já deveria saber, algo que já deveria compreender. Fui testemunha da batalha em meio a escuridão na cidade. Entretanto, isso vai muito além… até no uso de magia. Eles são iguais a guerreiros élficos e vampíricos.

E o que os motiva? Uma moral que queima com tanta força que poderia engolir uma floresta.

Infantaria não passava de apenas descarte, um uso desperdiçado de carne e almas? Como eles lutam com tamanha ferocidade? Resistem até mesmo quando são esmagados por lobos negros, rasgados por sugadores de sangue… poderiam os guerreiros élficos serem capazes de tal feito?

Um povo que porta o fogo, monta a cavalo e luta como se fosse as chamas.

Esses são os humanos.

Essa é a humanidade.

Um povo com uma história comparável à dos elfos e que agora possui a benção de um deus. Isso é o que se tornaram.

É isso mesmo. Não há dúvidas. Eu conheço a Apóstola da humanidade. A guerreira de cabelos negros, sinônimo de inevitabilidade. A incrível ameaça que corta elfos e vampiros sem distinção alguma.

Kuroi… Kuroi, a Apóstola da Humanidade.

Ela é poderosa, muito poderosa. Os vampiros não têm chance alguma contra ela. Vê-la criar armas infinitas, matar seus inimigos com lâminas e reduzi-los a cinzas com chamas era como uma tempestade de fogo formada por espadas. Ela escolhe sua vítima e a destrói sem piedade.

Usar magia de invocação para combate corpo a corpo… Pelo método de batalha dos elfos, é um conceito impossível de se imaginar, muito menos executar. De fato, é mais próximo da forma de batalha dos vampiros. Como os Três Apóstolos dos Vampiros, os quais incomodam sem parar os Três Apóstolos dos Elfos… pois possuem em comum a magia de invocação de armas.

— Fleilyu, está aí, Fleilyu?

— S-Sim, estou aqui, Lady Sakiel.

Que vergonha, me perdi em pensamentos devido à surpresa, pois tamanha é a vista diante de mim.

— Um mensageiro do exército humano… peça para que venha aqui! Minha magia não pode protegê-los de tão longe!

— Com todo o respeito, eles parecem ter a vantagem. Talvez não precise pedir para que…

Trazer aquele exército para perto é arriscado.

Parece que Kuroi retornou à tropa para descansar, então devemos manter certa distância deles. Os outros ainda estão confusos.

— Idiota! O céu, olhe para o céu!

O céu, ele está manchado pelas cores do sol poente e vermelho… Não, de vermelho e preto. Uma nuvem espessa e preta engole todo ele. Quando foi que…? Não, parece que está crescendo enquanto conversamos.

— É ela! Ela invocou uma nuvem tempestuosa!

Ela. Sim, Dourada. A governante da terra maligna, a Dourada, começou a se mover.

— Se apresse! Diga aos humanos… Oh! Está chegando perto!

As nuvens emitem um som assustador, contorcendo-se antes de uma luz e um impacto se seguirem. Um após o outro. De novo e de novo. Ninguém pode fazer nada a não ser fechar os olhos e se agarrar contra o massacre. Uma mostra esmagadoramente violenta de magia de relâmpago.

Mesmo assim, mal algum acontece às nossas tropas, pois acima de nós flutuam inúmeros Sinos de Água-viva e Gongos do Peixe-lua. Devagar, quase que casual. Apesar de serem alvos dos relâmpagos, absorvem sem deixar que o mínimo de choque ultrapasse. Uma arte divina e imponente em posse da Sino. A habilidade surpreendente de Lady Sakiel.

Os humanos… eles não têm chance. A cavalaria, a infantaria, os magos, nenhum deles consegue. Há poderes que equipamento algum pode parar. Tal é o relâmpago disparado pela magia de invocação de Dourada.

Mas é um ataque indiscriminado. Os humanos sofrem perdas enormes, mas os vampiros que os atacam também são atingidos. Não importa o poder, se ele só pode criar resultados bárbaros e destrutivos, acaba por ser digno apenas de desprezo, não de admiração.

E, agora, os mil seixos, o núcleo das suas tropas, começam a se mover. Eles sempre estão com a Dourada. Se pudermos dar um jeito neles de maneira correta, seremos capazes de vencer esta batalha.

— F-Fleilyu…!

Lady Sakiel, se essa é a sua primeira vez em um campo de batalha, posso entender muito bem os sentimentos que a incomodam.

— Lhe dou minha ordem como Comandante Dragão.

Lady… Sakiel?

— Ajude o exército humano. Salve os feridos deles, então recue. Eu irei dar cobertura ao recuarem. Fique em silêncio, esta é a minha ordem. Eu devo Fazer o Meu Melhor e forçar um impasse!