Não estou perdida, pois Deus me salva, me ama e me protege.
-Transmissão de DDR, Parte 1-
O tempo que passo na frente da máquina de vendas para decidir que café comprar é tão relaxante. Há uma felicidade em estar perdido, não acha?
Então! Continuando! Olá, recém-chegados e bem-vindos de volta, veteranos! Sou PotatoStarch! Para a transmissão de hoje, pensei em jogarmos um pouco de Dragon Demon RPG DX. Tenho certeza que todos já conhecem. É um jogo japonês que foge de todas as tradições. Um RPG de mundo aberto, no qual a narrativa depende das suas ações. O nível de liberdade, número de opções de [1]playthrough e espaço necessário de disco rígido estavam acima da média. Além disso, a dificuldade era tão alta que o senso comum dos desenvolvedores era questionado.
No trailer, diziam: “Embarque em uma grande aventura em um mundo de espadas e magia”. Mas o jogo é tão brutal que contradiz por completo essa frase. Primeiro, o próprio título era uma armadilha. Havia dragões e demônios no jogo, mas, caso os encontrasse como inimigos, eles iam te matar. Simplesmente te matariam. Não passavam de eventos de morte forçada. E mesmo que os tenha como aliados, ainda vão te mat- Oh, está começando!
Ah, a cena de abertura é perfeita. Essa é uma versão de luxo, realmente. É tão linda que te enche de alegria. Homens bonitões dão gritos de vitória enquanto mulheres charmosas sorriem timidamente.
Mas é tudo uma mentira. Uma ilusão. Não há esperanças nem sonhos no mundo desse jogo. É um mundo de desgosto. Bem, é por isso que eu gosto, no entanto.
Agora, com o que eu deveria jogar? Posso morrer logo de cara, mas tem que ser uma garota bonita, né? Vamos nessa então, deixar o rosto para o gerador de personagem e… hã? E-Essa garota… D-De qualquer forma, parece bastante boa, certo? Vamos com ela. Quanto ao nome, que tal [2]“Kuroi”, já que tem cabelo preto?
Eu escolho você, Kuroi! A propósito, algum de vocês notou que só podem selecionar sua raça, gênero e aparência nesse jogo? Todo o resto é deixado para a sorte. É uma aposta estranha. Faz com que o slogan deles, “Destinos infinitos o aguardam”, soe falso para mim.
Como podem ver, escolhi um humano. Eles são a raça menos popular que tem. Mas acho que desta forma posso mostrar as melhores característica do jogo para todos vocês. Podem dizer que é tipo se afogar em um mar de desespero, mas curtindo a vida. Agora era só confirmar e pronto.
Está rodando para determinar meu ponto de partida! Os resultados aqui determinarão meus níveis de status e habilidades, então é bastante importante. Sério, basicamente tudo é decidido com base em onde você nasce? Onde está o romance, hein? É inutilmente realista. Guardem essas porcarias para vocês mesmos, desenvolvedores.
O que será? Um nobre ou alguém de origem militar de alta patente faria com que os meus status iniciais fossem ótimos e diminuiria um pouco a dificuldade estratégica… Oh, deus. Oh, deus. Uma escrava. Dentre todas as coisas, uma escrava? Uma escrava humana era, sem dúvidas, o pior começo que eu poderia ter. Isso era ruim ao quadrado. Tipo, humanos são, basicamente, escravos mesmo. São a raça mais fraca do jogo, fazendo com que sejam a escolha perfeita para masoquistas.
As configurações de mundo para o DDR eram incrivelmente injustas para humanos. Vampiros controlam 40% do continente e estão expandindo de maneira agressiva o seu território, enquanto os elfos também controlam 40% e defendem com firmeza suas fronteiras. Os 20% que sobraram são controlados pelos humanos — ou melhor, estava mais para uma zona neutra que lhes permitiram ocupar. Eram tratados como uma raça inferior, a qual era alvo de discriminação. O simples fato de falar sobre o quão cruel é a situação já me deixa triste.
Na realidade, como seres vivos, a força em batalha deles está em uma escala diferente. Em termos de força física, fica o seguinte: vampiros, humanos, elfos. Quando se trata de habilidades mágicas: elfos, humanos e vampiros. Se eu explicar dessa maneira, os humanos não parecem tão ruins. Entretanto, cada uma das especialidades das outras raças quebra o balanço e deixa os humanos comendo poeira.
Agora, sei que está pensando que eu estou sendo todo dramático — Caramba! Está levando uma eternidade para carregar. Quanto tempo mais? A propósito, meu começo como escravo está travado, mas ainda há uma rodada randômica para que tipo de escravo serei. Tem vários pontos nesse jogo em que o jogador pode pensar que existe liberdade, mas não existe. Um escravo gladiador faria com que as minhas habilidades de luta aumentassem com facilidade. Seria uma boa. Até mesmo um escravo mineiro faria com que a minha força física fosse… Não, não vou ser tão sortudo. Já que sou uma personagem feminina, talvez acabe como um escravo acorrentado. O melhor que posso esperar seria ser o animal de estimação valioso de outra raça. Desta forma, poderia esperar o momento certo e visar a chance perfeita para me libertar. Com um pouco de má sorte, poderia acabar tendo um fim de jogo instantâneo, mas… Oh, carregou.
Um servo, hm? Eita. Eles têm um pouco de força física, mas suas habilidades…! Isso vai deixar a aquisição de magia difícil. Oh, mas meu local de início é bem interessante. Fica nos arredores do território humano, então eu posso ser capaz de mostrar todo o verdadeiro charme de DDR antes do esperado. Há ataques de monstros para lidar, abuso dos elfos — um vampiro pode até acabar nos assassinando. Pois é, tantas coisas para deixar na expectativa.
Então! Para evitar isso tudo, terei que aumentar os meus status depressa. Em outras palavras, mini-games sem parar! Hehehe! Contemple as minhas habilidades de construção. Click click click! A propósito, pessoal, vocês são do tipo que correm atrás de informações estratégica antes? Ou só usam quando estão enrascados? Pessoalmente falando, eu… Oh! O sol está se pondo. É hora de vampiros, o que significa que precisamos entrar no abrigo. O mini-game que recomendo aqui é…
-Cavaleiro Agias I-
A garota era estranha. Cabelo e olhos pretos, magrela, quieta e baixa. E uma trabalhadora. O cultivo na Fronteira era visto como uma punição, nada mais. E, na realidade, apenas servos e condenados eram mandados para trabalhar lá. Quaisquer preocupações e reclamações que ela pudesse ter foram sobrescritas por uma renúncia lúcida e, apesar do fato de que era a única ali que usava a enxada sem qualquer senso de convicção, nunca desistiu. Arava diligentemente, trabalhando em silêncio. Ninguém poderia se igualar aos seus resultados. Dia após dia, nunca se cansava.
Mas ainda tinha alguns hábitos curiosos. Era algo que eu testemunhava durante as pequenas pausas do nosso trabalho pesado. Às vezes, pulava repetidamente sobre a pilha de lenha. Em outros momentos, jogava pedrinhas em rochedos. Eu até a vi encarando sem piscar um balde de água tirado do poço e contando inúmeros grãos de trigo. Se falasse até dos pequenos detalhes, ela teria dezenas dessas atividades que, por algum motivo, repetia com todo o esforço em uma certa ordem. Chegou a ponto de sacrificar o sono para continuar com isso.
Em uma noite enluarada, a confrontei. Precisava saber. Não tinha interesse nos outros, muito menos em uma plebeia que sequer poderia manejar uma espada, mas fui obrigado. Ou, talvez, fui atraído até ela pelo destino.
— De onde você é?
— Dali. — Apontou para o chão. Me perguntei se seus pais tinham a vendido ou havia sido abandonada. Ambos eram atos comuns.
— E a sua família?
— Não tenho.
— Foi criada em um orfanato?
— Não. — Seja lá o que ela tenha passado, não pude conseguir informação alguma. O seu rosto, apontado para as estrelas, não buscava consolação nem mostrava tristeza. Eu sequer conseguia sentir um traço de solidão vindo dela. Uma determinação inabalável, suponho que assim possa chamar, brilhava no fundo dos seus olhos.
— O que são aquelas coisas que você faz? Vejo que tem muitos hábitos estranhos.
— Preparação.
— Para o quê?
— Sobrevivência.
— Parece cansativo e um desperdício de energia.
— Na verdade, não.
— S-Sério?
— Sim.
— Hm. Sério mesmo? — A garota rejeitou todas as tentativas de conversa. Parecia rejeitar tudo ao seu redor e, mesmo assim, era uma serva ansiosa. Trabalhava mais do que qualquer um, com uma disposição inabalável. Seu rosto bonito só era rivalizado pelo seu comportamento puro, e ela trazia uma sensação refrescante para todos ao redor.
Era sempre ela mesma. Apesar de chamar atenção, nunca mudou. Talvez o mundo visto pelos seus olhos era diferente daquele que todos nós víamos. No final das contas, vivia com força e cuidado neste nosso mundo cruel. Era como deveria ser— ou devo dizer, Deus Ex.
Certo dia, um grupo de monstros surgiu da floresta. O ar foi tomado por gritos e rugidos enquanto o chão era coberto por sangue humano, carne e entranhas. Mas apenas ela revidou, prosperando em meio às circunstâncias adversas. Ela era maior do que todos nós.
Essa garota, amada por Deus, se chamava Kuroi. Ganharia títulos heroicos, tais como: Matadora de Dragões e Matadora de Demônios, mas esta foi sua primeira batalha. E eu, Agias Willow, fui testemunha do seu poder incrível. Se não fosse por ela, um cavaleiro fraco como eu teria perdido a vida naquela batalha.
Notas:
2 – Playthrough: Jogar sem pular cutscene, diálogos, trailers, etc. Sendo assim tendo uma jogabilidade mais lenta, porém aproveitando o jogo do início ao fim. Também é uma tag no YOUTUBE, onde os vídeos de determinado jogo quase não tem edições, ou em alguns casos, não tem nenhuma. Com isso, contém partes onde a pessoa que está jogando morre ou erra diversas vezes.⇧
1 – Kuroi: Significa preto em português, no Japão essa cor simboliza sabedoria e respeito.⇧
Tradução: Taiyo
Revisão: Midnight
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