Uma rajada de vento gelado passou pela colina do templo, dando uma sensação desagradável ao alegre inverno. As casas arruinadas à beira do lago ainda estavam lá, fazendo o melhor que podiam para suportar o ar frio. Nuvens cobriam o céu, sem deixar entrar muita luz do sol, mesmo sendo meio-dia. Mesmo quando olhei para o céu, não senti calor algum.
Meses se passaram, e o dia do meu confronto contra Sanguinário finalmente chegou. Amanhã eu me tornaria um adulto. E na primavera, provavelmente deixaria esse templo e viajaria sozinho.
Fiz alguns alongamentos completos e pratiquei balanços com minha espada de treinamento, que pesava o dobro da minha arma habitual. Corte diagonal do ombro para baixo. Em cruz. Diminuir a distância e atacar. O som da ponta da lâmina cortando o ar ecoou.
Eu ouvi as palavras de Gus no fundo da minha mente. Coloquei um esforço extra para focar e esquecê-las. Meu corpo começou a aquecer e, gradualmente, passou para um estado em que eu poderia liberar todo o meu potencial.
— Beleza. — Depois que terminei meu aquecimento, coloquei minha espada de lado e verifiquei meu equipamento.
Eu estava com minha espada longa e um escudo circular: uma placa de madeira em uma armação de metal, coberta de couro. Tinha uma adaga no meu cinto para usar em combate próximo. Usava uma armadura de couro macio por cima de uma armadura grossa e, para as áreas vulneráveis do meu corpo, usava metal: uma placa na garganta, um peitoral, manoplas e grevas. E para terminar, um simples capacete também. Essa era a lista completa de equipamentos que usaria hoje. Acabei parecendo um cavaleiro fortemente blindado depois de colocar tudo.
— Will, deixe-me ajudá-lo com isso, — disse Maria. Este tipo de equipamento pesado era muito complicado para se colocar sozinho. Maria amarrou as cordas e prendeu as fechaduras na armadura, com as suas mãos treinadas.
Hoje provavelmente seria a última vez que usaria essa armadura. Na primavera, estaria saindo daqui e indo viver minha própria vida. Não poderia andar pelas cidades e montanhas constantemente usando um conjunto completo de armadura como um personagem de RPGs. E desde que não tinha a mínima noção de quanto tempo estaria na estrada, estar bem preparado e bem suprido seria uma prioridade maior do que usar muita armadura.
Mas nada disso importava hoje. Eu ia enfrentar Sanguinário lutando seriamente. Eu tinha a bênção de Maria, mas não seria de nenhuma ajuda se um dos golpes de Sanguinário me matasse instantaneamente.
Se eu quisesse o tipo de proteção que me salvaria da morte instantânea, mesmo que Sanguinário me acertasse com seu golpe mais poderoso, eu precisaria procurar pelos melhores itens dos anões, e encará-lo com uma defesa absolutamente impecável. Mas isso era uma disputa. Um teste de habilidades. Não é uma luta até a morte.
— Ei, Will. Preparado? — Sanguinário perguntou. Como desvantagem para me ajudar, ele não estava usando nenhuma armadura.
Ele tinha um talim em volta da cintura, ao qual estava presa uma espada de uma mão em uma bainha preta. Mas essa arma não seria a estrela do show. Em suas mãos, ele segurava uma longa e grande espada de duas mãos. Essa era a verdadeira arma do Sanguinário.
Eu examinei a área. Apenas a colina, grama seca, Maria e Sanguinário. Não havia sinal de Gus.
— A qualquer hora, — eu disse. — Vamos nessa… — Balancei a cabeça algumas vezes para tirar Gus dos meus pensamentos. Disse a mim mesmo para focar. Tinha que manter minha mente e foco na batalha.
— Beleza. Vamos repassar as regras uma última vez antes de começarmos. Sem magia. Nada de golpes instantaneamente fatais. Fora isso, vale tudo. Se algo acontecer, Maria resolverá. Vence quem fizer o outro se render ou quando um de nós ficarmos incapaz de continuar a batalha.
Enquanto ele casualmente explicava as regras, Sanguinário recuou e segurou sua espada larga. Disseram-me que, quando Maria ficava séria, ela podia restaurar um membro mesmo que fosse esmagado ou cortado, então essas condições eram absolutamente impiedosas.
— Tenha certeza de não morrer, — Sanguinário avisou. Sua voz baixa me fez arrepiar. E então meu teste final começou.
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Era como uma tempestade. O imenso peso da grossa lâmina de aço veio de todas as direções a uma velocidade impensável.
Sabia que era inútil tentar bloqueá-la. Mesmo um único golpe direto quebraria minha espada ao meio e esmagaria meu escudo. E não queria imaginar o que aconteceria se tentasse bloqueá-la com minha armadura. Onde quer que acertasse, tinha certeza que isso me levaria a ficar permanentemente deitado no chão em questão de segundos. Tentei desesperadamente evitar tomar mais do que um golpe de relance, batendo no lado da espada quando vinha para mim, desviando-a para longe de mim com o meu escudo, esquivando-me, andando ao redor, tentando resistir.
Meio que vi isso acontecer, mas tudo o que estava vestindo, todas as minhas armaduras, realmente estavam lá, então não iria morrer na hora! A força e a técnica dos mortos-vivos combinavam com o que eles tinham enquanto vivos, e Sanguinário tinha os dois de sobra. Ele estava demonstrando força monstruosa, bem como a técnica necessária para transferi-la para os golpes de sua arma.
O conhecimento do meu mundo anterior dizia que uma espada japonesa não conseguia cortar um samurai com armadura completa, e você também não conseguiria cortar uma armadura ocidental com uma espada ocidental. Se algo assim fosse possível, todos esses estilos pensados de armadura japonesa nunca teriam se desenvolvido.
Mas esses ataques de Sanguinário, grunhi enquanto evitava outro, eram diferentes. Ele fez questão de colocar tudo o que tinha nos balanços que ameaçavam me derrubar: seu tamanho físico avassalador, a força centrífuga de sua arma favorita incrivelmente longa, e o poder proveniente dos músculos treinados que ele tinha em vida. Mesmo que ele não pudesse me cortar, a força sozinha definitivamente me derrubaria.
Seja musculoso, e você pode resolver praticamente tudo pela força. Era a personificação perfeita do que Sanguinário sempre me disse.
Eu fiz um som desesperado no meio do caminho entre uma respiração afiada e um grunhido enquanto rapidamente dava um passo para trás. Minha espada longa tinha um bom alcance, mas o alcance de sua espada ainda era maior.
Ele tinha controle total dessa luta agora, atacando-me de novo e de novo de fora do meu alcance. E sendo um morto-vivo, Sanguinário não ficava cansado, então prolongar a luta seria impossível. Isso é uma merda. Não era como se eu não tivesse preparado nenhuma estratégia para lidar com sua maneira de lutar, mas se as coisas continuassem assim, eu não me conseguia ver tendo a chance de usar qualquer uma delas.
Eu amaldiçoei Sanguinário em minha mente. Você realmente precisa tanto assim da vitória?! Aja como um adulto!
Abri uma grande distância entre nós e chamei o ataque. Quando ele veio para mim, eu puxei a adaga do meu cinto e joguei para ele em um movimento rápido.
— Aha, — disse Sanguinário. Ele segurou sua espada larga, como um escudo, para desviar a adaga. A adaga colidiu com a espada, mas eu estava correndo para Sanguinário depois que joguei-a quase perto dele…
— Uau! — Eu pisei no freio de emergência e pulei para trás. Eu não tive outra escolha.
Sanguinário estava segurando a parte cega da espada com uma mão, e com a outra, ele segurou a base da lâmina, e mirou a espada em minhas canelas como se fosse uma arma de haste.
Ele riu.
— Achou que você só tinha que se aproximar? — Seus fogos-fátuos balançavam lentamente em suas órbitas. Eu senti como se um sorriso tivesse se formado em seu crânio.
Agora que eu pensava sobre isso, eu tinha uma leve lembrança de ler que as espadas largas de duas mãos e a nodachi japonesa podiam ser usadas dessa maneira. Não vai ser tão fácil, eu acho… ugh, isso é um pesadelo.
Agora que eu sabia que ele poderia segurá-la com as mãos separadas e usá-la como uma arma de haste, isso significava que a arma não só dava varrida, mas ataques curtos e rápidos também eram uma possibilidade. Se eu me aproximasse demais, arriscaria que ele usasse técnicas que alguém poderia usar com um cajado contra mim.
Não era simplesmente poder. Sanguinário dominava totalmente o manuseio dessa longa e maciça arma. Apesar do imenso peso dessa arma destrutiva, sua incrível força muscular permitia que ele mantivesse a distância e atacasse em sequência em um ritmo de tirar o fôlego. Ele era rápido, habilidoso e preciso. Se eu chegasse perto dele, ele mudaria a posição da sua mão e me atacaria de perto. Em suma, ele era monstruosamente forte, e igualmente em todos os sentidos.
Poder, técnica e armamento, ele não se tornou dependente de nenhum desses três à custo dos outros dois. Ele aprimorou todos os três juntos. Ele não tinha fraqueza que eu pudesse aproveitar. Não admira que ele era chamado de Ogro de Guerra. Eu realmente senti que era o que eu estava enfrentando.
Só tenho que arriscar. Eu me preparei bem.
— Oh? — Como se pudesse dizer o que eu estava pensando, Sanguinário segurou sua espada larga acima da cabeça, pronto para um ataque para baixo. Sua postura era uma declaração clara e confiante de que ele iria me esmagar, não importava o que eu tentasse.
Se eu bloqueasse com minha espada, ela se quebraria. Se bloqueasse com meu escudo, ele se quebraria. Se bloqueasse com minha armadura, ela se quebraria.
Eu precisava de algo melhor do que pequenos truques, ou ele apenas mudaria de ideia e faria eu me afastar. Como poderia sobreviver a esse ataque e trazê-lo ao alcance de minha espada? Havia apenas uma resposta.
Bradando um grito de guerra para me incentivar, avancei. Sua resposta: mudar sua postura para uma com a espada na vertical perto do ombro, e em um golpe horizontal no meu estômago! Era um ataque como de um taco de beisebol.
Um movimento de cima para baixo faria o inimigo usar seu escudo para desviar o golpe. Um golpe horizontal no pescoço permitiria que o inimigo se abaixasse, e um golpe nos joelhos permitiria que ele saltasse. Todas essas opções deixou Sanguinário com aberturas. Mas o ataque horizontal no estômago me deixou com apenas duas opções: pular para trás ou bloquear.
Pular para trás me salvaria, mas me colocaria de volta à estaca zero. Bloquear significaria que eu seria esmagado pela força física de Sanguinário. Este movimento foi uma escolha lógica que se encaixou perfeitamente com Sanguinário. E foi por isso que eu pude ver o ataque vindo.
Se eu bloqueasse com meu escudo, ele se quebraria. Se bloqueasse com minha armadura, a armadura quebraria. Então, quando Sanguinário fez um som curto de surpresa, deslizei meu escudo pela lâmina para retardar o ataque, e bloqueei o resto com minha armadura.
A espada larga acertou em meu escudo com força suficiente para esmagá-lo completamente e deixá-lo deformado, e então fez um segundo impacto no meu peitoral. Eu gemi quando acertou. Se eu suportaria ou não, era outra aposta.
Mas foi um risco que ganhei. Rugindo novamente, enquanto Sanguinário estava chocado, eu avancei para frente. Abaixando-me, eu o empurrei e me afastei com os restos do meu escudo. Seus pés saíram do chão.
Eu sabia que mortos-vivos tinham uma força misteriosa. Seus poderes e capacidades de manter-se firme foram preservados da mesma forma que em vida. Era por isso que Sanguinário podia balançar sua espada larga, e também podia ficar firme sem ser influenciado pela enorme massa da espada.
Mas e quanto ao seu peso? Se você simplesmente tentasse levantar Sanguinário do chão, ele seria tão pesado quanto era em vida? Não. Eu provei isso com o vraskus. Tornar-se um esqueleto reduziu seu peso. Isso tinha que ser uma pista de como eu poderia derrotar Sanguinário, que era um guerreiro excepcional.
O peso de todos os ossos de um humano, incluindo o líquido espinhal, é inferior a dez por cento do peso total do corpo. Mesmo que Sanguinário fosse um homem enorme pesando bem mais de cem quilos antes de morrer, agora, ele só pesaria em torno de dez no máximo. Mesmo incluindo o peso de suas armas, ele não passava dos cinquenta. Eu rugi mais alto do que nunca. Quando Sanguinário perdeu o equilíbrio, empurrei minha espada longa para ele com todas as minhas forças. Estava mirando em sua espinha. Tudo o que eu precisava era de um ataque…
— Will. — Uma palavra gentil chegou aos meus ouvidos.
Segundos depois, minha espada longa foi pega e presa entre as costelas dele.
— O q…
Assim que Sanguinário, segurando sua imensa espada larga, prendeu a lâmina de minha espada longa entre suas costelas, ele torceu seu corpo e a tirou de minhas mãos. Era o movimento de costela-aprisionadora (?!) equivalente à pegar a lâmina vindo em sua direção com suas mãos, só era possível pelo fato dele ser um esqueleto.
Surpreendido, eu não consegui soltar o cabo da minha espada longa a tempo, e antes que eu percebesse, meu braço estava sendo torcido com a espada larga, e fui jogado no chão. O choque do impacto fez eu perder o fôlego.
— Você lutou muito bem. — Tentei me levantar o mais rápido que pude, mas uma lâmina já estava descansando contra o meu pescoço.
Era a espada de treino de uma mão do Sanguinário, a que estava pendurada em seu cinto. A lâmina era preta fosca e um padrão carmesim corria vividamente ao longo de seu comprimento. Era uma espada mágica? Eu quase senti como se fosse uma espada demoníaca. Embora não fosse realmente a hora para isso, admirei a beleza da espada, apesar de sua aparência sinistra.
— Eu perdi, — eu disse baixinho, declarando minha rendição.
Gus obviamente tinha vários pensamentos diferentes passando por sua cabeça, mas eu nem cheguei ao estágio de deliberadamente perder ou não. Mesmo depois de montar um plano, mesmo depois de dar tudo o que eu tinha… me doía admitir, mas em um teste simples de perícia com espadas, simplesmente não conseguia vencer Sanguinário.
— Bom trabalho —, Sanguinário disse. — Porra, isso foi difícil. Não ter músculos é uma real desvantagem. — A partida acabou, e Sanguinário embainhou sua espada.
Como sempre, não sabia como responder a esse comentário, mas entendi o que ele queria dizer. Quando eu estava prestes a dizer alguma coisa, uma voz arrepiante encheu o ar.
— Sanguinário?
— Ack! Maria…
— Ack? Essa não é uma maneira muito legal de responder.
Maria tinha as duas mãos nos quadris e estava olhando para Sanguinário, sua expressão indicava claramente o quanto ela estava irritada. Sendo uma múmia, Maria não tinha olhos. Isso a deixava ainda mais assustadora.
— Eu te disse para não usar mais esse movimento, não disse?
“Esse movimento? Não usar mais?”
— U… Uh… o que seria?
— Não se faça de idiota! Esse movimento onde você pega a arma do seu oponente em sua caixa torácica!
— Sim, mas… não é como se eu ainda tivesse órgãos.
— O que?! — Eu gritei, incrédulo. — Sanguinário, você fazia isso enquanto estava vivo?
— Sim, fazia! — Maria estava extremamente irritada. — Você acredita nisso?!
Eu balancei a cabeça. Ele era verdadeiramente inacreditável.
Eu estava pensando que esse movimento era algo que apenas um ser morto-vivo poderia realizar, mas de repente me lembrei que os mortos-vivos nunca avançavam. Com pouquíssimas exceções, todos os ataques e assim por diante que eles poderiam usar conformavam-se ao que eles conheciam em sua vida anterior. Em outras palavras, ele não seria capaz de realizar uma ação insana como essa, a menos que ele tivesse experiência com isso antes de morrer.
— Ele estava enfrentando um demônio que tinha um florete com a Palavra Penetratus inscrita.
— Sim, ele era uma pequena praga ágil e bom com sua arma. Ele se esquivou de mim e parecia que estava indo para Maria, então naturalmente eu…
— Naturalmente?!
Naturalmente, ele se permitiu ser perfurado no torso, prendeu a arma do demônio em suas costelas, jogou-o para o chão e decepou sua cabeça? Nenhuma pessoa em sã consciência poderia chamar isso de um curso natural de ação. Apenas o Ogro de Guerra poderia fazer algo assim.
— E… ele tem sorte de ter sobrevivido…
— Ele estaria morto sem a minha bênção!
— Sim, e eu confiei em você! É por isso que eu fiz isso!
Uau, as estratégias que uma equipe pode usar. E ele fez isso em primeiro lugar para proteger Maria.
— Desculpe! Eu pensei que você tivesse morrido no local! Eu estava realmente preocupada! Agora eu pedi ou não pedi para você nunca mais fazer isso?! — Era raro ver Maria discutindo com alguém assim. Entendi o motivo de Sanguinário, mas também podia entender os sentimentos de Maria.
Vamos lá, Sanguinário. Claro que ela ficaria com raiva.
Eu sorri e ri secamente. Não havia melhor maneira de responder a esta situação. De longe, assisti Sanguinário ouvir sermão por um tempo. Posso não ter tido muita experiência com relacionamentos, mas não era estúpido. Havia um ditado sobre pegar um cachorro pelas orelhas, afinal.
Sanguinário ruidosamente fingiu limpar a garganta.
— Uhh, de qualquer maneira. Will, mesmo que você não possa me vencer, você não terá problemas se continuar tão bom assim. Mesmo que você não possa me vencer. Mesmo que você não possa me vencer!
— Pare de dizer isso! Você é tão irritante!
Caramba! Como diabos eu deveria prever esse estratagema distorcido? Montei uma estratégia adequada com antecedência, como lidar com o enorme poder de sua espada, como explorar seu peso, todas essas coisas, e acertei tudo, só para dar tudo errado no último segundo!
Sanguinário riu alto.
— Quer me dizer como você está se sentindo agora?
— Gaaahhhh! Vou encarar você de frente e destruir você da próxima vez!
E eu diria: — Bem? Como você está se sentindo agora? — Olhando diretamente para seu rosto estúpido!
Ele ainda estava rindo.
— Esse é o espírito, esse é o espírito, Willie, meu garoto…
— Tudo bem, já chega! — Maria disse, dando um tapa na cabeça dele.
— Ai!
Sim, tome isso. Você mereceu!
— Vocês dois! Por favor, vocês vão continuar brincando?! — Ela também ficou com raiva de mim. — Continue! Com isso!
— Tudo bem, tudo bem, vou ouvir você… — Sanguinário disse de má vontade. — Então, sim, sim. Se eu tivesse algum movimento assassino ou tecnologia secreta para transmitir, poderia ensiná-lo agora mesmo.
— Você não vai?
— Não —, ele disse claramente, e deu de ombros. — Você e eu temos diferentes maneiras de lutar. Eu não estou tentando transformar você em uma cópia minha. Então os movimentos que são úteis para mim não serão os úteis para você. E de qualquer maneira, como disse antes, os movimentos são situacionais. Você não pode confiar em apenas um. — Ele falou confiante e calmamente. Eu podia sentir o ar de um guerreiro forjado em batalha sobre ele.
— O que importa é o básico. Lembre-se de todas as coisas que eu ensinei a você, e esteja pronto para usá-las a qualquer momento. — Ele bateu com o punho contra o peitoral e segurou-o lá. Maria sorriu enquanto nos observava. — Eu e Maria… Nós lhe ensinamos tudo de importante que você precisa saber.
Seu punho esquelético não tinha calor. Mas eu tinha certeza de que podia sentir algo quente emanando dele, enchendo meu peito.
Então reuni um pouco de coragem e respondi, com orgulho e um sorriso no rosto.
— Obrigado pai. Obrigado mãe!
Sanguinário riu alto.
— ‘Pai’? Realmente nunca pensei sobre isso. Suponho que sou.
— Sim, eu acredito que você é —, Maria disse. Sua risada era silenciosa e elegante.
Comecei a sentir-me meio envergonhado e, inconscientemente, arranhei o lado do rosto com o dedo. Nós três rimos juntos por um tempo.
Eu senti uma sensação de família. O pensamento de que eu teria que deixá-los na primavera era incrivelmente difícil de aceitar.
— Ok, e sobre isso —, Sanguinário disse depois que nossas risadas pararam. — Eu não posso te ensinar nenhum movimento final, mas, o que acha de achar algo para marcar a sua independência?
Eu olhei para ele, perplexo.
— Eu estou te dando isso.
Ele desabotoou o cinto da espada e me presenteou com a espada mágica que usou para acabar com nossa luta: aquela espada sinistra, atraente, preta, de uma mão.
— Esta é a mais forte espada demoníaca que tenho.
A mais forte? De todas as que ele possuía? Mas eu quero dizer…
— Eu nem ganhei…
— Eu disse que é para marcar sua independência. Vá em frente, saque-a. — Ele empurrou-a em minhas mãos, com cinto e tudo.
Eu hesitantemente coloquei o cinto, e com um pouco de receio, tirei a espada larga de uma mão de sua bainha. Era preta fosca e de dois gumes. O peso era distribuído em direção ao final da lâmina, que era um pouco mais grosso e mais largo que o resto. Pensei que provavelmente era bem afiada. Os elementos decorativos da espada davam-lhe uma espécie de impressão sinistra, e o desenho carmesim que corria pela lâmina tinha uma beleza sedutora.
— Seu nome é Devoradora. É uma das melhores espadas demoníacas. Vai cortar o que você quiser, até mesmo os Ecos dos deuses, desde que você consiga um ataque de verdade. As Palavras inscritas nela são muito difíceis de entender, mas eu posso resumir o efeito em uma frase, — Sanguinário falou com naturalidade — Quando você corta seres vivos com essa espada, ela recupera sua força vital. Quanto mais você corta, mais se recupera.
Hã?
— Espere o quê? Eu ouvi errado?
— Eu vou dizer de novo. Quando você corta os seres vivos com essa espada, ela recupera sua força vital. Quanto mais você corta, mais se recupera. Você não ouviu errado. Se você estiver em um confronto corpo a corpo, você pode simplesmente deixar sua mente vagar e balançar essa coisa. Você ainda será o último homem de pé.
Percebendo as implicações disso, eu fiquei pálido.
— Você é esperto. Tenho certeza que você já entendeu, mas… eu não quero que você tire essa coisa a menos que seja necessário. Não se apoie nisto —, Sanguinário continuou, no mesmo tom calmo.
— Vai fazer você se sentir forte, mas este não é o tipo de espada que serve para fortalecer o espírito do portador. Se você se apoiar, mais cedo ou mais tarde você vai se tornar dependente demais. Você ficará mais ousado com suas habilidades com a espada, e elas se tornarão uma sombra do que são agora. Ela vai direto para a sua cabeça, e mais cedo ou mais tarde você vai lutar com alguém que é muito melhor, ou alguém irá envenená-lo, ou você será cercado por arqueiros à distância, e de volta você irá para roda eterna do destino. Isso é o que faz disso uma verdadeira espada demoníaca. — Sanguinário fez uma pausa.
— Quanto a mim, sou um morto-vivo. Eu não tenho força vital, afinal de contas, então essa coisa não serve para mim. É apenas peso morto. Então estou dando para você. Apesar de todas as coisas que eu disse, tenho certeza que você vai ficar bem. Você pode dizer para o que é útil.
Maria concordou com a cabeça. Ambos tinham fé em mim e acreditavam que eu poderia lidar com essa coisa aterrorizante. Minhas memórias antigas passaram pela minha mente e meu coração doeu um pouco. Eu realmente era uma pessoa tão boa quanto eles acreditavam que eu era?
— Agora, então. Quando um guerreiro entrega sua espada demoníaca, o costume diz que deve contar sua história! E eu não vou ser o cara que quebra uma tradição antiga. Então, vamos falar sobre essa espada! — A voz de Sanguinário ficou animada, como se para apagar a atmosfera sombria que havia brevemente sobre nós. — E, claro, a história que a envolve. Nossa história. Sua história. A história que você ansiava ouvir.
Eu não podia acreditar que finalmente ia descobrir. Isso estava na minha mente há tanto tempo.
— Sanguinário… — Eu disse, sem palavras.
Sanguinário olhou para Maria. Ela assentiu, sorrindo.
— Você é um homem agora, Will —, ela disse.
— Eu prometi a você que diria quando você fosse maior —, Sanguinário continuou. — E você é mais do que grande o suficiente agora, no corpo e no coração. Vai demorar um pouco, mas vou te contar tudo. Esta é a história do rei entre os reis dos demônios que tentaram conquistar este continente: o Alto Rei dos Eternos. É a história da morte de muitos heróis. É a história da nossa derrota. É a história de como morremos… — Uma rajada de vento gelado passou por nós pelo cemitério na base da colina. — e é a razão pela qual você cresceu aqui.
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Mesmo que numerosos títulos existissem para se referir àquele rei dos demônios, não existia ninguém que conhecesse seu verdadeiro nome. Ele era chamado de Lâmina dos Mortos-Vivos, o Rei Entre os Reis. O Puro Mal, a Escuridão Inesgotável, o Cavaleiro das Tempestades, o Tagarela…
O Rei Supremo dos Eternos.
Há duzentos anos, o continente de Southmark, que desfrutava de uma paz duradoura, foi invadido por um rei demônio que comandou um exército de inumeráveis demônios.
— Foi um pandemônio global instigado pelos reis demônios do Abismo, — Maria disse. — Eles tinham projetos nesse plano, e eles estavam aguardando o tempo certo, aguardando sua chance.
— Demônios de alto nível que você realmente não quer ver frequentemente. Reis, Generais, todos esses caras, todos vieram rastejando para fora da casinha. — Sanguinário disse.
Os reis demônios conspiraram juntos para fazer um grande tumulto. Para dar uma ideia do senso de escala, o Vraskus, que eu havia derrotado antes, era classificado como Comandante. O General era o próximo posto, e Rei era o posto acima disso.
Com base em minha experiência com o Vraskus, achei que poderia lidar com um General cercado por soldados, se estivesse preparado para aceitar riscos significativos. Contra um Rei, porém, eu provavelmente não teria chance, não sem fazer algumas suposições completamente irrealistas como lutar cara a cara. Se esse tipo de demônio tivesse um exército de formigas, bem, não era difícil entender o quão terrível isso seria. A sociedade não era inteiramente composta de pessoas como eu, que haviam passado por treinamento de combate. E despachar um grupo de soldados gastaria tempo e energia física, mesmo se você tivesse experiência.
— Além disso, — Sanguinário continuou — aqueles Generais e Reis que se espalharam pelo nosso mundo realizaram uma série de grandes rituais para o seu deus, o deus das dimensões. Eles ofereceram a esse deus enormes quantidades de carne e sangue. Você provavelmente aprendeu geografia com Gus, mas, uh… meu conselho é, não pense que ainda é o mesmo atualmente. Não me surpreenderia se houvesse enormes buracos na terra que virou mar, ou se o mar secou e agora é terra.
— Como se estivessem esperando que tudo isso começasse, — Maria disse — os servos do deus da tirania, Illtreat, e do deus da morte, Stagnate, também se tornaram ativos em todo o mundo. Os deuses bons gastaram muita energia para se opor a eles. Muitas dessas batalhas duraram o suficiente para mudar o mapa para sempre. A informação tornou-se bastante confusa e caótica. As diferentes regiões perderam completamente o contato umas com as outras.
Achei um pouco difícil imaginar o caos nessa escala. De qualquer forma, basicamente, o mundo se tornou uma bagunça.
— Então… graças a isso, estamos praticamente sem noção de como que os outros continentes eram naquela época —, Sanguinário disse. — A única coisa que sabemos é sobre o Rei Supremo, que foi o principal a ficar furioso em Southmark.
— Ele tinha alguns apelidos bem preocupantes —, eu disse.
— Sim. Não me faça começar. Esse cara era tão doido da cabeça, eu quero adicionar mais alguns. Ele não parecia muito, apenas um pirralho com olhos de aparência cruel. Mas…
Mas?
— Primeiro, quando seu sangue era derramado, se transformaria em demônios Soldados. Quando sua carne era cortada, se transformaria em demônios Comandantes. Ele poderia continuar produzindo-os para sempre.
— Mais uma vez, minha audição está me enganando?
— Eu posso contar tudo de novo se você quiser.
— Hax…
— Hax?
— Quero dizer… ele é um trapaceiro! — Ele poderia apenas continuar multiplicando suas forças infinitamente? Que tipo de piada idiota era essa?!
— Nada além de lâminas poderia cortá-lo também. Explodi-lo com magia ou atirar nele com flechas, não era nada mais que um arranhão. E não só isso —, Sanguinário suspirou — mas sua espada favorita era a Devoradora.
Eu pisquei.
— Você entendeu. Ele era louco. Ele constantemente tagarelava enquanto cortava seus inimigos e se cortava, multiplicando seu exército como queria.
— Estou sem palavras. — Que trapaceiro desgraçado.
Maria assumiu.
— A razão pela qual ele passou a ser chamado de Rei Supremo, significando o Rei Entre os Reis, foi por causa de sua atuação na batalha, que foi notável até mesmo entre os demônios de ranking Rei. Foi muito acima e além do normal.
Sua voz diminuiu para um murmúrio.
— Muitas cidades foram consumidas pelas hordas de demônios. Esta aqui foi uma delas. Era um importante centro para o transporte no lago, mas mesmo com a determinação conjunta dos humanos e dos anões para protegê-la, mal passaram alguns dias antes que caísse.
Ela olhou para a cidade em ruínas com olhos distantes.
— E foi nessa cidade que o Rei Supremo permaneceu, produzindo demônios. Eles assumiram o controle de todo o transporte de água nas proximidades. Embarcações cheias de demônios Soldado e Comandante usavam as rotas para invadir cidades em vários lugares. Era dia após dia, noite após noite de derramamento de sangue e incêndios. Por haver tantos refugiados, as cidades que ainda estavam seguras tinham que lidar com as brigas internas. Às vezes eles não conseguiam aceitar todos e tinham que expulsar as pessoas. Houve tumultos. Os desordeiros foram massacrados em massa…
Eu me senti mal apenas ouvindo isso.
— Ninguém conseguia matá-lo. O colapso de Southmark foi considerado inevitável. E não apenas isso, mas o alcance do Rei Supremo se estendia facilmente através do estreito e do mar intermediário que separava Southmark do continente Grassland e do norte. Quase todos estavam aceitando, — Maria sorriu — quando Gus, o Sábio Errante Augustus, declarou que agora era a hora de atacar, e apresentou seu plano para destruir o Rei Supremo.
Meus olhos se arregalaram.
— Agora era a hora? Espere um segundo. O Rei Supremo é cercado por uma horda infinita, ele não pode ser morto por flechas ou magia, e a única coisa que funciona nele, a espada, faz com que os demônios nasçam de sua carne e sangue derramados. E ele tem uma espada demoníaca que o cura quando contra-ataca.
— Sim.
— Destruir ele… Como? Em primeiro lugar, quem seria capaz de matar… hm. — Parei no meio da frase. Uma lâmpada estava piscando dentro da minha cabeça. Eu senti como se quase tivesse alguma coisa.
Eu pensei sobre isso. Um exército de demônios. Flechas e magia não funcionam, apenas espadas. Sangue e carne se tornam demônios. Lâmina demoníaca. Cidade. Cidade subterrânea. Técnicas de batalha do Sanguinário. Bênção da Maria. Estratégia de Gus…
— Aha. — Uma ideia surgiu no meu cérebro como uma corrente elétrica. — Entendi.
Sim. Sim, era isso. Havia uma chance assim. Ele poderia ser morto, se fosse feito corretamente.
— O que você quer dizer, você entendeu?
— Você realmente descobriu?
— Sim. Provavelmente. — Toquei na Devoradora, que estava pendurada no cinto ao redor da minha cintura. Em teoria, deveria funcionar. Deveria ser possível matá-lo dessa maneira. — Gus provavelmente planejou uma equipe de elite para se infiltrar na cidade através do subterrâneo.
Esta cidade tinha um complexo quarteirão subterrâneo cheio de anões. Provavelmente também tinha passagens secretas, embora eu não tivesse o talento para encontrar alguma. Se eles pudessem entrar por uma delas, era possível que eles pudessem passar pelas forças demoníacas e atacar diretamente o centro.
— E ele provavelmente usaria alguma magia localizadora para identificar a localização do Rei Supremo de antemão. Isso provavelmente seria muito fácil para Gus. — Eu tive a impressão de que Maria e Sanguinário estavam surpresos. Parecia que eu estava certo até agora. — E depois…
Coloquei minha mão no queixo, repassei a ideia que tinha passado pela minha mente mais uma vez. A questão era como matá-lo. Flechas não funcionavam, a magia não fazia nada. Ele poderia ser golpeado com uma espada, mas os demônios sairiam dele infinitamente, e se você levasse um único golpe de sua espada demoníaca, todas as feridas infligidas a ele seriam curadas. Provavelmente havia apenas uma maneira de fazer algo sobre isso.
— Roubar sua espada demoníaca durante a luta.
Foi-me dito que a Devoradora recuperava sua própria força vital quando você cortava seu oponente. A julgar pelo nome, provavelmente sugava a força vital deles ou algo assim. A questão era que todo o problema começou porque o oponente tinha aquela espada.
O inimigo só sofreria dano quando cortado, e essa lâmina deixaria ele bater em você enquanto recuperava suas feridas e gerava um fluxo interminável de demônios. Não havia como vencer. Mas a espada demoníaca, que era uma das premissas dessa situação “invencível”, era apenas um objeto como qualquer outro, e poderia ser entregue ou roubado. Não era uma das habilidades inerentes do Rei Supremo. Não era algo com que ele nasceu.
— Uma vez que você roubasse sua espada demoníaca, as peculiaridades do Rei Supremo seriam sua ruína. — Quanto mais você o corta, mais demônios sairão prontos para curar você. E Sanguinário não tinha me dito que em uma luta, você poderia balançar essa espada sem pensar e ser o último homem de pé?
Você seria capaz de continuar atacando o Rei Supremo, usando os fracos que saem dele como fonte de cura. O Rei Supremo, por outro lado, não seria capaz de se recuperar mais, tendo perdido a espada demoníaca, que era seu item de cura.
— Caso se tratasse de uma competição de resistência, o Rei Supremo deveria ser aquele que desistiria primeiro… — Eu murmurei pensamentos incessantemente. — Quanto a como roubá-lo… Primeiro, Gus acabaria com os caras à sua volta com um feitiço de grande escala. O Rei Supremo não pode ser ferido por magia, então isso é perfeito para nós.
Nós só precisávamos colocá-lo em uma batalha cara a cara, mesmo que temporariamente.
— Então Sanguinário, você iria para o ataque. Maria curaria você e o Rei Supremo com bênção. Isso impediria que mais demônios aparecessem. — Se sua carne e sangue se transformassem em demônios, então curar as feridas deveria parar isso. O objetivo desta primeira fase não seria machucá-lo, seria apenas roubar sua arma.
— Nós provavelmente precisaríamos de alguma ajuda para parar os demônios vindo de fora. Algumas dúzias… Na verdade, talvez uns cem ou mais? — Essas pessoas também provavelmente seriam elites muito talentosas, mas os números que eu imaginava em torno deles não podiam ser subestimados. Nossas forças presumivelmente seriam gradualmente reduzidas.
— Então você, Sanguinário, usaria seu truque de costela-aprisionadora, ou agarraria ele, ou cortaria seus dedos ou mãos, basicamente o que quer que você tenha que fazer para conseguir a espada demoníaca dele. Esta parte definitivamente funcionou.
— Ei, espere —, Sanguinário disse — Como você pode ter tanta certeza?
— O fato de você ter a espada demoníaca em primeiro lugar prova que você conseguiu roubá-lo, certo? — Sanguinário ficou quieto. Eu pensei que estava certo. — E isso seria xeque-mate.
As habilidades do Rei Supremo eram tão injustas que ele basicamente estava trapaceando, mas teoricamente, ele poderia ser morto dessa maneira. Não havia como Gus deixar passar uma oportunidade como essa. Ele teria reunido uma equipe de elites de alguma forma, e conseguido.
— O Rei Supremo… morreu, eu acho. Mas ainda havia hordas de demônios por aí. O suficiente para esmagar nosso pequeno esquadrão… — E todos morreram. Basicamente, uma derrota mútua. Que triste conclusão. Mas, mesmo assim, o continente foi salvo…
— Não, Will —, Sanguinário interrompeu.
Quê?
— Você é mesmo um gênio. Estou mais seguro agora do que nunca. Mas a sua conclusão —, Sanguinário disse amargamente —, está errada. — Ele parecia enojado consigo mesmo.
— Nós… eu… não consegui matar o Rei Supremo. — Suas palavras estavam cheias de profundo desespero e resignação.
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— Você… não conseguiu matá-lo?
A cabeça de Sanguinário foi jogada no chão. Maria assentiu em resposta à minha pergunta.
— Will, você pensou corretamente. Todos os seus palpites foram surpreendentemente precisos ao descrever exatamente a estratégia que Gus planejou. Assim como você imaginou, Gus recuperou a possibilidade de matar o Rei Supremo, fazendo uso de todos os fatores visíveis para ele. E, de fato, o plano dele foi bem-sucedido —, Maria disse calmamente. — Mas… — Sua voz soou distante, como se ela estivesse olhando para algo distante. — Mas o Rei Supremo tinha mais para dar além dos fatores visíveis para Gus. Ele era um monstro além das expectativas de Gus.
Agora eu realmente estava perdido por palavras. Eu nem sequer tinha em mim para chamá-lo de trapaceiro novamente. O que esse cara era?
— O Rei Supremo rasgou sua aparência infantil e revelou sua verdadeira natureza, assumindo a forma de um guerreiro hediondo e grotesco. E, hum… bem… — Maria vacilou, como se fosse difícil para ela dizer o resto.
Sanguinário falou por ela.
— Quando o Rei Supremo ficava sério, ele era um espadachim melhor do que eu. — Ele estava olhando para longe. Eu me perguntei se ele estava se lembrando de sua luta com o Rei Supremo.
Ele falou novamente.
— Nada funcionou. Eu lutei com caras grandes como esse várias vezes antes, mas esta foi a primeira vez na minha vida que não pude fazer nada.
Foi além da imaginação. Sanguinário não era páreo para ele? Qual o nível de habilidade que esse cara tinha? O que uma pessoa precisaria acumular, e quanto, para ter uma esperança de alcançar alturas tão estonteantes?
— Minha espada demoníaca não estava cortando nada além de ar, e ele estava me separando com algum demônio nojento que ele tirou com a Palavra de Despacho. Enquanto isso, mais longe, nossos aliados que estavam agindo como nossos muros dos demônios estavam sendo esmagados. — Ele falou disso com um sorriso falso, como se fosse um pesadelo de criança. — Eu posso dar desculpas por um longo tempo, sabe? Ele era o chefe dos demônios. Rei entre os Reis. As habilidades de seu corpo eram como nada que eu já tivesse visto. A espada demoníaca que eu roubei era uma espada de uma mão, diferente da espada que sempre usava. E assim por diante. Mas você sabe o quê? Tive apoio suficiente. Tinha a magia de Gus, a bênção de Maria. O Rei Supremo também ficou ferido por causa de sua forma infantil.
Seu oponente poderia dar desculpas exatamente como ele podia. Batalhas eram muitas vezes assim no mundo real, ele me disse sombriamente.
— E ele não estava muito melhor. Só um pouco. Provavelmente apenas um passo acima, isso é tudo. Um passo adiante, a uma altura que não consegui alcançar enquanto estava vivo.
Isso provavelmente fez um ferimento terrível no coração de Sanguinário. Eu nunca o ouvi soar tão deprimido antes. Ele normalmente era tão brilhante.
— Eu ainda penso sobre isso. O que eu estava esquecendo, o que eu poderia ter feito…
Maria baixou os olhos em silêncio. Parecia que nada que ela dissesse seria confortante.
— Mas agora é tarde demais. Você sabe como eu faço. Isso é o máximo que minha espada alcançará.
Os mortos-vivos não progrediam.
Não importa quanto Sanguinário pensasse sobre isso, não importava o quanto balançasse a espada, ele nunca seria capaz de escalar aquele último degrau, onde o Rei Supremo estava acima dele.
Sanguinário ficou em silêncio. Depois de um tempo, Maria percebeu que ele não queria mais falar e continuou de onde parou.
— Quando parecia provável que íamos perder, Gus e eu usamos todas as técnicas disponíveis para colocar um selo no Rei Supremo. Foi pelo menos algo que poderíamos fazer.
Isso significava que eles abandonaram a possibilidade de Sanguinário ganhar. Eu sabia bem que os três confiavam profundamente um no outro e tinham respeito pelas personalidades e habilidades um do outro. Este era o momento em que eles deveriam ter confiado mais no potencial de Sanguinário para fazer o que ele era capaz de fazer. Prosseguir com uma ação que era tão boa quanto dizer a ele: “Você é incapaz?” Como ele deve ter se sentido?
Tradução: ***
Revisão: ***
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