O Começo Depois do Fim

O Começo Depois do Fim – Cap. 502 – O Latido dos Cães

 

POV ARTHUR LEYWIN

 

— Ali, pegue-o!

Um dos jovens fênix soltou um grito animalesco enquanto lançava uma figura flamejante, como a de uma ave de rapina, queimando através das árvores. Uma grande besta de mana, com pele manchada de verde e marrom, disparou de onde estava escondida na vegetação rasteira. O feitiço do fênix curvou-se no ar, passou entre as seis patas poderosas da criatura e queimou diretamente através de seu peito musculoso.

A besta de mana grunhiu enquanto caía ao chão, mas o som foi curto. Após um único espasmo de seus membros poderosos, ficou imóvel. A criatura tinha um rosto longo, com grandes olhos em ambos os lados da cabeça, sob os galhos dos chifres, cada um com vinte ou trinta ramificações que se espalhavam como uma antena larga a partir do crânio.

Riven Kothan e um dos outros basiliscos correram até o cadáver ao lado do fênix que desferiu o golpe.

— Uma morte limpa — anunciou Riven, segurando um dos galhos dos enormes chifres ramificados da besta e girando sua cabeça para que eu pudesse vê-la mais claramente, revelando um terceiro olho olhando fixamente, sem vida, no centro da testa. — Um belo ah’tule. Muito bem, Orrin.

O fênix que havia matado a besta, semelhante a um alce, sorriu.

— Vai alimentar todos nós esta noite. Talvez eu prepare a pele e a ofereça à sua irmã como presente de cortejo… — Ele grunhiu de repente quando Riven lhe deu um golpe no braço, arrancando gargalhadas de todos.

Riven olhou ao redor em busca da irmã, que viera como uma das quatro representantes dos basiliscos do Clã Kothan, mas ela estava em outro ponto da encosta da montanha.

— Você teve sorte da Romii não ouvir isso. Já estaria casado antes de voltarmos ao Ninho Passo de Pluma.

— Pouco provável — disse o outro basilisco, ainda rindo. — Enquanto Arthur não escolher uma dessas mulheres como esposa, nenhuma delas vai olhar para outro homem.

Regis soltou uma risada enquanto ele e Boo procuravam por sinais de movimento na clareira montanhosa e arborizada.

— Ele sempre teve jeito com princesas. Não leve isso para o lado pessoal.

Ao meu lado, Ellie apertou os lábios em uma linha fina, lutando para não rir junto com os outros. Dei um empurrãozinho nela, que soltou um riso abafado e afastou minha mão.

— Então, aquela besta não era nossa presa? — Chul perguntou, franzindo o cenho enquanto observava o fênix e o basilisco começarem a limpar a carcaça. O restante de nós continuou subindo a encosta.

— Pelo visto, saberemos quando a encontrarmos — respondi. Meus sentidos estavam estendidos além dos limites do meu corpo físico, procurando por qualquer perturbação no éter ou na mana.

Chul franziu o cenho em concentração enquanto caminhávamos.

Sylvie estava com os outros dragões, cerca de meio quilômetro atrás. Vireah, representante do Clã Intharah, caminhava conosco. Ela permaneceu ao lado de Ellie, oferecendo um fluxo constante de conselhos e instruções. A maioria dos fênix e basiliscos estava próxima, mas Zelyna havia levado os leviatãs por um caminho separado pela clareira.

À nossa frente, a montanha parecia subir sem fim.

— Esqueci de perguntar, mas você e… — Inclinei-me, falando apenas para Chul ouvir. — Você e Mordain resolveram as coisas?

Chul grunhiu, olhando para mim confuso.

— O que significa ”resolver as coisas”?

Franzi o cenho.

— Quero dizer, esclarecer. Ficar na mesma página. — Hesitei, percebendo que não estava ajudando. — Chegar a um entendimento.

Chul fez um som de “ah” quando finalmente entendeu.

— Ele enfrentou a mulher que tomou a forma de sua amada para me salvar. Ele precisava que eu voltasse para compreender você plenamente. Ele me mandou embora porque confiava em mim e sabia que era o que eu precisava. Explicou isso enquanto eu me recuperava, e me senti tolo por duvidar de suas motivações.

Pisquei para ele, ainda preso na parte do “amada”. Aos poucos, minha mente alcançou o resto. Limpei a garganta, desconfortável.

— Bem… isso é bom.

Adiante, ouviu-se um estalo como madeira quebrando, e o chão cedeu sob uma das fênix. Naesia gritou, e o chão se agitou. Cinco árvores se fecharam como os dedos de um punho gigante. Chamas fênix e fogo da alma se ergueram nos galhos das árvores, um laranja brilhante entremeado de preto.

Avancei rapidamente, espalhando o éter em todas as direções para repelir as árvores retorcidas. Naesia saltou em direção a um buraco negro no chão, segurando uma raiz contorcida na borda para não cair no escuro sem fundo. Chamas reluziram dentro do buraco, e a fênix que havia caído reapareceu, arqueando pelo ar como se tivesse sido jogada. Naesia surgiu logo atrás dela, saltando do buraco e pousando de pé.

Expandi a barreira de éter, e as árvores se estilhaçaram com um som como o de tiros de canhão, espalhando estilhaços brancos como ossos para todos os lados.

— Entes da madeira. — Riven murmurou, olhando para o buraco enquanto Naesia se abaixava para verificar seu companheiro.

Meu próprio olhar seguia o de Riven; o poço não estava mais preto e não estava mais profundo do que três metros até o fundo coberto de terra e raízes.

— Sugam você para dentro e o prendem — Riven continuou, afastando-se do buraco. — Depois digerem seu mana lentamente. Uma forma horrível de morrer.

— Foi uma loucura. Aconteceu tão rápido — comentou Ellie enquanto se aproximava contornando o buraco a uma distância segura.

— A montanha tem muitas formas de matar os desavisados — disse Naesia, levantando-se e puxando a outra fênix para ficar de pé.

Ele passou os dedos sujos pelo cabelo laranja brilhante, com expressão contrariada.

— Desculpe, Naes. Deveria ter percebido — murmurou.

A filha de Novis revirou os olhos amarelo-citrino.

— Pelo menos você não esqueceu que não pode voar.

Seguimos em frente, eventualmente alcançando Zelyna, onde seus leviatãs haviam abatido um gigantesco urso titã. Os leviatãs, geralmente sérios — algo mais relacionado à proximidade com Zelyna do que à sua raça em si —, estavam animados após o que chamaram de uma “batalha digna de muitas histórias ao redor da fogueira”.

Quando chegamos ao ponto onde a floresta dava lugar a encostas rochosas salpicadas de neve, Naesia decidiu interromper a jornada no início da tarde. Fogueiras foram acesas, e as carnes das feras epheotanas caçadas durante o dia foram preparadas e espetadas. Em pouco tempo, o aroma de carne assada enchia a montanha.

Encontrei uma pedra coberta de musgo ao sol e me sentei, apreciando os sons e cheiros enquanto os asuras cozinhavam.

— É uma pausa agradável — disse Sylvie, sentando-se ao meu lado e compartilhando meus pensamentos. — Consigo entender por que esses rituais resistiram ao teste do tempo.

— São uma válvula de escape necessária — comentou Zelyna ao se aproximar vindo de onde estavam os outros leviatãs. Havia um arranhão em seu pescoço que já estava quase cicatrizado. Em ambas as mãos, ela carregava uma bandeja de madeira com cortes de carne fresca e salgada. — Não, não é do urso titã — disse ela com um sorriso sarcástico, notando meu olhar.

Ela colocou a bandeja entre Sylvie e eu e depois se sentou do outro lado.

— Sem uma forma de nos desafiarmos, os asuras murchariam. Ou pior, entrariam em guerra uns com os outros.

Ellie apareceu e se jogou em um pedaço espesso de grama a nossos pés com um bocejo de estalar a mandíbula.

— Ugh, ainda estou exausta daquela subida. Sou a única que sente que não consegue respirar aqui em cima?

— Não sei como isso funciona em Epheotus, mas, no nosso mundo, quanto mais alto você sobe, mais rarefeito o ar fica — comentei, respirando fundo. — Ainda não sinto, mas…

— Mas você não é normal — disse Ellie, revirando os olhos. Ela colocou as mãos atrás da cabeça e começou a chutar o solo com os calcanhares. — Embora, acho que, sendo eu a única normal aqui, isso faz de mim a estranha.

— Odeio dizer isso, El, mas você sempre foi a estranha — provoquei.

— O oxigênio realmente fica mais escasso aqui, mas o mesmo acontece com a mana — Zelyna observou a floresta como se enxergasse as partículas fluindo loucamente ao nosso redor. — O éter o substitui. Nós, asuras, sentimos isso como uma pressão no peito.

— Então… estamos de volta ao Arthur sendo o estranho — disse minha irmã após pensar por um momento. — Ótimo.

Por perto, Boo estava mastigando os restos de uma carcaça de besta de mana, que havia ganhado de um dos asuras. Ele ergueu a cabeça de onde devorava o almoço, a uma distância saudável de nós. Houve uma pausa, e então a grande besta guardiã, semelhante a um urso, soltou uma risada quase humana.

— Valeu, Boo — disse Ellie, sorrindo para seu vínculo. — Sabia que você estaria do meu lado.

Boo bufou e voltou a enfiar o rosto na carcaça.

Regis surgiu da vegetação, deu algumas voltas e se jogou ao lado de Ellie, descansando o queixo em seu ombro.

— Espero que a Mama Leywin esteja bem com todos aqueles asuras. É estranho termos simplesmente deixado ela lá sem proteção.

— Ela está mais segura com o clã Avignis do que em qualquer outro lugar — respondi. — Mais segura do que conosco, com certeza.

Ellie estalou a língua, pensativa.

— Aposto que ela está relaxando nas fontes termais, bebendo alguma bebida fênix apimentada. É sério, tudo o que eles fazem cheira a canela…

Um bramido cacofônico interrompeu o final da frase de Ellie.

Congelamos no lugar, cada um olhando em uma direção diferente. O som parecia vir de todos os lugares ao mesmo tempo, como se mil cães fantasmagóricos enchessem a floresta da montanha.

— Nossa presa! — gritou Chul, correndo em nossa direção desde o fogo de cozinha dos fênix

Eu sabia que ele estava certo. Não sabia como, exatamente, mas cada instinto no meu corpo ardia com a certeza da caçada.

O bramido veio novamente, mais alto e mais condensado. Todas as nossas cabeças se voltaram simultaneamente na direção do som.

— Vão! — gritei ao me levantar e sair correndo da clareira. Chul, Sylvie, Ellie e Regis estavam logo atrás de mim.

— A caçada começou! — gritou Riven de algum lugar atrás de mim. Num instante, a montanha ganhou vida com sons de gritos empolgados e corpos atravessando a vegetação.

Os uivos trovejantes mudaram para a direita, nos levando de volta montanha abaixo. Gambito do Rei e Realmheart brilharam com uma luz dourada enquanto eu os energizava. O tempo pareceu desacelerar enquanto as camadas sobrepostas da minha consciência procuravam qualquer sinal de nossa presa.

A encosta estava viva com sons e mana. Fios de feitiços asuras cruzavam o ar à nossa frente enquanto cada um dos vinte integrantes da nossa caçada buscava a presa. Entre esses feitiços, senti Ellie canalizando sua vontade bestial, sua conexão com Boo vívida entre eles.

A origem do bramido se concentrou enquanto o Gambito do Rei me ajudava a atravessar os ecos e o efeito abafador do som na floresta.

Parecia que todo aquele barulho vinha de um único ponto.

Sem diminuir a velocidade, varri a vegetação rasteira ao meu redor em busca de qualquer sinal de movimento. Os uivos eram tão altos que era difícil determinar exatamente quão distante estava sua origem, mas eu sabia que tinha que estar ao alcance da minha visão.

Um movimento na minha visão periférica chamou minha atenção para a direita: Zelyna corria paralela a mim, segurando uma espada curta em cada mão. Seus olhos azul-tempestade encontraram os meus por um instante, e um canto de seus lábios se curvou em um sorriso sutil. Ela plantou o pé esquerdo no toco de uma árvore caída, saltou para o ar, impulsionou-se com o pé direito em outra árvore e lançou a espada que estava em sua mão direita.

A lâmina cortou o ar com tanta força que deixou um rastro visível em seu percurso.

Através de uma brecha na vegetação, vi um lampejo branco. A espada estava prestes a acertar…

Porém, no instante seguinte, ela atingiu o chão com um baque surdo, levantando uma chuva de terra.

Os uivos de repente vieram da nossa esquerda, afastando-se rapidamente a uma velocidade impressionante.

Nossa equipe de caça virou para perseguir. Naesia e Vireah assumiram a dianteira. Boo e Ellie estavam ficando para trás, então Sylvie diminuiu o ritmo para acompanhá-los. Os passos pesados de Chul sacudiam o chão enquanto ele corria ao meu lado, rompendo a vegetação densa e até derrubando árvores caídas como um auroque espinhoso em disparada.

Mais feitiços e ataques foram lançados, mas eu nunca via mais do que flashes brancos em meio ao verde e ao marrom.

A encosta da montanha se incendiou em um brilho laranja, e uma parede de fogo engolfou o terreno à nossa frente. Diminui o ritmo, concentrando todos os meus sentidos nos uivos.

Logo à minha frente, dois arbustos se abriram. Uma pequena criatura branca disparou pelo vão. Tinha orelhas desproporcionalmente grandes, um rosto pontudo e uma enorme cauda peluda. Pelos misturados com escamas cobriam seu corpo, enquanto penas brancas cresciam das asas que estavam puxadas contra suas costas. Seus pés, com garras e membranas, mal pareciam tocar o chão enquanto ela corria.

Seus flancos pulsavam no mesmo ritmo da cacofonia de uivos e bramidos, que pareciam não vir de sua boca, mas de dentro de seu corpo.

O tempo pareceu desacelerar, contraído pelas artes aevum de Sylvie, enquanto o malho de cabeça arredondada de Chul descia em direção à pequena criatura. O impacto quebrou o chão, derrubando árvores próximas, mas os uivos agora estavam atrás de nós. Virando-me, observei como se estivesse em câmera lenta enquanto a criatura passava disparada entre as pernas de uma Ellie atônita. Boo tentou atacá-la, mas parecia que o urso guardião estava em câmera lenta, enquanto o pequeno animal continuava a correr sem ser afetado.

Os caminhos etéreos se iluminaram na minha visão, apontando o curso que deveria tomar para interceptar a criatura. Uma espada violeta brilhava em minha mão, mas hesitei em atacar. Algo parecia… errado, e essa hesitação me conteve. O fluxo do tempo avançou novamente em velocidade normal.

Os asuras, já virando para o lado oposto, passaram por mim em velocidade incrível, Chul entre eles. Regis permaneceu ao meu lado, tremendo em antecipação da caçada.

— O que estamos fazendo aqui, chefe? — perguntou.

Eu não sabia. Retomei a perseguição, mas sem o fervor de momentos atrás.

Sylvie e Ellie, que antes estavam na retaguarda, agora lideravam a caçada. Embora Ellie segurasse Silverlight em uma mão, não tentava usá-la. Em vez disso, anéis condensados de mana branca brilhante se formavam repetidamente no caminho da criatura. Ela desviava em zigue-zague, evitando tanto os anéis quanto flechas brilhantes de fogo fênix, espinhos negros e os golpes estalantes de um chicote de água. Cada vez que um feitiço parecia prestes a acertar seu alvo, a criatura desaparecia na vegetação rasteira, apenas para reaparecer próxima, sem nunca interromper o estridente coro de uivos bestiais.

Outros feitiços começaram a bombardear a floresta à nossa frente à medida que mais asuras se aproximavam.

Nossa presa saltou de um pico para outro enquanto o chão explodia em um campo de ferro- sangue. Um falcão em chamas desceu sobre ela, mas quando a ave desapareceu em um clarão amarelo brilhante, a criatura, que assemelhava-se a uma raposa, já estava vinte pés adiante, mergulhando sob uma bola espiralante formada por correntes aquosas. Vinhas e galhos tentaram prender suas patas, mas ela escapou no último instante.

O céu escureceu quando Vireah invocou centenas de raios de mana pura. Árvores tombaram, e o chão se rompeu sob a força do feitiço. Nossa equipe inteira teve que parar enquanto o ataque avançava como uma tempestade, devastando a clareira.

E, mesmo assim, quando o feitiço se dissipou, os uivos continuavam atrás de nós.

Um grito fino e agudo perfurou a cacofonia.

Ao meu lado, Ellie arfou, seu rosto se contorcendo em concentração.

— Eu… eu a prendi! — exclamou ela.

Correndo por uma árvore, Naesia se ergueu sobre o tronco, segurando-se com os pés. Com um movimento ágil, ela posicionou os braços como se puxasse a corda de um arco. Chamas surgiram entre suas mãos, formando o arco e uma flecha incandescente. Sem hesitar, ela disparou sua flecha conjurada.

O tempo pareceu desacelerar novamente enquanto eu observava a flecha de fogo traçar uma linha laranja brilhante pelas sombras intermitentes. A pequena criatura ainda era visível, sua pata envolta pela auréola de mana condensada de Ellie. Ela se contorcia e girava freneticamente, seu grito fino quase se perdendo sob o rugido mais alto que vinha de dentro dela.

A flecha encontrou seu alvo, perfurando-a atrás do ombro esquerdo — um tiro perfeito.

Meu estômago se revirou enquanto eu via a pequena forma branca girar e cair, imóvel.

Nossa equipe de caça permaneceu imóvel, ouvindo. Perturbadoramente, os ruídos de mil latidos, bramidos e uivos não cessaram.

Uma energia nervosa se acumulava dentro de mim. Regis, Chul, Ellie, Sylvie e eu nos reunimos. Os outros asuras começaram a se mover, formando um círculo ao redor do cadáver da criatura, mas mantendo distância.

Ellie olhou para mim, seus olhos arregalados.

— Eu a amarrei… — Ela murmurou, hesitante.

— Eu vi — respondi, sem desviar os olhos do corpo imóvel. Estreitei o olhar, observando os flancos da criatura com atenção. Era quase como se…

A carne coberta por escamas do lado da criatura inchou de repente, como se algo estivesse empurrando contra ela. Um grito ecoou de vários dos asuras.

— Mantenham-se firmes! — bradou Naesia. Em vez do arco de fogo, ela segurava uma lança com as duas mãos, mas a lança estava quebrada em três peças separadas, cada uma conectada por um pequeno pedaço de corrente. Chamas amarelas corriam para cima e para baixo em seus braços e ao longo da extensão da arma. — Não gosto do som dessa coisa.

Antes que as palavras saíssem de sua boca, sangue jorrou do pequeno cadáver da criatura quando sua carne cedeu. Garras rasgaram a carne, seguidas de longos membros escamosos. Em questão de momentos, uma criatura várias vezes maior do que a pequena besta, parecida com uma raposa, ergueu-se sobre os restos do corpo. O mesmo uivo arrepiante emanava da barriga dilatada da nova criatura.

Ela se torceu e girou como uma raposa encurralada por lobos, mas essa nova criatura não era uma raposa.

A monstruosidade não se parecia com nada que eu tivesse visto antes. Tinha um corpo amplo e reptiliano, com uma barriga protuberante, da qual brotavam uma variedade de membros desproporcionais. Braços com garras, tentáculos escorregadios com pontas de lâmina e membros finos e nus terminando em garras sustentavam seu peso entre quatro asas estendidas, duas grandes acima de um par menor. Sua pele era uma mistura grotesca de pelagem amarela, escamas verdes e azuis e carne rosa enrugada.

Um longo pescoço serpenteava de um lado para o outro como uma cobra, com olhos puramente brancos observando de uma cabeça alongada e coberta de ossos. Sua boca cheia de dentes estalou e sibilou, pingando saliva verde-brilhante que chiava e estourava onde quer que caísse.

Chul rugiu e saltou à frente, seu malho talhando uma linha brilhante de fogo pelo ar.

Apesar de ter o tamanho de um boi lunar, a criatura se movia com a velocidade de uma pantera prateada. Ao desviar, seus tentáculos se esticaram, com as pontas cortantes atingindo a carne de Chul em meia dúzia de lugares ao mesmo tempo.

Lancei um olhar rápido para minha irmã; ela assentiu em resposta e então saltou em Boo. Os dois recuaram enquanto Ellie começava a canalizar seus feitiços de apoio.

God Step brilhou ao longo da minha espinha e os caminhos de éter me puxaram.

Raios violetas correram por meus membros enquanto eu balançava uma lâmina conjurada em direção à base do pescoço da monstruosidade. Ela se contorceu, e eu acertei uma das asas menores em vez disso, cortando-a do corpo. Um tentáculo se lançou em direção à minha perna. Em resposta, reverti a direção do golpe, bloqueando o ataque e cortando o tentáculo na mesma movimentação.

A floresta se iluminou com azul e amarelo, preto e branco. Uma dúzia de feitiços diferentes desabaram sobre a monstruosidade recém-nascida. Defendi um golpe de tentáculo, recuei enquanto uma das asas se estendia para me atingir e então avancei para me reposicionar, prestes a atacar novamente o pescoço.

As espadas cruzadas de Zelyna chegaram primeiro. As duas lâminas faíscaram ao deslizar uma pela outra, fechando como tesouras para separar o longo pescoço do corpo inchado e deformado. A monstruosidade caiu, suas asas se contorcendo de forma fraca enquanto o pescoço cortado se enrolava sobre si mesmo como um verme moribundo.

Os pensamentos de Sylvie confirmaram que ela e Ellie estavam bem, e um rápido olhar sugeriu que Chul também não havia sofrido ferimentos fatais.

— Então, como fazemos essa coisa calar a boca? — Regis pensou para mim, andando de um lado para o outro enquanto observava o corpo fresco, de onde continuavam a sair os uivos selvagens.

Recuei rapidamente enquanto o lado inchado se abria e algo dentro da segunda criatura rasgava seu caminho para fora, liberando-se do cadáver.

Armas e feitiços se chocaram contra o horror que emergiu.

Essa nova monstruosidade era três vezes maior que a anterior, facilmente do tamanho de um jovem dragão transformado. Três cabeças, cada uma ligeiramente diferente, gritaram de cima de seus longos pescoços.

Fogo de fênix e ondas de mana pura rolavam sobre escamas escuras, mal parecendo afetar a criatura. Um espinho de ferro-sangue atingiu seu peito, mas se despedaçou contra a pele.

As espadas de Zelyna, brilhando com sua mana infundida, atingiram um dos três pescoços, deixando uma linha fina que jorrou sangue vermelho escuro. Uma das cabeças se virou para encará-la. As mandíbulas se abriram e um feixe de ametista de éter puro irrompeu dela.

Mais uma vez envolto em raios de etéreos, apareci à frente dela. Uma parede do meu éter se formou entre nós e a viga como um escudo, e as duas forças opostas estalaram e brilharam uma contra a outra. O cheiro de ozônio preencheu o ar, e então o feixe se apagou.

Chul estava perto das coxas da monstruosidade, batendo nela repetidamente com seu malho em chamas, com chamas saltando pelas fissuras da cabeça redonda a cada golpe.

Grilhões de mana se ergueram do chão para amarrar os muitos membros desproporcionais e os três pescoços longos. Com uma única batida de suas asas, nosso inimigo quebrou o feitiço da minha irmã e sua forma grotesca se levantou do chão.

Concentrando meu éter, dei um God Step para cima. A lâmina de éter cortou as duras escamas na base de sua garganta, mas não separou o pescoço. Quando meu ímpeto mudou e comecei a cair novamente, peguei a lâmina com as duas mãos, empurrando éter para dentro dela a fim de fazer com que ficasse mais longa e mais grossa.

Torcendo o pescoço, uma cabeça horrível em forma de caveira me encarou, luz ametista de éter irradiava de sua boca.

Com toda minha força, desci o golpe, acertando a linha do corte anterior de Zelyna. Minha lâmina ficou presa por um momento, mas então deslizou através das escamas, carne e osso. A cabeça se soltou, serpenteando no ar antes de cair.

A cabeça do meio se virou rapidamente e um jato de água superaquecida explodiu em direção ao meu rosto. O ataque escovou meu éter protetor e minha pele e carne abaixo dele, mesmo tendo usado God Step para me afastar.

De volta ao chão, precisei esperar um momento para que minha visão se corrigisse enquanto meus olhos e pálpebras se curavam. O Gambito do Rei moveu a parte da minha consciência focada na dor para o fundo da minha percepção.

Zelyna me olhou com horror e então maravilhada, enquanto minhas feridas se curavam, mas não prestei atenção nisso. Acima de nós, nosso inimigo se tornava o centro de um enxame de feitiços. Uma rede de mana branca brilhante se enroscou em suas asas, uma tempestade crepitante lançou flecha após flecha em cima dele, e dedos de fogo estavam penetrando sob as escamas e nos olhos, boca e nariz das duas cabeças restantes. Flechas e balas de diferentes elementos atingiam seu ventre, e armas de mana pura, sem serem seguradas por nenhuma mão física, perfuravam e cortavam os membros, pescoços e asas.

Abri mão de lançar ataques.

Cada vez que essa fera horrível era morta, uma versão mais forte nascia de sua carcaça inchada. Mesmo agora, o uivo de mil cães fantasmas abafava quase todos os outros sons. O ciclo simplesmente continuaria até que fosse forte demais para nós matarmos?

Outra linha de pensamento se concentrou no próprio monstro. Suas características eram uma fusão grotesca e quase sem sentido de dragão, fênix, basilisco e leviatã. Tanto éter quanto mana queimavam dentro dela; não foi por acaso que se manifestou com um ataque etéreo. Essa monstruosidade nasceu especificamente para esse teste. A presa era um reflexo dos caçadores.

No entanto, esse era um pensamento trivial no momento. Não me ajudava a aprender como matá-la. Atacar sem destruí-la só resultaria em outra criatura mais forte.

Regis, comigo.

Percebendo meu desconforto anterior, Regis se manteve afastado até então. Agora, ele saltou em minha direção, tornando-se incorpóreo enquanto o fazia. Seu corpo desapareceu no meu. Nossos pensamentos se entrelaçaram.

— Vamos com aquilo.

Acima, a criatura se retorcia contra o bombardeio contínuo. Jatos de água superaquecida — uma fusão de mana, dos atributos água e fogo — caíam sobre os asuras de uma boca, enquanto nuvens negras de fogo da alma saíam da outra.

Respirando fundo para me estabilizar, entrei nos caminhos etéreos revelados pelo God Step.

Regis e eu aparecemos no ar seis metros à frente de nosso inimigo, que vinha em nossa direção. Ambas as cabeças se fixaram instantaneamente, e os fluxos de mana fervente de suas bocas foram redirecionados para mim enquanto Regis fluía para a lâmina etérea já firmada em minhas mãos.

Uma plataforma de éter puro se solidificou atrás de mim. Pressionei meus pés contra ela e canalizei éter em cada músculo, tendão e junta. Dezenas de pequenas explosões de éter projetaram meu corpo para frente em um único passo quase instantâneo.

As chamas violetas da Destruição dançaram ao longo de minha lâmina enquanto ela cortava o ar. Após o Burst Step, o éter acendeu no tempo exato em meus ombros, costas e braços, impulsionando meu ataque. A lâmina encontrou a criatura no ponto de junção entre os dois pescoços restantes. Somente os sentidos aguçados do Gambito do Rei me permitiram permanecer consciente de minha própria passagem pelo espaço enquanto passava em um borrão sob a monstruosidade voadora de três cabeças.

Eu girei no ar, muito além da ponta da cauda da criatura. Sangue escarlate choveu da barriga inchada, que havia sido cortada de uma ponta à outra pelo meu golpe. Enquanto observava, estrondo da minha passagem ecoou, fazendo a chuva vermelha se espalhar em uma auréola sobre a floresta.

A Destruição dançava na ferida, devorando o sangue à medida que caía, esvaziando a grotesca besta. Suas asas batiam descontroladas enquanto as chamas da Destruição abriram buracos nelas e, antes que o arco do meu Burst Step começasse a voltar para o chão, a besta que viemos caçar estava caindo no chão.

Apoiei-me no topo de uma árvore e saltei de volta para a agora fogueira violeta que antes fora o corpo da monstruosidade.

— Fiquem bem atrás — avisei, acenando para os asuras. Minha própria irmã e vínculo já haviam se afastado, ambas cientes do que a Destruição podia fazer. Para os outros, porém, era a primeira vez vendo tal coisa.

O assombro e o medo eram óbvios em suas mandíbulas tensas e rostos pálidos.

Uma cabeça emergiu da barriga aberta e em chamas, se retorcendo para frente e para trás em seu pescoço ondulante, com as mandíbulas abertas em um grito silencioso. A Destruição dançava ao longo das escamas escuras e fumegava em seus olhos negros cheios de ódio. Já estava queimando, como era meu objetivo.

A Destruição consumiria tudo até que não restasse mais nada.

Uma segunda cabeça surgiu, depois uma terceira, e então uma quarta. Cada uma era quase idêntica a outra, um dragão cuja mandíbula dividia o rosto na direção errada, na vertical em vez de na horizontal.

Garras envoltas em Destruição cavaram o chão, tentando desesperadamente puxar o resto da agora enorme massa para fora.

Tarde demais, vi a diferença entre queimar e estar em chamas.

As quatro mandíbulas verticais se desencaixaram, e ondas de fogo roxo jorraram para fora.

Riven trombou com sua irmã, empurrando ambos para fora do caminho. Sylvie, Ellie e Vireah juntas envolveram a si mesmas e a mais três em um escudo prateado que estremeceu sob o ataque. Naesia explodiu em fogo laranja como uma vela, e grandes asas a puxaram para trás, para longe da conflagração. O chão escorreu como água sob os pés de Zelyna, e ela desapareceu nele enquanto a vegetação ao seu redor se transformava em cinzas, e depois em nada.

Fiquei boquiaberto quando a monstruosidade terminou de se libertar. Abaixo dela, a Destruição desfez os restos de seu predecessor. Porém, a Destruição não se alimentou dela.

E ainda assim, os cães continuavam a uivar.

 


 

Tradução: NERO_SL

Revisão: Crytteck

 

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