Quando a mana surgiu violentamente do leste, outro dragão sobrevoou a Muralha, acelerando com uma urgência assustadora. Olhei para Helen, mas não encontrei respostas; ela estava tão incerta quanto eu.
Os defensores da Muralha, aventureiros registrados na guilda de toda Sapin, alinharam-se no topo da estrutura colossal, olhando nervosamente para o leste sobre a Clareira das Bestas. Havia pouco que pudéssemos fazer além de assistir e esperar que nada se aproximasse, mas parecia que a cautela de Arthur era quase uma previsão; não tinha passado nem um dia inteiro desde que ele entrou em seu refúgio debaixo da Muralha.
Lança Mica Earthborn desceu de onde estava voando alto, pairando no ar livre à nossa frente. Seu olho de pedra, negro como um céu noturno nublado, dava a ela um olhar temível.
— Esse era um dos guardas de Vajrakor, tenho certeza disso. Inacreditável. Se deixaram as cidades sem defesa, eu vou… — Ela saiu com um suspiro e um encolher de ombros.
— Pensando agora, o que exatamente eu iria fazer sobre isso? Mesmo assim eles não deveriam deixar seus postos. A fenda deve estar sob ataque, então eles foram defendê-la. A única coisa que faz sentido, realmente.
— Se há uma força neste mundo que pode derrotar os dragões, então tudo isso é em vão — disse Helen. — Quanto a nós, tudo o que podemos fazer é o trabalho que nos foi confiado. Arthur está vulnerável sob nossos pés. Precisamos mantê-lo seguro pelo tempo suficiente para que ele atinja seu objetivo. Esse menino luta por nós desde os quatorze anos de idade. Agora é a nossa vez de lutar por ele.
Lança Mica assentiu gravemente.
— Ele é a nossa melhor esperança, contando ou não com os dragões.
— Eu gostaria que ele estivesse aqui agora — disse Angela Rose, inclinando-se sobre uma crenulação e olhando para baixo. — O que quer que esteja acontecendo lá, seria muito menos assustador se eu soubesse que nosso residente Lança Godspell estaria nos protegendo, e não o contrário.
Lança Mica zombou.
— Bem, você vai ter que se contentar só comigo, mas eu…
— O que é isso? — perguntou Angela, inclinando-se um pouco mais e olhando para as árvores. — Há algo se movendo nas sombras.
A Lança voou a cerca de vinte metros de distância, depois amaldiçoou e se virou.
— Aos seus postos homens, o inimigo está…
Dezenas, talvez centenas, de feitiços irromperam das sombras das árvores. Não deveria ter sido possível; nenhuma força considerável poderia se mover tão silenciosamente e sem nem um vislumbre de assinaturas de mana, e ainda assim, de alguma forma, os alacryanos estavam bem em cima de nós.
Lança Mica rebateu um punhado de feitiços e esquivou-se de outros enquanto conjurava placas de pedra para desviar o máximo possível. Disparos de fogo e relâmpagos, lanças de gelo e vento e balas de todos os elementos colidiram com o fronte da Muralha ou os portões muito abaixo, enquanto mais feitiços eram direcionados aos aventureiros que estavam no topo da estrutura.
Como formigas, centenas de alacryanos saíram das árvores que foram cortadas a algumas centenas de metros da base da Muralha para fornecer uma melhor linha de visão do chão; não que isso tivesse ajudado.
Feitiços começaram a chover do topo da Muralha, mas escudos de uma dúzia de formas e cores diferentes absorveram ou desviaram a maior parte do dano. Ao meu redor, aventureiros gritavam por ordens ou corriam para chegar aos seus postos, pegos fora de posição pelo súbito ataque. Helen direcionava o tráfego, mas estava com o arco na mão e, a cada ordem gritada, soltava uma flecha para o exército que se aproximava.
— Angela, você deveria estar com Durden no cofre! — Helen ordenou, disparando outra flecha.
Angela Rose hesitou antes de acenar com a cabeça e se apressar, passando por outros aventureiros que estavam correndo para a borda da Muralha para começar a lançar seus próprios feitiços. Era muita gente transitando para esperar pelos longos elevadores, então ela pulou um lance de escadas e desapareceu de vista.
Uma lâmina redonda de vento assobiou pelo ar entre Helen e eu, forçando-nos ambas a desviarmos. Aquilo cortou um conjurador na lateral de seu pescoço atrás de nós, levando-o ao chão com um grito surpreso de dor, depois se curvou e voltou. Peguei-o em uma adaga imbuída em vento e o desviei de volta na direção de onde tinha vindo, mas após esculpir um arco largo pelo ar, voltou mais uma vez, desta vez mirando Helen.
Um escudo de rocha escura apareceu à sua frente, pegando o disco, mas quebrando sob a força de seu impacto. Uma flecha infundida em mana assobiou através dos escombros restantes, esculpindo seu longo arco no exército abaixo. Não vi quem a flecha atingiu, mas o disco cortante de mana do atributo vento se dissolveu apenas um momento depois.
Abaixo, vi um borrão preto se afastar das forças inimigas e, em seguida, um barulho cacofônico no ar, seguido pelo tremor de pedra sólida sob meus pés.
Um único homem imponente, de ombros largos e chifres havia avançado para a linha de frente do inimigo. O feixe negro tinha vindo dele. Agora, uma esfera de escuridão reluzente — metal sólido e preto — apareceu na frente de sua mão estendida antes de voar novamente para o portão reforçado na base da Muralha.
Outro golpe, outro tremor.
Uma onda de mana respondeu, sustentando a pedra e o metal da estrutura com magia.
— O reforço está segurando! — gritou alguém, com as palavras pesadas de alívio.
— Mas por quanto tempo? — Helen perguntou entre as respirações.
Um cometa em chamas apareceu no céu acima do campo de batalha, pairando por apenas um instante antes de despencar em direção ao homem. Tive que desviar o olhar do brilho, mas o flash seguinte e a explosão concussiva quase me derrubaram. Agarrei a soldado ao meu lado, me firmando eu e ela ao mesmo tempo, depois voltei meu olhar para a batalha.
O chão ao redor do homem com chifres e da linha de frente alacryana foi queimado e detonado, mas ele não parecia ferido. Na verdade, embora pudesse ter sido a distância pregando peças em mim, parecia que ele estava sorrindo. Com um floreio de chicote, ele mandou outro projétil contra os portões e a Muralha tremeu.
— Não por muito tempo — disse Helen, já se movendo.
Em vez de perder tempo com o elevador, ou mesmo com as escadas, atravessei o topo da Muralha, coloquei um pé firme em um merlão e saltei. Os edifícios da cidade interior da Muralha estavam muito, muito abaixo, mas cresceram em minha direção rapidamente.
Concentrando a mana do atributo vento sob um pé, peguei um pouco do meu próprio impulso, me desacelerando perceptivelmente antes que meu peso rompesse. Repeti isso novamente com o pé alternado, então mais uma vez, como se estivesse correndo pelo ar. Apesar de voar pelo lado interior do Muralha em grande velocidade, quando bati no chão alguns segundos depois, não me despedacei na pedra dura, mas empurrei o impulso recolhido para a frente em um pique em direção ao interior dos principais portões do Leste.
Dezenas de aventureiros já estavam reunidos ali, conjuradores segurando bolas de fogo em suas mãos nuas ou rodopiando ar gelado ao lado de ampliadores imbuídos de mana, alguns envoltos em pedra ou com armas em chamas. Pilares de pedra haviam sido erguidos do chão para sustentar o portão, e o solo estava cheio de trepadeiras venenosamente verdes e espinhosas.
Os portões rangeram como um enorme gongo quando outro projétil o atingiu do lado de fora. A mana que se derramava pelo interior do Muralha para reforçá-lo era como uma presença física no ar, mas havia um elemento lamurioso e tenso que me dizia que a medida defensiva não aguentaria muito mais tempo como se esperava.
Um grito pontuou através da batida retumbante nos portões e um homem mergulhou no interior da Muralha, apenas para ser pego momentos antes de atingir o chão por uma nuvem condensada de vento e água. Do outro lado do portão, ouvi a terra se deslocando e pedra moendo contra pedra.
Os portões se romperam quando um enorme espigão de ferro preto os arrebentou, grande o suficiente e com tanta força que rachou os alicerces da Muralha ao seu redor.
Como um, os defensores recuaram. Muitos já haviam conjurado escudos ou outras barreiras de proteção que salvaram muitas vidas, com espigões gigantes divididos em centenas de lascas do tamanho de lanças, espalhando a morte como se fossem dados jogados. A pedra estourou, a mana quebrou e desmoronou, e o gelo se partiu enquanto as lanças esculpiam uma faixa sangrenta através de nossos números.
Rastejando, tendo-me jogado sob uma barragem de lanças de ferro preto, olhei através da abertura recém-perfurada. Centenas de alacryanos estavam marchando em nossa direção, armas e feitiços levantados. Do lado de fora dos portões quebrados, o campo de batalha estava repleto de cacos reluzentes de algum cristal preto. A Lança se ajoelhou em meio aos destroços. Ela parecia atordoada, como se tivesse levado um golpe poderoso.
Enquanto hesitava sobre se deveria ou não correr para o lado dela, os restos quebrados de cristal começaram a se levantar e voar para ela, encaixando-se em todo o seu corpo como placas de armadura. Ela se levantou e uma parede de gravidade, visível como uma distorção no ar que corria à sua frente, empurrando a poeira contra o chão e esmagando o solo vários centímetros, saiu em direção aos soldados que se aproximavam.
O chão duro se movia sob seus pés e cinco dedos negros se curvaram no solo, fechando-se em torno dela como um punho. Ela levantou um braço, então um enorme martelo de pedra foi subitamente apertado em seu punho. Ela o balançou direto na palma da mão de metal com todas as suas forças.
Pedra e metal gritaram quando o martelo e o punho conjurado se estilhaçaram, mas a onda de gravidade foi interrompida, diminuindo pouco antes de atingir o exército em marcha. Lança Mica lançou um olhar calculista para trás através da boca do túnel, então voou através dela em velocidade, de volta ao nosso anel de defensores.
— Por Dicathen! — Ela bradou, pairando dez metros no ar acima de nós, seu martelo agarrado em ambas as mãos.
— Por Dicathen! — gritaram os aventureiros em resposta, com suas vozes ressoando pela fortificação.
Uma gota de chama verde se espalhou à frente dos alacryanos que marchavam, queimando as videiras espessas e emaranhadas, então uma névoa obscura saiu da boca do túnel, escondendo o inimigo da vista. Um instante depois, feitiços começaram a disparar contra nós. Como um, nosso grupo devolveu o fogo, despejando tudo o que tínhamos pelo buraco.
— Usem os corpos dos mortos para fechar a brecha — rosnou Lança Mica.
De repente, a névoa caiu do ar, revelando os soldados avançando, escondidos atrás de seus escudos conjurados. Eles lutavam para progredir em frente, com os pés arrastados pelo chão como se não pudessem erguê-los.
Uma resposta veio de dentro do túnel, então o homem com chifres irrompeu, sobrevoando os soldados alacryanos e colidindo com a Lança. Os dois bateram contra o muro de um prédio próximo e sumiram de vista, enquanto os alacryanos voltaram a acelerar.
Abaixando-me sob um feixe de mana laranja do atributo fogo, avancei e atirei-me ao primeiro inimigo que alcancei. Uma parede de mana apareceu exatamente onde bati, bloqueando o golpe e desviando-o para o lado. Ele levantou uma lança em resposta, empurrando contra minhas costelas. Girando, bloqueei a lança em uma adaga e a movi para o lado enquanto direcionava a outra adaga na direção oposta. Uma parede de mana parecia proteger um soldado alacryano diferente, mas a adaga, empunhada dentro de mana do atributo vento, curvou-se atrás do meu alvo e dirigiu-se para entre suas omoplatas. A lança ficou mole em suas mãos, então minha primeira adaga afundou em seu peito. Com um toque de mana, a adaga em suas costas saltou para minha mão.
Lembrando-me de tudo o que me ensinaram sobre como os alacryanos lutavam e a forma como seus grupos de batalha eram estruturados, procurei seus Escudos, aqueles magos que se concentravam em proteger os outros. Por todo o campo de batalha, barreiras giratórias de fogo e vento pareciam desviar os feitiços e golpes de meus aliados, estávamos rapidamente perdendo a vantagem dos números à medida que mais e mais alacryanos passavam.
Enquanto eu passava por um Conjurador lançando raios condensados, um prédio atrás de nós explodiu, fazendo chover escombros no campo de batalha. Pelo canto dos meus olhos, vi a Lança Mica balançar seu martelo com força suficiente para distorcer o ar ao seu redor, e cada golpe bloqueado parecia ondular para fora do impacto e enviar tremores através dos meus ossos.
Seu oponente — uma Foice, eu tinha certeza — desviava os golpes com um imponente escudo de ferro preto que tocava como um sino gigante a cada golpe. Ele parecia estar em êxtase, se divertindo com o combate. Felizmente, ele só tinha olhos para ela. Contudo, não tive tempo de ficar embasbacada com a luta deles.
Um grupo de ataque se fechou em mim, orbes de relâmpagos branco-azuis girando em torno deles. Uma barreira de vento se moveu com eles, e não muito atrás, um Conjurador canalizando mana em flechas de fogo me fixou com um olhar terrível. Enquanto o Atacante avançava só com os próprios punhos, os relâmpagos se moviam como um eco do golpe. Dei um salto para trás, imbuindo mana em ambas as adagas enquanto olhava além do Atacante para o resto de seu grupo de batalha.
As adagas gêmeas voaram, curvando-se para passar uma de cada lado do Atacante, uma arqueando em direção ao Conjurador enquanto a outra voou mais longe, apontando para o núcleo do Escudo. O vento que envolvia o Atacante se afastou em um ciclone de poeira, voando ainda mais rápido do que minhas armas para interceptá-las. Ao mesmo tempo, mergulhei para frente, empurrando uma rajada de mana de vento à minha frente para desequilibrar o Atacante. Suas bolas orbitais de relâmpagos se projetavam ao vento como vaga-lumes, eu voei entre elas para enfiar um punho enrolado pelo vento em seu plexo solar.
Minhas adagas, que haviam sido arremessadas para fora do curso pelo feitiço de vento do Escudo, voltaram para minhas mãos enquanto passava pelo Atacante ofegante. Um único corte rápido em suas costas expostas finalizou o homem, então me concentrei no Conjurador, cujas flechas flamejantes me atacavam a uma velocidade perigosa.
À minha direita, dois grupos de batalha se separaram e correram para a cidade. Não havia defensores suficientes para pará-los.
Amaldiçoando, desviei uma das flechas, deixei uma segunda passar raspando por meus ombros e, em seguida, mergulhei entre mais três, minhas lâminas liderando o caminho. A barreira de vento me atingiu e interrompeu meu ímpeto para frente, me mandando em um mortal para trás. Ao aterrissar, ataquei com a adaga direita. A barreira saltou novamente, movendo-se entre mim e o Escudo, mas o movimento tinha sido uma finta. Em vez disso, a adaga esquerda foi lançada da minha mão, impulsionado à força letal por uma rajada de mana do atributo vento.
A barreira cambaleou, tentando voltar ao lugar para proteger o Conjurador, mas tarde demais. O homem se engasgou de dor e surpresa quando a lâmina perfurou seu peito, cortando-o através dele antes de girar para a direita e se cravar no lado do Escudo. O ciclone de vento protetor vacilou, corri através dele, pulando e plantando meus joelhos no peito do Escudo, levando-o ao chão enquanto minha segunda adaga abria sua garganta desprotegida.
A Muralha tremeu acima de mim quando a Lança e a Foice colidiram contra ela, saltaram de sua superfície e colidiram nela novamente. O fluxo de mana para dentro e através da estrutura física da Muralha pulsou rapidamente, pedaços de pedra do tamanho de granizo caíram sobre o interior da cidade, arrancando telhados e quicando pelas ruas. Alguns corpos caíram do topo do Muralha com elas, pousando com uma pancada molhada.
Enquanto procurava meu próximo alvo, só podia esperar que Helen não estivesse entre eles.
Mais grupos de batalha alacryanos haviam se separado, correndo para dentro de casas ou ao longo da base da Muralha em vez de continuar avançando para a linha de defensores. Dezenas de aventureiros avançaram atrás de mim, a rua estava manchada com o sangue de alacryanos e dicathianos, corpos espalhados como árvores derrubadas após um furacão.
— Encurralem-nos! — gritei, projetando minha voz com uma rajada de mana de vento através de meus pulmões. — Não podemos deixá-los correr pela Muralha! — Minha mente voltou-se para os magos cuja função era alimentar com mana a Muralha, a fonte da magia de reforço. — E enviem homens extras para proteger a equipe de apoio. — A maioria daqueles magos não estava mais apto para lutar, muitos feridos de batalhas anteriores, mas ainda eram capazes de canalizar mana.
Finalmente, mais aventureiros estavam chegando da longa série de escadas que ziguezagueavam pelo interior do Muralha. Apontei na direção das tropas inimigas e gritei ordens onde parecia apropriado. A maioria me conhecia, e os que me conheciam foram rápidos em cumprir.
Essa não foi minha primeira batalha na Muralha, afinal. Não gostava de pensar no meu tempo aqui logo após a primeira guerra, e gostava menos ainda das minhas lembranças da batalha contra o exército de bestas de mana corrompidas — a batalha onde Reynolds havia morrido — mas conhecia a fortaleza, e já tinha visto a estratégia dos alacryanos antes.
Isso era diferente. Eles não tinham mão de obra, estavam afunilando suas forças através dos portões estreitos e depois se espalhando, uma estratégia que os levaria para a fortificação, mas nunca permitiria que eles a mantivessem. Suas perdas foram muito grandes, mesmo com a Foice presente para fazer um buraco na parede para eles.
— Cacem e tomem conta dos retardatários — disse a vários aventureiros de Blackbend enquanto desciam a rua em nossa direção. — Eles estão procurando onde ele está escondido. Não deixe que o encontrem. Matem todos!
Correndo de volta para a batalha, cortei um Atacante em pé sobre um aventureiro caído, um jovem de não mais do que dezesseis anos. Ajudando o menino a ficar de pé, indiquei que ele me seguisse.
— Avance para o portão! Temos que fechá-lo.
Homens e mulheres se reuniram atrás de mim, gritando seus gritos de guerra, nós pressionamos os alacryanos, forçando-os de volta através dos escombros do portão e do arco em colapso que um dia o havia segurado. Atrás de nós, uma pousada de três andares desabou quando uma onda de força irradiou de onde Lança Mica e a Foice lutavam de um lado para o outro pelo ar sobre a cidade.
Eu me concentrei em caçar seus Escudos, passando pelos lutadores como vento sobre rochas para derrubar os homens e mulheres que os mantinham seguros. Sem a prática ou o talento natural para se revestirem de mana protetora, meus aventureiros fizeram um trabalho rápido sem seus escudos. À medida que avançamos, a força deles começou a entupir o túnel, presos ali, incapazes de avançar contra as costas dos soldados à sua frente.
Alguns dos aventureiros jogaram feitiços no túnel, tentando tirar proveito de tê-los tão amontoados, mas a densidade de Escudos tornou qualquer ataque quase impossível.
Por toda a cidade, podia ouvir os sons da batalha enquanto nosso povo caçava aqueles que havíamos deixado passar. O ataque deles estava diminuindo, a intensidade dele diminuía a cada segundo que lutavam para forçar a passagem pelos portões e com cada corpo que se amontoava, só aumentando a barreira.
Houve uma calmaria, e percebi com alguma desorientação que estava acabando a cacofonia de quedas e explosões que estavam saindo da batalha da Lança Mica com a Foice. Olhando para cima, eu a vi envolvida em uma luta no ar com o homem muito, muito maior. O escudo dele se foi, assim como o martelo dela, se enfrentavam só com os próprios punhos. Ela tinha um dos braços dele preso na dobra do cotovelo, seus dedos apertavam em torno do pulso da Foice, enquanto suas pernas envolviam o outro braço. Sua mão direita torceu um de seus chifres, puxando seu pescoço violentamente.
Por sua vez, o corpo da Foice tremia com poder quase irrestrito. Seus batimentos cardíacos podiam ser sentidos com ondas de mana martelando sobre nós, batendo em meu peito com mais força do que meus próprios batimentos. Seus lábios se enrolaram para trás em escárnio, e seus braços se fecharam centímetro a centímetro. De repente, temi que ele rasgasse a Lança ao meio.
Então, com um som como um trovão, seu chifre estalou. A explosão de mana que se alastrou em uma esfera me jogou no chão e atingiu a lateral da Muralha com tanta força que ela desabou, a mana de reforço finalmente cessando e falhando completamente.
Assisti com horror como uma rachadura correu do túnel do portão até o topo da Muralha. Pedras se deslocaram provocando um barulho como um terremoto, depois desabaram para baixo, uma seção de quinze metros de largura da Muralha caindo no vazio do túnel. Distantes e pouco visíveis através da nuvem de poeira que se seguia, os corpos caíam com as pedras.
— Saiam, saiam daí! — gritei, ficando de pé e correndo para longe enquanto as pedras quicavam contra os escombros e rolavam pela rua, demolindo casas e esmagando grupos de batalha alacryanos inteiros.
Acima de tudo, a Lança havia soltado a Foice. Eu podia sentir a parede de mana irradiando para fora dela enquanto tentava tanto pegar e estabilizar a queda das rochas, quanto impedir que elas derrubassem o resto da Muralha e, com ela, engolir metade de nossas forças.
A Foice mono-chifre recuou, quase caindo do céu, seu rosto largo externando uma máscara de incredulidade e agonia. Seu braço direito estava pendendo, quebrado, sangue escuro escorrendo de dezenas de feridas.
Audível mesmo sobre a Muralha em colapso, uma buzina soou de repente. Era uma reverberação profunda que subia pelas solas dos meus pés, vibrando meus dentes e me golpeando atrás dos olhos.
Os olhos chocados da Foice vasculharam o chão antes que se virasse e disparasse pelo ar, voando para cima e sobre a Muralha, desaparecendo de vista.
Eu não conseguia ver nenhum alacryano sobrevivente deste lado da Muralha, e restaria poucos daqueles que estavam dentro do túnel quando desabou. Embora não pudesse vê-los, podia sentir o suficiente de suas assinaturas de mana para saber que aqueles fora das fortificações estavam se virando e fugindo de volta para a Clareira das Bestas.
Minha mente se recompôs. O ataque tinha começado como uma tempestade de verão e terminou tão rápido quanto, mas por quê? Meu olhar desviou-se para o chifre ainda agarrado na mão da Lança, mas não tinha sido a Foice que havia sinalizado o recuo.
Os aplausos subiram ao meu redor quando as pessoas começaram a perceber que tínhamos vencido e que tinham sobrevivido. Eu podia ouvi-los até do alto da Muralha. Mais perto de mim, os aplausos se tornaram gritos para a Lança, seu nome repetido várias vezes.
Eu podia dizer com um simples olhar que nenhuma resposta para minhas perguntas viria dela, no entanto. A armadura que ela havia conjurado em torno de si, composta de placas interligadas do feitiço de cristal negro que havia sido quebrado anteriormente, estava em ruínas, sangue cobrindo tanto de seu corpo quanto os restos de sua armadura. Sua assinatura de mana estava desaparecendo e aumentando perigosamente, seu único olho olhava ao redor como se estivesse atordoada, como se mal ouvisse os aplausos.
Meus pés começaram a me levar dos portões desmoronados em direção a uma porta indescritível na base da Muralha, uma das muitas que permitiam o acesso às forjas e outras operações essenciais alojadas dentro da própria Muralha. À medida que os aplausos se desvaneceram atrás de mim, tive o pensamento inabalável de que eram de alguma forma não merecidos.
A porta estava aberta, e vários soldados, alacryanos e dicathianos, estavam mortos na sala de pedra simples. Seguindo um túnel em uma série de passagens labirínticas idênticas, desci até as entranhas, pegando velocidade à medida que descia até que estava praticamente pulando escadas abaixo.
Chegando ao andar subterrâneo, encontrei o que deveria ser uma porta secreta pendurada em suas dobradiças, quebrada para dentro, a face de pedra quebrada. Além da porta, uma escada estreita e escondida descia em uma direção diferente.
Conjurando uma rajada de vento que passava por cima da minha pele, segurei minhas adagas com força e desci a escada secreta, girando enquanto ela me levava para o leito rochoso sobre o qual a Muralha havia sido construída. Abaixo, só pude sentir uma assinatura de mana ao lado de… outra coisa.
Respirando fundo, pulei as escadas finais, preparando-me para enfrentar quem estivesse esperando embaixo, mas fui interrompida com um suspiro.
A câmara de guarda, além do próprio cofre, que estavam trancados física e magicamente, estavam abertos. A sala além estava manchada de sangue e repleta de cadáveres daqueles que haviam sido colocados aqui como última linha de defesa.
— Durden? — perguntei, com a voz alta e firme. Os nós dos meus dedos ficaram brancos ao redor das empunhaduras de minhas adagas.
Durden olhou para mim de onde se sentou no sangue. Seu rosto estava manchado de escarlate, assim como seu braço e a forma prona puxada para seu colo. Demorou um momento para ver as feições sob todo o sangue e eu me senti endurecer contra a realidade.
Desviando o olhar para cima e para longe da visão, olhei além da câmara externa para a porta da abóbada que Senyir havia criado. Ficou ligeiramente entreaberta, e uma luz rosa prateada estava se espalhando para refletir nas piscinas carmesim. Passando por Durden, que pude sentir me observando, seu olhar desolado tentava encontrar consolo em minha empatia, mas não podia me dar ao luxo de dar, não naquele momento. Aproximei-me da porta do cofre cuidadosamente, minhas lâminas prontas, já imbuídas de vento cortante que girava em espiral em torno das lâminas.
— Arthur? — perguntei, sentindo-me idiota. Eu mais sabia do que esperava. Ainda assim, abri a porta do cofre, que protestou, com as dobradiças torcidas.
Lá dentro estava o mesmo quarto simples em que tinha visto Arthur entrar um dia antes. Algum tipo de construção de mana agora brilhava do alto do pedestal de metal que Senyir havia colocado no centro da sala. O orbe alongado enchia a tigela que cobria o pedestal e parecia estar cheio de uma rica energia roxa que brilhava através da mana pura, dando à sala seu tom rosa.
Arthur não estava lá. Uma percepção fria se espalhou de minhas entranhas para fora, me anestesiando por dentro.
De costas para a luz, voltei para a sala da guarda, minhas botas espirrando na força vital daqueles que vigiavam aquela câmara vazia.
Passos leves e apressados nas escadas me chamaram a atenção passando por Durden mais uma vez, que não estava mais me procurando por apoio. Helen praticamente pulou no último lance de degraus, assim como eu, e também ofegou com o que viu, embora o barulho que ela fez estivesse sufocado com uma emoção que eu estava suprimindo.
Agora, porém, ajoelhei-me ao lado de Durden e limpei cuidadosamente o sangue que cobria as feições de Angela Rose. Seus olhos sem vida, foi isso mais do que qualquer coisa que rompeu a casca dura que estava tentando manter. Aqueles olhos, tão brilhantes e cheios de divertimento quando em vida, agora estavam vazios. Com uma mão trêmula, fechei as pálpebras, dizendo a mim mesma que pareceria que ela estava apenas dormindo, mesmo sabendo que não era verdade.
Durden abriu a boca para falar, mas apenas um gemido cru de lamentação pura e condensada sangrou de seus lábios.
— Arthur? — Helen perguntou, sua voz tensa enquanto dava um passo vacilante à frente.
Engoli pesado, de repente me afastando do resto dos Chifres Gêmeos… os dois que restaram.
— Espero que esteja bem, onde quer que ele esteja. Porque não está aqui, nem nunca esteve.
Tradução: NERO_SL
Revisão: Crytteck
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