POV ARTHUR LEYWIN
— Isso não é possível.
Olhei para as marcas na parede. Chul estava errado. Ele tinha que estar. Eu não conseguia aceitar que tinha saído por tanto tempo. Pareceram meras horas.
Chul deu de ombros com indiferença, depois ergueu um braço musculoso sobre a cabeça para se alongar.
— Deve ser, porque tem sido assim.
— Mas o que está acontecendo com a guerra?
Exigi, encarando o guerreiro meio-asura.
— Agrona—
Chul grunhiu e se virou.
— É melhor você falar com Mordain. Venha agora. Eu vou te mostrar.
Rangendo os dentes, o segui. Sylvie e Regis caminharam atrás de mim, cada um transmitindo uma intensidade diferente de confusão e desconforto.
— Muito cedo para começar a tentar adivinhar o que aconteceu no abismo?
Regis perguntou em minha mente.
— Sim
Respondi irritado.
— Senti a passagem do tempo apenas como uma dor crescente em meu sangue e ossos à medida que minha mana se esgotava.
Falou Sylvie.
— Quero dizer que não pode ter sido meses, eu deveria ter murchado de desidratação em um tempo muito menor do que isso, mas…
— Você estava muito fora de si quando te checamos.
Regis respondeu a ela.
— É possível que você estivesse em um estado de congelamento ou algo assim?
— Minha mente estava…
Sylvie fez uma pausa, se esforçando para encontrar as palavras.
— Acredito que ainda estava me regenerando do uso do ovo–pedra? Meu cérebro de carne lutou para se fundir com as memórias paradoxais do que experimentei entre minha morte e retorno. É possível que a mana e o éter infundidos dentro do ovo para me ressuscitar também possam ter me sustentado naquele lugar, mas realmente não tenho ideia.
— Legal, legal, legal.
Respondeu Regis.
— Sou só eu ou Chul está tentando esconder alguma coisa?
— Chega.
Rebati, o fluxo de tagarelice mental ameaçando destruir meu último nervo.
— Por favor… Já chega.
Uma sugestão da dor que ambos sentiram com a minha reprovação vazou através de nossa conexão mental, rapidamente coloquei minha barreira mental para bloqueá-los. Meus próprios pensamentos eram um zumbido baixo e sem sentido. Simplesmente olhei para as costas de Chul e o segui pela masmorra transformada em santuário da casa dos Asura rebeldes.
— Você está diferente.
Disse Chul, aparentemente do nada.
— Sua energia. Você parece mais forte do que era. Sua presença é como um antebraço contra minha garganta.
Fiz uma careta andando atrás dele, sem vontade de jogar conversa fora. Na pressa de tirar Sylvie do vazio apenas para descobrir nossa longa ausência, não tive nem um instante para voltar meu foco para dentro de meu núcleo, mais uma vez fortalecido pela formação de uma terceira camada de éter em torno dos restos de meu núcleo de mana original.
Chul pareceu entender a dica do meu silêncio. Não fez mais perguntas, o Lar passou despercebido até que o rico cheiro das plantas alienígenas me trouxe de volta aos meus sentidos novamente.
Cerca de uma dúzia de Asuras estavam dentro do bosque, circulando sob os galhos das árvores de charwood. Nossa chegada causou alvoroço. Pelas expressões de choque, consternação e até indignação dirigidas a Sylvie, ficou claro que esses Asuras refugiados da raça fênix não gostavam de ter um dragão entre eles.
— Bem que eu falei.
Falou Regis, aparentemente incapaz de se conter.
Pareceu-me estranho que a reação deles fosse tão forte. Eles viviam no Lar há centenas de anos, a salvo das maquinações de Kezess. Sylvie não era uma ameaça para eles.
Mas só tive alguns segundos para pensar nisso, porque minha atenção voltou-se imediatamente para Mordain. A alta fênix caminhava lentamente entre os troncos de duas árvores charwood, com as mãos atrás das costas, suas vestes douradas apenas roçando a grama.
Contornei Chul, acelerando o passo. Algumas das outras fênix começaram a sair. Os que ficaram estavam tensos e vigilantes. Não tinha dúvidas de que, se fosse hostil com Mordain de alguma forma, eles sairiam em sua defesa sem questionar.
Sentindo minha aproximação, Mordain virou-se, franzindo as sobrancelhas e apertando os lábios.
— Arthur Leywin, você finalmente voltou para nós—
— Preciso saber o que está acontecendo lá fora.
Disse, sem me importar se estava sendo rude.
— Chul diz que já se passaram dois meses. Se isso for verdade, Dicathen está segura? Agrona atacou de novo?
Mordain ergueu a mão em sinal de paz, então gesticulou para um banco próximo.
— Há muito para lhe dizer. Talvez se nós—
— Não!
Interrompi, minha voz aguda soando desconfortavelmente no bosque tranquilo.
— Apenas me diga.
Mordain me olhou com uma graça natural, quase casual. Então, com um pequeno sorriso, acenou novamente para o banco e seguiu naquela direção.
— Arthur, talvez seja mais rápido parar de discutir do que continuar fazendo exigências?
Sugeriu Sylvie.
Fechei os olhos e respirei fundo, deixando o ar me encher. Quando soltei a respiração, imaginei-a levando um pouco da minha raiva em pânico com ela. Quando isso não ajudou, marchei até o banco e sentei-me rigidamente ao lado de Mordain.
— Agrona não atacou Dicathen novamente.
Mordain disse imediatamente. Cruzou as pernas e mudou para uma posição mais confortável no banco antes de continuar.
— Em partes porque ele ainda está ocupado administrando os negócios de Alacrya. Também, porém, por causa dos dragões.
Meu corpo inteiro ficou tenso.
— O que quer dizer?
Os dedos de Mordain tamborilaram na parte de trás do banco. Foi apenas uma vez, então o barulho e o movimento pararam, mas foi o suficiente para revelar sua agitação.
— Menos de uma semana depois que você e Aldir passaram pelo portal, uma fenda se abriu no céu acima da Clareira das Bestas. Não muito longe daqui, na verdade. Os dragões começaram a sair.
Me levantei.
— Kezess, os dragões, eles estão—
— Eles se espalharam pelo continente rapidamente. Seu povo, ao que parece, os recebeu de braços abertos. Os dragões patrulham o litoral e o céu, mas também se instalaram em suas maiores cidades. Conselheiros e protetores, ou pelo menos é o que afirmam.
O doloroso martelar do meu coração começou a diminuir um pouco.
— Eles não atacaram ninguém?
Mordain balançou a cabeça, então acenou para que eu me sentasse novamente.
— Parece que Kezess cumpriu sua promessa de ajudá-lo a proteger seu continente. Porém…
Parou, não terminando seu pensamento, mas seus olhos ardentes permaneceram nos meus.
Eu me acalmei de volta.
— Dragões em todas as grandes cidades. Você acha que eles são tanto uma ameaça quanto uma proteção.
A engenhosidade tortuosa da manobra de Kezess ficou clara enquanto eu a considerava. A ameaça de violência direta nunca precisou ser mais do que implícita como uma possibilidade, mas essa ocupação também permitiu que ele armasse a segurança de Dicathen indiretamente, ameaçando remover suas forças. Que líder, rei, conselheiro ou Lança, poderia convencer as pessoas de que estariam mais seguras sem a presença dos dragões?
Será que eu tenho esse tipo de capital político? Me perguntei.
O semblante de Mordain tornou-se sombrio.
— Kezess é um ancião e já jogou este jogo muitas vezes antes em Epheotus, com apostas muito maiores do que agora. Ou, pelo menos, esse é o caso no que diz respeito a ele.
Examinei o bosque. Regis e Sylvie estavam por perto, observando o desenrolar da conversa. Sylvie tinha uma expressão pensativa, poderia dizer que ela estava pensando sobre seu tempo de treinamento em Epheotus. Regis, por outro lado, não se preocupava com a aparição dos dragões.
Quando ele me sentiu sondar sua mente, inclinou a cabeça ligeiramente e encontrou meus olhos.
— O objetivo de ficar do lado do todo-poderoso psicopata era ganhar tempo, certo? Lidar com nossa lista de idiotas com complexo de Deus um de cada vez? Isso nos permite cumprir essa lista. Os dragões em Dicathen não vão agir contra nós ou contra o povo enquanto seu acordo com Kezess permanecer.
— Você tem alguma notícia da minha família?
Perguntei, sem conseguir esconder a culpa que sentia por tê-los deixado por meses sem dizer uma palavra.
Mordain me deu um sorriso triste e balançou a cabeça levemente.
— Embora os dragões possam ser seus aliados, eles ainda são firmemente meus inimigos, pelo menos enquanto Kezess os governar. Tem sido difícil descobrir, mesmo o pouco que tenho, sobre o que está acontecendo fora do Lar.
Reprimindo um suspiro, levantei-me novamente.
— Acho que preciso sair imediatamente, então. Já estive longe por muito, muito tempo.
Mordain ficou onde estava, olhando para mim do banco.
— Talvez a urgência não seja tão grande quanto você acredita. Se aceitar meu conselho, sugiro que se prepare melhor antes de entrar na boca do dragão, por assim dizer.
— Escute, não é como se a pequena Ellie estivesse pendurada pelos dedos dos pés sobre a caldeira de um vulcão ativo e correr de volta para Vildorial agora fosse o único jeito de salvá-la, certo?
Regis perguntou com todo o seu charme habitual e tato.
— Provavelmente deveríamos, sabe, descobrir o que diabos está acontecendo primeiro.
— Embora eu não concorde necessariamente com o jeito que falou.
Acrescentou Sylvie, lançando um olhar exasperado a Regis.
— Regis tem razão. Se os dragões estão no controle de Dicathen, isso torna tudo muito perigoso para todos nós.
Não achei seus argumentos convincentes, mas sabia que havia outra maneira de garantir a segurança de minha família. Voltando ao meu assento, retirei o artefato de visão.
— Com licença, um momento, Mordain. Quero ouvi-lo, mas preciso ter certeza.
Agarrando o cristal branco leitoso, o imbuí com éter. Minha visão mudou, focando na superfície do cristal enquanto tentáculos de éter encontravam os meus. Como já havia feito muitas vezes antes, pensei em Ellie e meus sentidos foram atraídos pelo artefato e pelos quilômetros que nos separavam. Quando a onda de movimento parou, estava olhando para ela de cima. Ellie estava descansando em uma cadeira de madeira, com a perna levantada sobre o braço, tinha um olhar de intenso tédio.
Reconheci o laboratório de Gideon perto dela e, quando pensei no velho inventor, a perspectiva mudou ligeiramente, revelando Gideon e Emily. Eles estavam conversando, fazendo perguntas a Ellie. Não pareciam estar em perigo…
Assisti por mais um minuto, mas nada mudou. Emily ou Gideon diziam algo que eu não conseguia ouvir, então Ellie oferecia uma resposta muda. Com bastante esforço, poderia ter lido seus lábios, mas era o suficiente para saber que Ellie estava segura. Vê-la tão relaxada, até entediada, me deixou confiante de que minha mãe também estaria bem.
Retirando-me do artefato, o devolvi à minha runa dimensional.
— Obrigado por sua paciência.
Disse a Mordain, que deixou seu olhar vagar enquanto eu focava na visão distante oferecida pelo artefato.
— Onde está Aldir?
Olhei para cima para perceber que Wren Kain havia aparecido enquanto eu estava focado no cristal.
— Ele…
Fiz uma pausa, meu olhar varrendo todos os Asuras que estavam ouvindo.
Aldir tinha razão. Sua morte foi capital que eu poderia gastar com o povo de Dicathen e Kezess. Agora, com os dragões presentes em Dicathen, eu precisava de todas as vantagens que pudesse obter.
Da minha runa dimensional, retirei o florete de prata que Aldir chamou de Cintilação Prateada, observando Wren com firmeza, mas solenemente.
— Seus crimes contra Dicathen não poderiam ficar impunes.
Ambos Mordain e Wren olharam para a lâmina, momentaneamente congelados.
— Seu menor ignorante.
O titã cuspiu, jogando seus braços para cima e olhando para mim.
— Aldir não era seu inimigo. Você não tem ideia do que ele abriu mão para deixar Epheotus. Se acha que Kezess vai recompensá-lo por fazer o trabalho sujo dele, você é mais idiota do que eu jamais imaginei. Se eu soubesse que treinar você nos levaria a isso, teria deixado você girar seus malditos polegares naquela cratera.
Mais do que qualquer outra coisa que Wren disse, esta última parte doeu. Cintilação Prateada desapareceu novamente, me endireitei em toda a minha altura.
— Milhões de vozes élficas nunca mais ecoarão pelas florestas de seus antepassados, porque Aldir destruiu as vozes e as florestas. Se você acha que Aldir morreu simplesmente para que eu pudesse receber um tapinha nas costas de Kezess, então vocês, Asuras, são ainda mais ignorantes do que nós, os chamados menores.
O olhar de Wren poderia ter quebrado granito.
— Então você pode perdoar o tirano que ordenou tal atrocidade, mas não o soldado forçado a executá-la? Você realmente já foi um rei, não foi?
— Não confunda necessidade com perdão.
Respondi, as palavras duras e frias como o fio de uma faca.
Wren soltou um bufo de escárnio, mas se ele tinha mais alguma coisa a dizer, guardou para si mesmo.
Mordain limpou a garganta.
— Não é minha função julgar o que foi feito. Epheotus lamentará a morte de um grande guerreiro, mas também pode ser que seu povo celebre sua morte como justiça. O que está feito está feito.
Seu olhar mudou para Sylvie.
— Parece que você teve sucesso em seu propósito.
Graças a Aldir, pensei, reconhecendo seu sacrifício em silêncio, mesmo que não pudesse expressá-lo em voz alta.
Sylvie deu um passo à frente e balançou a cabeça em uma reverência superficial.
— Lorde Mordain do Clã Asclepius. Obrigada por ajudar meu vínculo.
As sobrancelhas de Mordain se ergueram, sua expressão, enquanto a considerava, era difícil de analisar.
— Senhorita Sylvie do Clã Indrath. Sua herança é conhecida por mim. Meio dragão, meio basilisco, criado por um humano. Uma alquimia de contradições. Onde, eu me pergunto, está sua lealdade?
Sylvie ergueu o queixo e senti o fogo interior de sua determinação aumentar.
— Com Arthur, como sempre. Dicathen é minha casa, seu povo é meu povo. Seus inimigos.
Ela segurou o olhar na velha fênix, cada sílaba afiada ao ponto.
— São meus inimigos.
Mordain murmurou pensativo.
— E ainda assim você sempre será puxada não em duas, mas em três direções diferentes. Ambas as facções de Asura tentarão usar e manipular você para seu próprio ganho. Arthur já anda à beira do perigo ao lidar com seu avô. Seu retorno vai complicar ainda mais.
Movi-me para ficar ao lado do meu vínculo, descansando a mão em seu ombro. Regis avançou, ficando do meu outro lado.
— Suas palavras de cautela estão começando a soar mais como ameaças.
— Eu não sonharia com isso. Você não parece um homem que seria facilmente atraído, mas contra uma força como Agrona, ninguém está imune à tentação.
Disse Mordain.
Seu olhar parecia perfurar minha mente e evocar a memória de como eu implorei a Agrona que aceitasse seu acordo: a segurança de minha família em troca de parar de lutar na guerra por vontade própria.
Meu comportamento ficou frio enquanto eu olhava de volta.
— Passei por fracassos e cresci, mas, ao contrário daqueles que preferem manter a cabeça enterrada no chão, continuo lutando.
Mordain acenou com a mão, descartando nosso argumento com uma risada sábia.
— Não pretendo dizer a todos vocês o que fazer. O destino deste mundo está em suas mãos, não nas minhas. Mas conheço Lorde Indrath bem, Agrona também, e ambos verão o retorno da Senhorita Syvlie como uma oportunidade de ferir o outro, quer a usem como arma ou escudo. Você também não deve deixá-los fazer isso.
— Não vamos.
Disse, apertando o ombro de Sylvie antes de deixar minha mão cair.
— Bom!
A voz de Chul explodiu como um canhão, fazendo várias fênix próximas recuarem.
— Hora de ir, então?
Encarando o meio-asura, dei a ele um sorriso de desculpas.
— Receio que a presença dos dragões torne perigoso para você nos acompanhar. Eu—
— Já pensamos nisso, não é?
Disse Wren, suas palavras em tom afiado.
— Desenvolvi um artefato que vai esconder a assinatura de mana única de Chul para que ele se apresente como apenas mais um humano estúpido.
— Tão rápido?
Perguntei.
Wren Kain bufou.
— Rápido? Já se passaram dois meses, garoto.
Chul estufou o peito e ergueu uma braçadeira de metal indefinível forjada em metal opaco.
— Embora eu me esforce para ser a lança que atinge nossos inimigos, vou vestir a máscara da obscuridade por enquanto.
Ativando o Realmheart, o examinei mais de perto. Sua assinatura de mana era poderosa, mas não se destacava como desumana.
— Você não poderia ter consertado os olhos dele também?
Chul cruzou os braços e olhou para tudo e todos.
— Meus olhos não estão quebrados.
— Vai ter que ser o suficiente então.
Estendi a mão para Mordain.
Ele se levantou e a pegou, sacudindo-a com firmeza.
— Você não irá longe sem chamar a atenção dos novos guardiões de Dicathen. Há uma saída secundária que o levará a uma boa distância do Lar antes de ir acima do solo. Vou te mostrar o caminho. Enquanto caminhamos, posso contar o pouco que sei sobre a presença do dragão em seu continente.
— Adeus então.
Disse a Wren, oferecendo-lhe minha mão também.
— Entendo seus sentimentos e não vou usar sua raiva contra você. Mas prefiro me separar em bons termos.
— Partir?
Ele perguntou, olhando para mim incrédulo.
— Eu vou contigo. Não me juntei a Aldir só para me esconder.
Seu olhar saltou para Mordain.
— Sem ofensas.
Mordain deu a ele um sorriso suave.
— Venham por aqui. São algumas horas de caminhada por túneis raramente usados.
À medida que nos aproximávamos do final do longo túnel toscamente escavado, grossas raízes de árvores começaram a ultrapassar o teto e as paredes. Uma espécie de cova havia sido esculpida nas raízes, com muitos outros túneis convergindo para ela. Onde a árvore deveria estar acima de nós, apenas um toco oco permanecia. A rocha e a madeira restante estavam marcadas de preto.
— Uma fênix anciã costumava fazer ninho aqui, mas desapareceu há vários anos.
Comentou Mordain, de pé sob a abertura.
— Posso sentir os dragões mesmo daqui. Você pode tentar esconder suas assinaturas de mana, mas duvido que consiga se esgueirar daqui até Darv.
— Esgueirar-se é para os fracos e para aqueles que têm coisas a esconder.
Disse Chul, sua voz tão profunda que sacudiu a poeira entre as raízes que se espalhavam acima de nós.
— Você é o que precisamos esconder, espertinho.
Disse Regis com um bufo.
Wren revirou os olhos e Chul coçou a nuca com uma expressão envergonhada.
— Estes são os soldados de Kezess. Supostamente, são meus aliados.
Disse.
— Tentar me esconder deles pode gerar ainda mais suspeitas do que já está gerando minha repentina reaparição depois de dois meses.
— Como você procederá depende de você, é claro.
Mordain reconheceu, balançando a cabeça. Ele pegou a mão de Chul em seu próprio punho e segurou-a contra o coração.
— Não deixe suas paixões voarem com você. Se realmente deseja encontrar justiça para sua mãe, isso levará tempo e paciência. Deixe seus novos companheiros guiá-lo nisso.
— Deixar que eles me protejam dos meus piores impulsos, você quer dizer?
Chul disse sério.
— Entendo.
— Adeus então. Espero que volte para nós quando tudo isso acabar.
Para mim, acrescentou:
— Estou confiando em você para cuidar de um dos meus, Arthur Leywin. Não é um dever, ou confiança, que coloco em você levianamente.
— Adeus, Mordain.
Disse, então saltei através do toco queimado para pousar no chão da floresta acima. Os outros voaram atrás de mim.
— Suprima suas assinaturas de mana.
Disse, então comecei a marchar para longe através da vegetação rasteira.
Estávamos cercados por árvores enormes e frondosas como torres de guarda que encobriam o céu do meio da manhã. Mantive o Realmheart ativo, detectando as assinaturas de mana das perigosas bestas de mana que habitavam as partes mais profundas da Clareira das Bestas. Não havia nenhuma besta de mana em nenhum dos continentes que representasse uma ameaça para este grupo, mas eu não queria a demora ou a distração de ter que despachar os tipos de bestas de mana que provavelmente encontraríamos.
— Nesse ritmo, a guerra terminará antes de chegarmos a algum lugar.
Chul resmungou depois de mais ou menos vinte minutos.
— Você vai andar o caminho todo?
— Não.
Respondi baixinho.
— Aqui deve ser longe o suficiente.
Como os outros, eu estava segurando a aura etérica que sempre irradiava de mim, efetivamente me mascarando dos dragões que sentiam o éter. Me abri, como um punho se soltando, e minha assinatura de éter irradiou para fora como um farol. Empurrei ativamente, querendo ter certeza de que foi detectado.
Wren e Chul não conseguiam sentir o éter, mas podiam sentir a pressão.
— O que você está fazendo?
Wren perguntou, olhando-me com incerteza.
Um rugido rasgou o ar como um trovão. Galhos de árvores estalaram e pés com garras pesadas esmagaram e arranharam o chão da floresta. O chão tremia a cada passo.
Chul sorriu e saiu confiante na frente dos outros. Uma arma colossal apareceu em seu punho, pouco mais que uma esfera de ferro de forma grosseira na ponta de um cabo longo. Rachaduras na esfera liberavam luz laranja como se o núcleo estivesse derretido. A cabeça em si era tão larga quanto meus ombros. Devia pesar uma tonelada, mas ele a segurava sem esforço.
Um monstro bípede imponente surgiu à vista, suas enormes e alongadas mandíbulas largas, três olhos redondos em cada lado de seu crânio achatado dilatados com a emoção da caça. Isso me lembrou um crocodilo da Terra em pé sobre as patas traseiras, exceto que seus braços eram grossos com músculos tensos e terminavam em garras afiadas como navalhas e tinha mais de seis metros de altura.
Com um alegre grito de batalha, Chul se lançou contra ele, derrubando a arma em sua cabeça.
A barreira de mana protetora natural da besta classe S quebrou sob a força do golpe e chamas laranjas brilhantes cuspiram das rachaduras na cabeça da arma enquanto esmagava a pele grossa e de couro, o osso duro como pedra e a carne vermelha.
Chul pousou com graça surpreendente para alguém tão grande. O cadáver da besta de mana atingiu o chão com muito mais força, enviando uma onda de choque pela floresta. Um punhado de assinaturas de mana igualmente poderosas que estavam convergindo para nossa posição parou e depois se dispersou lentamente.
— Ah, sentir o calor escaldante da batalha fluindo como vinho de mel em minhas veias.
Disse Chul, respirando fundo.
— Pena que este venator era tão jovem. Se estivesse totalmente amadurecido, nossa batalha poderia ter valido a pena ser contada!
— Eles estão vindo.
Disse Sylvie, com os olhos no único pedaço de céu nu que podíamos ver através dos galhos e folhagens densas das árvores.
— Vamos enfrentá-los em um terreno mais plano.
Disse Wren, passando os dedos sujos de terra por sua massa emaranhada de cabelo.
Com um aceno de sua mão, a mana do atributo terra começou a se fundir, retirada do solo para endurecer em pedra sólida. Em segundos, um navio moldado para se parecer com um veleiro pairava entre os galhos das enormes árvores. Era feito de pedra, mas as texturas eram tão finamente manifestadas que era quase indistinguível de madeira e tecido.
Sylvie passou o braço em volta de mim e flutuou sobre a amurada do navio, deixando-nos no convés. Os outros seguiram e o navio começou a subir por entre os galhos.
Regis respirou fundo e soltou o ar alegremente.
— Isso é ótimo. Sempre quis ser pirata. Um tapa-olho realmente melhoraria minha estética malandra em geral, você não acha?
— O que é um “pirata”?
Chul perguntou, suas feições rudes contraídas em confusão.
Descansando minhas mãos no corrimão, olhei para o oeste em direção às distantes Grandes Montanhas. O vasto deserto de Darv ficava do outro lado, escondido embaixo dele estava minha família e todos aqueles que contavam comigo. Porém já podia sentir as ondas distantes, mas opressivas da Força do Rei irradiando de vários dragões.
— Coloque o navio em movimento, mas devagar, como se estivéssemos procurando alguma coisa.
Disse a Wren. O navio começou a flutuar sobre as copas das árvores, movendo-se geralmente para o oeste.
— Devemos ter algum tipo de sinal se você deseja que ataquemos.
Chul disse sério, olhando na direção da assinatura de mana mais próxima.
— Talvez se você gritar “Atacar”.
— Anotado.
Disse, meu foco nos dragões distantes.
Sylvie se aproximou de mim. Havia uma rigidez em sua postura com a qual eu não estava acostumado.
— Você está bem? Perguntei em sua mente.
— Só pensando no que Mordain disse. Esses dragões saberão o que sou de vista, mesmo que não saibam quem sou. Não consigo nem começar a prever todos os… os…
Sylvie estremeceu, fechando os olhos com força. Ela virou o rosto e a conexão mental entre nós foi cortada enquanto ela se protegia.
— Sylv, o que—
Ela balançou a cabeça e seus olhos se abriram novamente.
— Nada. Apenas algum tipo de efeito colateral da ressurreição.
Ela olhou para a frente na direção de onde emanavam duas das assinaturas de mana.
Sem saber como confortá-la, também mantive meu olhar fixo à frente. Uma assinatura, vinda do norte, tornou-se um pontinho no horizonte. O segundo estava um pouco mais longe, voando das montanhas a noroeste. O terceiro se aproximava da costa para o sudoeste.
O primeiro a chegar foi um grande dragão com escamas de esmeralda, metade do tamanho do nosso navio. Quando estava a trinta metros de distância, se virou para voar ao nosso lado, seus olhos amarelos brilhantes examinando o convés. Eles pararam em Sylvie, primeiro semicerrando os olhos como se não tivessem certeza de que podia confiar em seus próprios olhos, depois se arregalando.
A segunda, um pouco maior que o primeiro, com escamas brancas peroladas que brilhavam à luz do sol, circulou para voar acima e atrás de nós, seu enorme volume eclipsando o sol e mergulhando o convés na sombra.
O terceiro era uma criatura ágil com escamas de cor carmesim escura que pareciam beber a luz do sol, sem brilhar mesmo quando suas asas batiam. Seu rosto, com mandíbulas grandes o suficiente para engolir até Chul inteiro, estava coberto de cicatrizes de batalha, havia um rasgo esfarrapado na ponta de sua asa direita. Ele fez uma curva acentuada ao longo de nosso lado de bombordo para que os dragões nos flanqueassem.
O dragão verde falou, mana irradiando através das palavras para carregá-las facilmente através do barulho e da distância.
— Arthur Leywin. Não nos conhecemos, mas reconheço você pela descrição. Lorde Indrath ficará satisfeito em saber que você está vivo. Houve… preocupação com sua longa ausência.
— Onde você esteve?
O dragão vermelho rosnou, batendo suas asas para se aproximar do navio, seus grandes olhos ocres sondando cada um de nós, terminando em Sylvie.
— O que um dragão, um titã e dois humanos estão fazendo nas profundezas da Clareira das Bestas?
— Essa não é a recepção que eu acho que meu avô esperava para mim quando eu voltasse.
Sylvie inclinou a cabeça, conseguindo parecer irritada e apática ao mesmo tempo em que olhava de nariz empinado para o dragão vermelho. Em contraste com sua postura externa, senti um desconforto contorcido sangrar através de nossa conexão quando ela invocou Kezess em nossa defesa.
— Você deve ter cuidado com quem marca com esse olhar malévolo.
Os olhos do vermelho se arregalaram e ele se afastou.
— Senhorita Sylvie Indrath?
Os três dragões trocaram olhares incrédulos. Foi a branca quem falou, com a voz tensa de emoção.
— Senhorita, você deve vir comigo imediatamente. Vou levá-la à fenda que conecta este mundo com Epheotus. O Lorde Indrath—
— Pare.
Sylvie disse, sua voz soando como um comando.
— Meus deveres estão aqui em Dicathen no momento. Se deseja informar o Lorde Indrath, fique à vontade, mas não irei acompanhá-la.
O dragão estremeceu com suas palavras, ferida e com medo.
— Senhorita, o Lorde Indrath desejaria—
Sylvie liberou uma onda tangível de mana para projetar seu desagrado, cortando as palavras do dragão branco mais uma vez.
— Neriah do Clã Mayasthal obedecerá.
O dragão proferiu rapidamente antes de se virar para os outros dois.
— Escoltem a Senhorita Sylvie até seu destino.
Afastando-se, o dragão branco voou em alta velocidade para o leste, mais fundo na Clareira das Bestas.
Só então senti o movimento sutil de mana daquela direção, como se uma leve brisa soprasse para o oeste sobre a Clareira das Bestas.
— O que é aquilo?
Perguntei a Wren, que até então observara em silêncio e não se dirigira diretamente aos dragões.
— Lorde Indrath abriu o caminho entre os mundos.
Disse suavemente.
— Epheotus jaz nua para o universo mais amplo.
— Vocês dois, nos deem algum espaço.
Sylvie ordenou ao dragão verde e vermelho.
— Vocês não estão escoltando prisioneiros.
O verde assentiu respeitosamente antes de se afastar, voando algumas centenas de pés a estibordo. O vermelho hesitou, inspecionando-a de perto, então seu olhar foi para mim e seu rosto endureceu. Muito mais lentamente do que sua contraparte, ele se afastou.
Nosso navio ganhou velocidade e corrigiu o curso, de modo que estávamos voando direto para as Grandes Montanhas.
À distância, mais dragões se tornaram óbvios, voando sobre as montanhas e a fronteira entre a Clareira das Bestas e os arredores de Elenoir.
Um escudo de asas, fogo e garras.
— Um escudo… ou uma prisão.
Respondeu Regis com um sorriso malicioso.
— Vamos ver qual é.
Tradução: Reapers Scans
Revisão: Reapers Scans
QC: Bravo
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